Capítulo 48: Demorou vários dias sendo sacudida numa carruagem
Demorou vários dias sendo sacudida numa carruagem antes de Angeline chegar à cidade de Estogal. Era diferente das ruas caóticas que compunham Orphen; aqui, havia um senso de ordem e planejamento. Estava mais perto do império e a arquitetura imperial compreendia grande parte da paisagem urbana. As paredes que revestiam as estradas eram recém-pintadas e não apresentavam manchas visíveis.
Um grande rio cortava o centro da cidade. Era uma vez, a força de subjugação do império do norte e os clãs aliados do norte travaram uma batalha feroz em margens opostas. Os vencedores — o exército imperial — construíram uma cidade que floresceu no comércio daquele mesmo rio e, mesmo agora, navios grandes e pequenos podiam ser vistos pontilhando sua superfície.
Havia docas e ancoradouros aqui e ali, margeando o rio até o centro da cidade. Ao longo da margem do rio, ao lado dessas estruturas, foram construídas fileiras de casas sobre bases de madeira que lembravam pequenos navios ancorados uns aos outros. Estas eram as habitações das pessoas que viviam da navegação e da pesca.
“Hey, Gil... O que eles fazem se o rio transbordar?” Angeline murmurou, fazendo uma careta enquanto o vento assobiava em seu rosto.
Gil, a mulher segurando as rédeas, semicerrou os olhos para alguma coisa. “Dê uma olhada lá.”
Angeline seguiu seu dedo até o final das docas e percebeu que as casas estavam apenas flutuando sobre barris vazios, entre outras coisas. Embora atualmente estivessem amarradas, as casas poderiam ser remadas, se necessário.
Angeline deu um aceno satisfeito. “Então eles pensaram... Mas por que se esforçar para construir casas na água?”
“Diz a lenda que seus ancestrais eram sereias. Os mais supersticiosos do grupo acreditaram e decidiram viver na água.”
“Sério?”
“Claro que não. Hehehe...”
Angeline franziu os lábios e recostou-se nos suportes da carroça. Havia pensado que estaria viajando sozinha, mas a antiga membro do grupo de Lionel a acompanhou para carregar suas malas.
Seu nome era Gilmenja, uma aventureira Rank AAA ativa que mantinha seu cabelo castanho-avermelhado curto. Embora fizesse parte da geração de Lionel — o que significava que devia estar na casa dos quarenta anos — Gilmenja poderia passar por ter vinte e poucos anos.
No grupo de Lionel, ela havia lidado principalmente com suprimentos, reconhecimento e preparativos de viagem — em especial com suporte e trabalho nos bastidores. Dada sua habilidade e raciocínio rápido, foi escolhida para ir com Angeline, que sem dúvida precisaria de sua ajuda para essas coisas. Gilmenja era despreocupada e propensa a dizer coisas estranhas com bastante frequência, porém Angeline gostava bastante dela — se tivesse de dizer, não ficou entediada durante a longa jornada.
As ruas eram largas o suficiente para que muitas carroças entrassem e saíssem. Esta era a própria cidade do arquiduque, por essa razão era visitada por nobres com frequência.
Foi a primeira vez de Angeline em Estogal. Mesmo que seu coração não estivesse de fato nisso, ainda estava animada por visitar um lugar novo. Sua raiva por toda a empolgação e preparativos desperdiçados foi um pouco amenizada ao longo de quase meio mês na estrada.
No entanto, sempre que pensava no cenário de Turnera, a irritação e a raiva surgiam de novo, e Estogal de repente parecia desinteressante em comparação.
“Já havia vindo alguma vez a Estogal, Gil?”
“Sim. A força de subjugação do norte do outro lado do rio. E nesta margem, Barablien, herói dos clãs. Eu vi com meus próprios olhos.”
“Isso aconteceu mesmo?”
“Cerca de trezentos anos atrás, hehehe.”
“Trez...”
“Bem, vamos manter nossas piadas para depois.” disse Gilmenja. “Quer parar na guilda?”
