Capítulo 120: Falka estava agachado no canto da sala
Falka estava agachado no canto da sala, com uma expressão de medo no rosto. Donovan, que acabara de atingir Falka com firmeza com sua lâmina embainhada, lançou-lhe um olhar satisfeito enquanto enfiava a espada de volta no cinto.
“Seu idiota... É por isso que vocês, homens besta incultos, são tão problemáticos.”
“Já terminou?” François perguntou a Donovan, um tanto surpreso.
“Sim, você foi de grande ajuda.” zombou Donovan. “Muito obrigado.”
“Eu apenas fiz o que tinha que fazer. Não posso permitir que causem problemas, ou refletirá mal em Sua Majestade... Então, o que estavam fazendo lá? Tem rancor desses caras?”
Donovan caiu em uma cadeira com um baque forte.
“É a espada dele. Aquela grande espada que o homem ruivo leva... Gostaria que fosse minha. Mas esse idiota deixou sua sede de sangue dominá-lo... Ficou um pouco complicado.”
Falka, abraçando incansavelmente os joelhos, estremeceu quando o olhar penetrante de Donovan voou em sua direção.
François cruzou os braços e organizou seus pensamentos por um momento.
“Então, só precisa solicitar a Sua Majestade. O homem ruivo é pai de uma mulher que ofendeu o príncipe.”
“Oh, sério...? Hmm...” Donovan esfregou o queixo, a testa franzida enquanto considerava suas opções. Por enquanto, parecia que seus interesses estavam alinhados. Ele assentiu. “Muito bem... Então farei assim. Pode nos levar até Sua Majestade?”
“Eles parecem estar tramando algo, então preciso reportar a Sua Majestade de qualquer maneira. Há mais alguma coisa que eu deva saber?”
“Quando cheguei, havia algo... Estranho flutuando no ar. Ouvi uma voz dizer algo sobre ‘Salazar’. Este Salazar parece ser o seu destino atual.”
“Isso é preocupante.” disse François, estreitando os olhos. “Vou precisar fazer meu relatório nesse momento, então.”
Vestindo o casaco que acabara de tirar, François saiu com pressa da sala. Os dois Templários seguiram atrás. Esta foi uma oportunidade para François acumular alguns méritos em seu nome e, mesmo assim, não estava nem um pouco entusiasmado com a situação. Era como se estivesse agindo puramente por obrigação; uma estranha indiferença parecia ter tomado conta de seu coração. Sua ambição, e até mesmo a vingança que sentia por Angeline — sempre que não estava se forçando a pensar nessas coisas, tudo parecia tão inconsequente para ele.
“Está orgulhoso do trabalho que faz?” Engula sua língua, seu humilde aventureiro...
Só de lembrar o rosto de Belgrieve o irritou. E, no entanto, essa irritação pode ter sido apenas uma pretensão de sentir alguma coisa quando seu coração estava empedernido. Tudo o que fez parecia uma desculpa. Vingança, avanço — se perguntava se essas coisas não seriam simples desculpas para continuar vivendo.
Não, isto está errado. É por essa razão que procuro ganhar poder. Quando eu estiver mais forte, tenho certeza de que minhas percepções mudarão. Não precisarei mais ficar frustrado com minha impotência e não serei mais ridicularizado por meros aventureiros.
François disse isso a si mesmo enquanto acrescentava propositalmente algum vigor aos seus passos, estimulando-se ainda mais. Donovan seguiu atrás com um sorriso fino e peculiar no rosto.
○
Angeline embainhou a espada antes de lançar um olhar atento para o homem segurando as barras — um homem que afirmava ser Benjamin. Estava emaciado e seu cabelo e barba haviam crescido de forma desenfreada, mas por baixo dos cachos despenteados, seu rosto era de fato bonito, com um toque de elegância.
“O verdadeiro...?”
“E-Eu sou o real... Por favor, salve-me.” implorou Benjamin. Sua respiração deu lugar a uma ofegante dor e depois a um ataque de tosse.
