sábado, 18 de junho de 2022

Boukensha ni Naritai to Miyako ni Deteitta Musume ga S Rank ni Natteta — Volume 02 — Capítulo 27.6

Capítulo 27.6: Irmãs


Quando Belgrieve ainda estava hospedado na mansão Bordeaux...

Sob o sol ininterrupto da manhã, estava claro e alegre, mas logo as nuvens vieram para lançar sua sombra. Um olhar para cima revelou uma extensão cinzenta opressiva que parecia anunciar chuva a qualquer momento. “Estamos tendo muita chuva nesta primavera.” alguém murmurou.

Belgrieve estava ajudando a separar os escombros extraídos da mansão, porém assim que os céus começaram a parecer perigosos, ele e todos os outros recuaram para dentro. Não que houvesse algo para fazer lá dentro; depois de dar uma volta em torno de seu quarto, Belgrieve se sentou em uma cadeira.

Alguns dias se passaram desde o caos. A mansão tinha sido grosseiramente arrumada, no entanto os cortes nas paredes e no chão ainda precisavam ser reparados; carpinteiros podiam ser vistos indo e vindo todos os dias.

Logo estava chovendo do lado de fora da janela. Não caiu muito forte, apenas o suficiente para encharcar qualquer um que saísse; talvez sua falta de força ao invés tornasse mais fácil para acabar deixando alguém encharcado sem perceber. Recuar tinha sido a decisão certa de fato.

Embora pudesse dizer que estava chovendo, as gotas eram tão finas que mal faziam barulho ao pousar. Talvez por essa razão, achasse bastante inquietante ficar parado. Enquanto ele estava sentado lá, olhando pela janela com as relutantes mãos ociosas, entrou Angeline. Ela devia estar do lado de fora, pois seu cabelo preto brilhava com pequenas gotas.

Nem um momento depois de entrar, se agarrou às costas de Belgrieve.

“Chuva...”

“Sim, parece.”

“Não podemos limpar assim...”

“Não há muito que possamos fazer sobre o clima.”

Por um tempo, Angeline enterrou o rosto com prazer nas costas de seu pai, antes de colocar a mão em seu ombro para se erguer.

“Vou checar Sasha com Anne e Merry... Você vai se juntar a nós?”

“Hmm... Hm... Talvez da próxima vez.”

“Hã?”

Angeline fez biquinho, mas não tentaria forçá-lo. “Vou indo então.” disse ela, depois de apertá-lo um pouco mais antes de sair. Belgrieve suspirou.

O céu lá fora aos poucos ficou mais escuro. Pouco a pouco, as gotículas incharam até que o ar se encheu de um rugido estrondoso enquanto batiam contra a janela e o chão.


Quando Angeline entrou no quarto, Anessa estava enxugando os cabelos úmidos, enquanto Miriam fazia o mesmo com o chapéu. A chuva havia aumentado enquanto as duas estavam treinando com os soldados. Estava claro o suficiente para que elas pensassem que poderiam continuar, contudo parecia idiota pegar um resfriado sem motivo e logo desistiram.

Assim que notou Angeline, Miriam acenou com a toalha. Suas orelhas de gato se contraíram em cima de sua cabeça.

“Hã? Onde está o Sr. Bell?”

“Ele não vai vir... Não sei por quê. Ele não gosta de Sasha...?”

“Não acho que seja o caso... Talvez se sinta estranho por estar cercado apenas por garotas.”

Entendo, pensou Angeline. Com certeza não seria nada além de mulheres jovens além de Belgrieve. Embora mantivesse a compostura, talvez não fosse tão confortável para ele aqui.

“Que incômodo.” comentou. Ela estava perfeitamente bem em ter um único homem mais velho misturado. “O pai está atingindo sua fase rebelde...?”

“Do que você está falando... Seja como for, vamos.”

As três saíram do quarto. A escuridão do lado de fora havia se infiltrado até o corredor, tornando-o estranhamente sombrio. Talvez seja porque os sons da chuva são silenciados aqui. É mais silencioso do que tem o direito de ser.

