Capítulo 61: Era um restaurante de dois andares
Era um restaurante de dois andares. Para onde quer que Belgrieve olhasse, seus olhos cairiam sobre um ornamento de fabricação oriental, criando uma atmosfera bastante exótica. Várias lanternas de papel vermelho pendiam dos beirais.
Se eu perseguisse Percy e fosse para o leste, encontraria cidades inteiras arrumadas assim? Belgrieve se perguntou. Estava com uma atípica animação com tal pensamento.
Quando estendeu sua mão para a porta, alguém a abriu por dentro e Belgrieve se viu envolto em vapor. Um grupo de bêbados saiu cambaleando, resmungando algo incompreensível enquanto avançavam.
Ao conceder o caminho, Kasim murmurou.
“Parece que os negócios estão crescendo.” ele parecia bastante impressionado.
“Sim, está animado... Tenho certeza que Ed está esperando por nós.”
O aquecedor mágico preenchia o interior com um calor confortável. Belgrieve sacudiu a neve, tirou a capa e olhou em volta. Havia várias fileiras de mesas redondas, cada uma cercada por muitas almas generosas participando de comida e bebida. As garçonetes, com roupas do oriente, iam e vinham com grandes bandejas nas mãos. Seu estilo de roupa parecia vir de Keatai: a metade superior era colada ao corpo, enquanto o tecido solto da cintura para baixo tinha uma fenda na lateral que permitia melhor mobilidade.
Edgar parecia não estar à vista.
Kasim sacudiu o chapéu enquanto dizia.
“Oh, já faz um tempo que não vou a um restaurante oriental. Havia alguns na capital, pelo que me lembro.”
“Esta é a primeira vez para mim... É um pouco desconcertante, para ser honesto.”
Vinte e cinco anos atrás, quando era ativo em Orphen, não havia nenhuma influência oriental, tanto quanto podia se lembrar. Belgrieve não conseguia se lembrar de ter visto nenhum restaurante nesse estilo. Foi um pouco revigorante, embora também o fizesse sentir como se estivesse atrasado.
Deixando de lado sua perplexidade com a atmosfera desconhecida e os vislumbres de coxas pálidas que ocasionalmente via pelas fendas dos vestidos, ele informou ao anfitrião sobre sua reserva e foi conduzido em seguida ao segundo andar.
Ao contrário do primeiro andar aberto, o segundo andar foi dividido por várias divisórias ornamentadas para um pouco mais de privacidade. Mesmo assim, todas as mesas estavam lotadas e animadas. Edgar e Lionel já estavam sentados, passando o tempo conversando. Ao notar os recém-chegados, Edgar apagou o cigarro e acenou com a mão.
“Obrigado por enfrentar o frio por nós!”
Lionel ofereceu um aceno reservado.
“Desculpe. Está um tempo ruim mesmo lá fora...”
“Oh não, eu deveria me desculpar por fazer vocês esperarem. Obrigado pelo convite.” Belgrieve pendurou a capa nas costas da cadeira e sentou-se.
Kasim tirou o chapéu com um floreio, girando-o no dedo, antes de enfiá-lo em uma caixa ao lado. “Agora estou ficando com fome. O que estamos tendo?”
“Vamos começar com uma bebida, certo? Perdão, senhorita, estou pronto para fazer o pedido.” Edgar levantou a mão e chamou uma garçonete. “Gostaríamos de um pouco de huangjiu, quente. Você pode beber, Byaku?”
“Eu não quero...”
“Tudo bem, então quatro xícaras disso e um chá. Além desses, cinco ou seis pratos, à escolha do chef. Apenas certifique-se de que há carne assada e peixe cozido no vapor. O resto deixo pra sua escolha.”
“Você parece um regular, Sr. Ed.”
“Bem, sou. Veja, desde que encontrei um bom lugar na capital, fiquei viciado na culinária oriental — ou melhor, Keatai. Estou feliz por ter encontrado um bom lugar em Orphen.” disse Edgar com uma risada.
Apoiando a cabeça, Kasim murmurou.
“O oriente, hein... Acha que Percy está ali?”
No momento, sua única pista sobre Percival era que permaneceu na capital imperial por um curto período antes de seguir para a Federação Oriental — não que houvesse qualquer documentação definitiva a respeito. A liderança veio de seguir os rumores e contos heroicos do Lâmina Exaltada, que parecia aos poucos seguir para o leste. Embora fosse tudo boatos. Era muito possível que tudo tivesse sido exagerado por trovadores viajantes, mascates, viajantes e gente errante. Suas histórias eram como mercadorias valiosas para eles; certamente, não hesitariam em dramatizar um pouco se excitasse seu público.
A Federação Oriental estava muito longe para se aventurar com informações tão incertas. Embora Belgrieve tivesse ouvido falar de Tyldes, Keatai e Buryou, havia muitas outras pequenas nações que compunham a federação. Por falar nisso, Tyldes era em si uma espécie de federação de nações menores.
Belgrieve deu um tapinha no ombro de Kasim.
“Não precisa se apressar. Vamos fazê-lo no nosso próprio ritmo.”
“Acho que sim.”
“Sinto muito.” disse Lionel, esfregando as mãos em tom de desculpa. “Sou muito inútil mesmo...”
“Você já fez muito, Sr. Leo. Não precisa se cobrar tanto.”