Ainda cética, Angeline gentilmente colocou a mão nas barras, sentindo o toque frio do ferro. A prisão não tinha entrada — não havia porta nas grades e, da mesma forma, não viu nada na parede posterior da cela. Não sabia como o homem poderia ter entrado ali, porém em um mundo tão absurdo, uma prisão sem entrada não era motivo de surpresa.
“Afaste-se.” Angeline ordenou.
Benjamin se afastou em seguida das barras de ferro, pressionando-se contra a parede dos fundos.
Angeline respirou fundo e agachou-se.
“Phew...” ela respirou fundo.
Aquela única respiração foi o suficiente — Angeline sacou a lâmina de sua bainha e, com o mesmo impulso do saque, fluiu direto para um golpe. O som agudo de metal colidindo com metal reverberou várias vezes em rápida sucessão antes que as barras cortadas caíssem no chão.
Os olhos de Benjamin se arregalaram.
“In-Incrível...”
Angeline entrou pela abertura e cortou as correntes que prendiam as pernas do homem. Suas mãos se estenderam e levantaram as correntes, verificando se estava mesmo livre. Lágrimas escorreram de seus olhos.
“Não é... não é um sonho... Nunca pensei que esse dia chegaria.” ele murmurou enquanto tentava se levantar, contudo seus pés estavam instáveis. Não demorou para perdeu o equilíbrio e cair de joelhos.
Angeline agarrou seu braço e o colocou de pé, emprestando-lhe um ombro.
“Você está bem...?”
“Sinto muito... Você é minha salvadora... Mas como cortou aquelas barras de ferro?”
“Sou uma aventureira Rank S.” respondeu Angeline, puxando sua placa de aventureira para Benjamin ver.
“É-É verdade... Entendo, isso faz sentido... Poderia fazer a gentileza de me dizer seu nome?”
“Angeline.”
“Angeline... Um belo nome. Obrigado, de verdade.”
Foi muito bom que tivesse conseguido extrair o homem cambaleante de sua cela, no entanto não tinha certeza do que fazer a seguir. Eles ainda estariam presos se não conseguissem encontrar uma maneira de deixar este lugar bizarro.
Agora que Angeline havia encontrado o verdadeiro Benjamin, não havia dúvida de que aquele que conhecera antes era outra pessoa (ou alguma coisa). Claro, havia uma chance de que esse Benjamin fosse mais uma farsa — talvez até mesmo a mesma farsa que a prendeu ali. Porém Angeline nem sequer quis considerar essa possibilidade. Poderia pensar em toda uma lista de dúvidas sempre que quisesse, contudo nunca a levaria a lugar nenhum.
Por enquanto, sentou Benjamin contra a parede externa. Aquela pequena caminhada foi suficiente para deixá-lo sem fôlego e com dor.
“Eu deveria ter trazido um pouco de água.”
“Não, não se preocupe. Não poderia pedir mais nada de... Ahh...”
“Há quanto tempo você esteve aqui? Quem exatamente é esse impostor?”
Embora Benjamin parecesse estar com dor, era evidente que estava disposto a falar, então contou sua história respirando com dificuldade. Acontecera há alguns anos, quando Benjamin saiu para brincar com as meninas em cuja companhia se entregava. Sua carruagem sofreu um acidente e, quando recuperou o juízo, foi empurrado para uma cela. Presumivelmente, o impostor o substituiu na confusão causada pelo acidente.
No início, sua cela ficava em outro lugar, entretanto depois de algum tempo foi transferido para cá. Ele recebeu comida e água suficientes para mantê-lo vivo, todavia não lhe foi concedido um pingo de liberdade. Ao que parecia, não sabia nada sobre a identidade do impostor ou de onde poderia ter vindo. De vez em quando, o impostor e seus companheiros apareciam, no entanto fora isso nunca conheceu mais ninguém. O isolamento era enlouquecedor — quando Angeline enfim chegou, temia por fim ter começado a ter alucinações.
“Mas minha alegria levou a melhor sobre mim... Não me importei se você era uma alucinação naquele momento.”
“Você é tão idiota quanto dizem os rumores.”
“Não posso contestar isso... Eles se aproveitaram dessa idiotice. Sigh... O que aquele impostor está fazendo com a minha cara, afinal? Está bagunçando a nação?”