Quando bateram na porta, receberam um enérgico “Entre!” Sasha estava sentada na cama. Embora seu braço esquerdo estivesse enrolado e pendurado em uma tipoia, sua tez era maravilhosa.

Seren estava sentada na cadeira ao seu lado, sua expressão se iluminou assim que as viu. “Ah, vocês estão todas aqui!” Seren se levantou com um sorriso. “Por aqui, por favor. Vou pegar um chá.”

“Não se preocupe conosco... Viemos sem ser convidadas.” Angeline riu enquanto puxava uma cadeira até a cama. “Como está se sentindo?”

“Tenho energia de sobra. Na verdade, sinto que estou relaxando e não aguento mais.”

“Vamos, Sash. Precisa descansar se quer se recuperar rápido.”

“Eu entendo, no entanto... Urgh.” Sasha soltou um suspiro perturbado. Ela estava cheia de energia e irritada por não ter onde gastar essa energia. Apenas alguns dias antes, havia causado um grande alvoroço ao exigir participar das lutas, o que preocupou muito Ashcroft.

“Você usou um elixir, certo? Não vai estar melhor em um mês...?”

“Certo. Mas é frustrante, Ange. Estou fora disso quando você e meu mestre estão aqui.”

“Vejo que realmente gosta de balançar sua espada, Sasha...”

“Porém isso é muito raro.” disse Miriam. “Por que se tornou uma aventureira? Poderia ter sido uma soldada se quisesse, e como é uma nobre, tenho certeza que poderia ter sido uma cavaleira.”

Sasha coçou a cabeça timidamente. “Bem... Apenas admiro os aventureiros.”

“Os admira?”

“Sim. É certo que comecei a me debater com uma espada porque admirava os cavaleiros, mas...” Sasha continuou em um tom ansioso.

Seu pai, o falecido Conde Bordeaux, estava bem ciente de que as três irmãs tinham seus próprios pontos fortes. A mais velha, Helvetica, ostentava a capacidade de conquistar corações e mentes e ver o quadro geral. A mais nova, Seren, estava imbuída de perspicácia política, enquanto a filha do meio, Sasha, possuía uma competência anormal com a lâmina. O conde ensinou às filhas que não havia necessidade de ser bom em tudo, que todas podiam se concentrar em seus pontos fortes e ajudar umas às outras.

“Então, tenho estudado a lâmina desde que era jovem.”

“E isso o levou a se tornar uma aventureira?”

“Sim, uma vez estava acompanhando meu pai em suas inspeções. Um monstro nos atacou — um monstro com uma carapaça robusta, e os soldados que não estavam acostumados a enfrentar monstros estavam lutando. Foi quando um aventureiro apareceu, perfurando com precisão as lacunas em sua carapaça e derrubando-o em pouco tempo...”

“Hmm... Um rato blindado, talvez? Eles são Rank B, pelo que me lembro...”

“Ah, que conhecimento! De qualquer forma, admiro os aventureiros desde então.”

“Entendo... Seu pai não foi contra?”

Sasha balançou a cabeça. “Bordeaux sempre teve uma ligação estreita com seus aventureiros. Meu pai me deu um incentivo, dizendo que lutar contra monstros era tão importante quanto. É um dever importante que protege nossos cidadãos tanto quanto os soldados.”

“Entendo... O Conde Bordeaux foi um bom pai.”

“Ele era!”

“Meu pai não fica para trás...”

“Por que está fazendo disso uma competição?”

O clima estava alegre, porém quando Angeline olhou para Seren, viu a garota silenciosamente abaixando a cabeça. Fazia um tempo que ela não participava da conversa.

“O que há de errado, Seren... Uma dor de estômago?”

“Hum? Ah, não, estou bem.” Seren sorriu.

Sasha estreitou os olhos em dúvida. “Você tem se comportado um pouco estranha desde tudo o que aconteceu. Se algo estiver errado, precisa me dizer direito. Não o segure.”

