sexta-feira, 27 de junho de 2025

Slayers — Volume 09 — Capítulo 39

Capítulo 39: Um vislumbre de demônios em Bezeld

“Hum... Então está dizendo que há uma espada estranha em Bezeld?”

Gourry e eu tínhamos saído da cidade depois do almoço e estávamos a caminho da cidade em questão. Tinha terminado de lhe dar um resumo da situação e, depois de pensar bastante sobre o assunto, ele me deu uma bela resposta.

“Estou dizendo que pode haver. Mas também pode não haver.”

“Hã, o quê?”

“Há uma chance de que o pai de Sherra tenha encontrado oricalco em Bezeld. Um verdadeiro tesouro que... Na época, por algum motivo, não pôde levar consigo ou tirar da mina. Assim, ficou com medo de que alguém o roubasse, inventando uma história de advertência sobre uma espada estranha, que acabou chegando aos ouvidos do chefe na Vila das Espadas Falsas. Por sua vez, Sherra sabia a verdadeira localização do oricalco e, depois que seu pai morreu, conseguiu convertê-lo em algo para gastar. É assim que tem sobrevivido sem trabalhar.”

“Aha.”

“Agora, tudo isso levanta uma certa questão... Por que o velho Glen escolheu uma espada para sua história de mentirinha afastar os outros? Se quisesse manter as pessoas longe, seria de se esperar que tivesse optado por algo mais no estilo ‘fui atacado por um monstro assustador’. Acho que esse detalhe dá credibilidade à teoria de que realmente encontrou uma espada.”

“Hmm...”

“Mas se fosse uma espada e não oricalco, então preciso me perguntar de onde Sherra está tirando o dinheiro para sobreviver. Talvez esteja fazendo algum trabalho por baixo dos panos... Porém, considerando o jeito como o estalajadeiro falou dela, duvido.”

“‘Trabalho por baixo dos panos’?”

“Sim, não precisa quebrar a cabeça pensando nisso. Também existe a possibilidade de que, contrariando todas as expectativas, seu pai fosse um cara decente lá no fundo e tenha deixado algumas economias secretas para ela. Contudo essas são basicamente as nossas duas principais teorias. Entendeu?”

“Hmm...” Gourry olhou calado para o céu por um tempo e então disse. “Está um pouco além da minha compreensão, no entanto tudo vai se encaixar quando chegarmos a Bezeld, certo?”

“Bem, pode-se dizer que sim...”

Só que, se essa é a sua opinião, por que me dei ao trabalho de explicar alguma coisa para começo de conversa?

“Embora... Possamos chegar ao fundo das coisas antes disso.” continuou Gourry, parando pouco antes de a estrada passar por uma densa floresta.

Seu comportamento, somado à nossa localização, tornou fácil adivinhar do que se tratava. Tínhamos uma emboscada à nossa frente.

Ora, até onde sei, não havia lei alguma que obrigasse você a armar suas emboscadas perto de florestas antigas e solitárias no meio do nada, apesar de que admito que os dois são uma combinação perfeita. Um assassino camuflado é quase impossível de ser avistado escondido entre árvores escuras, o que significa que tudo o que precisa para se basear é a sua presença. E embora até eu pudesse detectar inimigos abertamente hostis (um bandido comum, por exemplo), não tenho um histórico favorável contra oponentes que mascaravam sua presença. Foi ótimo ter Gourry e seus instintos animais por perto quando encontrávamos um deles.

Sabe, tipo agora.

Não tínhamos muitas pistas sobre a identidade do nosso emboscador, entretanto me perguntei se poderia ser um dos homens de preto de antes.

“Acho que estou entendendo o que está dizendo... Está sugerindo que alguém no mato pode compartilhar alguma informação conosco.” respondi ao último comentário de Gourry, então parei no lugar e voltei meus olhos para a floresta.

“Fique longe da garota!” disse uma voz no vento, como se estivesse esperando minha deixa. Era desconhecida, masculina e abafada de uma forma que parecia até inapropriada em um dia tão claro e ensolarado.

A quem pertencia? À pessoa escondida na floresta, dã! Ele ainda estava se escondendo e disfarçando sua presença, o que significava que esperava para ver como reagiríamos. E por falar nisso... Bem, não tenho intenções de recuar!

“Que garota? A quem, exatamente, está se referindo?” perguntei, fingindo ignorância.

“Não se faça de boba comigo!” respondeu a voz baixa.

“Hmm... Parece que você tem um cérebro, ao contrário daquele Zain.”

“Só quero saber se você vai obedecer.”

Hmm... Esse cara aparentemente estava se mantendo firme, não se deixando levar pelo teatro ou sendo provocado. Ao contrário do Zain, este parecia entender um pouco de estratégia.

Então... Que tal isso?

“Seu mestre está tão obcecado assim pela espada?” tentei perguntar.

“Vai obedecer ou não?”

Hrm, um osso duro de roer. Nesse caso...

“Diga o que quiser, mas vocês nem sabem onde a Sherra está agora, sabem? Então, não importa o que tentem, tenho o conhecimento aqui... E a vantagem.”

Com essas palavras, a voz silenciou por um tempo. Aposto que sei o que vem a seguir!

Shwish! Sem aviso prévio, algo voou em nossa direção, vindo das árvores.

Acertei! Gourry e eu saltamos para trás e encontramos várias facas pequenas cravadas no chão aos nossos pés. Assim que as avistei, percebi que não conseguia me mover... Fui pega em uma Captura de Sombras!

Era um feitiço que prendia uma pessoa no plano astral, perfurando sua sombra com uma faca. Era um truque pequeno, na verdade, porém era preciso saber o que estava fazendo para funcionar. Também era impressionante que esse cara pudesse usá-lo em vários alvos ao mesmo tempo. O feitiço, todavia, tinha uma grande fraqueza!

“Bola de Fogo!” gritei, lançando um feitiço meu... Um que havia começado a entoar no segundo em que imaginei que isso aconteceria, mirando no chão aos nossos pés.

Fwoom! Minha Bola de Fogo explodiu em chamas ao contato, o que apagou por um momento nossas sombras. Sem elas, a amarração foi desfeita e pudemos nos mover novamente.

