Capítulo 122: O rugido da espada
O rugido da espada reverberou através do punho da lâmina, em sua mão e, finalmente, por todo o seu corpo. Ao passar por seu núcleo, ele sentiu uma estranha calma se espalhar.
Antes desse momento, era como se apenas conseguisse captar vagas memórias através de um véu espesso, mas agora essas imagens haviam se tornado nítidas, vívidas e brilhantes.
Como elfa, Satie não mudou nada desde aquela época. Seu cabelo ainda era sedoso, prateado e lindo, e embora tivesse um rosto de aparência gentil, tinha uma expressão feroz nos olhos sob as sobrancelhas espessas. Embora suas feições permanecessem inalteradas, havia algo mais maduro na maneira como se comportava.
Ele queria continuar olhando para ela, porém agora não era o momento para isso. Belgrieve teve que se concentrar nos inimigos que estavam diante deles.
“Bell, não mate esses corvos.” alertou Satie.
Belgrieve deu uma rápida olhada nos dois pássaros empoleirados nos enormes galhos de salsa, olhando para eles. Sua expressão suavizou-se.
“Entendi.”
“Eu realmente sinto muito. Gostaria que tivéssemos tempo para conversar.” disse Satie com um sorriso triste.
Belgrieve devolveu o sorriso.
“Vamos ter uma longa conversa quando tudo acabar.”
“Ahaha! Há muitas coisas que quero ouvir. E coisas que quero dizer também.”
Belgrieve estreitou os olhos enquanto dava uma olhada abrangente no campo de batalha. Ali, viu os mesmos Templários que conhecera momentos antes, e o homem por trás de François devia ser aquele notório príncipe herdeiro.
O homem que enfrentava Kasim parecia ser um mestre em seu ofício, e mesmo considerando que lutar de perto colocava Anessa e Miriam em desvantagem, a empregada que poderia enfrentar as duas ao mesmo tempo também não era desleixada.
O homem com aparência de príncipe herdeiro riu baixinho, contudo seus olhos não eram nem um pouco joviais.
“Ele é um pouco rústico demais para ser seu Príncipe Encantado, não acha? Que incômodo, de verdade.” disse o príncipe antes de perceber a pequena figura escondida sem sucesso atrás de Belgrieve. “Maitreya. O que está fazendo aí?” perguntou, franzindo a testa.
Maitreya soltou um fraco “Eep”, no entanto depois de reunir um pouco de coragem, ela mal colocou a cabeça para fora da sombra de Belgrieve e mostrou a língua.
“Só apostei no cavalo vencedor. Que ruim pra você.”
“Quem é você?” Angeline perguntou, olhando para a diabrete com curiosidade.
“Eu sou Maitreya, a Tapeçaria Negra, a grande e poderosa...”
Suas palavras foram interrompidas por um estrondo ensurdecedor, resultado do confronto entre a magia de Kasim e Schwartz.
Benjamin balançou a cabeça.
“Estou decepcionado com você. Mas muito bem, vou acabar com todos de uma vez.”
Benjamin fechou os olhos e começou a entoar algo baixinho. Enquanto isso, Donovan estava na sua frente de forma protetora, preparando sua espada com uma carranca.
“Minha nossa, saiba que me surpreendeu...” Donovan disse. “Porém estou feliz por poder enfrentá-lo aqui.”
“Não tenho nenhuma disputa com você, Sir Donovan.”
“Hmph, que considerado, vindo de vocês, traidores do império. Sua filha chamou Sua Alteza de fraude e atentou contra sua vida. E se não bastasse, teve a ousadia de reivindicar aquele vagabundo como o verdadeiro príncipe. É suficiente para julgar, certo?”
Os olhos de Belgrieve se arregalaram quando olhou para trás. Ao lado de Angeline e Satie, um homem vestido em trapos esfarrapados estava agachado e encolhido. Quando Belgrieve olhou para Angeline, sua filha assentiu.
“É o verdadeiro. Ele foi preso aqui.”
“Entendo...” foi exatamente como Belgrieve suspeitava. O impostor não conseguiu matar o verdadeiro Príncipe Benjamim. Embora Belgrieve quisesse persuadir Donovan, se possível, a situação não parecia permitir tal opção. Lutar era a única saída.
