Capítulo 35: General Rashart barra nosso caminho
“Hsshah!” com um silvo de cobra, Rashart desferiu um golpe para baixo com sua lâmina. Estávamos bem fora de seu alcance, então não deveria ter atingido nada, mas...
Vreew! Algo como uma onda de choque produzida pelo golpe cortou o ar em nossa direção! Nós três saltamos o quanto antes quando esta passou voando e desapareceu contra um prédio de tijolos atrás de nós. Não havia sinal de dano na parede, porém não significava que o ataque fosse inofensivo para humanos.
Bom, hora de revidar! Lancei o feitiço que havia terminado de entoar.
“Dam Blas!”
Este converteu poder mágico em uma onda de vibração para pulverizar um alvo. É claro, não poderia causar dano a mazokus puros, muito menos a um tão poderoso quanto Rashart, devido à sua natureza fundamentalmente espiritual. Contudo eu não estava mirando no General do Dragão. Não! Estava mirando em uma parede de tijolos próxima!
Com toda a honestidade, tenho um total de dois feitiços que poderiam derrotar o General Rashart. Um era a Lâmina Ragna, que até havia arrancado um pedaço do Dragão do Caos Gaav. No entanto, como ela se manifestava como uma espada, teria que chegar perto e atingi-lo fisicamente para que funcionasse. E se a brandisse aqui, ele poderia flutuar para fora do meu alcance e brincar de esconde-esconde pelo tempo que quisesse. No fim, estaria gastando meu próprio poder mágico à toa.
Assim, para evitar esse cenário, iria atravessar a parede mais próxima para fazer parecer que estava escapando. E depois, quando Rashart viesse me perseguir, o acertaria com minha Lâmina Ragna no espaço interno confinado! Ou pelo menos era esse o meu plano.
Todavia meu Dam Blas se chocou contra a parede... E foi isso. Um feitiço que deveria ter transformado rocha sólida em pó nem sequer quebrou os tijolos.
“O quê?” gritei em choque.
“Não adianta, Lina Inverse! Será que ainda não entendeu? Você já está dentro da minha barreira! Nenhum dos seus feitiços de ataque pode afetar o ambiente da cidade! Está presa aqui comigo!” Rashart disse em um irônico tom.
Claro... Ele vai nos manter aqui até que tudo acabe, de uma forma ou de outra.
Mas, para analisar a situação de outra forma, também significava que posso bombardear toda a área sem causar nenhum dano à cidade. Óbvio, ainda havia a dúvida se nós escaparíamos ilesos...
Enquanto pensava em tudo isso, Amelia completou seu feitiço.
“Ra Tilt!”
Porém, um momento antes de lançá-lo, vi uma leve ondulação percorrer o corpo de Rashart. Ele foi banhado pela coluna de chamas azul claras do mesmo jeito... E então pareceu se estilhaçar na luz azul!
“Eu fiz aquilo?” Amelia gritou incerta.
Infelizmente não! O ar atrás dela se contorceu e Rashart reapareceu, sua espada erguida! Ele havia deixado um fragmento de sua forma espiritual como isca enquanto se teletransportava pelo espaço... Um truque que já vi outro mazoku usar no passado. Rashart mirou em Amelia e...
“Ra Tilt!”
Esta veio de Zel. Pelo visto nosso inimigo não havia previsto essa, já que o General do Dragão estava de fato em chamas desta vez!
“Graaah!”
Rashart soltou um uivo de raiva. Embora... Foi tudo. Amelia saltou de onde estava e, quase no mesmo instante, o pilar de luz azul desapareceu.
“Pirralho atrevido!” rugiu Rashart, com o rosto contorcido de raiva enquanto liberava outra onda de choque de sua espada.
Zel se esquivou sem dificuldades. Contudo, naquele momento, o ar ao seu redor se distorceu e o mazoku branco Mordirag apareceu... Bem atrás das suas costas!
“O quê?”
Zelgadis nem teve tempo de se equilibrar depois de se esquivar antes que Mordirag o acertasse de frente com uma flecha mágica!
“Gah!”
Seu golpe derrubou o pobre Zel direto no chão. Era óbvio havia sobrevivido ao ataque, no entanto se eu não terminasse minha recitação rápido, as coisas poderiam realmente começar a piorar. Hora de focar em Mordirag, contra quem ao menos tinha uma chance!