“Todo mundo diz... Que foi uma mudança para melhor. As pessoas o veem como um excelente líder.”
Benjamin baixou a cabeça, uma expressão de desespero no rosto.
“Haha... Ha... O que há com essa situação? Então o que eu sou...?”
“Entretanto é bem provável que seja apenas superficial. O falso está planejando algo vil nos bastidores. Também está conduzindo experimentos humanos envolvendo demônios.”
“O que...? Não, não deveria estar surpreso... Onde eu estava detido antes, eles estavam aprisionando muitos monstros por algum motivo.”
Angeline agarrou o ombro de Benjamin e olhou-o em seus olhos.
“Hey, eu vou te salvar. Então me prometa: assim que derrotarmos a farsa e você for o príncipe herdeiro novamente, pare de brincar o tempo todo. Seja uma pessoa boa e atenciosa. Caso contrário, não posso ajudá-lo sem alguns sentimentos de vergonha.”
Benjamin fechou os olhos por um tempo. Após um momento, os abriu e olhou nos olhos dela.
“Entendido. Sou um idiota, porém não acredito que seja alguém que desconsideraria o pedido da minha salvadora. Prometo que farei o melhor que puder.”
“Ótimo. Esse é um príncipe herdeiro que posso respeitar.” satisfeita, Angeline assentiu e deu um tapinha na cabeça de Benjamin, fazendo-o se mexer inquieto. Evidentemente, sua longa vida em confinamento havia — involuntariamente — arrancado dele sua natureza depravada. De qualquer forma, precisaria escapar antes que isso acontecesse. O problema era que Angeline ainda não tinha ideia de como.
Se o pai estivesse aqui... Angeline pensou, contudo tirou essa ideia da cabeça. Não, o pai não ficará feliz se eu confiar nele para tudo, disse a si mesma, batendo as mãos no rosto para se animar.
“Suponho que não sabe como sair daqui?”
“Se soubesse...” disse Benjamin com um suspiro.
Bom, é verdade. Angeline assentiu, já esperando tal resposta, enquanto dava outra olhada ao redor. O chão ainda era um tabuleiro de xadrez vermelho e branco, e uma brisa suave carregava o aroma refrescante da floresta de salsa.
Quando esticou o pescoço para cima, a parede de tijolos brancos da prisão pareceu continuar por uma eternidade. Alguma distância depois que as barras deram lugar à parede, a parede fez a transição para barras mais uma vez. Barras, parede, barras, parede... Essas celas eram espaçadas em intervalos regulares, tanto para cima quanto para baixo e para a esquerda e para a direita. Não conseguia ver o que estava contido nos superiores. Talvez houvesse algo dentro, no entanto Angeline não possuía a habilidade necessária para escalar essas paredes sem nenhum apoio para os pés.
“Para começar... Vou dar uma volta e ter uma ideia melhor da área. Espere aqui.”
“N-Não, por favor, espere. Gostaria de não ficar para trás... Olha, posso andar por conta própria.” disse Benjamin enquanto apoiava as pernas trêmulas.
Angeline coçou a cabeça.
“Está bem mesmo? Não se esforce demais...”
“É mais assustador ficar para trás... A prisão estava me protegendo, de certa forma.”
Entendo... Ele não podia sair, mas nada poderia afetá-lo também. Partir deu-lhe o privilégio da liberdade, porém também abriu caminho para o perigo. Como Angeline não sabia nada sobre o que havia naquele espaço, separar-se não parecia uma decisão sábia. Depois de pensar um pouco, Angeline tirou uma faca do cinto e colocou-a nas mãos de Benjamin.
“Você deveria ficar bem... Contudo se for o caso, use essa faca para se proteger.”
“N-Não espere muito... Farei o meu melhor.” Benjamin suspirou enquanto segurava um pouco nervoso a faca.
Fazendo uma marca no chão com sua espada, Angeline lentamente começou seu caminho. Não havia muito o que fazer, então tentou caminhar ao longo da parede. Sua superfície parecia estar se curvando aos poucos. Talvez isso trace um círculo completo, ponderou.