“Fico feliz em ouvir isso, mas, bem... Só me sinto mal pelo Sr. Percy, que deve estar sofrendo com toda a culpa que está sentindo, e...”
“Desculpe, desculpe, deixei o clima depressivo!” Kasim gritou de repente. “Vamos lá, Léo. Estamos aqui para descontrair, então se anime! Não há razão para se sentir responsável por nada!”
“Hahaha... Obrigado, Sr. Kasim.”
A comida e a bebida chegaram à mesa redonda com muito alvoroço e aclamação. Diante deles, havia uma variedade de pratos vibrantes como nunca antes vistos em Turnera e desconhecidos até mesmo em Orphen.
O huangjiu — um vinho amarelado — estava tão quente que um vapor inebriante saiu do nariz de Belgrieve com seu primeiro gole. Ele se viu atordoado por um momento; estava conceitualmente familiarizado com licor quente, porém este era algo diferente do vinho quente.
“É um gosto bastante peculiar...”
“Não é? Ouvi dizer que o produzem fermentando arroz e trigo juntos. Sim, é um gosto adquirido, contudo uma vez que o pega, nunca mais vai largar.”
“Então este é o peixe… Está cozido no vapor? Não reconheço o cheiro...”
“Essa é a erva que está sentindo. O peixe é banhado, depois revestido com aromáticos orientais e cozido no vapor. Não é tão ruim.”
“Bem interessante... Talvez eu consiga fazer em Turnera.”
Belgrieve poderia usar peixes pescados no rio e, embora houvesse uma seleção diferente de aromáticos, havia muitos por perto. Os peixes maiores do rio tendiam a cheirar a lama, no entanto talvez o fedor pudesse ser ignorado se fosse preparado assim. Talvez consiga aumentar meu repertório, pensou Belgrieve.
“Eles vendem os aparelhos certos por aqui?”
“Quer dizer uma cesta fumegante? Acho que há uma loja especializada no leste no mercado de pulgas. Vou te mostrar na próxima vez.”
“Obrigado. Séria ótimo, sim.”
“Quão sério, Sr. Belgrieve...” disse Lionel.
“Hã?” Belgrieve gaguejou. “Por quê?”
“Quero dizer, seu primeiro pensamento foi como cozinhá-lo e as ferramentas necessárias. No geral, uma pessoa ficaria satisfeita em saber que a comida é boa.”
“V-Você acha? Quero dizer, não está curioso? E qual sua opinião, Kasim?”
“Não cozinho, então não sei.”
“S-Sr. Ed?”
“Eu? Bem, eu, Gil e Yuri costumávamos alternar o serviço de cozinha, mas era muito chato. Nunca fiz nada muito complicado... E agora não cozinho nada. Sei como é feito porque quero saber por que é gostoso. Entretanto não é como se quisesse tentar cozinhá-lo sozinho.”
“Hã...”
Ainda com a boca cheia de comida, a visão da crescente confusão de Belgrieve provocou gargalhadas de Kasim.
“O mesmo de sempre, Bell. A comida que cozinhava no trabalho era sempre deliciosa. Ser capaz de comer uma refeição quente em um trabalho difícil é uma dádiva de Deus.”
“Então estava encarregado de cozinhar mesmo quando é tão forte?” Lionel perguntou. “Porém imagino que teve que dar um passo para trás, com o Lâmina Exaltada e o Destruidor de Éter por perto.”
“Não, isso foi antes de terem seus títulos, e disse que era um Rank E, certo? É tudo sobre o homem certo para o trabalho certo.” explicou Belgrieve.
“Você se deu bem então, Sr. Kasim. Deve ter sido um peso a menos com o Sr. Belgrieve por perto.” declarou Lionel, levando Kasim a se inclinar para mais perto.
“Pôde notar?”
“Claro que pude. Quero dizer, apenas tê-lo por perto da guilda tira um peso dos meus ombros...”
“O que? Como? Não fiz nada de verdade.”
“Não é verdade. Quero dizer, você oferece conselhos, é receptivo e está praticamente organizando todos os nossos documentos antigos... E ter alguém com quem conversar é muito bom.” disse Lionel, batendo com a ponta dos dedos na mesa.
Belgrieve desviou os olhos.
“Na verdade não... E também não há o senhor Dortos e o senhor Cheborg?”
“Sr. Dortos é muito duro, e o Sr. Cheborg tem músculos no lugar do cérebro...”
“Então tem o Sr. Ed e a Sra. Yuri, e a Sra. Gil também. Devem estar perfeitamente bem para conversar, certo?” Belgrieve olhou para Edgar, que engoliu sua bebida com um sorriso malicioso.
Lionel fez beicinho.
“Eles não têm piedade de mim. Pelo menos com você por perto, alguém mostra um pouco de consideração por mim, e é razoável, então é apenas calmante poder falar com a sua pessoa.” Lionel bebeu as últimas gotas de seu copo e o colocou ruidosamente sobre a mesa. “E, o mais importante!” declarou em voz alta. “Você tem bom senso! Aquelas pessoas que estão se aventurando há muito tempo não têm nada disso! Pelo amor de Deus, não é como se eu quisesse acabar como um incompetente...” Lionel deitou o rosto na mesa e começou a murmurar. Mal havia bebido até agora, mas já parecia bêbado.