“Explosão Ragna!” entoei.
Na fração de segundo em que lancei o feitiço, o mazoku branco desapareceu no ar. Meu pilar mágico liberou seu plasma escuro contra o nada.
Mordirag havia desaparecido rápido demais para fugir do meu ataque... Deve ter optado por uma estratégia de bater e correr com antecedência. Eu tinha que admitir, seria um verdadeiro pé no saco para nós. Onde ela apareceria em seguida? Quando? E atrás de quem iria a seguir?
O fato de tudo estar em aberto tornava quase impossível prever onde atacaria em seguida, e capturá-la com um feitiço exigiria um cântico prévio. Em outras palavras, lidar com Mordirag seria difícil. Poderíamos ter uma chance com a Espada da Luz de Gourry, mas não havia sentido em lamentar o que não tínhamos... Isso significava que minha única opção era derrotar Rashart com a Lâmina Ragna!
E se esse fosse o caso, então era hora de colocar o plano em ação! Sem espaço para hesitação! Usando o poder dos meus talismãs de amplificação, comecei a entoar meu feitiço...
Lâmina forjada do vazio negro congelante,
Seja libertada sob o selo do céu...
Torne-se minha, torne-se parte de mim...
Causemos destruição como um...
Esmague até mesmo as almas dos deuses...
Era a Lâmina Ragna... Embora a versão imperfeita. A aperfeiçoada certamente teria mais poder, porém me exauriria muito mais rápido. Se errasse o primeiro golpe, não conseguiria um segundo. Sua versão imperfeita drena bastante rápido também, contudo posso mantê-lo por mais um tempo e ainda teria um impacto e tanto.
Corri para Rashart e...
“Hrngh!” quando ele percebeu o que estive preparando e se virou para mim, eu já estava na sua frente!
“Lâmina Ragna!” gritei, ativando o feitiço à queima-roupa! Em minhas mãos prontas, uma lâmina de pura escuridão surgiu! Em seguida, golpeei Rashart, todavia...
“Tch!” com apenas um estalo de língua, ele saltou para o lado e evitou meu golpe.
Será que Rashart é mais rápido do que imaginei? Dada a nossa proximidade, presumi que tentaria aparar o golpe. Nunca imaginei que fosse capaz de se esquivar... Como se estivesse cauteloso com a minha lâmina negra, Rashart rapidamente se afastou de mim.
Argh, ok! Hora do experimento número um! Com minha Lâmina Ragna ainda ativa, corri para perto de onde Rashart estava e cortei uma parede de tijolos.
Vrum! Sim! Funcionou! A parede protegida pela barreira de Rashart cedeu sem esforço algum sob a minha lâmina negra!
“Não!” Rashart gritou em choque.
Tudo bem! Continue assim! Com um pouco de habilidade com a lâmina, abri um buraco grande o suficiente para uma pessoa passar. O que eu estava fazendo, você pergunta? O que mais? Estava voltando ao meu plano original... Levar Rashart para dentro de casa para desafiá-lo lâmina a lâmina!
Dito isso, já começava a sentir os efeitos exaustivos do meu feitiço. Manter a Lâmina Ragna incompleta ativa, mesmo por um curto período de tempo, tomava muito da minha resistência.
Ainda assim, preciso tentar! Mas bem na hora em que fortaleci minha convicção...
Rashart saltou para trás, abrindo uma grande distância entre nós.
“Você rompeu minha barreira, porém não importa... Resolveremos isso da próxima vez!” gritou o General do Dragão, e logo desapareceu no ar sem esperar por uma resposta.
“Hã?” Amelia franziu a testa diante de sua partida extremamente abrupta.
“Ele foi embora mesmo? Ou está só tentando fingir?” perguntou Zelgadis, levantando-se e examinando com cuidado a área em busca de um Rashart escondido.
Contudo nenhum de nós conseguia sentir outra presença por perto.
“Acho que realmente se foi.” sussurrei, e enfim me permiti respirar aliviada.