Angeline balançou a cabeça. “Não estou aqui para trabalhar... Não há razão para visitar a guilda de Estogal.”
“Alguém está mal-humorada. Está desperdiçando esse seu rosto fofo.”
“Eu não sou fofa.”
“Está desperdiçando esse seu rosto horrível.”
“Não precisava reformular isso...”
Angeline carrancuda pressionou os cotovelos nos joelhos e segurou o rosto com as mãos. Gilmenja cutucou seu rosto, parecendo estar se divertindo.
Por fim, elas chegaram à pousada. Era um grande estabelecimento frequentado por aventureiros, mascates e viajantes, com espaço para guardar os cavalos e a carroça. O baile seria realizado dali a três dias; seus planos de viagem correram tão bem que chegaram com muito tempo de sobra. Contudo não era como se Angeline fosse conseguir alguma coisa ficando de mau humor como em Orphen. Angeline convenceu-se vigorosamente de que era melhor concluir todas essas coisas problemáticas o mais rápido possível.
Ela carregou as malas para o quarto e logo preparou uma xícara de chá para se acalmar. Era um quarto no segundo andar com uma boa vista do rio que corria logo abaixo de sua janela.
Gilmenja encheu as bochechas de açúcar como um esquilo e disse. “Vou esperar aqui. Por que não vai até a casa do arquiduque?”
“Hã, por que?”
“Quero dizer, você é a convidada deles... Que tal ir comprar um vestido bonito para o baile? Eles vão tratá-la com uma boa refeição em um quarto adorável. Não vejo por que não.”
“Então venha comigo. Vou me sentir estranha sozinha...”
“Isso provavelmente seria inútil. Você foi convidada porque tem grandes conquistas em seu currículo. Na maioria das vezes, nobres não se dão bem com aventureiros.”
“Mesmo que tragam um monte de pedidos para nós?”
“É assim que os nobres são. A seu ver, os aventureiros existem para serem usados. Hehehe.”
Sentindo-se irritada, Angeline recostou-se na cadeira e bebeu a xícara. “Não aguento mais. Eu Não deveria ter vindo aqui...”
“Sendo sincera, também acho. Por que está aqui?”
“Boa pergunta... Acho que porque pensei que causaria problemas para todos se não viesse...”
Gilmenja riu. “Você é uma boa menina, Ange. Bem, talvez esteja certa. Somos mais fortes em combate direto, mas os nobres sabem como trabalhar nos bastidores: um pouco de calúnia, conspiração e suborno, e vão encurralá-la em pouco tempo... Existem algumas coisas no mundo que só a força pode não resolver.”
“Para que servem os nobres, então?”
“Estes nascem sozinhos. Em todos os lugares, especialmente quando chove. Tiram ouro e medalhas de seus bolsos para corromper a todos nós. Hehehe.”
“Isso foi uma mentira... Certo?”
“Sim.”
Angeline soltou um suspiro resignado. Embora fossem nobres, Sasha, Seren e Helvetica eram boas pessoas. Se ao menos todos os nobres fossem assim, pensou. Porém o mundo não funcionava assim.
Em todo caso, agora que estava aqui, teria que pelo menos fazer uma visita ao arquiduque. Ela não sabia nada sobre concessão de medalhas e tudo mais, contudo se tivesse que receber alguma coisa, então poderia pegar antes do baile e seguir seu caminho. Na verdade, essa parecia a melhor solução.
Angeline se levantou. “Tudo bem, vou dar uma olhada... Porém não sei o caminho. Guie-me.”
“Tudo bem. Não que eu saiba o caminho também.”
“Não sabe?”
“Sei sim.”
Angeline franziu a testa e silenciosamente cutucou a aventureira mais experiente. As duas deixaram a estalagem, caminhando pelas ruas a pé. Um vento frio soprava, irritando suas orelhas e narizes nus.
“Trouxe o convite, não trouxe?”
“Sim.”
Angeline certificou-se do envelope no bolso do casaco. Estava bastante amassado, no entanto ainda legível.