Edgar suspirou, depois riu enquanto dava um tapinha no ombro de Lionel.
“A noite ainda é uma criança... Está desesperado como sempre.”
“Haha... Acho que tenho um pouco de ressentimento reprimido...”
“Quero dizer, o trabalho do mestre da guilda é o oposto do aventureiro livre. É bastante irônico que o alcance depois de subir na hierarquia da guilda.” disse Kasim enquanto tomava um gole. “Hey, eles têm alguma coisa mais forte aqui?”
“Oh, você bebe muito, Sr. Kasim?” Edgar fez outro pedido antes de enfiar um cigarro entre os lábios, acendê-lo e soltar uma baforada de fumaça. “Sabe, eu tinha certeza que Ange viria hoje.”
“Também pensei, mas Ange me recusou quando perguntei... Isso significa que ela está crescendo?” Belgrieve se perguntou.
“Hahaha! Bem, não iria se divertir muito com um bando de velhos, imagino.” Edgar meditou.
“Acho que a senhorita Ange está feliz enquanto o Sr. Belgrieve estiver por perto... Pensando bem, a busca por sua esposa está suspensa agora?” Lionel perguntou.
Belgrieve deu um sorriso amargo e tomou um gole de vinho.
“Ange foi e fez tudo sozinha... Acha que Ange quer uma mãe?”
“Acho que ela disse algo nesse sentido. Porém, Sr. Bell, mesmo que queira uma, é a sua vida. Não deve fazer algo que pode acabar se arrependendo.”
“Hmm... Acho que tem razão. Obrigado, Sr. Ed. Vou levar esse assunto a sério.”
“E além do mais já tem alguém, certo? Aquela garota Satie.”
Belgrieve coçou a bochecha.
“Não é bem assim, sério...”
“Hmm? Então, qual é a verdadeira história, Sr. Kasim? Era ‘assim’ entre os dois quando estava com eles?”
Kasim encheu as bochechas de comida e engoliu antes de responder.
“Sim, eu realmente não sei. Era só um pirralho naquela época e na verdade não me importava com esse tipo de coisa. Pensando agora, Satie sempre foi tão despreocupada. Ela tinha nós três na palma da mão. Era uma verdadeira provocação, certo, Bell?”
“É mesmo... Não consigo contar quantas vezes mexeu comigo...”
“Mas era bonita, admito. Meu coração ficava meio estranho quando a olhava. Naquela época, não tinha muita certeza do que significava, contudo agora... Ah, quero me socar.”
“Tem certeza de que vocês não estavam apenas excessivamente conscientes? Está começando a soar como uma paixão unilateral para mim.”
“Bem... Pode ser verdade.”
“Hehehe, você realmente acertou onde dói, Ed.”
“Hey, é da natureza do homem ser fraco para a beleza.”
“Ahh... Por que me sinto tão sozinho e vazio quando falamos sobre essas coisas...?” Lionel disse com um suspiro antes de virar outra bebida.
Edgar apagou o cigarro com cansaço e enfiou outro na boca antes de servir mais bebida a Lionel ao dizer.
“Então vá se casar já.”
“Hã? Com quem? Esse velho não tem ninguém...” respondeu Lionel.
“Seu idiota... Acho que não há cura para a idiotice.” Edgar acendeu seu cigarro.
Kasim riu.
“Pensando bem, somos todos solteiros aqui. Um de nós tem uma filha, no entanto nenhum de nós tem uma esposa.”
“Nem comente, só está piorando as coisas.” Edgar soltou mais fumaça. “Ainda assim, se você é casado, acho que está se preparando gradualmente para o momento. Mas como é ter uma filha de repente um dia?”
“Oh, foi uma grande confusão. Já cuidei das crianças da vizinhança antes, porém quando é minha casa, sabe... E ainda tinha meu trabalho diário para fazer, tendo bebê ou não.”
“Uma garota, nada menos. Tenho certeza de que há muitas coisas que um cara simplesmente não entenderia.”
“Sim, recebi muita ajuda e conselhos da esposa do meu amigo. Graças a sua ajuda, conseguimos superar as dificuldades.”
“Então é por isso que Ange é tão pegajosa com você.” comentou Edgar.
Belgrieve coçou a barba enquanto refletia.
“Éramos uma família, só nós dois. Foi muito difícil criar uma menina, no entanto. Quando Ange era pequena, tinha o cabelo curto e corria como os meninos. Não consigo nem me lembrar de ter comprado uma única peça de roupa bonita para ela... É, eu não prestava, contudo fico feliz que tenha se saído bem.”
“Espera aí, se você não presta, tenho certeza de que a maioria dos pais do mundo não presta.” argumentou Edgar.
“Ela é decidida e confiável, Sra. Ange... Quantas vezes já me ajudou...?”
“Haha... É uma garota tenaz, vou concordar aí. Todavia vou ficar preocupado se não aprender a ser um pouco mais independente de mim... Ela ainda quer dormir na mesma cama com sua idade atual.”
“Hah, bem, é uma filhinha do papai. Fica mimada sempre que está por perto, Sr. Bell... Porém, sabe, tenho certeza que está tudo bem. Sabe como é quando você está por perto, no entanto ainda é bastante diligente fora esses momentos.”