———
“Hmm...” resmunguei, cutucando meu cordeiro assado no vinho com garfo e faca. Não que a comida estivesse ruim. Não era a melhor coisa que já tinha comido, mas estava perfeitamente saborosa. Só tinha algo em mente. Já fazia três dias desde o ataque na Cidade Ruald. Rashart não voltou atrás de nós desde então, e por fim cruzamos a fronteira para o Império Lyzeille.
“O que houve, Lina?” perguntou Amelia, motivada pelos meus resmungos, enquanto preparava sua porção de lagosta cozida no vapor com molho cremoso.
“Bem... É que... Andei pensando em algumas coisas.” comentei, comendo um pedaço de guarnição de cenoura.
“Coisas?”
“É. Rashart se retirou da Cidade Ruald bem rápido depois que rompi a sua barreira. Foi estranho.”
“Porém ele sempre foi assim.” respondeu Amelia, colocando uma batata na boca. “Lembra? Não quer machucar pessoas inocentes.”
“Sim, eu sei... Só estou tentando entender o porquê.” sussurrei, com uma ruga se formando na minha testa.
Amelia e Zel me lançaram olhares curiosos, claramente confusos sobre por que isso de repente se tornou uma preocupação.
“Para atrair os dragões e elfos para o lado deles, certo? Era sua forma de dizer: ‘Não somos como aqueles desgraçados do Katart.’.” Zel adiantou.
“E para ajudar a passar despercebidos.” acrescentou Amelia. “Temiam que o Mestre do Inferno e seus companheiros os descobrissem se criassem alguma grande confusão. Embora tenha sido em vão.”
“Certo...” respondi com um aceno distraído. Essas eram de fato as razões mais prováveis para a facção do Dragão do Caos ter sido tão cuidadosa em evitar danos colaterais. Podia entender sua lógica. Contudo...
“Senhora Lina?” alguém me chamou de repente da entrada do restaurante.
Hã? Parece que... Me virei surpresa e vi uma figura familiar.
Era uma garota de cerca de vinte anos, com longos cabelos negros e sedosos e vestes roxo-claras.
“Sylphiel?”
De fato, esta era a clériga que conhecemos em Sairaag e que mais tarde acompanhamos até Saillune. A última vez que a vi foi quando desmaiou devido ao trauma devastador de conhecer Sir Phil e descobrir como ele realmente era... Mas, naturalmente, teria que acordar alguma hora.
“E aí, Sylphiel! O que está fazendo aqui?” perguntei enquanto ela passava pelas mesas para se aproximar de nós.
“Ouvi histórias de gangues de bandidos sendo destruídas por toda a região, e quando cheguei à cidade, correram rumores de uma feiticeira sem peito devorando o cardápio desta pousada. Então pensei...”
Será que está tentando começar uma briga? Sylphiel era uma beldade estonteante que falava com a máxima educação o tempo todo, no entanto, caramba, ela tinha um lado maldoso.
“Não estou falando disso! Estou perguntando o que você está fazendo aqui em Lyzeille!”
“Ah, bem, primeiro...” Sylphiel se virou para Zelgadis. “Já faz um bom tempo. Obrigado por toda a sua ajuda em Sairaag.”
“Claro. Não sou bom com gentilezas, porém... Fico feliz que você pareça estar bem.”
“Estou, obrigado!” respondeu Sylphiel, virando-se para Amelia. “E quem seria esta?”
“Amelia Wil Tesla Saillune.” disse Amelia, levantando-se e fazendo uma reverência educada.
“É um prazer conhecê-la. Sou Sylphiel Nells Ruda...” Sylphiel começou, e então seu sorriso congelou no rosto. “Amelia Wil Tesla... Saillune?” perguntou com a voz trêmula.
“Isso mesmo!” disse Amelia.
Inclinei-me para sussurrar no ouvido de Sylphiel.
“Ela é filha do seu amado Príncipe Philionel.”
“Nããããão! Não diga isso! Não me lembre daquilo!” Sylphiel gritou, segurando a cabeça e soluçando.
Pelo visto seguia bastante traumatizada. Eu entendia perfeitamente como se sentia, é claro. Já estava mais ou menos insensível ao fato, embora chamar aquele idiota de príncipe seguisse me dando arrepios.