Donovan parecia bastante habilidoso e, em vez de atacar às cegas, observou Belgrieve de perto enquanto media cautelosamente a distância entre os dois. Talvez estivesse tentando descobrir o alcance dos reforços que chegaram repentinamente do nada. Donovan notou que Belgrieve, que o observava com atenção, fazia movimentos muito pequenos em resposta a cada pequena ação que ele realizava.
De repente, Angeline deixou escapar.
“Pai! Vou sair por um segundo!”
Angeline se afastou e chutou a empregada que estava prestes a enfiar uma faca em Miriam.
“Obrigada, Ange... Pensei que estava morta.” disse Miriam, pálida e trêmula.
“Eu vou cuidar dela. Vocês duas apoiam o pai.”
“Entendi. Sim, nós, lutadores da retaguarda, não deveríamos enfrentar uma linha de frente.” disse Anessa com um sorriso irônico, devolvendo a adaga à bainha em seu quadril enquanto recuava com Miriam.
Belgrieve ficou de prontidão mais uma vez.
“Adoraria resolver essa situação com palavras, contudo não parece que isso vai acontecer.”
“Hmm... Aquele homem com o porte leonino não está aqui? Sua espada é esplêndida, no entanto não vou cair nas mãos de alguém do seu nível miserável... Falka!”
Falka, atendendo ao chamado, voltou de sua furiosa luta com Marguerite. O sangramento já havia parado devido ao ferimento que Angeline infligiu em seu flanco.
“Esta é a nossa chance. Mate-o e destrua sua espada. Cuidarei da elfa no seu lugar.”
E assim, Donovan interceptou Marguerite, que estava logo atrás de Falka.
Ao olhar para Belgrieve, o rosto de Falka pareceu se iluminar. O garoto com orelhas de coelho preparou sua lâmina — no instante seguinte, estava voando direto em sua direção com um golpe para baixo de uma posição elevada. Belgrieve interceptou o ataque com a grande espada e deixou sua mana colidir com a mana da lâmina de Falka. Fragmentos de energia mágica se espalharam como faíscas enquanto a espada larga rugia com força.
“Satie!” Belgrieve gritou. “Consegue correr?”
“Hã? Sim, consigo!”
“Este é um lugar perigoso para o príncipe! Tire Sua Majestade desta floresta! Merry, Anne, estou contando com vocês! Maitreya, siga-as!”
Com essas ordens, Belgrieve deu um golpe horizontal com sua grande espada, forçando Falka a fugir saltando para trás. Entretanto a lâmina atravessou sem dificuldade um grande tronco de salsa que estava bem ao lado. A árvore caiu com um som semelhante ao de um trovão, bloqueando Falka antes que pudesse atacar outra vez.
“Corram!”
Ele podia ouvir asas batendo no alto — os corvos perseguiam Satie. Independentemente disso, Belgrieve concentrou seus sentidos para ter certeza de que Satie e as outras haviam recuado com segurança antes de pegar uma bomba de luz de sua bolsa de ferramentas e jogá-la em Falka, que acabara de conseguir cortar a folhagem em seu caminho.
Falka foi retido quando a bomba explodiu bem na sua frente. Era noite e o súbito clarão de luz ofuscante desorientou o garoto, fazendo-o cambalear.
Sem deixar passar tal oportunidade, Belgrieve correu e cravou a parte plana de sua espada no braço de Falka. Falka soltou um suspiro irregular ao cair de joelhos. Deveria ter sido um impacto considerável, mas seu orgulho como espadachim parecia manter a lâmina em suas mãos.
“Desculpe, porém não pretendo trocar golpes com essa sua espada. Vou te colocar para tirar uma soneca.” Belgrieve se ajoelhou e mergulhou a palma da mão no plexo solar de Falka. O ar foi expulso dos pulmões do homem besta. Os olhos de Falka reviraram-se nas órbitas e depois seu corpo caiu no chão.