Do lado oposto ao muro, a floresta verde de salsa parecia sempre presente, com o mar presumivelmente além dela.
Talvez, esta parede esteja bem no centro e todo o resto circule em seu entorno. Pode ser uma ilha isolada. Quer dizer, o que pensei ser uma península acabou por ser omurice, então há uma hipótese de ser uma ilha circular. Se eu tivesse uma pista para sair... Angeline continuou pensando a respeito enquanto caminhavam, todavia não parecia que iria encontrar alguma coisa. O mesmo cenário parecia continuar sem fim. Também não podia sentir muito do fluxo de mana, nem sentiu qualquer força interferindo no espaço em que estava. Vai ser muito mais problemático do que os espaços anteriores... suspirou.
Depois de caminhar um pouco, ela parou para descansar um pouco, em consideração à resistência de Benjamin. Sentou e encostou-se na parede.
“Hey... O impostor foi o único que veio aqui?”
“Não, também me lembro de um homem de túnica branca. Embora não faço ideia de quem era...”
Angeline se lembrou do homem vestido que estava perseguindo Satie.
“Schwartz, talvez...”
“Schwartz...? Q-Quer dizer a Chama Azul da Calamidade, não é?”
“Você o conhece?”
“Quero dizer, ele é um mago cujo nome está em todos os livros de história. É muito famoso, e não no bom sentido... Schwartz está envolvido nisso?” mais uma vez, o rosto de Benjamin estava cheio de desespero.
Angeline suspirou.
“Não importa contra quem estamos enfrentando... Ele veio aqui com magia de teletransporte?”
“Não sei sobre essas coisas...”
Ele é um inútil... Angeline pensou, fazendo beicinho. Não que o culpasse depois de ter ficado trancado por tanto tempo. No entanto teria sido bom se fosse um pouco mais confiável.
“Depois que cuidarmos daquele impostor, é melhor que comece a estudar.”
“S-Sim. V-Vou tentar...”
O sol estava se pondo gradualmente. Seu sorriso suave estava desaparecendo além da linha da salsa. Angeline estreitou os olhos e inclinou a cabeça.
“Portanto, há um ciclo de dia e noite aqui.”
“Sim, existe. Estremeço ao pensar como estaria perdido se fosse meio-dia para sempre...”
Se Benjamin estivesse trancado em um mundo imutável, sem nenhuma maneira de saber a passagem do tempo, talvez tivesse enlouquecido de fato. Agora que penso a respeito, estou surpresa que tenha resistido, pensou Angeline. Sua opinião sobre o príncipe sofreu uma ligeira melhora.
Ela sentiu que algo precisava ser feito, entretanto não tinha ideia por onde começar, então hesitou em desperdiçar sua energia. Porém, a noite traria consigo um novo ambiente. No momento em que o sol se pusesse, talvez este mundo mostrasse uma faceta completamente nova de si mesmo. De acordo com Benjamin, não notou nenhuma mudança particular entre o dia e a noite, mas Angeline não ficaria satisfeita até que verificasse por conta própria.
Assim que o último raio de sol se foi, apareceu o perfil lateral com o leve sorriso de uma lua crescente. Primeiro o sol, agora a lua — ambos parecem ter rostos muito socáveis. Dito isto, a luz que emitia era bastante forte e a permitiu continuar a andar sem problemas.
“H-Hey.” Benjamin falou com timidez. “Angeline... Pensando bem, o que está fazendo aqui? Você aceitou um pedido secreto da guilda — hum, sobre me salvar ou algo assim?”
“Não, seu impostor está atrás de uma dos amigos do meu pai. Estou tentando ajudá-la.”
“E-Entendo... Deveria ter imaginado.” disse Benjamin com um sorriso um tanto triste.
Angeline olhou-o e encolheu os ombros.
“Estou feliz em ver que você ainda está vivo. Já que está aqui, tudo bem se acabarmos com o impostor.”
“Haha, é assim mesmo? Então, eu acho... Cough, hack...” Benjamin pareceu engasgar com alguma coisa no meio de sua frase. Logo, Angeline estava ao seu lado esfregando suas costas.