“O quê?” exclamou nosso atacante, chocado com a velocidade da minha reação.

“Aí está você!” declarou Gourry. Agora que estava livre, desembainhou a espada nas costas e avançou em direção à floresta de onde as facas tinham vindo. Mas antes que pudesse fazê-lo, outro brilho prateado voou do mato, direto em sua direção!

Shing! Gourry desviou a faca que se aproximava com sua espada enquanto uma figura escura saltava da vegetação para a luz do sol. Seu traje todo preto traiu instantaneamente sua identidade.

“Sabia! Você faz parte do esquadrão de capangas do Zain!” gritei.

O homem respondeu com silêncio... E um rápido avanço em minha direção!

“Não tão rápido!” Gourry se interpôs entre nós, porém quando o fez, o homem deu um passo para o lado e jogou uma faca em mim.

Fácil demais! Desviei com um leve giro.

“Hah!” Gourry brandiu sua espada enquanto o agressor tentava alinhar outro ataque. Contudo...

Shing! O cara defendeu o golpe de Gourry com uma espada curta que havia aparecido em sua mão esquerda. Ele não perdeu tempo e lançou a arma que tinha em sua mão esquerda, desta vez em Gourry, à queima-roupa! Foi bem na sua cara!

“O quê?” ele gritou, curvando-se para se esquivar do ataque iminente.

O homem de preto aproveitou a oportunidade para dar a volta e lançar mais uma faca em minha direção. Também desviei dessa com facilidade, no entanto algo me parecia estranho. Para um cara com a habilidade de bloquear um golpe de Gourry, os seus padrões de ataque eram simplistas demais. Não me diga...

Uma rápida olhada ao redor confirmou minhas suspeitas, então comecei a entoar um feitiço. O homem de preto continuou atirando facas, e Gourry e eu continuamos nos esquivando delas. O ciclo se repetiu várias vezes até que...

Por fim, o homem saltou abruptamente para longe de nós, formando um símbolo com os dedos na frente do peito. Aqui vamos nós!

“Gaiag, levante-se!” respondendo às suas palavras de poder, as facas que havia atirado começaram a emitir uma luz roxa escura.

É. O cara não estava tentando me atingir ou a Gourry, só estava fingindo que sim para poder formar um círculo mágico no chão. E em pouco tempo, como se borbulhasse da própria terra, um enorme demônio de bronze começou a se erguer no centro do círculo.

O Sr. Todo de Preto mal sabia que eu também já tinha previsto esse movimento. Ainda não havia percebido, todavia me posicionei do outro lado do círculo mágico, e tinha meu feitiço pronto para ser lançado! Assim que o corpo enorme do demônio se ergueu para bloquear o homem de preto da minha vista...

“Sinalizador Gaav!” o rastro de fogo que conjurei atravessou o demônio, reduzindo-o a cinzas enquanto avançava para incinerar o homem de preto! Pelo menos, esse era o plano. Na prática...

“Hã?”

Minha mão estendida estava completamente sem chamas. Nenhuma faísca à vista.

Espere um minuto...

Ahhhh! Claro! Esqueci completamente! A compreensão me atingiu como uma tonelada de tijolos. O feitiço que acabei de tentar lançar invocava o poder do Dragão do Caos Gaav, servo do Lorde das Trevas do nosso mundo... Que tinha sido Aniquilado há pouco tempo.

Esse simples detalhe me escapou enquanto entoava o feitiço como se tudo estivesse normal. Quero dizer, é óbvio que não se pode invocar o poder do Dragão do Caos quando não há mais Dragão do Caos, certo? Droga! O que há de errado comigo? Enquanto brigava comigo mesma, pensando no que fazer a seguir...

“Hrahhh!” o demônio de bronze terminou de se materializar com um uivo.

Bem, que assim seja! Não há tempo para me afundar nos pequenos erros da Lina do Passado! Voltei a me concentrar no jogo e comecei a entoar meu próximo feitiço.

“Destrua-os!” gritou o homem de preto, apontando para Gourry.

O demônio rugiu em resposta, invocando cinco ou seis orbes flamejantes que voaram em direção ao meu companheiro loiro. Ele fez seu movimento no mesmo instante, entretanto em vez de se esquivar, investiu direto contra o demônio!

Cara, espera!

Por mais preocupada que estivesse, foi em vão... Gourry se esquivou sem problema das chamas que se aproximavam. Mas o homem de preto, talvez tendo previsto essa reviravolta, jogou uma faca direto na trajetória de Gourry. Se parasse para desviar, ficaria vulnerável diante do demônio!

Parecia que nosso emboscador de repente estava considerando seriamente em nos matar! Pena que não tenho a intenção de facilitar seu trabalho!

“Sopro da Dinastia!”

Krikshhh! O feitiço que lancei congelou no ato, pulverizou e sublimou o demônio em uma névoa fina.

Clink! Ao mesmo tempo, Gourry usou sua espada para derrubar a faca no ar.

“O quê?” o homem de preto provavelmente não esperava que o demônio pelo qual tanto se esforçou para invocar fosse derrotado tão rápido, pois a visão o fez parar por um instante.

E o que você faz quando seu inimigo está distraído? Bem, Gourry decidiu rolar, pegar uma das facas que havia desviado e jogá-la de volta em nosso agressor. O sujeito não recobrou os sentidos a tempo e, em seguida, caiu de joelhos quando a pequena lâmina se enterrou fundo na sua coxa direita.

“Guh!”

Com a espada ainda em punho, Gourry se aproximou devagar do assassino comprometido.

“Acabou agora. Não poderá lutar com a perna neste estado.” disse ele, mantendo a guarda alta o tempo todo.

“Tch... Acabou, não é?” sussurrou o homem de preto, rangendo os dentes. Se Gourry tivesse sido menos do que completamente cauteloso em sua abordagem, o aspirante a assassino poderia ter tido opções... Porém, dada a cautela de Gourry e a perna ferida do pobre sujeito, era o seu fim.

“Desembucha logo. Me diga o que vocês estão...”