Ao mesmo tempo, grandes construções mágicas colidiram mais uma vez à distância, o enorme impacto sacudindo toda a floresta de talos verdes. Os vestígios de feitiços fracassados se espalharam pelos ares como trilhas de luz, cintilando e se contorcendo como se tivessem sido abençoados com vida própria antes de se dissiparem no nada.
À medida que as folhas eram sacudidas pelo choque de energias mágicas, o aroma revigorante de salsa enchia o ar. Foi tão incompatível com a cena tensa que Kasim apenas teve que sorrir enquanto pressionava o chapéu para evitar que voasse de sua cabeça.
“Hehehe... Isso está me deixando com fome, muito obrigado.”
Schwartz ficou contra ele com uma careta, mantendo distância enquanto olhava de volta. Então, Kasim girou os dedos. Os restos de mana explodidos giraram e se reuniram de volta para ele, e logo estava pronto para atirar uma vez mais.
“Que homem problemático.”
“Você tirou as palavras da minha boca.” disse Kasim, apontando o dedo. A mana reunida assumiu a forma de muitas lanças. “Realmente preferiria conversar com minha amiga em vez de ter de lidar com você.”
“Entendo.”
“Então, qual é o objetivo final que vocês estão planejando? Vão conquistar o mundo ou algo assim?”
Um sorriso frio cruzou o rosto de Schwartz.
“Acha que este mundo vale o suficiente para ser conquistado?”
“Eu não sabia, até pouco tempo. Mas nesses últimos tempos, comecei a amar todo tipo de coisa. Se pretende estragar tudo, então estou disposto a colocar minha vida em risco para impedi-lo.”
Os dedos de Kasim moveram-se aos poucos e várias lanças afiadas de mana voaram em direção a Schwartz. Mesmo assim, Schwartz conseguiu manifestar um hemisfério de mana ao seu redor para interceptá-las. Dessa forma, sua parede translúcida continuou a se expandir na tentativa de engolir Kasim.
Pulando para trás, Kasim ergueu os braços e depois os abaixou. Uma massa de mana que acumulou acima desabou como um martelo, colidindo com a parede de seu inimigo. Schwartz, que havia sido pego no meio disso, teve que franzir a testa diante das vibrações intensas.
“O que há de errado? Vai continuar defendendo?” Kasim provocou enquanto colocava as mãos no chão. A mana que circulava por seu corpo passou por suas mãos, fluiu para o solo abaixo e disparou em direção aos pés de Schwartz com tremenda velocidade.
No momento em que percebeu o ataque, Schwartz estremeceu e percorreu dez passos em um salto. O espaço que ele ocupava momentos antes havia sido empalado por muitas daquelas construções de mana semelhantes a lanças.
“Não vai facilitar, não é?” Kasim perguntou, sorrindo.
Schwartz não se dignou a responder, exceto movendo silenciosamente os dedos. Então, o espaço à frente e atrás de Kasim pareceu ganhar massa para esmagá-lo.
Kasim se animou, saltando para o lado para evitá-lo. Houve apenas uma ligeira distorção quando os dois espaços se chocaram, e então foi como se nada tivesse acontecido. Porém Kasim não teve tempo de recuperar o fôlego — em seguida, o chão pulsou e se esticou para agarrar sua perna. Ele sentiu algo ameaçador pairando logo acima dele.
“Não é bom...” acumulando com grande velocidade a mana na ponta dos dedos e recitando um encantamento rápido, Kasim passou a mão na terra que emaranhava seus pés.
“Desmorone!”
De repente, a terra se desfez como cerâmica quebrada e o libertou. Kasim saltou para trás, fora do caminho, no momento em que uma força invisível abriu uma cratera no chão onde acabara de estar.
O rosto de Kasim se contorceu em descontentamento. Agora que teve tempo livre, adotou uma postura de combate, contudo Schwartz apenas ficou ali, sem levantar um dedo.
Kasim estalou a língua.
“Não consigo me livrar dessa sensação doentia de que está apenas brincando comigo. Olha, não vou dizer para vir com tudo, no entanto se não vai levar isso a sério, poderia só sumir daqui? Sou um homem ocupado.”
“Portanto, mesmo o menor obstáculo pode acelerar o fluxo...”