“Não precisa se forçar a falar.”
“De-Desculpe por isso. Estou muito feliz em conversar com qualquer pessoa.”
Angeline riu baixinho e deu um tapinha na cabeça dele.
Benjamin coçou a bochecha sem jeito.
“Você é um garoto estranho... Meu Deus.”
A parede de tijolos da prisão lançava uma sombra enorme sobre eles. Talvez por causa do forte luar — ou talvez não, já que não conseguia mais dizer com esta dimensão — não havia estrelas visíveis no céu. Parecia que o perfil lateral da lua sorridente os observava.
Não, espere... Angeline tinha certeza de que havia caminhado bastante ao longo da parede, contudo ainda não havia retornado ao local que havia marcado no chão. Além do mais, quando o sol se pôs, estava do outro lado do mar, como sempre esteve. Agora a lua ocupava sua localização exata. Ela se perguntou se os próprios corpos celestes a estavam seguindo. Ou há algo mais mágico em ação?
Fosse o que fosse, o sol, a lua e os peixes eram as únicas entidades que pareciam trazer alguma mudança ao mundo. Talvez surrá-los faça alguma coisa acontecer, pensou Angeline enquanto se levantava.
Benjamin olhou-a com ansiedade.
“O que vai fazer?”
“A lua é suspeita. Estou pensando em ir lá.”
“E-Entendi...”
Angeline ajustou a espada no cinto e estava prestes a começar a andar quando ouviu algo. Foi um som muito fraco, como se alguém estivesse batendo uma pedra nas barras de metal.
“Está ouvindo isso?”
“Hã...? Alguma coisa está atingindo as barras?” Benjamin perguntou, com uma expressão curiosa no rosto enquanto se concentrava em ouvir.
Tem mais alguém aqui?
“Já ouviu esse som antes?”
“N-Não, não ouvi. Esta é a primeira vez...”
“Tudo bem... Vamos dar uma olhada então.”
A lua poderia esperar. Angeline seguiu na direção do barulho, de volta na mesma direção de onde tinham acabado de vir. Ela não tinha visto ninguém nas celas no caminho até lá. Então tem que estar em uma das celas superiores que não consigo ver.
Angeline olhou em volta com desconfiança enquanto refez seus próprios passos, e uma das celas superiores estava realmente bastante barulhenta. O ar ecoava incessante com o tilintar do metal, e o luar parecia tremer enquanto um ruído estridente reverberava pela noite.
Não havia como saber se era um inimigo ou aliado que encontraria lá dentro. Por um tempo, Angeline olhou para cima em silêncio até que, por fim, o barulho cessou.
Olhando para a sombra que agora se agarrava às barras, Angeline engasgou. Seus olhos seguiram as mechas de cabelo prateado que refletiam a luz da lua.
“Satie!” Angeline gritou.
Satie olhou para ela, assustada.
“A-Angeline? Por que...?”
“Podemos conversar mais tarde! Vou te tirar dai!”
Ou pelo menos queria, no entanto a cela era bem alta, e mesmo que quisesse pular lá, seria cansativo sem nenhum apoio para os pés.
Enquanto Angeline se perguntava o que poderia fazer, Satie estendeu a mão através das barras.
“Tem uma espada com você? Passe pra mim!”
Angeline puxou a espada embainhada do quadril e lançou-a com toda a força. A lâmina voou e pousou firme nas mãos de Satie. Pouco depois, ouviu-se o som de metal batendo contra metal, e então as barras quebradas caíram.
“Parece que eu precisava de um de verdade, afinal... Obrigado!” Satie gritou. Ela colocou a cabeça para fora e jogou a espada para trás.
Depois de pegá-la e colocá-la de volta no cinto, Angeline abriu os braços.
Benjamin parecia perplexo.
“O-O que vai fazer?”
“Pule! Eu vou te pegar!”
Mas Satie, aparentemente perturbada, permaneceu onde estava.
“N-Não, é impossível! Vou descer de uma alguma outra forma, então se afaste...”
“Não é impossível! Eu sou a Valquíria de Cabelos Negros Angeline... Uma Aventureira Rank S!”