“É verdade. Caso contrário, não teria conseguido entrar em Orphen aos doze anos.”
“Também acho.” Kasim entrou na conversa. “Quando mergulhei naquela masmorra com Ange, ela era forte e confiável. Quase me levou às lágrimas.”
“Entendo... Vocês podem ter razão. É natural que tenha um lado que eu desconheço.”
Certamente, quando ele não estava olhando, talvez Angeline agisse de acordo com sua idade, e era por essa razão que todos a adoravam e confiavam. O pensamento o fez sentir o desejo de mimá-la enquanto tinha a chance. Estou ficando mole mesmo, pensou.
“Fazer o seu melhor como aventureira é bom e tudo mais, entretanto penso que Ange deveria se esforçar um pouco mais como uma dama. Como vestir-se um pouco ou apaixonar-se... Sou egoísta como pai ao pensar dessa maneira?”
“Nah, não diria isso. Penso que Ange seria muito fofa se se vestisse um pouco mais...”
“Pensando agora, tenho visto-a trançar o cabelo nos últimos dias. Não fazia isso antes de voltar para casa; segundo o que disse, pegou o hábito fazendo o cabelo de Char.”
“Haha, pensando bem, talvez tenha um pouco de mente para moda então...” Edgar pegou a garrafa e fez uma careta. “Ouch, acabou. Senhora, outro huangjiu... Não, vamos com nigori desta vez. Também vou querer fígado de dragão ensopado, certo...? Sim, então um ensopado. O suficiente para cinco.”
“Ensopado?”
“Sim, você joga comida em uma sopa picante, depois escolhe e come. Fígado de dragão realmente traz o sabor. A panela tem um formato bem interessante também — tem uma parede no centro que dá para dois tipos de sopa, e ambas são deliciosas.”
“Hmm... Sabe onde eles vendem essas panelas?”
“Hahaha, parece que não fica satisfeito a menos que possa experimentar você mesmo, Sr. Bell. Claro, vou levá-lo na próxima vez que tiver um dia de folga. Acredito vão ter algumas a venda.” disse Edgar com uma risada, depois apagou o cigarro aceso. Logo, Lionel estava resmungando sobre seu vinho, Kasim estava respondendo à sua negatividade com mais risadas e, durante todo o tempo, Byaku silenciosamente mastigava brotos de folhas de uma tigela pequena.
Isso é divertido, pensou Belgrieve. Ele gostava de um bom banquete com os fazendeiros de Turnera para conversar sobre trabalho, mas esse tipo de refeição também não era ruim. Essa situação o relembrou de seus dias de aventureiro, e foi um alívio sentar ombro a ombro com homens de sua idade. Com certeza não seria ruim ter mulheres jovens por perto também, porém tendia a se sentir inferior e instável na velhice. Não pôde deixar de se sentir grato por esta oportunidade de falar de maneira aberta e irrestrita.
Olhando para Byaku enquanto o menino comia quieto, Kasim sorriu.
“Temos um garoto tímido aqui. Ou é chato sem nenhuma garota por perto?”
“O que diabos está insinuando?”
“Hehehe, já está nessa idade. Então, garoto Bucky, quem é o seu tipo, afinal? Ange? Merry? Anne? Ou talvez até mesmo Maggie? É um tiro no escuro, talvez Char?”
“Pensando bem, você está cercado por garotas bonitas. O que eu daria para ter tido uma juventude assim, seu patife.” Edgar alegremente estendeu a mão e cutucou Byaku.
Byaku fez uma careta.
“Tsk, velhos vulgares...”
“Não seja tímido, não seja tímido. Vou manter em segredo. Então, quem é?”
“O que... O que isso importa...?” Byaku fez beicinho e se virou.
O que foi isso? Belgrieve inclinou a cabeça. Foi um pouco diferente da reação usual. Normalmente, Byaku apenas mantinha um silêncio taciturno.
“Está com febre, Byaku?”
“Pareço estar?” Seu rosto sem dúvida estava um pouco vermelho e ele estava com os olhos vidrados.
“Está bêbado?” Belgrieve perguntou.
“Não, ele não teve nada para... Ah.” Edgar levantou uma tigela vazia com um sorriso irônico. “Os brotos foram temperados com borra de saquê...”
“Borras de saquê? Quer dizer o resquício depois que espremem o líquido...? Você deve ser mesmo um peso leve, Byaku. Está tudo bem?”
“Cala a boca, maldito velho...”
O álcool o estava afetando agora. Byaku estava arrastando suas palavras e dando leves balanças de um lado para o outro.
Kasim caiu na gargalhada.
“Pensei que fosse apenas um pirralho atrevido. Acho que você pode ser fofo se quiser, hehehe.”
“Grr... Ugh...” Byaku gemeu enquanto plantava uma cotovelada derrotada na mesa. Estava cochilando em seguida.
Belgrieve esfregou-lhe as costas com seu habitual sorriso torto. Quando ficou assim, era como qualquer outro garoto de quinze anos. Foi quando a garçonete chegou com um fogão de mesa e uma panela.
“Desculpe a espera.”
“Obrigado. Vou abrir um pouco de espaço, então...” Edgar se interrompeu, os olhos arregalados. Os outros ficaram tão surpresos quanto, com suas bocas entreabertas.
“O que há de errado? Apresse-se e abra espaço.”