“Hã?”
“Muito bem.”
Sem aviso, o braço esquerdo de Schwartz acendeu em chamas azuis claras. As faíscas de seu braço se transformaram em esferas flutuantes de fogo que giravam graciosamente enquanto queimavam com uma intensidade assustadora.
“Entendo.” murmurou Kasim, ajustando o chapéu. “Essa deve ser a Chama Azul da Calamidade da qual todos falam...”
As chamas levitantes se organizaram em algo como uma corrente serpentina antes de deslizarem alto no ar e dispararem contra Kasim. Quaisquer folhas de salsa que tocassem pegaram fogo, iluminando tudo com chamas azuis claras.
“Hey, está tentando começar um incêndio florestal?” Kasim se esquivou enquanto concentrava sua mana. “Perfure a terra, o ar, a alma.” ele entoou em um curto instante antes de liberar sua grande magia e produzir presas de mana, que começaram a consumir a serpente ardente.
Contudo, o inferno se espalhou e cresceu até engolir as presas por completo. Kasim tentou investir mais mana para manter a construção, todavia o fogo era muito forte e o suor começava a escorrer de sua testa. Era óbvio que o feitiço que deu a Schwartz seu título não era apenas para exibição.
“Hehehe... Você é bastante impressionante, me encurralando com uma magia como essa...”
Seus feitiços se travaram, empurrando um contra o outro, enquanto Kasim preparava uma lança com a mão livre. No momento em que percebeu a serpente flamejante crescendo em intensidade, ele a soltou. A lança fina e forte de mana foi lançada através de uma pequena abertura nas chamas e perfurou o ombro de Schwartz.
“Hã?” Schwartz fez uma careta e vacilou por um momento, e as chamas perderam um pouco da intensidade.
Kasim, buscando aproveitar essa abertura, despejou sua força em suas presas de mana até que a boca de uma fera poderosa se manifestou ao redor deles para morder a cobra.
“Isso não é tudo!” ao mesmo tempo manifestou projéteis mágicos no ar. Esses não eram os projéteis esféricos normais, que lembravam projéteis de canhão, usados pela maioria dos magos. As dele eram flechas afiadas em espiral — não tão fortes ou tão longas quanto às lanças, mas quase não levavam tempo para serem produzidas. Na verdade, num piscar de olhos, dezenas de flechas foram disparadas contra Schwartz de uma só vez, e as chamas enfraquecidas não foram suficientes para detê-las todas.
Schwartz estalou a língua e apagou as chamas serpentinas. A perda repentina de qualquer força de resistência fez com que Kasim perdesse o equilíbrio e tropeçasse para frente antes de conseguir se recuperar.
No lugar da serpente, as chamas no braço esquerdo de Schwartz aumentaram de intensidade. O fogo azul envolveu o homem como uma capa e, com um aceno da vestimenta de fogo, conseguiu interceptar todas as flechas mágicas que voavam em sua direção. Assim que as flechas tocaram as chamas azuis, voltaram a ser mana pura e se dissiparam no ar.
“Trabalho esplêndido, Destruidor de Éter...” Schwartz, com seu corpo escondido sob a camada de chamas, estendeu ainda mais seu manto infernal. O fogo foi transferido para os enormes talos de salsa que se aglomeravam ao seu redor e se espalhou de galho em galho, logo incendiando todo o campo de batalha. Com a conflagração ofuscantemente brilhante que os cercava, a luta logo se tornaria a menor das suas preocupações.
“Você o deixou muito entusiasmado, Kasim...” Angeline reclamou, franzindo a testa, enquanto serpenteava por entre as árvores que se transformaram em pilares de fogo. Embora o calor fosse imenso, a luz que essas chamas emitiam permanecia fria e azul clara, proporcionando uma visão bastante estranha.
De repente, sentindo um arrepio na espinha, Angeline preparou sua espada e golpeou uma faca de lâmina pequena. Ela olhou na direção de onde esta havia voado, entretanto a sombra se moveu pouco depois e se misturou ao fogo.
“Quer dar um descanso...”