Gilmenja colocou a mão em seu ombro. “Ange, sei que vai odiar cada segundo do seu tempo lá, no entanto nada de explodir. Apenas acene quando tiver que acenar, fale apenas quando necessário e supere essa situação. Então você poderá voltar para Orphen.”
“Entendi.”
“Além do mais, mantenha seu tom educado. É assustador o que pode acontece se deixar um nobre com raiva.”
“Isso vai depender da situação, senhora.”
Sob a orientação de Gilmenja, Angeline seguiu o rio por uma boa distância antes de virar uma esquina. O caminho começou a se elevar aos poucos enquanto a paisagem urbana ao redor delas ficava mais silenciosa. Logo, parecia que cada propriedade pela qual passavam era maior que a anterior. Alguns até tinham pequenos campos de desfile para exércitos particulares e podiam ouvir os soldados concentrados em seu treinamento.
No ponto mais distante e mais alto havia uma visível estrutura de pedra grande e robusta, cercada por muros altos como uma fortaleza. Sua profunda história era aparente apenas de relance.
Quando se virou, ela teve uma visão de toda a cidade bifurcada de ponta a ponta. Este edifício, presumiu, foi reaproveitado de um forte destinado a vigiar o inimigo do outro lado do rio.
Os grandes portões de ferro foram deixados abertos, seu papel contra a intrusão em vez assumido por soldados de aparência dura, parados em ambos os lados da entrada, seus olhos arregalados olhando para todos que se aproximavam. Talvez em preparação para o baile, Angeline pôde ver o que provavelmente eram servos ajudando com as carruagens carregadas de presentes dos nobres, bem como costureiras e fornecedores de todos os tipos de alimentos.
Angeline ficou congelada por um tempo antes de por fim seguir até um dos soldados na entrada.
“Com licença.”
“O que você quer? Aqui não é lugar para pobres.” o soldado estava ridicularizando-a.
Angeline zombou e estendeu seu convite em silêncio. Embora o soldado encarasse-a com desconfiança, ficou surpreso ao ver o selo nele e ainda mais surpreso ao ler o conteúdo. Ele olhou para Angeline.
“A Valquíria de Cabelos Negros matadora de demônios...?”
“Tem algum problema com isso?”
“N-Não... Pode passar.”
O soldado deu um passo para o lado em um alvoroço.
Angeline franziu a testa. “Você não pode só me deixar entrar. Não sei para onde ir a partir daqui.”
“Grr... Sou apenas um porteiro. Entre e pergunte a um criado.”
“Entendo... Obrigado.” Angeline fez uma leve reverência antes de se voltar para Gilmenja. “Estou indo... Tem certeza que não quer vir comigo?”
Gilmenja riu. “Esses lugares berrantes não são para mim. Não quero brigar com nenhum nobre, então estarei esperando na estalagem. Tome cuidado.”
“Hmm... Até mais, então.”
Angeline passou pelo portão e se viu em um pátio. A terra foi exposta e marcada com rodas onde o tráfego era maior. No entanto, o resto era um belo gramado com canteiros de flores e árvores bem cuidados. As cores eram bastante simples, devido à estação — mas várias árvores e arbustos ainda tinham suas flores, e ainda era uma festa para os olhos.
Várias estruturas — antes torres de vigia — foram construídas bem contra as paredes. Além disso, havia fileiras de construções feitas de madeira, pedra e argamassa — os alojamentos dos empregados, talvez.
Porém, passando por esses edifícios, ela logo chegou a um muito maior e mais extravagante. Era a mansão.
As maciças portas duplas da entrada principal foram, como os portões, escancaradas, e teve uma visão completa do interior através do terraço da entrada. O vestíbulo foi construído em belo e brilhante mármore; a propriedade de Bordeaux era esplêndida, contudo esta era algo completamente diferente.
Angeline ficou congelada, sentindo-se bastante sobrecarregada e fora de sua zona de conforto. Ela não tinha ideia de quem poderia chamar. Os nobres que faziam visitas de cortesia ao arquiduque lançaram olhares de lado e zombarias enquanto sussurravam entre si.