Zelgadis, que não conhecia Sir Phil pessoalmente, e Amelia, que cresceu com o cara, ficaram meio que desamparados com nossa pequena conversa.
“A-Aliás...” disse Sylphiel, recuperando-se com algum esforço e olhando direto para mim. “Não estou vendo Sir Gourry por aqui...”
Urrrgh! É verdade... Ela estava meio que afim do Gourry, não estava?
“Não me diga...” com essas palavras, Sylphiel se aproximou, e eu instintivamente me acomodei na cadeira. “Não me diga, Senhora Lina... Que você o vendeu!”
“Claro que não!”
“Então roubou a Espada da Luz e o abandonou na beira da estrada?”
“Que tipo de pessoa acha que sou?”
“Então me diga o que aconteceu com o Sir Gourry!”
“E-Ele, uh...”
“Onde está?”
“Bem, que droga, veja... O idiota acabou sendo sequestrado pelo Mestre do Inferno Fibrizo... Teehee!”
Um segundo depois...
“Ooh...” Sylphiel desmaiou. “Mas não é hora de desmaiar, é?”
Mesmo assim, ela se recuperou com uma velocidade impressionante e sentou-se ao meu lado. Seus joelhos tremiam um pouco, então não parecia toda recuperada.
“Posso perguntar o que aconteceu?”
Zel, Amelia e eu trocamos um olhar. As circunstâncias eram fáceis de explicar, porém ao fazê-lo significaria arrastar Sylphiel para o meio da confusão. Ainda assim, sendo realista, já havia mencionado o nome do Mestre do Inferno. Além do mais, não tinha certeza se a abordagem ‘Não posso te contar porque te envolveria no problema’ seria suficiente para convencer Sylphiel a ficar longe.
“Vejamos...” depois de pensar um pouco, soltei um suspiro. “Certo, antes de te contar, preciso ter certeza de uma coisa. Estamos envolvidos em um assunto muito sério. Te contar significa que vai se envolver de uma forma ou de outra. Quer dizer, acho que você enterrar a cabeça na terra ainda pode ser uma opção, contudo... Bem, tem certeza de que quer ouvir?”
“Sim!” disse ela, imediatamente e sem hesitar.
“Certo. Lá vai...”
E então contei um rápido resumo dos eventos recentes. Com Xellos. Com o Dragão do Caos. Com a Bíblia Claire. Com o Mestre do Inferno. Com o sequestro de Gourry. Como estávamos a caminho de Sairaag para resgatá-lo. E como o membro sobrevivente da facção Gaav, General Rashart, estava tentando me matar.
Um longo minuto depois de terminar minha história...
“Entendo...” Sylphiel sussurrou num tom gentil. Seu tom era calmo, no entanto percebi que estava tentando suprimir algum choque interno. “Em outras palavras... Ele levou Sir Gourry para forçá-la a ir para Sairaag?”
“É... Nisso que tudo se resume, sim.” admiti. Meus instintos de sobrevivência me fizeram me afastar um pouco dela.
“Entendo, entendo...” mas Sylphiel continuou repetindo aquelas palavras como se estivesse elaborando algo em sua mente.
“Hum... Sylphiel?” instiguei.
Logo depois, seu olhar enfim se voltou para mim e imediatamente mudou de assunto.
“É verdade... Ainda não te contei por que estou aqui.”
“C-Certo...”
Ignorando minha leve perplexidade, começou a contar sua história.
“Estou hospedada com meu tio, um médico mágico na Cidade de Saillune, e trabalhando como sua assistente. Um dia, um paciente nosso chegou com uma história curiosa. Este homem é um mercador viajante, sabe, e nos contou que quando passou por Sairaag pela última vez, há algum tempo... A grande árvore havia sumido e não tinha certeza do que havia acontecido com ela.”
“Espere, Flagoon sumiu?” perguntei, franzindo a testa ao ouvir as palavras de Sylphiel.
Flagoon é uma grande árvore que ficava no coração da Cidade de Sairaag, absorvendo o miasma do ambiente para crescer. Agora que a cidade havia sido destruída pela segunda vez, deveria ser a única coisa de pé no meio de um deserto desolado, mas...
“Você quer dizer, tipo... Caiu? Ou alguém cortou?” perguntei.