“Estou bem mesmo... Hmm, vou pedir um chá.” Seren se levantou e fugiu da sala.

Anessa e Miriam trocaram olhares.

“O que acha?”

“Está acontecendo algo. Achei que Seren fosse um pouco mais composta do que isso.”

“Seren está assim desde aquela confusão.” disse Sasha, parecendo bastante perturbada. “Às vezes, Seren olha para longe, e às vezes tem esse olhar triste no rosto... Sempre que a pergunto, ela sempre diz que está bem.”

“Hmm... Deve ter sido um choque para ela.”

“Sim, nosso pai voltou como um morto-vivo, afinal.” Sasha suspirou. “Sei que me falta um pouco de tato. Sempre que tento dar um conselho, pareço um pregador... Se estiver tudo bem, gostaria que vocês três se aproximassem casualmente de Seren. Talvez as conte as coisas que não vai me contar.”

Sasha estava ciente de como podia ser grosseira, enquanto Helvetica ainda estava bastante ocupada lidando com as consequências. Embora ambas tenham notado o comportamento estranho de Seren, nenhum delas teve a chance de chegar ao fundo do assunto.

“Entendido.” Angeline assentiu. “Fique boa logo.”

“Obrigado, Ange. Significa muito.” Sasha ofereceu um sorriso fraco — uma rara exibição da jovem. Sasha estava evidentemente preocupada por não conseguir ouvir como gostaria as preocupações de sua irmãzinha.

Um momento se passou, e então uma empregada entrou com o chá.

“Onde está Seren?” Sasha perguntou com uma inclinação de cabeça.

“A senhorita disse que estava ocupada e voltou para o quarto.”

“Hmm...” Sasha coçou a cabeça parecendo totalmente não convencida. “É em momentos como esses que odeio a minha falta de tato.”

“Não se preocupe. Duvido que Seren esteja te evitando porque te odeia ou algo assim.”

“Certo, certo. Seren é uma boa garota, então ela tem muito com que se preocupar. Com certeza.” Anessa e Miriam disseram isso para animá-la. Sasha assentiu um pouco tímida.


Naquele momento, Belgrieve havia sido convidado para tomar chá com Helvetica, que evidentemente estava tomando um pouco de descanso do trabalho. Ele se sentou em frente à senhorita em seu escritório enquanto ela empilhava açúcar em sua xícara, sorrindo. “Obrigado por toda a sua ajuda.”

“Você nos deu um lugar para ficar.” disse Belgrieve antes de tomar um gole. As folhas de chá exalavam um aroma muito peculiar. “Este é um chá estranho que você tem aqui.”

“Sim, as folhas são fermentadas. Comprei de um vendedor ambulante outro dia... Você gosta?”

“Não é ruim, mas, bem, pode levar algum tempo para se acostumar. Devo adicionar açúcar?”

“Sim, e me disseram que as pessoas adicionam leite ou espremem um limão junto também.”

Belgrieve acariciou a barba, confuso; nunca havia ouvido falar de tais maneiras de beber chá antes. Embora houvesse muitas coisas no mundo que não soubesse. Ele olhou de volta para a mesa, notando as pilhas de envelopes e documentos. Helvetica teve que enviar algumas cartas para outras regiões e nobres para consertar a cidade, entre outras coisas. Isso é uma coisa com a qual não posso ajudar, pensou Belgrieve, com um sorriso irônico no rosto.

Observando Belgrieve com um pouco de interesse, Helvetica pousou a xícara e suspirou.

“Algo de errado?” Belgrieve a perguntou.

“Ah, não... Só estava pensando em como o tempo voa.” disse Helvetica e olhou ao redor do escritório.

Belgrieve seguiu seu olhar. Com exceção de uma janela nos fundos, as paredes estavam completamente cobertas por prateleiras forradas de livros e documentos empacotados e, embora parecessem bastante irregulares e bagunçadas, tudo estava, talvez, em seu devido lugar. “Dificilmente mudou desde quando meu pai o usava.”