Antes que eu pudesse terminar de perguntar... Fwoom! O corpo do homem de preto explodiu!

“O quê?” Gourry gritou, incrédulo.

Não houve nenhum ataque externo, o que significava...

“Ele se explodiu... Para proteger seu segredo. Droga... Que coisa estúpida de se fazer!” sussurrei, com um gosto amargo na boca.

“E nos impediu de descobrir qualquer coisa.”

“Não seja bobo. Só porque não nos contou nada, não significa que não descobrimos nada.”

“Hã? Mas que...”

Uma expressão de espanto cruzou o rosto de Gourry. Cara, que caso perdido.

“Escute, Gourry, o fato de esse cara estar esperando aqui para nos atacar significa que de fato deve haver algo em Bezeld.”

“Como sabe?”

“Os homens de capa preta estão atrás de algo que Sherra sabe, então não é de se admirar que estejam tentando impedir qualquer competição. Agora, por essa lógica, acha mesmo que eles se importariam conosco se estivéssemos indo na direção errada?”

“Ah, entendi.” Gourry fez um aceno com a cabeça. “No entanto, espere um minuto... Se havia um assassino aqui, significa que já matou aqueles dois que partiram antes de nós?”

“Talvez. Ou talvez tenham ido em uma direção diferente, ou talvez estejam evitando as estradas principais. Enfim, a outra coisa que descobrimos aqui é que os homens de preto ainda não capturaram Sherra. Esse cara não mordeu a minha isca até eu dizer que sabia o seu paradeiro, foi então que nos atacou. Eles não sabem onde ela está, então quando falei que sabia, se sentiu compelido a tentar me prender e testar a veracidade da minha alegação. É também por essa razão que manteve as coisas não letais no início.”

“Ah, sim. É verdade.”

Embora, quanto mais penso, menos sentido tudo faz. Os homens de preto da brigada deviam saber, quando explodiram a casa de Sherra, que ela iria atrás de Bezeld. Era seguro presumir, então, que nosso amigo assassino e vigia estava estacionado ali desde ontem.

Sendo assim, como Sherra conseguiu passar despercebida? Seria possível que estivesse indo para outro lugar além de Bezeld? De qualquer forma, ir para lá nós mesmos segue sendo nossa melhor e única aposta por enquanto.

“Tudo bem, é melhor irmos logo. Para Bezeld!”

E assim Gourry e eu retomamos nossa jornada.

———

“Mas Lina, aqueles caras de preto e aqueles outros dois...”

“Luke e Mileena.”

“É, esses dois. Quem você acha que são eles?” perguntou Gourry perto do pôr do sol, enquanto descíamos uma estrada florestal bem monótona.

“Quem são? Qual é, cara... Os primeiros são operações especiais de algum lorde real ou local, ou sei lá o quê. Comentei antes quando estávamos os enfrentando ontem.”

“Sério?”

“Você não ouviu uma palavra do que falei para aquele Zain?”

“Bem, como não estava falando comigo, por que prestaria atenção?”

Por que você...? Está falando sério? Não me teste, cara...

“Tanto faz... Enfim, é o que penso sobre os de capa preta. Quanto ao Luke e a Mileena, talvez sejam como nós. Mercenários ou algo do tipo que estão de olho no tesouro da Sherra.”

“Hmm... O que significa que pode não ser uma espada, afinal.”

“O que te faz dizer isso?” franzi o cenho, pensativa, com as palavras de Gourry.

“Bem, quero dizer... Você disse que os caras de preto trabalham para um rei ou algo assim, certo? Se for o caso, por que se dar a todo esse trabalho por uma espada?”

“Hahh...” soltei um suspiro e assenti resolutamente. “Sabe de uma coisa? Que bom. Até que foi um esforço impressionante para o velho Gourry.”

“O velho Gourry?”

“Porém falando sério, cara... Está subestimando o quão incríveis são as armas lendárias, sabe?”

“Hã? Quer dizer, se for para a guerra, mesmo que tenha uma arma lendária, um único feitiço de ataque chamativo ainda pode te derrotar, bem... Num piscar de olhos, sabia?”

“Claro. Contudo está presumindo que o verdadeiro valor de uma arma lendária reside no campo de batalha. O que não é o caso, entendeu? O verdadeiro valor delas está nas técnicas usadas para criá-las.”

“O quê?”

“Armas lendárias têm propriedades que não podem ser reproduzidas por métodos mágicos modernos. Há um mérito incrível em estudar do que elas são capazes e como foram criadas, porque assim poderá encontrar maneiras de aplicar esses princípios a outras coisas. Isso vale muito mais do que um tesourozinho miserável. Lembra como Amelia e Zelgadis usavam o feitiço Videira Astral para imbuir por algum tempo suas espadas com magia?”

“Quem?”


Splat! Essa frase em particular foi tão inacreditável que literalmente me derrubou.

“Vo... Você! Gourry!” uma veia latejou na minha têmpora enquanto eu me levantava.

Gourry respondeu com um sorriso forçado.

“Brincadeira, brincadeira! Nem eu me esqueceria dos nossos velhos companheiros.”

“É melhor tomar cuidado com as piadas! Algumas coisas são convincentes demais saindo da sua boca...”

“E-Enfim... Um feiticeiro inventou esse feitiço há muito tempo, aplicando técnicas que aprendeu estudando uma espada mágica.”

“Tá...”

“Claro, existem armas lendárias que podem não render muitos recursos em termos de conhecimento útil. É meio que uma aposta, para sermos honestos. No entanto isso não significa que não deva tentar encontrá-las quando puder. Mesmo que não aprenda nada de valor com elas ou as use muito, ainda ganha uma espada bacana e todo o direito de se gabar... Não é pouca coisa.”

“Mas matar pessoas por isso...”

“Estou vendo que ainda não entendeu, Gourry. Uma arma lendária pode render dinheiro suficiente para colocar uma família em uma situação fácil para o resto da vida. É mais do que suficiente para matar por ela.”

“Uma situação fácil para o resto da vida? Elas valem tanto assim?”

“Pode apostar que sim! Acha mesmo que as pessoas estão comprando armas lendárias por dinheiro de galinha?” perguntei com um olhar furioso.