“Você... O que está fazendo aqui, Gil?”
Lá estava Gilmenja no vestido oriental. As roupas justas de Keatai do sul pareciam se adequar perfeitamente à sua constituição atlética.
Gilmenja riu.
“Estou trabalhando. Como estou?”
“Você sempre parece aparecer onde eu menos espero. Está reunindo informações?”
“Vejo que me conhece muito bem, Ed.”
Evidentemente, Gilmenja costumava se infiltrar em vários lugares para coletar informações. Seu corpo esguio e bem torneado e seu jeito casual com as palavras sem dúvida extraíram informações de muitos pares de lábios.
“Vamos lá, limpe a mesa já. Boa noite, Sr. Belgrieve, Sr. Kasim.”
“S-Sim, boa noite, Sra. Gil...”
“Como vai indo, Gilly?”
Segurando o acendedor com as duas mãos e equilibrando uma bandeja com uma garrafa de líquido na cabeça, Gilmenja encolheu os ombros com habilidade.
“Mais ou menos... De qualquer forma, vocês dois — estão se divertindo perto desses imprestáveis? Se assim for, adoraria acompanhá-los na próxima vez, heheheh... Trarei as mercadorias.”
Ela largou os objetos e depois uma garrafa cheia de licor turvo antes de sair como se nada tivesse acontecido.
Kasim parecia bastante divertido.
“Gilly é uma garota interessante. Acho que gosto dela.”
“Eu a conheço há um tempo, entretanto é a única pessoa que não entendo... E, espera, os dois estão dormindo. Eu pedi cinco... Hey, acordem!”
Edgar cutucou Byaku e Lionel, que estavam em um sono profundo. E embora resmungassem, nenhum dos dois mostrava qualquer sinal de acordar, apenas mudando de posição em resposta.
Com um suspiro resignado, Edgar pegou a garrafa e estendeu-a.
“É impossível... Bem, bons sonhos então. Tome uma bebida, Sr. Bell.”
“Obrigado... É diferente da anterior.” observou Belgrieve enquanto o líquido enchia seu copo. Então, percebendo de repente, se virou para Kasim. “Pensando agora, você superou seu medo de estranhos.”
“Quando chegar à minha idade, não poderá mais ficar ansioso com todos os Tom, Dick e Harry. Essa é a parte de mim que cresceu!” Kasim gargalhou.
Edgar estendeu a garrafa para Kasim também.
“Então você costumava ser tímido, Sr. Kasim?” ele disse, parecendo bastante interessado.
“Sim, costumava ser o pior de nós em lidar com as pessoas que encontrava pela primeira vez e...”
“Hey, Bel! Eu falo por mim! Fique fora disso!”
Duas cores diferentes de sopa borbulhavam na panela enquanto o vapor se enrolava como uma cobra.
○
A casa de Anessa e Miriam era convenientemente compacta. Era pequena o suficiente para que a limpeza não fosse mais difícil do que deveria ser, sem parecer apertada. Havia três cômodos principais: uma sala de estar para comer e descansar, um quarto e uma sala de trabalho onde guardavam seus equipamentos de aventura. Além destes, havia também uma cozinha.
Hoje à noite elas estavam tendo uma noite de garotas. Os homens estavam saindo para beber, então acharam que não havia razão para não se divertirem. O grupo de Angeline rendeu tanto que não havia lugar na cidade fora da sua faixa de preço, mas mesmo que os bares tivessem um ambiente agradável, seria uma dor de cabeça chegar em casa depois da última hora. Realizar a reunião na casa de alguém significava que não importaria se bebiam ou não até desmaiar.
Com isso dito, Angeline e Anessa saíram para comprar comida e bebida e agora estavam se preparando. A mesa e as cadeiras da sala foram retiradas do caminho e, em seu lugar, um tapete grosso do depósito foi estendido no chão. Montes de travesseiros foram colocados ao redor para que todas pudessem se sentar no chão; dessa forma, ninguém teria que se preocupar em cair de uma cadeira se começasse a cochilar. Graças ao aquecedor mágico modificado com as próprias sequências de feitiços de Miriam, sua casa era mantida aquecida sem uma lareira.
Belgrieve disse a ela para não beber muito, e é claro que Angeline pretendia honrar seu pedido. Porém uma vez que a bebida começasse e as conversas florescessem, sabia que não seria prudente o suficiente para distinguir o significado de ‘demais’.
Ao mesmo tempo, Marguerite cozinhava na cozinha. Desde que ficou com as garotas em seu primeiro dia em Orphen, se tornou uma aproveitadora. A casa delas não era tão pequena que sua presença a tornasse apertada, e ficou bastante aliviada ao encontrar amigas de sua idade para ficar na vastidão de Orphen. Agora, se sentia completamente em casa.
Com a sala pronta, Angeline entrou na cozinha e estreitou os olhos com curiosidade ao ver Marguerite de avental.
“Você parece um pouco obscena assim...”
“Hã? Pareço?”
Marguerite se deu uma olhada. Havia tirado o cardigã de pele de sempre e, com apenas o peito enrolado e as calças curtas sob o avental, parecia estar nua por baixo quando vista de frente.
“Não posso dizer deste lado. Bom, quem se importa? Somos todas amigas aqui.”
Enquanto Marguerite cantarolava e mexia a panela, Angeline estendeu a mão e passou um dedo pelas costas.