E então, alguém por fim a chamou: “Hey, você aí.”
Angeline olhou para ver um homem de meia-idade, um criado, presumiu.
“Quem é você? Como entrou?”
“O senhor trabalha aqui?”
“E se trabalhar? O que alguém tão miserável está fazendo na propriedade do arquiduque?”
“Fui convidada. Onde está o arquiduque?”
Angeline entregou o convite, que foi recebido com muito escrutínio e surpresa. “Então você é a Valquíria de Cabelos Negros... Eu ouvi os rumores, todavia você é muito jovem...”
“Isso é um problema?”
“Não, não é. Peço desculpas pela minha insolência. Por favor, espere um momento.” o servo correu apressado de volta para as profundezas da mansão.
Angeline cruzou os braços e suspirou. Isso foi mais cansativo do que pensou que seria. Quando ela olhou em volta, descobriu que todos no prédio estavam vestidos lindamente, sendo a única com roupas de rua decadentes, o que a tornava muito visível. Nunca pensou que perderia a coragem com algo assim, entretanto agora que de fato enfrentou esse dilema, se sentiu envergonhada por ser tão incompatível.
“Os nobres são uma força a ser reconhecida.”
Angeline se encostou na parede externa e fechou os olhos. Não demorou muito para que ouvisse passos se aproximando. Quando abriu os olhos, encontrou o mesmo servo em sua frente.
“Eu os informei de sua chegada. Por esse caminho, por favor.”
“Obrigado...”
Angeline seguiu o servo até a mansão. No momento em que estava dentro daquelas paredes, sentiu como se pudesse congelar outra vez. Um enorme lustre pendia do teto do salão de entrada. Era feito de vidro, prata e ouro e, como esperado, brilhava não com velas acesas, mas com pedras amarelas.
Foram necessárias várias moedas de ouro para comprar apenas uma pedra brilhante, e este lustre foi adornado com uma infinidade delas. Angeline não sabia se ficava impressionada ou enojada, porém ainda assim era uma visão estonteante. O mármore polido sob seus pés brilhava, e é provável que pudesse ver seu próprio reflexo se o examinasse de perto. Não pôde deixar de ficar ansiosa com a ideia de seus sapatos o arranhassem.
Seguiram por um corredor acarpetado e entraram em uma sala no segundo andar.
“Espere aqui.” o servo disse algo para a empregada na porta antes de sair correndo.
A sala não era muito grande, no entanto estava arrumada com toques sutis de decoração de bom gosto ao redor. Parecia ser um quarto de hóspedes e tinha uma porta aberta nos fundos, através da qual pode vislumbrar uma banheira.
Angeline estava sentada inquieta em uma cadeira esculpida com uma almofada macia. Deveria ter sido divino sentar ali, contudo por algum motivo, sentiu vontade de ficar de pé. Mesmo quando uma criada a serviu uma xícara de chá, hesitou em levar a xícara aos lábios.
Entendo agora — é muito bonito aqui para se sentir relaxado. Entendo porque Gilmenja não quis vir. Angeline assentiu para si mesma. Não é de admirar que os nobres menosprezem os aventureiros, se suas vidas são passadas em lugares como este. Embora tivesse chegado a essa conclusão, ainda a achava tão absurda quanto lógica.
“No entanto, somos todos iguais sem nossas roupas.” murmurou. Embora a nobreza pudesse usar roupas chamativas e viver em mansões berrantes, todas as pessoas seriam iguais se fossem despidas e jogadas no deserto. E se algo assim acontecesse a Angeline, preferiria voltar para seu lugar em frente à lareira de seu pai em Turnera, onde o ar cheirava a palha e fuligem, do que retornar a este lugar inquietante.
A porta se abriu e um homem que parecia ter vinte e poucos anos entrou. Roupas bem ajustadas adornavam sua estatura mediana; seu cabelo, no qual passou os dedos, era de uma cor castanho-acinzentada e encaracolada.
