Capítulo 54: O álcool em Orphen era mais forte
O álcool em Orphen era mais forte do que o que Belgrieve havia se acostumado em Turnera. No dia seguinte, se pegou suspirando enquanto segurava a cabeça dolorida. Ontem, ele foi arrastado pelos dois lutadores veteranos e tomou bastante bebida no processo. Os dois homens grandiosos continuaram bebendo copo após copo, e talvez Belgrieve tenha se inspirado neles. Não conseguia se lembrar de tudo direito; tudo o que sabia era que havia bebido muito.
O mesmo volume de sidra de Turnera não teria passado para o dia seguinte. Aliás, isso de fato mostrou o quanto Graham era fraco com bebida, mas este é um assunto diferente. De qualquer forma, as bebidas da capital eram fortes e de alta qualidade.
Porém só porque estava de ressaca, não significava que se arrependia de beber. Belgrieve ouviu histórias de batalha e bravura, e das façanhas de seus antigos camaradas que se tornaram aventureiros Rank S. Até ouviu falar das aventuras de Angeline em Orphen; as histórias pareciam vir em um suprimento infinito. Talvez fosse por essa razão que havia bebido tanto.
Charlotte dormia de bruços ao seu lado. O que quer que ela estivesse sonhando, parecia bastante feliz com isso, e estava murmurando algo baixinho. Byaku deveria estar dormindo do outro lado de Charlotte, no entanto já havia acordado e estava lendo um livro no sofá.
Belgrieve balançou a cabeça. “Phew... Bom dia, Byaku.”
“Hm...” Byaku mal ergueu o rosto carrancudo para cumprimentá-lo. “Você bebeu demais, velho.”
“Haha, desculpe. Me soltei um pouco demais.”
Belgrieve equipou sua perna de pau com um sorriso irônico, então foi lavar o rosto na pia. Sentiu-se um pouco revigorado. O sol já havia nascido do lado de fora da janela. A estrada principal estava lotada como de costume, e o clamor podia ser ouvido na hospedaria, que ficava escondida nos becos.
“Eu dormi demais... Contudo acho que não importa.”
Ainda não era meio-dia. Ele tinha um treino agendado com Dortos, mas era melhor superar a ressaca primeiro. Eu disse a Angeline para beber com moderação, mas dificilmente posso falar a respeito, pensou enquanto coçava a cabeça.
Byaku serviu uma xícara de chá e a colocou sobre a mesa.
“Aqui.”
“Oh, obrigado.”
“Hmph...”
Belgrieve sentou-se em frente ao garoto, que com raiva voltou os olhos para o livro.
“O que está lendo?”
“O que é isso para você?”
“Isto é interessante?”
“Não particularmente.”
Belgrieve se inclinou para frente para dar uma olhada melhor no livro. Parecia ficção.
“Ange deixou isso para trás?”
“Quem se importa?”
“Haha, não precisa ser tão frio. Continue franzindo a testa e ela ficará presa assim.” Belgrieve estendeu a mão e cutucou Byaku na testa.
“Pare com isso.” Byaku olhou furioso, afastando sua mão.
“Sim, sim. Você é bem atrevido.” Belgrieve riu, dando tapinhas na cabeça de Byaku.
Embora fizesse beicinho com os lábios, Byaku concordou.
“Agora então, imagino que deva estar com fome. Quer que eu faça alguma coisa?”
“Não há o que fazer. Nunca fomos às compras.”
Agora que comentou... Ontem, Belgrieve tinha a intenção de fazer compras no caminho de volta da guilda. Ao invés, acabou preso no bar e perdeu a noção do tempo depois. Não podemos comer fora todos os dias... Porém eles tinham pouca escolha agora. Decidiu que faria algumas compras enquanto saíam para a próxima refeição.
Belgrieve voltou para a cama para acordar Charlotte.
“Char, acorde. É manhã.”
“Hmm...” Charlotte se virou e gemeu. Ela enterrou o rosto no travesseiro.
“Ugh...”
“O sol já nasceu.”