“Entendo.”

“Eu não sou a condessa há muito tempo... Mas ainda assim faz quase meio ano.”

“Mesmo assim, você é bastante adorada, não é? Estou impressionado.”

“Hehe, obrigado. É um alívio ouvi-lo de você.” Helvetica corrigiu sua postura e se virou para Belgrieve. “Devo perguntar mais uma vez, Sir Belgrieve. Aceitaria o serviço com a Casa Bordeaux? Suas contribuições no incidente dos mortos-vivos são incomparáveis. Por favor, empreste-nos a sua força.”

Belgrieve coçou a bochecha. “Sinto muito. Tenho que recusar.”

“Entendo.” Helvetica não insistiu no assunto, encerrando-o com um único suspiro desapontado. Então ela sorriu. “Achei que fosse dizer isso.”

“Eu realmente sinto muito.”

“Não sinta. Você tem o dever de proteger Turnera.” ela disse, antes que seus lábios se torcessem em um sorriso malicioso. “Porém não vou desistir.”

“Não estou certo de como reagir a respeito.” Belgrieve deu de ombros. “Acho que você pode ficar muito bem sem mim. Tendo duas irmãs excelentes, e Ashcroft também... E não vamos esquecer como você cresceu, pelo menos desde a última vez que a vi em Turnera.”

“Certo...” Helvetica estreitou os olhos. “Talvez seja porque... Superei uma das provações colocadas diante de mim.”

“Hum...”

“É estranho. O incidente do outro dia foi triste, com certeza. No entanto, sinto que aconteceu porque tinha que acontecer. De certa forma, eu teria permanecido uma pequena dama protegida sem ele.”

Seus olhos, agora bem abertos, travados em Belgrieve. “Embora... Foi um pouco doloroso.”

“Está falando do seu pai?”

Ela deu um pequeno aceno de cabeça. Belgrieve não estava lá, então não sabia os detalhes, mas ao que parecia, Helvetica ficou cara a cara com o monstro morto-vivo que uma vez foi o Conde Bordeaux. Ele não podia nem imaginar como deve ter sido dar o golpe de misericórdia ao seu pai, um homem que respeitava do fundo do coração.

“Não quero dizer nada de forma impensada, contudo... Acredito que agiu bem.”

“Obrigada.” Helvetica sorriu.

Belgrieve não sabia o que significava viver como um nobre. O fato de que seus meios de subsistência e de todos aqueles ao seu redor repousassem sobre os ombros dela talvez fosse uma responsabilidade pesada, muito além do que um plebeu estava acostumado. Havia nobres que jogavam fora esse dever para satisfazer seus próprios desejos egoístas, porém Helvetica não era um destes. Era simples apenas elogiá-la, no entanto Belgrieve acreditava de verdade que ela havia feito o melhor que podia.

Vendo seu rosto sério, Helvetica não conseguiu conter a risada. “Desculpe, chamando-o aqui só para falar sobre essas coisas.”

“Não me importo. Recusei a posição, contudo ajudarei no que puder.”

“Hehe, então vai se tornar meu marido?”

“Aí está você, me provocando de novo.”

“Hmph, não foi completamente uma piada.” Helvetica estufou as bochechas como uma criança.

Belgrieve riu enquanto levava a xícara de chá à boca.


Depois de conversar um pouco mais com Sasha, Angeline se separou do grupo e voltou para o quarto. Belgrieve estava sentado perto da janela olhando para fora. A chuva havia parado enquanto ela não estava olhando, e o sol brilhava através das lágrimas nas nuvens.

Seus tons tingidos de vermelho sugeriam que já estava perto do pôr do sol.

Belgrieve olhou-a quando Angeline se sentou ao seu lado.

“Como está Sasha?”

“Ela é otimista.”

“Haha, entendo. Estou feliz que não seja nada sério.”

“Pai... O que acha de Seren?”

“Hum? O que quer dizer?”