Gourry apenas respondeu calmamente.

“Bem, eu me lembro de uma certa pessoa se oferecendo para comprar minha Espada da Luz por quinhentas moedas e uns trocados...”

Krrrk... Tch. Por que tinha que se lembrar disso?

“D-De qualquer forma, meu ponto permanece. Mesmo que seja ‘apenas’ uma espada lendária, não estou nem um pouco surpresa que capangas da realeza estejam aparecendo do nada para consegui-la.”

“Entendo.” Gourry assentiu em resposta, e então parou de repente. “E-Espere um minuto...” meio congelado no lugar, ele virou a cabeça, rangendo, em minha direção. “Espere um minuto! Quer dizer que vamos ter que continuar lutando contra eles de agora em diante?”

“Quer dizer, se for considerar a situação... Sim.”

“O-O que vamos fazer? Nem sabemos quantos deles existem!”

“É verdade! Acho que você vai ter que se esforçar ao máximo!”

“Eu? E quanto a você? E por que estamos nos enfiando nesse buraco quando nem sabemos se a tal espada existe?”

“Prefere relaxar e deixar uma oportunidade tão suculenta passar? Enquanto Sherra está por aí sendo perseguida por sabe-se lá o quê?”

“Rgh...” Gourry soltou um leve gemido. “É mesmo... Esqueci que Sherra está no meio da bagunça também...”

Não se esqueça dela, seu babaca!

“E deixando de lado a questão de se realmente existe uma espada ou um tesouro, acho que me arrependeria para sempre se voltasse atrás agora. Então...”

“Acho que é justo.” admitiu Gourry, embora parecesse um tanto infeliz.

Não tinha contado, contudo havia outra coisa em minha mente também: por que os homens de preto e a Equipe Luke só estavam atrás de Sherra agora? Rumores sobre a espada circulavam há décadas, e já fazia alguns anos desde que Sherra se mudou para a cidade e seu pai faleceu. Parecia que ninguém a havia incomodado antes, então por que a mudança repentina? Algo deve ter acontecido para incitar as operações especiais e os mercenários a agirem... O que significa que havia mais na história do que sabíamos até então.

Espero que nada de ruim saia disso... Com esse pensamento, me virei mais uma vez para a estrada que cortava a floresta verde-escura à nossa frente.

“Hã? O que é aquilo?” sussurrei, parando no lugar.

A escuridão estava começando a se infiltrar no céu escuro, e as nuvens no horizonte à frente estavam tingidas de vermelho. No entanto não era o pôr do sol. O sol estava se pondo na outra direção... Atrás de nós.

“Parece um pouco vermelho. Um incêndio, talvez?” perguntou Gourry casualmente, também olhando para o horizonte.

Um incêndio? Claro...

“Espere, como consegue estar tão calmo assim? Se essa for a próxima vila em chamas, significa que não haverá pousada esta noite! Vamos acampar!”

“Não que haja algo que possamos fazer a respeito.”

“Com certeza há! Podemos chegar lá e ajudar a apagar! Vamos!”

Sem esperar por uma resposta, comecei a recitar meu cântico de amplificação. Os quatro talismãs em meus pulsos, cintura e peito emitiram suas luzes fracas. Então, comecei meu feitiço, pegando a mão de Gourry quando cheguei às palavras de poder.

“Lei Asa!”

Whoosh! O vento chicoteava formando uma barreira ao nosso redor enquanto subíamos no ar... No momento seguinte, decolamos em direção às chamas no horizonte!

Lei Asa era um feitiço usado para voo rápido e, quando impulsionado pelos meus talismãs, conseguia me mover em alta velocidade, mesmo com Gourry a reboque. A paisagem passou por nós rapidamente e, em pouco tempo...

“A vila!” ele gritou em choque.

A vila à frente, aquela onde planejávamos ficar, foi engolida por um inferno escarlate. Não eram apenas uma ou duas casas em chamas. A cidade inteira lançava chamas aos céus, como se tudo tivesse sido destruído de uma só vez.

O que no mundo...

Ainda estávamos a uma boa distância e a barreira de vento impedia minha visão, então era difícil dizer o que estava acontecendo ao certo, mas não me impediu. Convoquei toda a minha força de vontade e redobrei a velocidade. Assim que chegamos perto o suficiente do marco zero, pousamos e dispensei meu feitiço.

Foi aí que tudo começou.

“!”

No instante seguinte, pudemos avistar figuras grandes e pequenas disparando através das chamas vermelhas. Eram os aldeões fugindo... Da fúria de algumas dezenas de demônios inferiores e de bronze! Será que foram eles quem incendiaram a vila?

Essas raças de demônios não tinham a propensão de se aglomerar em números como aquele, o que sugeria que algo mais estava acontecendo ali. (A teoria mais provável é que alguém tenha invocado os demônios e os incitados a atacar a população.) Porém, naquele momento, descobrir a causa do horror era menos importante do que pará-lo!

“Gourry!”

“Certo!”

Acenamos um ao outro e saímos correndo em direção à vila em chamas.

———

“Asher Dist!”

Fwssh! O demônio de bronze que acertei com meu feitiço se transformou instantaneamente em pólvora negra. Vendo aquilo, os outros demônios próximos voltaram sua atenção para mim, e Gourry aproveitou a oportunidade para atacar! Antes mesmo que pudessem reagir, um já havia sido vítima de sua lâmina.

Veja, eu havia lançado Videira Astral em sua espada antes de chegarmos ao local. Isso a aprimorou e a tornou eficaz contra demônios... Mesmo os puros, como mazokus. Tornaria nossa luta muito mais fácil, contudo ainda assim...

“Hraaagh!” um dos demônios inferiores soltou um uivo furioso enquanto invocava e atirava algumas dezenas de flechas flamejantes em nossa direção.

Desviei delas enquanto entoava meu feitiço e...

“Sopro da Dinastia!” pulverizei aquele também.