Seguindo Anessa e Miriam, Angeline desafiou a empregada de olhos vazios, porém no momento em que se tornou sua inimiga, a empregada se absteve de tentar qualquer combate corpo-a-corpo. Ela manteve uma distância segura, movendo-se de forma furtiva para mirar nos pontos cegos de Angeline com suas armas escondidas com os movimentos esplêndidos de um assassino veterano. Mesmo que Angeline quisesse persegui-la, havia pouco que pudesse fazer quando seu inimigo poderia se tornar um com a escuridão da noite. Todas as árvores ao seu redor também deram vantagem ao inimigo. Para piorar a situação, as chamas agora dificultavam suas manobras.
“Eu absolutamente nunca perderia em uma luta honesta...” Angeline resmungou enquanto sua lâmina acertava outro projétil — desta vez uma agulha fina. De fato não queria correr o risco de ser atingida por nenhum desses ataques, contudo ficar na defensiva assim apenas a incomodava. Foi realmente difícil lidar com inimigos que se recusaram a iniciar um confronto direto.
As chamas ganharam cada vez mais força, espalhando-se pela interminável linha de árvores. No entanto esta também era sua chance — se conseguisse chegar a um espaço aberto, seu inimigo não teria onde se esconder. Um vasto campo de batalha sem obstáculos era justo o que Angeline precisava.
“Hey.” ela murmurou, evitando uma chuva de agulhas vinda de cima. Cinzas queimadas de folhas de salsa espalhadas sobre ela. “Então está lá agora.”
Angeline podia ver a empregada pulando de galho em galho com a destreza de um macaco. Posso ver praticamente tudo se você subir tão alto com uma saia, pensou Angeline, de forma um tanto inadequada. É verdade que, nessas circunstâncias, estava escuro demais para ver alguma coisa dentro das dobras da saia.
De qualquer forma, a empregada parecia ter se adiantado — e não planejava deixar Angeline sair da floresta.
Nesse caso... Angeline deu uma rápida olhada ao redor. Assim que avistou um talo que ainda não havia pegado fogo, colocou um pé sobre ele e pulou. Usando um galho baixo como apoio para os pés, alcançou a copa em pouco tempo, derrubando as facas e agulhas que vieram em sua direção na subida.
O calor crescente significava que estava mais quente lá em cima do que no chão, entretanto tinha uma linha de visão clara e podia ver claramente onde a empregada estava.
“Já chega de brincar de pega-pega!” Angeline saiu do galho mais próximo e se aproximou da empregada. Ela antecipou que seu inimigo fugiria mais uma vez, mas para sua surpresa, a empregada bloqueou sua espada com uma faca. Porém, seu inimigo ainda não tinha intenção de lutar de forma justa agora. No mesmo instante em que suas lâminas travaram, a empregada deu um chute forte no galho em que Angeline estava, fazendo-o balançar para os lados. Angeline perdeu o equilíbrio por um instante — tempo suficiente para a empregada apunhalá-la com uma adaga.
“Grah!” Angeline estendeu a mão para agarrar o pulso da empregada, evitando por pouco a ponta pontiaguda da faca. Podia ver seu próprio rosto refletido nos olhos sem vida da empregada. O local onde Falka a atingiu doeu e Angeline cerrou os dentes.
Aproveitando esse momento, a empregada se lançou a seus pés, contudo Angeline manteve um aperto firme em seu pulso, fazendo-as cair juntas das copas das árvores.
“Pegue isso!”
Angeline a arrastou, posicionando com força a empregada embaixo dela para servir de plataforma de pouso. A empregada bateu no chão primeiro, no entanto conseguiu mitigar um pouco a força com um giro, cambaleando e ficando de pé em seguida. Angeline também conseguiu amortecer a força do impacto e pousou com segurança. Sem hesitar, se aproximou com a espada desembainhada.
“Tenha misericórdia...”
“Hã?”
Lágrimas escorriam dos olhos da empregada, agora com uma expressão no rosto que teria provocado pena de qualquer um que a visse e, naquele momento, Angeline hesitou. Sem mudar sua expressão, a empregada atacou com sua adaga.