Embora Satie hesitasse, por fim se abaixou e se lançou no ar. Angeline apoiou ambas as pernas, observando a descida da mulher. A distância diminuiu a cada momento até que Satie caiu direto no peito de Angeline.
O peso repentino em seus braços foi chocante, porém ela reuniu forças para segurá-la e manteve o equilíbrio. Na verdade, o corpo macio e quente em seus braços a deixava mais à vontade do que qualquer outra coisa.
“Satie... Você está bem?”
Satie não respondeu. Ela silenciosamente passou os braços em volta das costas de Angeline e a abraçou. Angeline, ouvindo a mulher fungar, retribuiu o abraço.
Agora que a olhou mais de perto, viu que Satie estava em frangalhos. Seu corpo estava coberto de feridas recentes, um leve cheiro de sangue pairando ao redor, e seu lindo cabelo prateado estava desgrenhado e despenteado. Ainda assim, seu corpo estava quente e tinha um estranho cheiro nostálgico.
“Obrigado... Mais uma vez...” Satie disse, com a voz congestionada.
“Onde estão Hal e Mal...?”
“Schwartz chegou até elas...”
Angeline fez uma careta. Então o inimigo enfim encontrou um caminho para aquele espaço sépia.
Angeline respirou fundo e olhou para Satie. Ela se viu refletida nos olhos esmeralda claros da elfa.
“Não vou te deixar fugir de novo... Vamos salvar Hal e Mal. Pegaremos o falso príncipe e Schwartz, e então poderá se encontrar com meu pai e todos os outros!”
“Ah, ha! Entendi... Eu desisto. Vamos juntas.” Satie olhou para o rosto de Angeline com um sorriso caloroso.
○
Embora a chuva tivesse diminuído até certo ponto, ainda caía impiedosamente, encharcando tudo abaixo.
O laboratório de Salazar ficava no final de uma passagem complicada. Com todos os edifícios empilhados uns sobre os outros, havia várias camadas de teto sobre a passagem subterrânea. Uma vez lá embaixo, não estavam mais ao alcance da chuva, contudo a ausência do sol os deixava na escuridão e, se alguém fosse descuidado, era muito fácil se perder.
Belgrieve estava preocupado que pudessem muito bem fazer isso neste lugar desconhecido, no entanto Anessa e Miriam pareciam saber para onde estavam indo devido às habilidades que adquiriram como aventureiras de alto escalão. Marguerite, por outro lado, não era uma aventureira há muito tempo e se sentia perdida em qualquer lugar que não fosse uma floresta, então parecia bastante perplexa.
Miriam, que estava logo à sua frente, parecia ter leveza em seus passos.
“Isso não é legal? Parece que Ange está bem.”
“Sim. Mas ainda não podemos recuperar o fôlego. Não é como se tivéssemos resolvido o problema.”
“Hey, Bell, como acha que Kasim descobriu a condição de Ange?”
“Bom, Sir Salazar foi quem descobriu que Ange foi jogada na prisão do tempo-espaço ou algo assim, certo? Tenho certeza de que ele tem alguma maneira de investigar o local.”
“Oh, entendo. Acho que faz sentido. Hmm, porém Salazar, hein... Ele é muito suspeito.” disse Marguerite, cruzando as mãos atrás da cabeça.
Enquanto caminhava pelo corredor subterrâneo de pedra, o pé protético de Belgrieve fazia seus passos baterem com um som diferente dos outros. Eles avançaram por um bom tempo antes de se depararem com uma porta de madeira repleta de algo que parecia ser algum tipo de sequência de feitiços inscrita.
“É esse. Bem aqui.”
“Isso levou pouco menos de uma hora, eu diria...”
Anessa bateu na porta e logo depois Kasim a abriu e colocou a cabeça para fora.
“Ah, aí estão vocês. Entrem, rápido.”
“O que está acontecendo, Kasim?”
“Bem, vai demorar um pouco para explicar. Algum desenvolvimento de sua parte? Além do mais, por que era todo aquele barulho lá?”
“Ficou um pouco complicado para nós também.”