No entanto seguia havendo muitos deles! Demônios inferiores e de bronze pertenciam a uma família conhecida como semi-mazokus, notáveis ​​por seus corpos robustos e capacidade de anular feitiços de ataque abaixo de um certo limite de poder. Gourry e eu conseguíamos lidar com alguns sem problema, entretanto tantos de uma vez estava se mostrando um saco. Se estivéssemos em um campo vazio em algum lugar, poderia apenas lançar um Dragon Slave ou algo parecido para varrer o lugar, todavia estava fora de questão com os aldeões por perto.

“Goz Vu Row!” meu próximo golpe destruiu mais um demônio de bronze. Assim que este caiu, senti uma onda de hostilidade atrás de mim! Rapidamente pulei para longe e me virei para ver um terceiro demônio de bronze parado ali.

“Graaagh!” ele soltou um uivo horrível e conjurou uma dúzia de flechas flamejantes. Então...

“Fell Zaleyd!”

Shing! Um raio de luz surgiu do lado e explodiu a cabeça do demônio! De jeito nenhum isso veio de Gourry. Quem poderia...

Examinei a área e avistei uma mulher parada ali perto, com seus cabelos prateados esvoaçantes brilhando em vermelho à luz das chamas.

“Mileena?” ofeguei.

Não tinha percebido que a outra metade do Time Luke também era uma conjuradora. Com a espada longa em punho, ela virou seu olhar estoico para mim.

“Conversamos depois. Vamos cuidar disso primeiro.” sua voz soou calma antes de começar um cântico.

Ela então se esquivou facilmente de um golpe de um demônio inferior que a atacava, respondendo com um golpe. O demônio retaliou com dor e raiva, embora Mileena se esquivou outra vez e finalizou tudo com um feitiço...

“Dis Rush!”

Hmm... Nada mal. Mas agora não era hora de ficar observando com admiração! Criei coragem e voltei para minha própria maratona de ataques.

“Dinastia Blas!”

Kracka-pop! Um raio brilhou e outro demônio de bronze caiu!

———

Um cheiro de queimado pairava no ar noturno, e a lua cheia brilhava sobre uma floresta fervilhante de insetos.

Nossa batalha enfim havia chegado ao fim, algum tempo depois do anoitecer. Depois de acabar com os demônios, Mileena e eu nos concentramos em usar nossa magia para apagar as casas e outros incêndios... E por fim, tivemos um momento para recuperar o fôlego.

Dito isso, a atmosfera não era lá propícia ao relaxamento. Tínhamos evacuado os aldeões para uma área aberta nos limites da cidade, mas as coisas estavam longe de ser confortáveis. As tristes lágrimas dos moradores locais lamentando a perda de suas casas e entes queridos flutuavam na brisa.

“Ei, vocês não são nada ruins, afinal!”

Nem preciso dizer que a voz com um inapropriado tom alegre que cortava a melancolia silenciosa era de ninguém menos que o companheiro idiota de Mileena, Luke.

“Ah, cale a boca! O que diabos aconteceu aqui?” eu o ataquei.

Ele apenas deu de ombros e perguntou em resposta.

“Como vou saber?”

“Como você não sabe?”

“Eu e a Mileena estávamos fazendo umas coisas aqui na cidade e, de repente, o lugar ficou infestado de demônios. Demos o nosso melhor, porém já viu quantos desses otários apareceram? Não conseguimos pegar todos, e quando nos demos conta eles estavam incendiando tudo... Foi mais ou menos nessa hora que vocês dois apareceram. Talvez se tivessem vindo antes, a cidade ainda estivesse de pé.”

“Ah, não ouse nos culpar com isso! Não sei se estavam tentando se adiantar ou o quê, mas foram vocês que nos abandonaram com essa mentira deslavada para perseguir Sherra por conta própria!”

“Hã? Não sei do que está falando.”

“Não se faça de bobo! Sei que também estão atrás da espada, né?”

“Espera aí, ‘também’? Está me dizendo que também está...” Luke explodiu em choque.

Aha, te peguei! Dei um sorriso largo.

“Aha! Então estão atrás da espada!”

“E-Espere um minuto... Ahh, maldição! Você me enganou!”

Mas sua percepção foi tardia demais. Ele tinha caído na minha pequena armadilha linguística, me dizendo justo o que precisava saber. (Se não tivesse reagido, só teria inclinado a balança a favor da teoria do ‘desculpe, sem espada’.)

“Bom, o velho estalajadeiro me contou tudo sobre o pai da Sherra, e eu mesma liguei os pontos.” expliquei. “Imagino que não tenham encontrado a Sherra, né?”

“Não sei do que está falando.”

“Ah, pare com isso. Não estou te enganando dessa vez. Você disse que estava ‘fazendo coisas’ na cidade, né? Aposto que significa que estava perguntando por Sherra.”

“...”

“Bem intuído.” foi Mileena, não Luke, quem respondeu com um sorriso calmo.

“Ei!” Luke resmungou.

“Eles não vão acreditar nas nossas desculpas, então por que continuar com essa farsa?” ela disse casualmente, ignorando o descontentamento dele.

“Tem razão...” admitiu o rapaz.

Interessante. Luke parecia meio derrotado.

“A propósito, como chegaram até aqui?” perguntei. “Vocês tiveram que lutar contra os caras de preto também?”

“Vocês lutaram contra eles?”

“Bem, sim. E vencemos, claro, porém não conseguimos interrogar quem nos atacou.” admiti.

Luke me olhou consternado.

“Será que são idiotas por acaso? Deveria ser óbvio que teriam armadilhas esperando! E ainda assim apenas seguiram pela estrada principal? Por que não cortaram caminho pela floresta?”

“Está dizendo que cortaram caminho pela floresta?”

“Claro que cortamos!”

“Oho... Bem, ao contrário de você, eu não ia abrir mão de uma boa refeição e de uma boa noite de sono só porque estou com medo de uma pequena emboscada.”

“Quem disse que eu estava com medo?”

“É claro que estava!”

“Eu não...”

“Luke!” Mileena o pressionou, fazendo-o se calar em seguida.

Ohoho... É, ela o treinou muito bem mesmo.