“Agh!” Angeline conseguiu sair do caminho, mas não sem sofrer uma fina linha vermelha cortada em sua coxa. Desta vez, a determinação de Angeline não vacilou — ajustou o controle da espada e golpeou sem piedade.
A cabeça da empregada voou pelo ar, deixando um rastro de sangue. Angeline confirmou que o corpo enrugado não se moveria mais antes de embainhar a espada.
“Que inimigo terrível...”
É provável que a empregada tivesse sido uma assassina de primeira linha. Aquelas lágrimas no final a enganaram completamente. Porém não havia tempo para ficar parada, então Angeline se virou e saiu correndo da floresta em chamas.
○
Além do inferno, os corvos circulavam no alto, descendo inúmeras vezes para capturar suas presas abaixo. Satie ficou diante de Benjamin protetoramente enquanto Anessa e Miriam fixavam seus olhares nos corvos com as armas em punho.
“Eles são rápidos...”
“O que nós fazemos? Magia de captura não é minha especialidade.”
“Sinto muito, vocês duas.” desculpou-se Satie. “Por pedir o impossível assim.”
“O que está dizendo? Também não queremos matar crianças manipuladas!”
“Certo, certo! Hey, pare de ser rebelde e volte já para casa! Whoa!”
Um dos corvos desceu como uma flecha, passando bem ao lado de Miriam. As duas meninas foram atingidas pelos bicos e garras dos corvos, com arranhões finos marcando suas roupas e pele.
“Hal! Mal!” Satie gritou. “Basta disso! Eu não criei vocês para serem crianças tão fracas a ponto de deixarem alguém mandar em vocês desse jeito!”
Voltando ao céu, os corvos grasnaram entre si.
Anessa resmungou.
“Se pudéssemos apenas... Atordoá-los por um segundo.”
“Você não trouxe nada da sua lima, Anne?”
“Bem, não estava esperando essa situação... Ah, que incômodo.”
Anessa geralmente carregava flechas mergulhadas em lima, contudo para viajar com leveza e agilidade, as deixou na pousada junto com muitos outros dispositivos que achava que não seriam necessários. A magia relâmpago de Miriam teria sido capaz de atingir os pássaros, com certeza, no entanto seria inútil se acabasse matando-os.
Anessa se virou.
“Maitreya, há algo que consiga fazer?”
Maitreya, escondida ao lado de Benjamin, semicerrou os olhos para o céu.
“Esses corvos são tão importantes?”
“Hey, agora não é hora de discutir sobre isso — wah!”
Um dos corvos arrancou com o bico o chapéu de Miriam da cabeça. Anessa disparou uma flecha para afastá-lo, todavia depois de evitá-lo, o corvo voltou sua atenção para ela — e Anessa ficou indefesa enquanto preparava sua próxima flecha.
“Oh droga!”
Entretanto antes que o bico pudesse perfurá-la, foi como se algo invisível o tivesse atingido. Ele grasnou lamentavelmente enquanto voava para longe. Anessa, chocada com o rumo dos acontecimentos, virou-se e viu que Satie havia estendido uma das mãos, fazendo algo com sua magia para bloquear o ataque.
Satie respirou fundo e deu um passo à frente.
“Sinto muito...” ela disse. “Mas está tudo bem. Vamos derrotá-los.” ela olhou para os corvos.
“Eles não são importantes para você...?” Maitreya perguntou a Satie.
“Elas são como filhas para mim. Porém não sei mais o que fazer.”
“Entendo.” Maitreya levantou-se e levantou levemente a mão. Sua mana girou, fazendo com que a bainha de seu manto tremulasse como faria com uma brisa suave. “Se puder aterrá-los, posso capturá-los. Cobrarei o favor mais tarde.”
“Podia ter dito isso antes! Merry! Pode fazê-lo, certo?”
“Deixe comigo!” Miriam balançou seu cajado e disparou vários projéteis mágicos de baixa potência, das quais os corvos escaparam. “Tudo bem!”