Em resumo, Angeline explicou que havia algo estranho em Seren e que parecia estar se preocupando com alguma coisa.

Belgrieve alisou a barba. “Você pode estar certa a respeito.” comentou.

“Você acha? Fiquei me perguntando o que fazer...”

“Hmm... Por enquanto, precisará ouvi-la, ou não chegaremos a lugar nenhum.”

“Sim. Acho que vou passar no quarto de Seren.”

“Certo. Às vezes é difícil falar com a família. Talvez uma pequena conversa a alivie.”

Angeline assentiu, levantou-se e saiu da habitação. Ela vagou um pouco sem rumo, pois não sabia onde era o quarto de Seren. Ao perguntar a uma empregada que passava, conseguiu identificar a localização, apenas para descobrir que a garota havia saído para algum lugar, o que tirou o vento de suas velas.

“Onde Seren foi...?”

“Ela disse que estava indo para a cidade.” aparentemente partiu a cavalo.

O que Seren está indo fazer quando o sol está quase se pondo? Angeline se perguntou. Mais uma vez, Angeline se viu de volta ao seu quarto.

Belgrieve vigiou-a com curiosidade. “Isso foi rápido.”

“Seren tinha saído.”

“A esta hora do dia? Hmm...” Belgrieve parecia duvidoso.

Angeline sentou-se ao seu lado com um cotovelo na mesa. “Com o que Seren poderia estar se preocupando?”

“Ela encontrou seu pai como um morto-vivo. E testemunhou Helvetica derrotá-lo.”

“Sim... Então foi realmente um choque...”

Angeline tentou imaginar. Se Belgrieve morresse, seu cadáver aparecesse na sua frente e tivesse que derrotá-lo... Uma vez que seus pensamentos chegaram a esse ponto, ficou tão desolada que teve que pular e se agarrar ao homem.

Belgrieve piscou. “O que? Algo errado?”

“Wah...”

Então é isso que Seren e Helvetica tiveram que passar, pensou Angeline. Seus olhos já estavam marejados com o mero pensamento.

“Foi difícil, Seren... Incrivelmente difícil...”

“Por que está chorando? Minha nossa...”

“Quero dizer... Seu pai morreu, e os mortos-vivos! Urgh...” Angeline soluçou, seu rosto enterrado no peito de seu pai.

Belgrieve suspirou e acariciou suas costas. “É verdade... Talvez Seren não saiba lidar com essas emoções.”

“O que devo fazer? O que posso fazer por ela, pai?”

Com um olhar perturbado no rosto, Belgrieve olhou pela janela, procurando as palavras certas.


A noite havia chegado, mas no final Seren não voltou mesmo quando o jantar chegou. Os soldados em patrulha confirmaram que ela estava em algum lugar da cidade, então Helvetica intencionalmente não enviou ninguém para encontrá-la. Ao que parecia, entendia como sua irmã se sentia.

Terminado o jantar, Belgrieve deixou a mansão para uma curta caminhada. Havia fiapos de nuvens finas esticadas sobre o céu, a lua quase cheia brilhando fracamente atrás de seu véu. Ele olhou distraído, quando ouviu passos atrás, logo seguido por alguém se arrastando em suas costas. Era Angeline.

“Não me deixe para trás...”

“Hmm? Ange... Você não estava com Anne e Merry?”

“Estamos aqui.”

“Ange fugiu dizendo que preferia estar com você, Sr. Bell.”

As duas garotas apareceram por trás de Angeline, seguindo-a quando saiu correndo.

Belgrieve deu um tapinha em Angeline com um olhar resignado no rosto.

Os quatro andaram sem rumo, encontrando uma fogueira acesa em frente ao posto de guarda próximo. Vários soldados colocaram peles para sentar, mantendo conversas animadas com canecas de cerveja na mão.

“Precisava ter visto como Angeline se moveu naquela hora! Não recuou nem um passo quando deu um bom chute naquele pirralho!”