“De qualquer forma, não é hora para brigas.” falei, depois que Luke calou a boca, com razão. “A verdadeira questão agora é o que fez tantos demônios aparecerem aqui. Não pode ser um evento natural. Então, aqui está o que estou pensando... O homem de preto com quem lutamos no caminho para cá tinha um feitiço de invocação, então me parece provável que seus aliados também estejam por trás deste ataque.”

Luke e Mileena se entreolharam enquanto compartilhava meu palpite com eles.

“Você não ouviu?” Mileena se virou para mim e perguntou. “Demônios estão aparecendo em grande número ao redor de Bezeld por razões desconhecidas.”

Tudo começou com uma criança que foi morta por um demônio enquanto brincava nas montanhas próximas.

Normalmente, essas criaturas precisariam ser invocadas. Dizia-se que vagavam livres por Katart, entretanto, se fosse verdade, eram uma exceção à regra. Claro, não significava que não existissem ‘demônios selvagens’ por aí. Se um feiticeiro invocasse um para algum experimento e depois o libertasse, ou invocasse um e depois morresse, o demônio permaneceria neste mundo, vagando pela natureza selvagem e causando estragos de acordo com seus instintos básicos.

Assim, os moradores da cidade, presumindo que um desses demônios selvagens fosse o responsável pelo assassinato, organizaram um grupo de caça que partiu para as montanhas. Bem, esses caras deveriam ser mais do que capazes de matar um ou dois demônios bronze, mas a questão é... Eles nunca mais voltaram. E, desde esse dia, houve repetidos avistamentos de bandos de demônios na área. O conselho dos feiticeiros e o exército local (do Ducado de Kalmaart) abriram uma investigação, porém até o atual momento não haviam descoberto a causa de tudo.

Isso resumia o que Mileena nos contou.

Quando terminou de contar a história, estávamos instalados em um campo a uma curta distância da vila incendiada. Queríamos ir até a próxima cidade para encontrar alojamento, contudo a caminhada àquela hora teria sido extenuante e os moradores estavam preocupados com a possibilidade de um segundo ataque. Dessa forma, nós quatro decidimos acampar nas proximidades durante a noite.

“Entendo. Quer dizer que pode ser parte daquela horda de demônios em movimento.” supus, e Mileena assentiu em concordância silenciosa. “No entanto, se estão aparecendo aqui, não sugere que já devastaram Bezeld?”

“Eu mesmo não ouvi nada a respeito.” disse Luke, jogando alguns gravetos na fogueira que havíamos compartilhado. “Embora, sim, se estão atacando vilas tão longe... Há uma boa chance de chegarmos a Bezeld e descobrirmos que é um buraco no chão.”

“Então, se ainda estão indo para lá, acha que há alguma verdade nos rumores sobre a espada, não acha?”

“Er...” com isso, Luke coçou a bochecha, hesitando, e se virou para Mileena.

“Pode contar!” disse ela sem pensar duas vezes.

Luke pareceu um pouco desanimado por um momento antes de começar.

“Bem, veja... Quando começamos a investigar, o problema dos demônios não era tão grave. Havia rumores de um grupo de caça desaparecendo e de que havia alguma coisa acontecendo em Bezeld, só que era tudo. Não sei quem começou, mas em algum momento, as histórias de pânico demoníaco acabaram se cruzando com aquela velha história sobre um cara que viu uma espada estranha nas minas de Bezeld. E então começou a circular esse boato sem sentido de que a espada estava por trás dos demônios de alguma forma. Parece estúpido para mim. Quero dizer, como algo assim poderia causar tanto estrago vinte anos depois? Porém suponho que sejam são boatos para você.” resmungou.

Sua história prosseguiu.

“De qualquer forma, foram os rumores sobre a espada que nos deixaram curiosos. Se for real, valeria uma grana, independente de ter ou não algo a ver com os demônios. E não tínhamos nada melhor para fazer, assim, mesmo que fosse um fracasso, achamos que valia a pena conferir. Seguimos os rumores até Sherra... Só que quando perguntamos a ela sobre isso, ela congelou. Como se estivesse escondendo alguma coisa. E quando alguém começa a agir assim, tem que começar a achar que tem alguma coisa por trás. Falando da minha parte, pelo menos. Então, eu e Mileena reservamos um quarto na cidade para ver se conseguíamos descobrir o que é o quê. Estávamos passando na casa da Sherra com frequência quando...”

“Os homens de preto apareceram, seguidos por nós, certo?”

“É, mais ou menos.”

O fogo soltou um estalo.

“Não que tenha como saber o que esses caras estão pensando... Contudo alguma organização importante se envolvendo faz com que essa coisa da espada pareça bem legítima.”

“Hmm, entendi.”

“E tem sido uma coisa atrás da outra desde aí. Bem quando começamos a achar que a espada era de verdade, Sherra nos abandonou. Imaginamos que tivesse ido para Bezeld, então achamos que deveríamos ir para lá também... E aqui estamos.” Luke lançou um olhar para o que restava da vila. “Agora, deixe-me esclarecer uma coisa. Só porque te contei tudo não nos torna um time. Só compartilhei porque não adianta manter segredo, no entanto não estou planejando ser legal com vocês.”

“Não se preocupe. Esse pensamento nunca me passou pela cabeça.” respondi, acenando com a mão.

Não tinha intenção de ficar amiga de pessoas com quem pudesse ter que lutar no futuro. Certo, antes de chegarmos lá, teríamos que resolver algumas questões incômodas... Como se a espada realmente existia e se a rainha do gelo favorita de todos de fato tinha algum direito sobre ela.

Entretanto onde estava Sherra, a chave para tudo isso?

———

Acordei silenciosamente na minha cama barata com uma sensação estranha no ar ao meu redor. Já havia tido o desprazer de acordar com maus presságios precedendo emboscadas algumas vezes no passado, mas aquilo era diferente. Não conseguia descrever ao certo como era diferente, porém... Naquele momento, parecia que qualquer coisa poderia estar prestes a acontecer.

Já se passaram duas noites desde o incidente na vila em chamas. Eu, Gourry e o casal de mercenários estávamos viajando juntos em direção a Bezeld e, ao longo do caminho, cruzamos cidades grandes e pequenas que haviam sofrido ataques dos demônios. Qualquer povoado na área poderia ser a próxima vítima, incluindo este lugar.