Belgrieve contou-lhe de forma resumida sobre os Templários e como já havia encontrado François em Findale uma vez.
“Hmm... Bom, não esperava que ele trabalhasse conosco de qualquer maneira. Se sabe que Benjamin é um impostor ou não... Não posso dizer. Entretanto esses detalhes podem esperar — por enquanto, basta entrar.”
Kasim acenou para que entrassem, onde Belgrieve foi imediatamente pego de surpresa. A sala estava cheia de um cheiro medicinal, com cada caractere tremeluzindo sem parar com uma luz azul clara. Tudo parecia vertiginoso.
Alguém estava esparramado sobre um círculo mágico no centro da sala. A figura parecia esticar-se e encolher rapidamente, nunca estabelecendo uma forma específica.
Miriam piscou de espanto.
“Hã? Esse é o Sr. Salazar? O que aconteceu?”
“Bem, deixe-me explicar as coisas em ordem.”
Por enquanto, Kasim ordenou que todos entrassem na sala. Maitreya surgiu de um dos cantos e cutucou Belgrieve na perna.
“Está atrasado. O que houve?”
“Haha, desculpe, desculpe. Chegamos o mais rápido que pudemos.”
“O que está acontecendo aqui? Salazar ficou doido de vez ou algo assim?” Marguerite perguntou.
Kasim encolheu os ombros.
“Não exatamente. Isso aqui é culpa de Ange.”
“Hã? O que quer dizer?” Anessa perguntou.
“Eu disse que explicaria, contudo vocês são realmente um bando impaciente. Tá, tanto faz. Indo direto ao ponto, Salazar estava aliado a Schwartz.”
“O que?”
Os olhos de todos se arregalaram com a revelação.
Maitreya, aparentemente se divertindo, explicou.
“Eles estavam usando um ao outro, para ser mais preciso. A dimensão alternativa usada por Schwartz e Benjamin foi criada pelo velho Olhos de Serpente. Schwartz e seus aliados o usaram para implementar seus planos, e o Olhos de Serpente aprofundou sua pesquisa observando os eventos que surgiram a partir disso.”
“Porém é inútil questioná-lo. Como já disse, Salazar não consegue distinguir entre o bem e o mal. Não tem consciência e age apenas por curiosidade. Para observar o que chama de ‘fluxo de eventos’, ele construiu uma dimensão alternativa para Schwartz. Foi também o responsável por criar aquela prisão de tempo-espaço onde Ange foi trancada.”
Então foi assim que aconteceu, pensou Belgrieve, cruzando os braços. Isso explicava como percebeu na hora que Angeline havia sido capturada.
Parecendo perplexa, Miriam virou-se para Salazar, que agora mudava de forma a um ritmo violento.
“Tudo bem, eu entendo isso, mas... Como chegou a essa situação?”
Kasim gargalhou e pôs o chapéu na cabeça.
“Bem, é aquilo. Ange está danificando tudo, querendo ou não, rompendo todas as engenhocas da prisão que a prendem. Hehehe... Ela é sem dúvida incrível.”
“A magia espacial de Salazar é única e está constantemente conectado ao espaço materializado a partir de sua própria mana e o mantém de forma contínua. Por esse motivo o espaço fica muito estável, entretanto quando você quebra, o usuário fica muito instável.”
“Entendo... Você descobriu muita coisa nesse curto espaço de tempo.”
“Não é nada para Maitreya, a Tapeçaria Negra. Poderia me elogiar mais.”
“Ok, acho que entendi, mas o que fazemos agora? Vendo que Salazar está nesse estado...” Marguerite se perguntou.
Naquele exato momento, Salazar surgiu com um grito estranho. No atual momento estava em sua forma jovem. Balançando de um lado para o outro, soltou uma risada grandiosa.
Ajustando o chapéu, Kasim disse.
“Levantou na hora certa. Hey, Olhos de Serpente, controle-se.”
“Bwaha! Hahahaha! Incrível! Que maravilha, Destruidor de Éter! O fluxo de eventos está se unindo enquanto falamos!”
“Cale a boca. Estou enjoado e cansado de suas bobagens. Já nos arrastou tempo demais em círculos.”