O homem olhou para Angeline com olhos avaliativos. Embora achasse isso bastante desagradável, ela segurou a língua e apenas traiu seu desconforto com a testa ligeiramente franzida.
“Então você é Angeline, a Valquíria de Cabelos Negros?”
Ela silenciosamente assentiu. O homem franziu a testa enquanto se sentava do outro lado da mesa e estalou os dedos emburrado. Uma criada correu para servir-lhe uma xícara de chá.
“Não precisa ser tão fria. Tive muitos problemas para sugerir sua concessão a meu pai, sabe.”
Angeline ponderou suas palavras antes de se decidir por uma resposta simples. “Quer se apresentar, então?”
“Que tom insolente!”
“Sou do campo, por favor, perdoe meus modos grosseiros.” disse Angeline, inclinando a cabeça e escondendo o olhar desagradável em seu rosto. Sabendo que este era o homem que a havia chamado aqui, sentiu uma vontade imensa de atingi-lo no rosto. Todavia isso seria apenas pedir mais problemas. Ela cruzou as mãos sobre o colo, onde não poderiam fazer mal.
Embora o homem ainda parecesse descontente, rapidamente recuperou a compostura. “Bem, ainda que seja uma mera aventureira, afinal de contas você matou um demônio! Tolerarei este grau de grosseria de sua parte.”
“Que magnânimo de sua parte.”
Com o bom humor restaurado pelo ato educado de Angeline, o homem se recostou. “Meu nome é Villard Estogal. Já ouviu falar de mim antes?”
Angeline estava prestes a balançar a cabeça, entretanto reconsiderou e acenou com a cabeça. Os lábios de Villard se curvaram em um sorriso triunfante.
“Haha, então me conhecem mesmo em um remanso como Orphen.”
Verdade seja dita, Angeline não tinha a menor ideia de quem ele era, mas Angeline seguiu com um aceno de cabeça ambivalente. Villard apoiou o cotovelo na mesa e se inclinou para frente.
“O demônio era forte, verdade?”
“Sim... Foi forte.”
“Entendo... Bem, é bom saber.” Villard se levantou e começou a andar pela sala. “Sim, um alívio mesmo. Seria uma vergonha para mim se eu sugerisse elogios para alguém que não os merecia. Contudo, se derrotou um demônio poderoso, faz sentido que as medalhas sigam o feito. Considere isso uma honra.”
“É claro...”
“Hehehe... Isso deve dar ao pai uma impressão melhor de mim... Como se eu fosse deixar meu irmão monopolizar todos os holofotes.”
Será que já podemos acabar? Angeline tomou um gole de chá com uma expressão azeda. Pelo que pôde juntar, Villard abordou o assunto da conferência de Angeline com seu pai por algum tipo de competição com seu irmão. Sentia-se cansada só de saber que teria que aturar uma luta pelo poder entre os nobres.
Sua xícara fez um clique quando a pousou. “Então... Quando vou receber a medalha? Acredito que é melhor fazer essas coisas assim que tivermos a chance.”
Villard pareceu um pouco surpreso com a sugestão feita. “A medalha não é tudo. Há uma cerimônia magnífica para lhe dar o devido peso e dignidade. Caso contrário, ninguém saberia quem deu a você. Não traria nenhuma honra.”
Não me importo se ninguém souber, quase disse Angeline. Porém ela sabia melhor, lembrando-se das palavras de Gilmenja, e relutantemente acenou com a cabeça. O resultado foi que não poderia sair até que a cerimônia fosse realizada no baile.
Villard observou Angeline da cabeça aos pés antes de zombar. “Todavia, como devo dizer... Você está um pouco suja. Seria como jogar terra no meu rosto se fosse ao baile assim. Hey...” disse Villard, chamando a empregada. “Cuide dela, coloque-a no banho e dê-lhe um vestido de primeira classe. Não se esqueça, é minha convidada. Precisa prepará-la completamente dentro de três dias. Ela é magra, então se certifique de que também esteja bem alimentada! E ensine-a o mínimo de etiqueta. Não me traga vergonha.”