Suspirando, Belgrieve enfiou as mãos sob os braços dela e a ergueu. Charlotte havia se juntado à festa da bebida, ficando acordada tanto quanto ele, e ainda parecia muito sonolenta. Quando a colocou no chão, Charlotte esfregou os olhos e encarou-o com olhar distraído.
“Bom... Dia, pai...”
“Sim, bom dia. Não durma muito, ou não conseguirá dormir à noite.”
“Hum...”
Charlotte cambaleou em sua direção e o abraçou. Ainda parecia sonolenta. Belgrieve a pegou e a carregou até a pia. A garota balançava para frente e para trás enquanto jogava água no rosto.
Enquanto preparava as roupas para Charlotte, Belgrieve elaborou a programação do dia em sua cabeça.
Primeiro, iria até a guilda e conversaria com Dortos sobre a batalha simulada. Não estava em ótimas condições, então teria que ser à noite ou em outro dia. Depois, precisava buscar um lugar para almoçar e comprar mantimentos. Precisava de ingredientes suficientes para cozinhar para si mesmo. Aqui era diferente de Turnera, onde poderia administrar se fosse para o campo.
Lembrou-se das conversas que tivera na noite anterior. Dortos e Cheborg pareciam se lembrar do Lâmina Exaltada, Percival. Por infelicidade, a dupla não se lembrava muito de Kasim, que só se tornou um Rank S depois que partiu, ou Satie, que havia desaparecido antes disso. Segundo os dois, Percival era bastante insociável e quase não interagiam, parecia estar procurando por algo e usaria os pedidos da guilda como desculpa para viajar por todo o país. Eles nunca o tinham visto sorrir; era sempre taciturno e tinha um ar inacessível.
“Ele costumava ser alegre e sempre tinha um sorriso destemido no rosto...” Belgrieve sentiu uma dor latejante no peito. Talvez o fato de ter saído sem dizer uma palavra tenha se tornado um espinho afiado cravado profundamente no coração de Percival. Belgrieve pensou que era o único ferido, mas talvez eles estivessem piores do que ele.
Ele soltou um profundo suspiro.
“O que será, será. Contudo...”
Talvez houvesse outra coisa que pudesse ter feito. Parecia que havia cometido um grave erro enquanto era jovem e tolo. No entanto, não podia passar cada momento acordado preso em dias passados. Ninguém poderia viver no passado, não importa quem fossem. Não havia nada que pudesse fazer sobre o que já havia acontecido; tinha que assumir e seguir em frente.
Assim que Charlotte lavou o rosto e trocou de roupa, a pequena agarrou a mão de Belgrieve.
“Estou acordada, pai. Vamos!”
“Soa bem pra mim. Vamos, Byaku.”
“Imagino o que a irmã está fazendo agora. Tenho certeza que está usando um lindo vestido. Ela é linda, então deve estar deslumbrante!”
“Ange em um vestido... Não consigo imaginar.”
Pensando bem, ele não conseguia se lembrar de ter comprado roupas da moda para Angeline. Não fui o melhor pai para Ange. Belgrieve franziu a testa. Mesmo que tais roupas raramente chegassem a Turnera, era inerentemente difícil para um pai solteiro criar sua filha como uma menina. Talvez tenha sido por isso que Angeline se tornou uma aventureira.
“O que Ange estará fazendo agora...?” Belgrieve murmurou antes de abrir a porta.
○
“Estou cansada. Quero ir para casa...” Angeline apoiou a cabeça nas mãos e soltou um suspiro profundo.
Finalmente era o dia do baile, e a mansão estava lotada de gente desde a madrugada. Todos se pavoneavam com graça em trajes berrantes.
As festividades ocuparam o grande salão e também o jardim. Havia mesas postas aqui e ali, forradas com comida e bebida, com música de bandas tão grandes que nem podiam ser comparadas aos músicos do povo errante de que Angeline se lembrava de sua juventude.