“Aquele pirralho era muito forte. Nunca teria imaginado que a senhorita Sasha, Ashcroft e Elmore juntos não teriam chance contra um garoto.”

“Quem eram eles, afinal? Tenho certeza de que o Conde Malta estava apenas usando, no entanto... Oh, Sr. Belgrieve!”

“Angeline também!”

“Fique um pouco se quiser!”

Os jovens soldados os convidaram a sentar-se ao redor do fogo. Havia pouca razão para recusar, e receberam canecas de madeira cheias até a borda com a mistura suave.

“Aqui está! É uma honra bebermos juntos.”

“Obrigado.”

“Não, obrigado, Sra. Angeline. Aquela partida que tivemos antes foi uma boa lição.”

“De nada...”

“Como ficou tão forte?”

“Mas o Sr. Belgrieve também é incrível. É ainda mais forte que Angeline, não é?”

“Ah, de jeito nenhum. Essa garota é muito mais forte do que eu.”

“Pelo contrário, meu pai é mais forte.”

“Haha, invejo como vocês podem discutir sobre isso.”

“Que tipo de treinamento fazem? Deve ser bastante rigoroso.”

“Não tenho tanta certeza... Não acho que façamos nada de especial, embora no meu caso, minha perna esteja assim.”

“Já que tocou no assunto...”

“Ainda assim, é incrível o quão forte é apesar da sua condição. Não estou confiante de que poderia me mover tão livremente se ficasse assim.”

“Hey, vamos, está me deixando envergonhado com todos os elogios descarados...”

“O que isso importa? Você é forte de verdade, Sr. Bell.”

“Ela está certa. Você foi quem percebeu que algo estava errado com a mansão.”

“Sim. Meu pai é muito forte.”

“Estão realmente me superestimando aqui...” o vento acariciou o pescoço de Belgrieve enquanto dava uma risada tensa. Os ventos estavam frios nesta bela noite de primavera, e ele moveu as mãos para perto do fogo.

Os soldados admiraram Belgrieve por se apressar em ajudar a mansão durante o primeiro ataque e o adoraram por dar ordens precisas e fazer as chamadas apropriadas no segundo. Eles acreditavam, sem dúvida, que as três irmãs Bordeaux só haviam saído inteiras graças às meninas e a Belgrieve. E assim, queriam ouvir seus contos e elogiá-los.

Enquanto conversavam, bebericando a cerveja, ouviram passos vindos de trás.

Os olhos de Angeline se arregalaram quando ela chamou, “Seren”.

“Ah... Todos estão aqui.” Seren parecia um pouco abatida enquanto caminhava até eles.

Os soldados estavam em movimento.

“Senhorita Seren, que incomum.”

“Ainda está frio. Por favor, venha.”

Seren abriu e fechou a boca em silêncio, seus olhos vagando. Parecia hesitante. Angeline se levantou, correu, segurou-a pelo ombro e bagunçou o cabelo com um pouco de força.

“Você vem, não vem?”

Seren piscou algumas vezes. “Tudo bem.”

Os soldados ficaram animados quando Seren entrou em seu círculo. Ao contrário de Helvetica e Sasha, Seren raramente se juntava em tais ocasiões.

“Aqui, senhorita Seren! Sente-se ao lado do Ogro Vermelho! O melhor lugar da casa.”

“Ahahaha!”

“Movam-se! Abram espaço!”

“O que acha que eu estou fazendo?”

Os soldados ocuparam um lugar ao lado de Belgrieve.

“Hehehe, obrigado...” Seren sorriu. Ela se viu espremida entre Belgrieve e Angeline enquanto segurava os joelhos, os ombros tremendo.

Um dos soldados trouxe um grande jarro. “Quer um pouco de cerveja, senhorita?”

“Estúpido, a senhorita Seren não vai beber sua cerveja desagradável. Vinho! Traga o vinho!”

“Alguém pegue vinho.”

“Está tudo bem, tudo bem. Não se preocupem comigo... Vou tomar um pouco de cerveja.” Seren acenou com as mãos um pouco nervosa.