Enquanto isso, Anessa removeu a ponta da flecha de um de seus projéteis e enrolou um pano em volta da ponta. Sem perder tempo, acertou e atirou. A flecha voou para onde havia previsto que um dos corvos iria parar depois de escapar dos projéteis mágicos e atingiu com firmeza a base da asa do pássaro. Com um grito estridente, o corvo girou no ar antes de cair no chão, onde uma sombra se retorceu da terra para formar uma corrente que o prendia. O segundo corvo seguiu logo depois, ambos presos por suas próprias sombras.
Satie piscou, surpresa.
“Haha... Eu não deveria ter esperado nada menos dos membros do grupo de Ange... Obrigado!”
“É uma honra ouvi-lo de você, Sra. Satie.”
“Hehe, estou muito feliz que um dos antigos camaradas do Sr. Bell esteja me elogiando. Estão está resolvido?” Miriam perguntou, avaliando o ambiente enquanto colocava o chapéu de volta na cabeça. A área foi iluminada pelas chamas azuis que se espalhavam pela floresta.
○
Perto da borda da floresta, soaram sons de lâminas se chocando. Um florete fino atacava com grande velocidade a larga lâmina de um cavaleiro em um ataque unilateral.
Enquanto Donovan foi forçado a ficar na defensiva, Marguerite sorriu serena.
“Vamos, vamos, o que há de errado? Suas costas estão cedendo, velho?”
“Grr, sua pequena...” Donovan empurrou com força o florete para o lado para um contra-ataque, porém Marguerite se esquivou sem se importar e o chutou no estômago. Donovan recuou alguns passos, segurando a barriga e cerrando os dentes.
“Tedioso como o inferno. O coelho era muito mais forte.”
“Que língua grosseira... Os elfos não deveriam ser uma raça nobre?” Donovan perguntou, franzindo a testa.
A personalidade de Marguerite era o oposto dos elegantes elfos dos quais ele tinha ouvido falar nos contos de fadas, embora suas feições, iluminadas pelo ardente fogo azul ao redor, fossem sem dúvida tão dignas e belas quanto essas lendas contavam. Contudo o mais importante é que ela era forte demais. Donovan tinha muitos anos de experiência como Templário e com certeza não era fraco, no entanto não podia fazer nada para colocá-la na defensiva.
Marguerite saltou de um lado para outro, balançando levemente seu florete. Ela olhou em volta para as chamas que se espalhavam rapidamente com uma carranca.
“Devíamos acabar com essa luta já. Seria estúpido morrer queimado aqui.”
“Não... Me subestime!”
De repente, naquele momento, uma presença assustadora se manifestou atrás de Donovan. Os dois olharam para aquilo em estado de choque. Era uma figura estranha vestida com um manto preto. Embora tivesse forma humana, não revelava nenhum sinal de vida. O monstro de preto encarou Marguerite com dois olhos vermelhos onde deveria estar um rosto, ignorando Donovan.
“Um a-amaldiçoado...? Não, isto é...”
“Haha! Os Templários são daquela igreja de Viena, certo? Isso é uma coisa muito sinistra que você tem aí.”
“Se... Esta entidade decidiu ser minha aliada, então é sem dúvida a vontade da Todo-Poderosa Viena!”
“Que deusa conveniente tem aí. Espere, deixe-me adivinhar — você não é tão piedoso assim.” Marguerite preparou sua espada mais uma vez.
A figura de preto gemeu como um estrondo das profundezas da terra enquanto se lançava sobre Marguerite. Seus braços longos e enrugados emergiram de seu manto, e suas garras tortas arranharam sua espada.
“Está me assustando aqui!” Marguerite tentou se defender com força bruta, mas não conseguiu cortar sua mão. O monstro rastejou pelo chão, perseguindo-a enquanto ela recuava. Com uma torção vigorosa de todo o corpo, estocou o florete no ser. Porém não parecia que sua arma havia feito contato até que sentiu uma sensação terrível de algo disforme envolvendo sua lâmina, fazendo-a recuar com pressa.
“Droga, que irritante...”
Marguerite observou a criatura pela luz azul das chamas. Embora possuísse uma forma humanoide, não havia garantia de que compartilhasse todos os mesmos pontos vitais. Sendo franca, ela tinha a sensação de que esfaqueá-lo em qualquer lugar seria arriscado.