Angeline pensou que poderia se esconder em seu quarto até a hora de receber sua medalha, mas as empregadas invadiram, colocaram-na no banho, colocaram-na no vestido, pentearam seu cabelo — e desta vez, até aplicaram maquiagem. Ela no seu dia-a-dia nunca usava nada do tipo e não conseguia se acostumar com a sensação de ter algo manchado em seu rosto. Com suas mãos esfregava inconscientemente, e as empregadas tinham que impedi-la várias vezes.
Poderia ter aguentado tanto. No entanto, à tarde, Villard chegou para arrastá-la para fora. Ele tinha estado tão zangado na noite anterior, contudo agora estava de bom humor. Sem dúvidas estava muito orgulhoso de que a aventureira que havia sugerido tivesse se tornado tão graciosa. Assim, arrastando Angeline pela mão, gabou-se dela para todos os tipos de nobres.
Era a mesma coisa de novo e de novo, e Angeline estava cansada disso. Por enquanto, descansava em uma cadeira em um canto do corredor.
Gilmenja, em seu costumeiro traje de empregada, trouxe uma garrafa de vinho e serviu-lhe uma taça.
“Parece estar cansada.”
“Gil... Me escute. Esses nobres são um saco...”
“Claro que são. No entanto você se tornou uma especialista em fazer reverências, se assim posso dizer. Bom trabalho, bom trabalho.”
“Isso não me deixa feliz...” Angeline disse antes de engolir seu vinho.
Cada vez que Villard a apresentava, Angeline levantava a saia tal qual fora ensinada. Os homens ficavam encantados e a convidavam para dançar — o que recusava — enquanto as damas a zombavam. Foi muito cansativo lidar com todos eles.
Depois de escapar por pouco, observou de longe.
A banda tocava belas melodias, porém o ritmo não era tão animado quanto às melodias do povo itinerante. Como vou dançar assim? se perguntava. Quando criança em Turnera, dançava com aquelas canções alegres e animadas. Belgrieve era péssimo dançando por causa de sua perna, e Angeline se lembrou da cara preocupada que ele fez quando ela o fez dançar de qualquer maneira. Ainda assim, os dois dançavam juntos e podia assim balançar em seus braços.
Sua força foi drenada a cada nova memória, até que uma chamada alegre a trouxe de volta.
“Ange!”
“Oh... Liz.”
Liselotte correu energicamente e agarrou seu braço.
“O que há de errado? Você parece cansada.”
“Sim, estou... Não estou acostumada com esse tipo de coisa.”
“Sério? Pensei que seria fácil para uma aventureira Rank S.”
“Isso não é verdade... Quer sejamos Ranks S ou nobres, somos todos humanos.” Angeline riu e acariciou a cabeça de Liselotte.
Ela ouviu mais alguns pequenos passos se aproximando. Um punhado de garotas da idade de Liselotte, se não um pouco mais novas, apareceu.
“Sério, Liz. Odeio quando foge sozinha!”
“Ah, me desculpe! Esta senhorita aqui é Angeline! É uma aventureira incrível que derrotou um demônio.”
As meninas cercaram Angeline com espanto.
“Wow! Alguém tão bonita pode derrotar um demônio!”
“Como conseguiu? Com uma espada ou lança?”
“Hmm... Oh, eu uso uma espada. Embora não a tenha comigo agora.”
“Sua pele é tão lisinha! Você usa loção?”
“Não, nunca usei antes.”
“Hã?”
“Ser uma aventureira deixa sua pele macia?”
“Que legal. Não consigo me livrar essas sardas.”
“Está bem, você está muito fofa como está.”
“Hey, Ange! Me conte uma história! O que aconteceu com aquele dragão maligno nos pântanos?”
Embora não estivesse de bom humor, Angeline não conseguiu vencer aqueles olhos curiosos. Claro, elas a estavam importunando, todavia era muito menos desgastante do que lidar com qualquer outra pessoa. Se ao menos os nobres fossem tão simples e sinceros, lamentou, antes de fazer uma careta com a imagem de Villard, François e Fernand olhando-a com olhos tão brilhantes.