“Kyaah! O que está fazendo?”
“Suas costas estão indefesas... O que mais esperava?”
“Isso não significa que tem que me fazer cócegas, idiota!”
“É sua culpa por baixar a guarda...”
“Falando nisso, estou surpresa que não sinta tanto frio assim.” disse Anessa.
“Sempre fui resistente contra o frio. E é ainda mais frio de onde venho.” Afinal, o território élfico ficava ainda mais ao norte do que Turnera. Tendo vivido aqueles invernos gelados, o frio em Orphen não era nada para Marguerite.
A mistura fervente de carne e legumes borbulhava na sua frente, exalando um aroma inebriante. Ao contrário de sua personalidade selvagem, a princesa elfa moleca era uma boa cozinheira. Tinha um bom senso de tempero — ou melhor, um instinto aguçado para o sabor. Apenas um leve ajuste na quantidade de ervas, temperos e sal faria com que o mesmo prato tivesse um sabor completamente diferente quando outra pessoa o preparasse. Angeline provou o sabor e sentiu um pouco de vergonha de como era delicioso.
“Maggie... Você já cozinhou no palácio dos elfos?”
“Não. Ah, mas às vezes eu usava a cozinha do meu tio-avô sem permissão quando passava por lá.” Marguerite disse enquanto virava a carne na frigideira. Angeline se alinhou ao lado dela, pegando um talo de cogumelo e picando-o junto com a cebola e o alho.
“Vejo que também é muito habilidosa, Ange. Cozinha para si mesma?”
“Bem, é isso. Contudo ajudei meu pai em Turnera, então...”
“Oh, entendo. Bell é um ótimo cozinheiro.”
“Sim. Estou feliz por poder comer sua comida todos os dias agora.”
O simples fato de poder comer a comida de Belgrieve no café da manhã, almoço e jantar enquanto ainda morava em Orphen enchia Angeline de uma força que nunca havia sentido antes.
A maçaneta rangeu e uma rajada de ar externo entrou. Alguém havia entrado na casa.
“Estou em casa! Peguei alguns acompanhamentos no caminho de volta.”
“Agh, está muito frio.”
Miriam e Charlotte voltaram do treinamento com Kasim. Estava evidente que nevava lá fora, com uma camada fofa de branco grudada em seus chapéus e roupas. Anessa pegou suas coisas e espiou pela porta.
“Está caindo muito forte.”
“Sim, é aquela época do ano de novo. Sigh.” Miriam esfregou as mãos e então sacudiu vigorosamente o casaco para tirar a neve dele.
Por sua vez, Marguerite preparava a carne. Vapor emanava e carregava um aroma de dar água na boca. Angeline jogou a cebola picada, o alho e o cogumelo no óleo e no suco que restaram na frigideira. Depois de fritá-los um pouco, jogou vinho para deglaçar, depois sal e temperos. Por fim, ela derramou esse molho sobre as batatas cozidas no vapor.
“Tudo bem... Char, pode carregar isso para mim?”
“Claro!” Charlotte carregou nervosamente o grande prato. “Onde devo colocá-lo, Anne?” perguntou.
“Ah, logo ali. O treino está indo bem?”
“Sim! Acho que estou começando a entender.”
Anessa e Charlotte continuaram sua conversa amigável enquanto faziam sua parte nos preparativos para o banquete.
“Ahh, que cheiro. Agora estou com fome.” o nariz de Miriam se contorceu.
“O papai já saiu?”
“Sim, já foi. Acho que eles já estão comendo agora.”
“Então devemos começar também.” o sol estava começando a se pôr, e seria uma pena se alguma coisa que cozinharam esfriasse. E assim, as meninas sentaram-se nas almofadas. Um pote de vinho quente e perfumado encheu a sala com seu aroma picante.
“Saúde.” disse Angeline, levando o brinde, o resto tilintando seus copos contra os dela. O vinho quente que elas mesmas prepararam era um pouco mais doce do que o do bar. Como Charlotte era muito jovem para beber, só foi servida com suco de uva.
Enquanto o álcool quente descia pela garganta de Angeline, de repente parecia que poderia relaxar os ombros. Angeline deu uma boa cheirada no perfume aconchegante.
“Ah, é bom relaxar.”
“Estou esfomeado. Já vamos comer.”
“É bastante comida... Você realmente fez isso, certo.”
“Bom, depois que comecei a cozinhar um pouco, começou a ficar divertido. Ah, essas batatas não são tão ruins.”
“Poderia me passar o prato, Char?”
“Aqui vai você. Me dá uma dessas bolas de peixe, Merry.”
Mãos passaram por cada prato. Ninguém teve que trabalhar para fazer a bola rolar; o tópico da conversa mudava à menor palavra-chave, apenas para fluir para outro tópico. As garotas falaram de estranhos monstros, de seus fracassos em suas viagens e de Turnera, dos contos de fadas do território élfico, das melhores lojas da cidade e dos peixes de Lucrecia... Em momentos como aquele, era um desperdício falar sobre assuntos substanciais. Afinal, é provável que esqueceriam tudo no dia seguinte. A conversa era incoerente, divertida e embriagada — e era assim que deveria ser.