Enfim, saí da cama e abri a janela, deixando o ar fresco da noite entrar no quarto. O horizonte da cidade permanecia silencioso contra um fundo estrelado. Havia apenas conversas distantes no vento, talvez de algum bar em algum lugar.

Uma paisagem noturna tranquila. Nada de estranho. Hum? Não, espere...

Enquanto olhava para a escuridão, vislumbrei um movimento com a minha visão periférica. Olhei rapidamente naquela direção e forcei os olhos, contudo não vi nada.

“Estou imaginando coisas?” sussurrei, e naquele momento...

Uma silhueta disparou através do luar! Não, duas... Três delas! Estavam pulando de telhado em telhado. Estava escuro e estavam longe, então não consegui distingui-las bem, no entanto a julgar pelos seus tamanhos, não eram gatos de rua em movimento.

Tudo bem! Quando a curiosidade bate à porta, você tem que atender! Não é saudável se privar! Coloquei minha capa por cima do pijama, peguei minha espada curta e comecei a entoar um feitiço.

“Levitação!” após lançar o feitiço, saí pela janela e adentrei na noite.

———

A menor das três figuras pousou silenciosamente em uma borda do telhado. Quando uma segunda figura pousou, a primeira já havia sumido. Em pouco tempo...

Whoosh! Quando a segunda figura saltou, ouviu-se um som fraco de algo rasgando o ar. A pequena figura à frente hesitou.

“Seu idiota! Disseram para não a matar!” sibilou a terceira figura.

“Eu só a acertei na perna. Isso deve atrasá-la...” começou a argumentar a segunda.

Entretanto antes que pudesse terminar, a pequena figura estava correndo pelos telhados mais uma vez. As duas sombras que a perseguiam ficaram boquiabertas com a visão.

“Hã?”

“Você claramente errou! Vamos pegá-la!”

Não comigo aqui, amigão! Achei que seria uma frase legal de se dizer, todavia às vezes é melhor mostrar do que contar vantagem, se é que me entende. Então, em vez disso...

“Iluminação!” lancei uma rajada de luz mágica com o brilho máximo bem na frente dos perseguidores sombrios.

“Guh!” gritaram os dois, cegos pelo clarão repentino e recuando no mesmo instante.

Eu conhecia as vozes dos dois. Eram Gal-sei-lá-o-quê e Zain, a dupla de assassinos que encontramos na casa de Sherra. Usei minha Levitação para me elevar acima da dupla e, na primeira brecha, lançar meu feitiço de luz sobre eles. Era óbvio demais quem estavam procurando.

“Senhora Lina?” Sherra ofegou, olhando para mim, surpresa.

Dispensei meu feitiço de Levitação e pousei ao seu lado.

“Guarde as gentilezas para depois. Por enquanto, vou...”

“Nos derrotar? Vá em frente e tente!” ameaçou Gal-sei-lá-o-quê enquanto ele e seu companheiro começavam a se mover de novo. Nenhum deles emitiu um som sequer enquanto disparavam em nossa direção pelo telhado. Parecia que ambos já haviam recuperado a visão, pois nenhum demonstrava qualquer sinal de incerteza em seus movimentos.

“Por enquanto, vamos sair daqui! Por aqui!” falei, disparando pelo telhado. Sherra seguiu logo atrás. Imaginei que se conseguisse atraí-los de volta para a estalagem e acordar Gourry e os outros...

Wuh?

De repente, senti o perigo se aproximando, então saltei para o lado.

Fwish! Algo atravessou minha capa por trás e continuou passando por mim. Ele provavelmente tinha jogado uma faca. Uma com a intenção de matar.

Para os nossos perseguidores, Sherra valia mais viva, graças ao que sabia. Por outro lado, eu era a definição de dispensável. Teria que fazer mais do que apenas correr!

“Flecha Congelante!” fiz uma leve alteração no cântico para invocar e disparar uma dúzia de raios de gelo atrás de mim. Imaginei que flechas de fogo seriam fáceis demais de avistar e desviar no escuro, entende? Mas quase no exato momento em que lancei meu feitiço...

“Vento de Diem!” gritou Zain.

O quê?”

O vento soprou atrás de mim, agitando minha capa e meu cabelo. Deve ter sido o suficiente para desviar minhas flechas de gelo. Será que anteciparam meu ataque e prepararam um feitiço para detê-lo? Se sim, teria de esperar...

“Flecha Congelante!”

Sabia! Eles esperaram até logo depois do meu ataque para me atacar. Não que não soubesse como lidar com algo desse nível! Dei um grande empurrão em Sherra para o lado.

“Gyaaah!” ela gritou enquanto caía do telhado.


Pulei logo depois enquanto as flechas mágicas passavam, roçando meu cabelo.

Ka-pwash! Sherra mergulhou de cabeça em uma montanha de lixo no beco abaixo, enquanto pousei perfeitamente ao seu lado.

“Você está bem, Sherra?”

“Claro que não!”

“Certo, esqueça o que perguntei por enquanto! Temos que ir embora!”

“Na verdade, acho que é mais seguro não ir com você...”

Cracka-cracka-crack! Interrompendo os murmúrios de Sherra, uma série de flechas de gelo vindas do telhado atingiram o chão e se estilhaçaram.

“O quêêêê?” assustada com o ataque, ela disparou em minha direção. A garota devia ter percebido que não era hora para discussões encenadas!

“Vamos! Por aqui!” chamei, correndo enquanto sussurrava um encantamento.

Nós duas seguimos pelos becos escuros. Os caras de preto estavam em nosso encalço, pulando de telhado em telhado enquanto nos bombardeavam com feitiços menores. Entre esquivá-los e me proteger... Enfim terminei de entoar meu feitiço!

“Bola de Fogo!” atirei minha bola de fogo por uma fresta entre os telhados, direto para a lua.

Claro, ela sequer chegou perto de atingir nossos perseguidores. Em vez disso...

“Quebre!” gritei, e no momento em que estalei os dedos... Fwoooom! Minha Bola de Fogo explodiu no céu noturno com um rugido!

“O quêêêê?”