“Agora me sinto mal.”
O mundo nunca segue a minha vontade, não é?
Enquanto contava sua história, alguém invadiu a multidão gritando.
“Liz!” era o noivo de Liselotte, Oswald.
“Estava me perguntando onde você tinha ido. O que está fazendo...” Oswald fez uma pausa quando avistou Angeline. No dia anterior a tinha visto usando um vestido com o cabelo penteado. Hoje, tinha maquiagem adicionada a isso, tornando-a uma beleza ainda mais cativante.
Angeline inclinou a cabeça, no entanto de repente percebeu o que tinha que fazer. Levantou-se e fez uma reverência.
“Bom dia...”
“Certo...” Oswald desviou os olhos.
Seu braço foi agarrado por Liz, que estava estufando as bochechas. “Isso não é bom, Ozzie! Não pode me trair, não importa o quão bonita Ange seja!”
“Vo-Você entendeu errado, tenho apenas olhos para você, Liz...” Oswald gaguejou enquanto acariciava a cabeça dela.
As outras garotas riam e cutucavam umas às outras. Elas ainda eram jovens, contudo gostavam de fofocar sobre essas coisas. Embora Angeline estivesse bastante indignada e o elogio não a tivesse deixado nem um pouco feliz.
Liselotte ainda queria ouvir a história, então Oswald a acompanhou. Com um gole de vinho, Angeline continuou gradualmente. Logo, não eram apenas as meninas, até mesmo Oswald estava também torcendo. Só porque ele era um nobre, não significava que não ansiava por aventura.
“Incrível. Aventureiros são surpreendentes...”
Angeline deu um sorriso cínico.
“É uma honra ouvi-lo de um nobre... Meu senhor.”
“Não há necessidade de colocar assim. Estou no fundo da hierarquia. Dificilmente consigo me controlar sem meu orgulho de nobre.” Oswald fechou os olhos e suspirou.
Liselotte riu.
“Você vai ser meu marido. Pare de soar tão obstinado!”
“Sim, desculpe, Liz...”
Acho que acabei de ver um vislumbre do futuro deles. Angeline se viu sorrindo.
Um aplauso surgiu de repente, e a melodia mudou. Angeline pôde ouvir a voz clara e forte de uma mulher cantando. Até mesmo Angeline, que achava as apresentações anteriores chatas e sem vida, podia sentir seu coração tremer com a voz.
Uma das garotas estava com estrelas nos olhos. “Esta voz... É Canta Rosa!”
“Wow! Sério, é ela mesmo! Como esperado de um arquiduque! Vamos, Liz!”
As meninas saíram correndo e Liselotte se levantou para se juntar a elas.
“Não se perca desta vez, ok, Ozzie? Até logo, Ange!” então ela se foi.
Oswald se levantou rapidamente, porém as garotas desapareceram na multidão em um piscar de olhos, e ele desistiu de segui-las e voltou a se sentar.
“É alguém famosa?”
“Oh, quer dizer Canta Rosa? É uma cantora renomada de Dadan. Embora esta seja a primeira vez que a ouço... É incrível. Quase não há oportunidades de ouvi-la se apresentar, contudo acho que é de se espera do arquiduque.”
“Sim.”
Por um tempo, os dois voltaram sua silenciosa atenção para a performance. A música dava vontade de ouvir de perto, no entanto se viesse a se mexer, talvez se envolvesse com alguém problemático, então ficou onde estava.
“Hey... O senhor... Está se envolvendo com a Liz porque gosta dela, certo?”
“Não sabe falar formalmente, não é... Claro que a adoro.”
“Entendo. É bom saber...”
“Achou que era político?” Oswald mal-humorado perguntou. Sua idade era quase a mesma de Angeline, talvez um ano mais novo, todavia quando fez aquela cara, ficou claro que ainda tinha alguma inocência infantil.
Angeline deu de ombros.
“Não sei muito sobre a nobreza...”