Uma bebida pode levantar ou deprimir o ânimo de alguém. No entanto não havia como diminuir esse humor. O pote de vinho quente foi esvaziado rapidamente e o próximo foi trazido. Seus pratos vazios formaram uma pilha no canto.
A partir desse ponto, não ficou claro para Angeline quando ao certo pegou no sono, entretanto o sol já estava nascendo quando acordou. Por azar, estava atrás de uma espessa camada de nuvens e não era muito brilhante. Ela mal conseguia discernir que não era mais noite.
Sentando-se, Angeline coçou a cabeça. Ela soltou a trança, permitindo que a cabeleira bagunçada caísse em cascata sobre os ombros. Ainda assim, bastou um pentear bastante violento com os dedos antes de ficar brilhante e desembaraçado.
Não sabia quanto tinha bebido na noite anterior, porém sabia que tinha sido muito. Embora estivesse acordada, era como se uma névoa tivesse sido lançada sobre sua mente. Além do mais, parecia que tudo o que havia comido e bebido agora estava girando em seu estômago.
“Hmm...” Houve um som vindo da cozinha, contudo Angeline não se sentiu motivada o suficiente para checar. Olhando ao redor, pode ver Anessa, Miriam e Charlotte, todas em um sono profundo. Todas haviam dormido amontoadas e, com todas trancadas juntas, seria impossível ir para a cama. As jarras de vinho vazias e talheres formavam uma pilha bagunçada sobre a mesa. A quantidade total de comida que tinham, incluindo o que compraram e o que prepararam, era bastante. No entanto os pratos estavam todos vazios.
Sem vontade de se levantar, ela estava sentada segurando os joelhos, olhando distraída pela janela, quando Marguerite saiu da cozinha. Parecia tão cheia de vida que era difícil imaginar que tivesse bebido uma gota sequer na noite anterior.
“Ah, você acordou, Ange. Bom dia.”
“Bom dia... Você acordou cedo.”
“O que, está de ressaca? Controle-se, hein.”
“Está parecendo o general musculoso agora... Você bebe muito, Maggie.”
“Sério? Foi só o normal. Ah, fiz uma sopa. Quer um pouco?”
“Hum... Obrigado. Eu quero um pouco.”
Angeline se contentou um pouco em ingerir um caldo limpo com repolho de inverno e carne seca. Enquanto se espreguiçava, sentia as juntas estalando e os músculos relaxando. Sua mente sinuosa tornou-se um pouco mais focada.
Angeline se divertira, no entanto agora se perguntava se Belgrieve também havia se divertido. Claro que o convite fora um deleite, mas se convencera de que o homem preferia beber sem reservas com os rapazes de vez em quando.
Estou impressionada com meu próprio tato, pensou Angeline com um sorriso. Eu me tornei uma garota que conhece o significado de autocontrole.
“O pai é gentil, então está sempre se esforçando...”
“O que é isso, de repente?”
“Só estou falando sobre como ontem foi divertido...”
“Hmm? Bem, acho que foi.”
“Acha que o pai também se divertiu?”
“Imagino que sim. Não consigo nem imaginar sobre o que homens como ele falam quando estão juntos.”
Marguerite se espreguiçou com um sorriso, e Angeline a encarou por um tempo, observando os cabelos prateados e sedosos da donzela élfica, o corpo esguio e o rosto refinado, que era tão adorável que teve que se perguntar se era artificial. A princesa da floresta ocidental era linda de fato, como toda a sua raça era considerada. Angeline se perguntou se a velha companheira de Belgrieve, Satie, também era tão bonita.
Talvez todos os olhares finalmente tivessem começado a deixá-la desconfortável, enquanto Marguerite mexia os ombros inquieta.
“E aí?” perguntou.
“Oh, desculpe... Hey, até que idade os elfos parecem jovens?”
“Bem, depende da pessoa. Alguns começam a mostrar rugas aos cinquenta, e outros parecem galinhas da primavera aos setenta. Ao que parece, tem a ver com quanta mana possui, porém eu realmente não entendo.”
Satie era da geração de Belgrieve, então deveria ter quarenta anos agora. Que tipo de mulher ela é? Angeline se perguntou. Será bonita como Marguerite? Eu poderia ficar nervosa se alguém assim se tornasse minha mãe. Sim, vou precisar me fortalecer...
As reflexões de Angeline foram interrompidas por um grande bocejo. Ela se enrolou, abraçando a almofada, e piscou os olhos.
“Vou embora assim que Char acordar.”
“Soa como um plano. Estou indo para a guilda.” transbordando de energia, Marguerite girou os braços e torceu o pescoço. Era uma bebedora forte, e Angeline se perguntou se era ainda mais forte do que Sasha em Bordeaux.
“Maggie... Você está bem? Tem certeza de que o vinho não está te afetando?”
“Isso não vai fazer nada para mim. Estou ansiosa para fazer outro trabalho.”
“Hmm... Não estava dizendo antes que eles são muito fáceis?”
“Sim, os monstros são fracos e o trabalho é básico, mas Bell está certo — tenho que construir bons hábitos. Esses trabalhos são bem interessantes se eu for até eles tentando descobrir coisas novas. Aventurar-se é tão divertido quanto pensei que seria! Estou feliz por ter vindo para Orphen.” Marguerite declarou com uma risada.
Atraída, Angeline se viu sorrindo junto.