“Certamente, milorde.” a criada assentiu.
Com uma risada satisfeita, Villard voltou-se para Angeline. “Estou ocupado, sabe. Fique aqui e não cause muitos problemas.” ao terminar, ele foi embora.
No momento em que a porta se fechou, Angeline pôde sentir o poder drenar de seu corpo. Era raro se sentir tão cansada, mesmo quando enfrentava monstros do mais alto calibre. Embora fossem nobres, Villard era o completo oposto das três irmãs Bordeaux. Sendo franca, sentiu vontade de dar um tapinha nas costas por não explodir de raiva.
“Nobres são uma força a ser reconhecida.” Angeline murmurou quando a empregada estendeu-a a mão.
“Hum, gostaria de outro copo?”
“Sim, por favor.” Angeline tomou um gole de seu copo recarregado. Desta vez, se acalmou o suficiente para que os sabores a alcançassem. Ela respirou fundo antes de se virar para a empregada.
“Então, quem era aquele cara de qualquer maneira?”
“Hã? Você não sabe?”
“Não, nada — apenas o seu nome.”
A criada assentiu. “Sir Villard é o segundo filho do arquiduque.”
“O que você acha dele?” Angeline perguntou.
Com isso, a empregada pareceu um pouco perturbada e seus olhos vagaram.
Angeline deu uma risadinha. “Não se preocupe... Sou uma aventureira, não uma espiã.”
Então a empregada sorriu de volta. “Acho que sim... Por favor, mantenha o que direi em segredo.”
“É claro.”
De acordo com a empregada, Villard era um pirralho nobre estereotipado. Por ter nascido em uma posição elevada na vida, tinha pouco desejo por dinheiro — ao contrário daqueles que tiveram que subir na escala social. No entanto, o que de fato desejava era o poder, e estava competindo com seu irmão mais velho, Fernand.
Para o azar de Villard, Fernand parecia superá-lo em todos os sentidos, e seus esforços para se destacar foram em vão.
“Sir Villard foi quem primeiro sugeriu sua conferência, Madame Angeline. Ele o propôs enquanto o arquiduque procurava uma peça central para o baile, presumo.”
Então é por esse motivo que demorou um ano, pensou Angeline com um suspiro. O motivo era tão absurdo que nem conseguia ficar com raiva.
“Então ele não se dá bem com o irmão?”
“Não tenho tanta certeza. Não parece assim da minha posição...”
“Hmm... E são apenas dois irmãos?”
“Não, também têm uma irmã mais nova. Bem como um irmão mais novo de uma mãe diferente. Há quatro irmãos no total.”
Angeline apoiou a cabeça com a mão. É provável que fosse conhecer todos mais cedo ou mais tarde. Enquanto estava olhando atordoada, a empregada começou a andar rapidamente ao redor dela.
“O que?”
“Estava me perguntando que tipo de vestido seria melhor para você.”
“Não sou boa com vestidos.”
“Não deve dizer isso, madame. Acho que é perfeitamente adequada para um; só precisa de um polimento para dar brilho... Posso preparar o banho?”
“Por favor, pegue leve comigo.”
Angeline se levantou, imaginando o que seu pai estava fazendo.
○
Angeline tinha chegado a Estogal por volta da mesma altura em que o inverno se aproximava de Orphen. A primeira neve havia caído outro dia, cobrindo as ruas de branco. No entanto, como um pêndulo oscilante, foi seguido por uma série de dias quentes que derreteu tudo. E então o vento frio soprou mais uma vez.
Assim, o frio e o calor competiriam até que o inverno conquistasse sua inevitável vitória.