“Oh. Faz sentido... Bom, não posso dizer que não houve motivos políticos. Venho de uma linhagem de nobres de manto sem qualquer território, então minha mãe e meu pai estavam torcendo por nosso noivado.”
“Tem certeza de que não estão apenas felizes com o noivado do filho... Vossa Alteza?”
“Haha, não estava brincando mesmo. Você realmente não sabe nada sobre nobres.”
“Sim, e também não estou interessado, milorde.”
“Havia algum ponto em adicionar um título honorífico a esse?” Oswald soltou uma risada espantada. Ele olhou para a garrafa de vinho na mesa, notou que estava vazia e chamou um garçom próximo. Recebeu dois copos e ofereceu um a Angeline.
“Toda essa conversa deve tê-la deixado com sede, certo?”
“Muito obrigado. Você não é tão arrogante quanto imaginei.”
“É assim que sou. Acho que é por isso que me dou bem com a Liz.”
“Mesmo que estivesse apaixonado por mim?”
“Bem, é claro, é da natureza humana que coisas bonitas chamem a atenção. Mas quem adoro é a Liz. Ela é doce, graciosa e inocente... E se preocupa comigo sem segundas intenções.” Oswald murmurou em um transe arrebatador.
Entendo. Oswald estava fingindo quando se aproximou dela no jardim outro dia, mas essa era sua verdadeira natureza. Talvez sua leve embriaguez tenha contribuído para descobri-lo.
Oswald tomou um gole de vinho e riu.
“Aventureiros travam uma batalha sangrenta com demônios. De certa forma, são muito fáceis de entender.”
“Isso não é tudo o que fazemos. Senhor.”
“Talvez não. Porém não são apenas os aventureiros cujas mãos estão cobertas de sangue. Os nobres estão cobertos pelo sangue de outros nobres. Às vezes até no sangue da família.”
“Está falando sobre seus futuros cunhados?”
A testa de Oswald se contraiu. “Bem esperta... Contudo isso não vai acontecer. Posso ter uma chance contra Villard, no entanto definitivamente não contra Fernand ou François. Não me considero um tolo, entretanto...”
“Por que não se dá bem com sua família?”
“Claro, eu quero. Só que para nobres, veja...”
Angeline o interrompeu, apertando seu rosto entre suas mãos.
“Não. Se for entrar em uma luta pelo poder com seus irmãos, Liz é quem ficará mais triste no final. Liselotte é importante para você, não é? Então tem que valorizá-la... Então nem pense nisso.”
“Bem...”
Suas bochechas estavam um pouco coradas, e seus olhos estavam olhando ao redor.
Angeline o soltou.
“O que é que você valoriza? Sua casa? Seu status? Sua ambição?”
“Não...”
“Agora vá para sua amada noiva.”
“Está certa...” Oswald levantou-se cambaleante e cambaleou para a multidão dançante.
Angeline prendeu a respiração e se deixou cair na cadeira.
“Nobres com certeza são um saco...”
“Você acertou.”
“Hwah?!” Angeline se virou com um sobressalto.
Lá estava Gilmenja. Pensando bem, ela está parada ali desde que serviu a primeira taça de vinho, pensou Angeline enquanto colocava a mão no peito.
“Não se aproxime de mim desse jeito.”
“Essa foi uma boa ação que fez aqui. Pode ter acabado de limpar uma das nuvens negras que eventualmente pairariam sobre a casa do arquiduque.”
“Está fazendo um grande alarido com isso.” Angeline suspirou e apoiou o cotovelo na mesa.
A música acabou, mas a cantoria continuou. Gradualmente, o sol poente tingiu os céus em tons de vermelho, e as sombras se estenderam por mais tempo. Quanto tempo até a cerimônia?
Uma sombra alta e esguia pairava sobre ela.
“Hey, parece entediada.”
Outro convite para dançar? Angeline ergueu o rosto, sentindo-se farta já. Seus olhos se arregalaram.