“Kasim — se Salazar criou esse espaço alternativo, podemos entrar nele a partir daqui?”
“Que bom que entendeu rápido, Bell. Bom, não, para ser honesto. Esse cara mantém o espaço, porém parece não pode interferir nele. Schwartz e Benjamin são os que têm direito a isso.”
“Então o que vamos fazer?” Marguerite perguntou com raiva.
“É aí que entra esta aqui. Certo, Maitreya?”
Maitreya estremeceu em resposta.
Anessa inclinou a cabeça sem entender.
“O que aquela garota pode...? Ah, certo, havia algo sobre magia de teletransporte...”
“Exato! Já ouvi falar da incrível habilidade da Tapeçaria Negra!”
A expressão de Maitreya suavizou-se com as palavras de Miriam, contudo de repente se recuperou e balançou a cabeça.
“No entanto não deveríamos, sério... Schwartz pode nos notar, sabe...”
“É um pouco tarde para pensar nessa possibilidade. Neste ponto, não fará diferença se nos notará ou não.”
“Hmmm...” Maitreya murmurou, mordendo o lábio, taciturna. A espada nas costas de Belgrieve soltou um rugido enfurecido. Maitreya gritou e se abaixou atrás de Kasim. “E-Eu não vou ceder às suas ameaças.”
“Por que está se fazendo de durona na frente de uma espada...?” Kasim resmungou. “Vamos, vamos, estou contando com sua ajuda aqui. Você com certeza tem uma vantagem contra mim quando se trata dessa magia.”
“Urgh...” Maitreya soltou um suspiro resignado e se virou para Belgrieve.
“Vai... Me proteger, não vai?”
“Sim, prometo... Por favor, Maitreya.” Belgrieve disse, inclinando a cabeça para ela.
Maitreya franziu os lábios e puxou a manga de Kasim.
“Primeiro, precisaremos identificar as coordenadas. Me ajude.”
“Pode deixar. Merry, venha dar uma mão também. E agora, Olhos de Serpente... Hmm?”
Até um momento atrás, Salazar estava rindo muito, mas de repente ficou quieto. Ele era agora um homem velho, olhando para Belgrieve por trás do monóculo.
“Isso é... Hmmm... Entendo. Então é você.”
“O que? Há algo de errado com Bell?”
Salazar, agora transformado na forma de uma jovem, coçou o queixo.
“Esse fluxo... Não terminará aqui. Um ponto de viragem. Entendo, sim, entendo.”
“Hey, vamos definir as coordenadas.”
“Muito bom, muito bom. Hoje é de fato um belo dia.”
Salazar cooperou com muita facilidade. Foi uma completa surpresa para Kasim, pois esperava outra troca problemática. Os magos se reuniram, cada um reunindo sua mana para construir seus feitiços. Vários círculos mágicos semitransparentes se materializariam no ar apenas para desaparecer. Não havia vento, porém Belgrieve sentiu os pelos da barba e a bainha das roupas farfalhando.
Marguerite estava ao lado de Belgrieve.
“Hey — digamos que chegamos lá, o que fazemos então? Vamos apenas salvar Ange?” sussurrou em seu ouvido.
“Não podemos ter certeza ainda. Contudo tenho a sensação de que não será o fim. No mínimo, eles vão tomar algum tipo de ação, da sua parte.”
O fluxo dos acontecimentos... Como não mago, Belgrieve não entendia tudo o que isso significava, no entanto sentia como se estivesse sendo arrastado por alguma força poderosa. Ele seguia não sabendo o que o esperava em qualquer ponto terminal para onde o fluxo o estava levando. Todavia, por alguma razão, uma coisa de que tinha certeza era que estava se aproximando do ponto final desta jornada.
Ele se perguntou se esta era sua melhor opção. Novamente, um mistério — se houvesse maneiras melhores de fazer isso, só poderia amaldiçoar sua própria incompetência por não pensar nelas.
A espada soltou um grunhido curto.
Vamos colidir com outros que estão no mesmo fluxo. Essa premonição estava ficando cada vez mais certa em seu peito.
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