“Está certa. Os tipos de ervas, onde crescem, como identificá-las, os pequenos hábitos dos monstros, tudo é muito interessante se observar de perto...”
“Certo, certo! Até agora, sempre derrotei monstros sem pensar, porém por fim percebi que havia um monte de coisas que estive ignorando.”
E com isso, Marguerite começou a estalar os dedos. Quando se tratava de força de combate, Marguerite era boa o suficiente para rivalizar com Angeline. Com a recomendação de Angeline, ela teria permissão para pular direto para os escalões superiores. No entanto, Belgrieve a aconselhou a começar do zero. Segundo ele, era preciso muito mais do que habilidade com a lâmina para se tornar um aventureiro, com poucas exceções.
Havia algumas coisas que só podiam ser vistas por observação cuidadosa durante tarefas aparentemente enfadonhas que qualquer um poderia realizar. Conter a arrogância e trabalhar com firmeza era uma boa maneira de prolongar a vida de um aventureiro. E era claro que Marguerite já começava a entender o que havia lhe dito. Angeline, é claro, gostava bastante da princesa elfa direta (embora um tanto grosseira), contudo também sentia um pouco de inveja.
Marguerite estava no mesmo caminho que a própria Angeline havia trilhado antes. Angeline não sentiu ciúmes disso; na verdade, sentia um pouco de superioridade como sua sênior na área. Todavia, sem dúvida parecia que Belgrieve estava sendo tirado dela. Quando Marguerite falou sobre o que Belgrieve lhe ensinou e o que aconteceu em Turnera, falou com uma alegria como se fosse a filha de Belgrieve.
Angeline, com uma expressão de beicinho, estendeu a mão e beliscou as próprias bochechas de Marguerite.
A princesa elfa piscou surpresa e protestou.
“U ki voi...”
“Suave...” Angeline sentiu como se pudesse tocar a pele macia de Marguerite para sempre. Ela havia beliscado as bochechas com um pouco de inveja e má intenção, mas a sensação era muito melhor do que poderia imaginar. Angeline se apressou em soltá-la e, em vez disso, apalpou as bochechas moles de Marguerite com as duas mãos.
“Não se precipite.” Angeline murmurou. “Tome isso. E isto.”
“Para!” Marguerite agarrou-a pelos pulsos, com as bochechas vermelhas.
“Você realmente é esquisita.”
“O que há de tão estranho em mim...?”
“Quero dizer, você dificilmente se parece com a filha de Bell. Seu rosto e a sua personalidade são diferentes... Aqui, vingança.” Marguerite estendeu a mão e agarrou Angeline pelas bochechas.
“Hmph... Eu sou uma órfã. Claro que não me pareço com meu pai...”
“Oh, certo... Já pensou em encontrar sua mãe e seu pai de verdade?”
“Nunca sequer considerei a possibilidade.”
Se Belgrieve não era seu verdadeiro pai, então certamente seus parentes de sangue estavam em algum lugar por aí. Angeline nunca havia pensado nisso antes, porém agora que havia sido mencionado, se sentiu um tanto curiosa.
Contudo, aqueles pais verdadeiros a deixaram de lado. Talvez houvesse algumas ‘circunstâncias’ envolvidas, no entanto não mudava o fato de que eles haviam abdicado de seu dever de criá-la. Uma cena em tons de sépia passou por sua mente por uma fração de segundo, apenas para desaparecer em seguida.
Angeline fez biquinho.
“Mas eles me jogaram fora, certo? Significa que não precisavam de mim. Não quero conhecer ninguém assim e acho que também não querem me conhecer.”
“Acho que sim... Porém é bem estranho.”
“O que é?”
Marguerite puxou o cabelo e o torceu enquanto dizia.
“Quero dizer, não há outras aldeias ao redor de Turnera. Contudo alguém jogou fora um bebê que ninguém mais sabia. Como quem te abandonou chegou lá? E por que ir até Turnera?”
Angeline cruzou os braços. Marguerite tinha razão: levava um dia inteiro para chegar a Rodina, a cidade mais próxima, e se quem chegasse viesse de outro lugar, era estranho que não houvesse testemunhas. Era difícil imaginar que um dos aldeões tivesse feito uma coisa dessas; seria impossível esconder uma gravidez em Turnera, onde todos se conheciam.
O pai está escondendo algo de mim? Algo que seria ruim se eu descobrisse...?
Aparentemente, Angeline estava fazendo uma cara assustadora, porque Marguerite gaguejou com pressa.
“D-Desculpe, eu não quis insinuar nada...”
“Nah, está bem... Não se preocupe.”
Angeline suspirou. Não vamos nos aprofundar muito nisso. É concebível que alguém de uma caravana mercante tenha me deixado e, mesmo que tenha vindo de algum lugar distante, é perfeitamente possível que ninguém os tenha visto pelo caminho.
Mais do que tudo, o afeto de Belgrieve com toda certeza não era uma mentira, e era o mais importante para Angeline. Ela não se importava com seus pais verdadeiros. Angeline chegou a uma conclusão.
“Meu pai é Belgrieve, o Ogro Vermelho... E ninguém mais. Isso basta para mim.” no entanto, mesmo quando as palavras saíram de seus lábios, Angeline teve que se demorar nelas por um momento. Marguerite assentiu silenciosamente.
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