Os soldados riram enquanto enchiam uma caneca limpa e a entregavam.

Seren tomou um gole antes de cair em um torpor. “É-É amargo...” murmurou.

“Você está bem, senhorita? Devo pegar um pouco de vinho?”

“Não, estou bem.” disse Seren. Seu rosto permaneceu amuado enquanto tomava outro gole. Enquanto os soldados trocavam olhares, nenhum deles pretendia ir contra a vontade dela, e rapidamente voltaram à sua conversa habitual.

“Esse foi o seu primeiro gole de cerveja?” Belgrieve sussurrou para Seren.

“Sim... Tenho vergonha de admitir que foi. Mesmo que eu viva em Bordeaux de todos os lugares...” suas bochechas ficaram levemente vermelhas.

Belgrieve riu. “Verdade seja dita, também não estou acostumado com cerveja... É bem amargo.”

“Oh sério...? Até você tem esses momentos.” Seren disse, piscando um pouco alarmada, antes que um toque de alívio se instalasse em seu rosto, e a tensão sumiu de seus ombros quando Angeline confortavelmente passou um braço ao redor deles.

As conversas animadas continuaram com um pouco da contribuição de Seren até que por fim o pequeno banquete chegou ao fim e os soldados se levantaram.

“Temos um dia cedo amanhã... Por favor, vão com calma.”

“Sim, bom trabalho, e obrigado.” disse Anessa.

Seren se levantou e curvou a cabeça enquanto os soldados saíam com jarras e canecas vazias. “Obrigado por tudo.”

“V-Você não tem que se curvar para nós, senhorita.”

“Estou envergonhado que um pouco de cerveja era tudo o que podíamos oferecer.”

Os soldados assentiram várias vezes antes de irem embora. Seren mais uma vez sentou-se com os outros. Anessa jogou uma tora na chama que quase se transformou em brasas, acompanhada por um som de estalo e faíscas espalhadas. As nuvens finas clarearam gradualmente, dando à lua nebulosa seus contornos definitivos. À medida que a área ficava mais clara, suas respirações eram iluminadas com um tom claro e pálido.

“Você foi para a cidade?” perguntou Anessa.

Seren assentiu. “Desculpe por te preocupar...”

“Está bem. Às vezes, você só tem um desses dias.” Miriam disse com uma risada, dando um tapinha no ombro de Seren.

Seren soltou um longo suspiro. “Eu nunca soube.”

“Hum?” Belgrieve inclinou a cabeça.

Seren olhou para as chamas. “Mal falei com os soldados... Gosto de andar a cavalo, porém lutar não é o meu forte... Sempre senti que havia uma distância desconfortável entre mim e eles.”

“É mesmo... Mas todo mundo tem seus pontos fortes e fracos. Acho que não precisa se preocupar com isso. Ainda é bem jovem.”

“Hehe... Pode ser assim. Contudo dado o que aconteceu...” Seren pressionou a boca em seus joelhos. Seus óculos refletiam o vermelho das chamas. “Fui incapaz de fazer qualquer coisa... Estava apenas sendo protegida.”

“Não foi sua culpa.” disse Anessa.

“Certo, certo. Não é como se todo mundo tivesse que lutar.” acrescentou Miriam.

Seren fechou os olhos. “Certo... Mas não sei se eu deveria estar ali... Fui salva por Angeline, então salva uma vez mais pelos soldados e Belgrieve... No entanto, sinto que sou eu quem deveria estar protegendo — como uma nobre, como alguém que deve estar acima dos outros...” ela puxou os joelhos para mais perto de seu corpo. “Me sinto patética. Quando meu pai apareceu, meu corpo não me ouviu. Eu me encolhi... Foi demais para mim.”

“Entendo...” Angeline a abraçou. “Não é nada para se envergonhar.”

“Mas... Minha irmã o encarou de frente. Desde então, tem se portado ainda mais magnificamente do que antes. Sash não mudou, porém sempre foi assim, e acho que lutar como uma aventureira fortaleceu seu coração... Agora, é como se eu fosse a única patética.”