A ausência de Angeline não foi suficiente para atrapalhar a eficácia das operações da guilda, mas toda a equipe administrativa a conhecia e todos se sentiam um pouco solitários quando ela estava fora. Como de costume, Yuri sentou-se no balcão, classificando a papelada enquanto aventureiros e clientes animavam a guilda. Sua mesa era apenas para aventureiros de alto escalão, então, ao contrário da mesa padrão, não era inundada por clientes. Yuri usava seu tempo ocioso para organizar arquivos e fazer outros trabalhos básicos de escritório.
“Hmm... Um monstro de Rank B em um campo de Rank D... Isso vai aqui.”
Os dados de solicitações antigas podem ser úteis no futuro. Ela checou o conteúdo de cada relatório, classificando-os em diferentes pilhas. O que formou um banco de dados de precedentes para verificar se algo estranho acontecesse mais tarde. O tumulto sobre o demônio mostrou a necessidade de algum tipo de sistema.
Enquanto estava ocupada com esse trabalho, Lionel cambaleava. As bolsas sob seus olhos estavam mais escuras do que o normal, e sua tez ainda mais pálida. Ele quase parecia doente o suficiente para ser hospitalizado.
“Yuri... Você poderia me dar os arquivos da... Masmorra de Rank C perto de Asterinos...”
“Espere, Leon. Você está bem?”
“Há... Haha... A culpa está me afetando... Acha que a Sra. Ange está bem? Espero que Gil esteja dando-a o apoio adequado...”
“Bem, então poderia ter a contado antes. É cruel como manteve isso em segredo até um dia antes de sair de férias.”
“Estava planejando dizer a eles que ela já havia partido. Porém acontece que o senhor de Orphen também recebeu uma carta, e descobriu que Angeline ainda estava por aí... E realmente me avisou antes que eu pudesse fingir que não vi nada. Como alguém que nem é tão forte pode ser tão assustador?”
Yuri suspirou. “Lá vai você, assumindo tudo de novo. É bom que esteja tentando não incomodar ninguém, contudo o resultado não poderia ter sido mais incômodo. Por favor, pense um pouco mais nas coisas.”
“É verdade... É um péssimo hábito...” Lionel soltou um profundo suspiro.
Naquele momento, alguém apareceu de repente e bateu com a mão no balcão.
“Com licença!”
“Sim?” Yuri piscou.
Orelhas pontiagudas como lâminas de bambu e cabelos prateados macios como seda... A garota parada ali só podia ser uma elfa. Embora seus olhos estivessem queimando com espírito de luta, o resto de seu rosto era tão bonito que quase parecia irreal.
Diante da rara beleza da raça élfica aparecendo de repente diante deles, os dois aventureiros experientes perderam suas palavras. No entanto, como se para minar a primeira impressão que sua aparência deu, a elfa fez um discurso barulhento.
“Essa é a recepção? Estou aqui porque quero ser uma aventureira! O que eu preciso fazer?” perguntou exigente.
“Uh, hm, este é a área reservada para aventureiros de alto escalão...”
“Entendo! Isso parece verdade! Vou ser uma Rank S em algum momento!”
“Hm, Srta. Elfa...? Existe um processo para tudo...”
“Um processo? Então diga rápido! O que preciso fazer?”
Quando a elfa se inclinou, alguém estendeu a mão por trás e a puxou pelo ombro. “Hey, vamos, Maggie. Entendo que está animada, porém não é assim que pede um favor.”
“V-Você acha?”
“Acho. Veja como a simpática recepcionista parece preocupada?”
O homem de meia-idade que apareceu por trás da elfa deu um sorriso irônico. Ele estava adornado com um colete de couro sob o manto, seu cabelo ruivo estava preso atrás da cabeça e ostentava uma barba do mesmo tom de fogo. Até agora, essas características eram muito familiares para a equipe da guilda.
Lionel e Yuri ficaram boquiabertos.
“V-V-V-Você é...?”
“oh, me perdoe.” O homem ruivo caminhou até o balcão com um sorriso afável. Sua perna direita fazia um som peculiar de batida a cada passo. “Meu nome é Belgrieve. Estou aqui para ver minha filha, Angeline... Sabe onde posso encontrá-la?”
Nenhum comentário:
Postar um comentário