O homem parecia ter vinte e poucos anos e era surpreendentemente bonito. Seu cabelo sedoso — um tom de loiro quase âmbar — estava bem penteado. Seu rosto era refinado e bastante andrógino e, embora seus olhos fossem gentis, pareciam capazes de uma visão penetrante. Não poderia haver ninguém que combinasse tão bem com roupas brancas. Oswald havia dito que era apenas da natureza humana que coisas bonitas chamassem a atenção. Irritava-a não poder mais negar sua afirmação.
O homem sorriu enquanto pegava a mão de Angeline.
“É um desperdício para alguém tão bela se esconder em um canto. Que tal uma dança?”
“Não, hmm...”
“Agora vamos. Eu assumirei a liderança.”
“Hey, espera...”
Ele era tão forte. E ainda assim seus movimentos eram tão naturais que antes que percebesse, Angeline estava de pé com uma mão em volta do ombro que lhe cedera. Ela estava pisando em passos que lhe eram estranhos.
Tendo perdido o momento de se livrar do homem, agora tentava, quase desesperada, acompanhar seu ritmo. O jovem a observou com um sorriso contagiante.
Embora Angeline estivesse em maior parte concentrada em seus próprios passos, cada vez que levantava o rosto, seus olhos encontravam os do rapaz. Isso era insuportável. Era irritante acompanhar suas travessuras, porém enquanto lutava para manter o equilíbrio, foi gradualmente pegando a dança. O homem cobria com maestria cada uma de suas inadequações.
No momento em que percebeu, Angeline estava no centro do corredor.
Os dois naturalmente chamaram a atenção, e logo aqueles ao seu redor estavam suspirando e maravilhados com este par dançante.
“Que bonito...”
“A moça de cabelo preto não parece acostumada a dançar...”
“Contudo possui um charme estranho e selvagem.”
“Eu não vi aquele homem em algum lugar antes...?”
Em pouco tempo, a banda encerrou sua música. Angeline parou e deu um suspiro de alívio. O homem deu um tapinha em seu ombro com um sorriso.
“Foi divertido.”
“Claro...”
Pelo menos um de nós se divertiu então. Angeline fez beicinho.
Foi quando Fernand se aproximou dos dois.
“Hahaha, esplêndido! Justo quando pensei que havia o perdido de vista, o encontro com nossa astuta convidada de honra!”
“Ela é legal, não é? Em especial, adoro como ela absolutamente me odeia. É muito mais atraente do que as garotas que tentam me seduzir a todo o momento.” o homem loiro riu. “Gosto de você. Qual o seu nome?”
“É... Angeline, senhor.”
Angeline fez uma rápida reverência. Fernand deu uma risada gostosa, enquanto o loiro sorriu, satisfeito.
Ele se virou para Fernand.
“Então, quando será a cerimônia?”
“Não deve demorar muito agora. Estamos preparando o cenário.”
Angeline inclinou a cabeça enquanto Villard corria até eles com pressa.
“S-S-Sua Alteza! A garota fez alguma coisa para ofendê-lo?”
“Olá, Villard. Não se preocupe, ela apenas me acompanhou para dançar um pouco.”
“Ha... Hahaha, entendo! Nossa convidada pode ser um pouco rude, no entanto sua aparência é inigualável. Na verdade, fui eu quem a chamou aqui e...”
“Você está sendo grosseiro, Villard. Poupe-nos.”
“S-Sim Fernand...”
Fernand interveio antes que Villard pudesse começar a se gabar e recuou relutantemente.
Com um olhar duvidoso no rosto, Angeline perguntou-o.
“Hey, quem é ele? Senhor?”
“S-Sua tola! Sequer sabe quem é? Este senhor é o filho mais velho do imperador e herdeiro do trono, o príncipe Benjamin! M-Minhas desculpas, Sua Alteza! Ela é apenas uma aventureira de nascimento inferior!”
“Príncipe Benjamin...? Esse cara?”
Benjamin sorriu largamente para ela. “É um prazer, Angeline.” “Agora, senhoras e senhores!” Fernand chamou. “A cerimônia vai começar em breve. Se todos puderem se reunir no salão!”
Nenhum comentário:
Postar um comentário