Sasha muitas vezes lutava com monstros e podia adotar uma perspectiva de longo prazo em alguns aspectos. Helvetica amadureceu depois de superar sua dor. E, no entanto, Seren tinha se dobrado a ela, congelada em seus rastros. Esta era sua preocupação.

“Eles ficam dizendo que tenho um dom para a política, porém não sabia de nada — não sobre luta, ou como preciso enfrentar o que não quero ver... Não sabia o que fazer. Apenas martelou em casa que ainda sou uma criança.” concluiu Seren com um sorriso impotente. “Desculpe por ser tão negativa...”

Nem Angeline nem Anessa nem Miriam sabiam o que dizer; A preocupação de Seren era mais complexa do que estar triste depois de encontrar seu pai como um morto-vivo. Sua personalidade é muito séria, pensou Angeline, e achou a garota ainda mais cativante. No entanto, sem saber o que dizer, apenas conseguiu fortalecer seu abraço.

“Eu tinha mais ou menos a sua idade quando parti para Orphen para me tornar um aventureiro.” Belgrieve começou de repente. Ele falou devagar, mas deliberadamente.

“Sério?”

“Sim. No começo, estava confuso com tudo... A vida lá fora era tão diferente de Turnera, e cometi alguns erros cruciais. Fui enganado quando tentei comprar coisas e acabei em ruínas por falsas acusações.”

“Eu me pergunto se isso aconteceu comigo também...?”

“Eu também. Eles me encheram de ferramentas defeituosas...”

“Ahh, me lembrei! Justo quando pensei que por fim havia pechinchado pela primeira vez, descobri que a primeira oferta que me deram era o dobro do preço de mercado.”

As meninas concordaram uma após a outra.

Belgrieve sorriu. “Não pude deixar de ficar frustrado quando aconteceu. Muitas vezes, pensei comigo mesmo: ‘Isso é patético. Eu deveria ser um aventureiro’.”

“Então, até algo assim acontece com alguém tão forte quanto você...”

“Todo mundo começa inexperiente. Eles falham, pensam a respeito e resolvem as coisas à medida que crescem. É assim que realmente alcança a maestria.”

Seren olhou para Belgrieve. “Esse é o caso mesmo...?”

“Sim. Seren, suas preocupações podem atormentá-lo agora, mas tenho certeza que essa experiência será necessária. Tome cuidado para não ser esmagado por eles, no entanto valorize-os da mesma forma.”

“Estimar minhas preocupações...? Está tudo bem se preocupar assim...? Isso é bom para alguém que está acima dos outros?”

“Sim. É mais perigoso pular em uma resposta fácil. Não somos perfeitos. Ficamos preocupados e perdidos, porém ainda temos que viver. Não é embaraçoso confiar nos outros quando está com problemas. Felizmente, você tem duas irmãs mais velhas confiáveis, então deve ficar bem se perder para o conteúdo do seu coração.”

Belgrieve colocou uma mão gentil em sua cabeça. Seren corou timidamente.

“Meu pai disse algo parecido.”

“Entendo... Então era um bom homem, Conde Bordeaux.”

“Ele realmente era...” Seren fechou os olhos em lembrança. Ela os abriu lentamente, olhando para Belgrieve. “Obrigada. Eu me sinto... Um pouco mais leve.”

“Haha, perdoe a bisbilhotice deste velho... Agora, então, está esfriando. Que tal voltarmos para a mansão?”

“Não, só mais um pouco...”

Seren se aconchegou mais perto de Angeline e fechou os olhos. Angeline acariciou suas costas, enquanto Anessa e Miriam a observavam preciosamente.

“Você não está sozinha, ok?”

“Sim, tudo bem.”

Seren soluçou, empurrando seu rosto ainda mais forte em seus joelhos.

A luz da lua caiu sobre eles. Faíscas de fogo saltavam a cada rachadura do tronco.


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