“O que foi isso?”

Vozes curiosas vinham das várias casas ao redor. A comoção havia chamado a atenção dos moradores.

Sim! Justo como planejado! Pelo que pude julgar, os homens de preto estavam em algum tipo de missão secreta, o que significava que é bastante provável que não quisessem ser vistos. Atrair uma multidão de aldeões para o local certamente os assustaria. Mas...

“Bola de Fogo!”

Hã? Antes que meu cérebro pudesse descobrir quem havia lançado o feitiço, me vi saltando para a frente para me esquivar. Houve uma violenta rajada de calor atrás de mim, e a luz das chamas tingiu os prédios ao redor de vermelho.

Era um dos caras de preto! Ele tinha soltado aquela Bola de Fogo do nada! Nem preciso dizer que não esperava que eles começassem a lançar feitiços de fogo no meio da cidade... Em poucos instantes o fogo se espalhou para as casas próximas.

“Vocês estão loucos? O que acham que estão fazendo?” gritei para os homens no telhado enquanto corria pelo beco com Sherra. Achei que fosse uma pergunta retórica, porém...

“Não tem importância para nós. Você, Lina Inverse, foi quem incendiou esta cidade!”

“Que diabos?” gritei com essa declaração inesperada.

Claro. Depois que me derrotassem, seu plano era espalhar a notícia de que fui a responsável pelo incêndio. Contudo não tinha qualquer intenção de deixar isso acontecer!

Rapidamente lancei meu próximo feitiço, no entanto, antes que pudesse terminá-lo, um homem de preto apareceu no beco à nossa frente para bloquear nosso caminho! Quando saíram do telhado? Vi sua mão se mover e, em resposta...

Tch! Dei meia volta, agarrei a ponta da minha capa e a puxei sobre mim em um movimento amplo.

Thwipa-thwip! Senti um impacto amortecido. O homem de preto deve ter jogado algumas facas pequenas ou algo assim, que consegui neutralizar com a minha capa. E em um instante, terminei meu feitiço!

“Flecha Congelante!” meus projéteis de gelo avançaram, atingindo o homem que bloqueava nosso caminho. Nem ele conseguiria desviar de uma dúzia dessas belezinhas!

“Guh!” ele levou uma na perna, congelando-o no chão.

Certo! Hora de finalizá-lo de vez!

Entretanto quando comecei meu próximo encantamento, senti uma presença hostil atrás de mim... O outro cara tinha nos cercado!

“Flecha Congelante!”

Quando ouvi aquelas palavras de poder, mergulhei para o lado e agarrei Sherra, fazendo-nos rolar pelo chão.

“Ei!” ela gritou.

Blah! Por favor, guarde todas as reclamações para o final da viagem! Embora Sherra estivesse sendo um pé no saco agora, tê-la por perto também mantinha os homens de preto sob controle. Enquanto a quisessem viva, não recorreriam a nada muito letal. As facas de arremesso, as Flechas Congelantes... Tudo aquilo eram sinais claros de que essas pessoas estavam se segurando.

Mas quando consegui me levantar na esperança de contra-atacar...

“Flecha Congelante!” alguém gritou, desta vez do telhado.

O quê? Na frente, atrás e agora em cima? São três homens de preto?

Uma fração de segundo de hesitação e choque me atrasou um pouco, porém mesmo assim consegui empurrar Sherra para fora do caminho e desviar das flechas ao mesmo tempo.

“Lança de Gelo!” entoei, lançando meu feitiço no homem imobilizado à minha frente. Como não conseguiu se esquivar, acabou congelado.

Um a menos! Enquanto entoava meu próximo feitiço, comecei a correr. No instante em que o fiz... Senti um puxão repentino por trás que me derrubou.

Que diabos é agora? Não senti ninguém ali! Olhei por cima do ombro e vi algo prendendo a bainha da minha capa no chão.

Droga! Pensei que tivesse desviado de todas aquelas Flechas Congelantes antes, contudo uma pregou minha capa ao chão. O segundo homem de preto no chão aproveitou meu pânico momentâneo, puxando uma faca ou algo do bolso e erguendo-a bem alto.

Whump! Ele então caiu no chão e ficou imóvel. Atrás do homem estava...

“Gourry!”

“Ei. Ouvi dizer que havia uma briga, então vim verificar.”

Com a espada na mão, ele me lançou uma piscadela.

Cling! Clang! Nesse momento, ouvi o som de metal chocando com metal no telhando. Logo em seguida, o último dos nossos agressores caiu no beco não muito longe de onde estávamos.

“A cavalaria chegou!” gritou uma voz petulante vinda do alto.

Não precisamos nos perguntar quem pousou ao nosso lado com uma rajada de vento... Eram Luke e Mileena. Com Gourry aqui também, tínhamos nosso grupo completo! Todavia não sabia quantos homens de preto ainda estavam lá fora, então não podíamos baixar a guarda ainda.

De qualquer forma, usei minha magia para criar uma pequena chama e soltar minha capa do chão congelado.

“Por que vocês não desistem logo?” perguntei aos homens de preto caídos.

“Por que deveríamos?” respondeu um deles, secamente. Parecia o Gal-sei-lá-o-quê. Ele já tinha sido esperto em fugir antes, então, se estava falando besteira agora, será que tinha algum truque na manga?

“Parece divertido! Vamos acabar com isso então!” Luke se recompôs, preparando sua espada outra vez. E logo depois...

Kra-koom! A parede de uma casa entre nós e os homens de preto desabou com um rugido explosivo. Todos nós demos um pulo para trás instintivamente.

“O quê?”

Rrrrrr... Como se respondesse à pergunta de Luke, um rosnado baixo veio da poeira que se assentava.

Não, não era só na poeira. Também podia ouvir atrás de nós, da sombra do beco. Várias presenças emitiam um ruído sinistro. Não pode ser...

Preparei um rápido feitiço e...

“Iluminação!”

Lancei a luz mágica para o alto para dissipar a escuridão ao nosso redor. A poeira baixou, as sombras recuaram e por fim pudemos ver os reforços chegando.

Eram cerca de uma dúzia de demônios.

***

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