Marguerite já havia lutado até mesmo contra demônios antes, contudo essa coisa de preta era diferente — algo distorcido. Ela se sentiu hesitante em enfrentá-lo. De repente, ocorreu-lhe que não teria hesitado nem por um segundo em lutar contra essa coisa no passado. A ironia trouxe um sorriso aos seus lábios.
Donovan, aproximando-se da sombra do ser, atacou-a. Embora Marguerite tenha conseguido desviar seu ataque no último segundo, o monstro estava atacando-a um momento depois. Ele não carregava armas, contudo a ideia do que aconteceria se fosse tocada por suas mãos a fez ficar arrepiada. Marguerite se esquivou enquanto empurrava Donovan para trás, recuando para criar alguma distância entre eles enquanto recuperava o fôlego. Donovan estava pronto com um sorriso diabólico no rosto. Era como se a força desse ser curioso o tivesse possuído.
“Bem, estou feliz que vocês sejam melhores amigos agora. Que tal começar a se chamar de cavaleiro negro ou algo assim? Esqueça toda essa conversa de Viena; não é para você.”
“Vou calar essa sua boca irritante em breve!” mais uma vez, Donovan atacou junto com o monstro. Se houvesse dois dele, Marguerite ainda poderia ter se aguentado com bastante facilidade, no entanto esse ser sombrio era um problema. Com sua atenção comandada por isso, até mesmo a fraca esgrima de Donovan poderia ser uma ameaça. Além do mais, as chamas estavam ficando mais fortes. Se não conseguisse quebrar esse impasse, a imolação se tornaria o perigo real.
Marguerite hesitou por um momento antes de se virar e se afastar.
“Está fugindo?” Donovan rugiu para a elfa. “Sua covarde!”
“Hmph! Se eu teimosamente lutasse com você aqui, Bell e meu tio-avô ficariam bravos comigo!” ela mostrou a língua provocativamente antes de correr para a borda da floresta.
Ao passar pelos troncos de salsa crepitantes e ardentes, o cenário se abriu de repente. A luz da lua refletia no mar distante, sua superfície calma exalava um suave brilho branco. Seu olhar percorreu em volta, na esperança de se reunir com seus companheiros, entretanto foi Donovan quem saiu da floresta.
“Não vou deixá-la fugir!” e mantendo esse impulso para frente, ele investiu em sua direção. Marguerite bloqueou seu golpe enquanto se orientava rapidamente. Essa entidade não estava em lugar nenhum agora. Aproveitando a oportunidade partiu para o ataque, forçando Donovan a defender sua vida.
Depois de algumas trocas rápidas, suas espadas foram travadas uma contra a outra. Donovan, incapaz de se manter firme, logo foi dominado por Marguerite, apesar de seu físico mais delicado.
“Maldita seja...”
“Enquanto essa coisa não estiver por perto, não tenho medo de você. Vou acabar contigo enquanto posso!”
“Não brinque comigo, sua elfa vulgar!”
De repente, Marguerite ouviu Belgrieve gritar.
“Maggie! Desvie!” ela imediatamente saltou para longe.
Os olhos de Donovan se arregalaram. Ele olhou para baixo — a lâmina de uma espada brotou de seu estômago. Sua boca tremia e então cuspiu um bocado de sangue.
“Gah... O-O que...” Donovan caiu de joelhos, virando a cabeça e... Lá estava Falka, tão inexpressivo como sempre, sua espada esfaqueando Donovan. “Falka, você...”
Falka retirou a lâmina e chutou Donovan para o lado como se fosse um lixo, um obstáculo em seu caminho.
“V-Vocês se desentenderam...?” Marguerite ficou pasma, apenas para de repente sentir uma dor aguda na lateral do corpo. Em estado de choque, colocou a mão sobre o local e sentiu sangue escorrendo. Ao olhar para baixo viu que seu flanco havia sido cortado. Entendo. Falka não estava tentando matar Donovan. Ele tentou me pegar de surpresa — e usou Donovan para fazer isso. Mas embora a mente de Marguerite tivesse captado a situação, não conseguia sentir nenhuma força nas pernas e caiu de joelhos.
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