Porém Sylphiel balançou a cabeça e respondeu.
“Não. Pelo que o homem me disse, havia literalmente desaparecido.”
Desaparecido? Tá brincando? Flagoon é... Bom, não tão grande quanto uma montanha, porém tinha pelo menos o tamanho de uma colina considerável. Seu tronco era tão largo quanto um quarteirão em alguns lugares. Como algo tão grande poderia só desaparecer?
“Também achei estranho, então o pressionei para obter mais detalhes, só que...”
“Só o quê?”
“Suas respostas apenas me confundiam mais.” respondeu Sylphiel em um sussurro. “Quanto mais perguntava, menos o que ele dizia fazia sentido. E quando expressei minhas preocupações e pedi esclarecimentos... Ele disse que a cidade de Sairaag estava lá.”
“Hã?” parei minha xícara de chá a meio caminho da boca, perplexa com suas palavras. “A cidade estava lá? O que isso quer dizer?”
“Exatamente o que sugere, pelo que entendi. Sairaag segue de pé e cheia de pessoas, como se nunca tivesse sido destruída. Só Flagoon está desaparecido.”
“Hein...” sussurrei em contemplação, com as sobrancelhas franzidas.
Podia dizer com absoluta certeza que Sairaag era uma cidade arruinada. Zel, Sylphiel e eu a vimos devastada com nossos próprios olhos. Foi há apenas meio ano, e não se passa de ‘terra árida e deserta’ para ‘metrópole funcional’ nesse tempo. A parte sobre Flagoon estar desaparecido só tornou tudo muito mais estranho.
“Tem certeza de que o homem não a confundiu com alguma outra cidade?” perguntou Amelia em silêncio. “Até eu sei sobre a grande árvore no meio de Sairaag. Também sei que a cidade foi destruída por alguma força desconhecida há algum tempo... Não tem como ela já ter se recuperado.”
“Destruída por alguma ‘força desconhecida’?”
“Ah...” Zel e eu dissemos ao mesmo tempo, trocando olhares instintivamente. Agora que penso sobre, nunca havíamos contado a Amelia sobre todo o incidente de Sairaag, não é?
“O que foi?” perguntou a garota, confusa.
“Ah, nada. Explicaremos depois.” respondeu Zel, acenando com a mão antes de se virar para Sylphiel. “Por enquanto... Você tem certeza de que o homem não estava só enganado?”
“Achei que sim, então depois parei em um bar popular entre viajantes para perguntar por aí... As histórias deles só aumentaram o mistério. Aqueles que passaram por Sairaag nos últimos tempos disseram a mesma coisa que nosso paciente. No entanto aqueles que passaram por lá há mais tempo disseram que não havia cidade, apenas uma grande árvore no meio de um deserto. Em outras palavras, algo parece ter mudado em um momento definitivo.”
Hmm... Curioso de fato.
“Agora, se essas histórias são verdadeiras... O que está acontecendo?” perguntei.
“Receio não saber.” disse Sylphiel com firmeza. “É por essa razão que estou indo ver com meus próprios olhos.”
“Sério? Está planejando ir para Sairaag depois de tudo o que acabei de lhe contar?”
“É claro. Não posso voltar sabendo que Sir Gourry é um prisioneiro lá. Dito isto...” então, ela parou por um breve momento, imersa em pensamentos. “Pretendo ir sozinha na sua frente.”
“O quê? Por que?”
“Porque eu mesma quero salvar Sir Gourry.”
“De jeito nenhum!” Amelia, Zel e eu gritamos em perfeita harmonia.
“Estamos lidando com o Mestre do Inferno Fibrizo! O mal encarnado! Mestre da destruição! Inimigo jurado de toda a criação! Não pode enfrentá-lo sozinha!” declarou Amelia.
“Sei que é um esforço infrutífero...” respondeu Sylphiel calmamente. “Entretanto se a Senhora Lina chegar ao Mestre do Inferno as consequências serão calamitosas. Seus planos colocam o mundo inteiro em risco.”
Ela lançou um olhar significativo em minha direção, pelo visto tendo decifrado o que Fibrizo estava tramando.
“Ainda assim, não posso pedir que você não vá, nem esperaria que me ouvisse... Então, a solução ideal não seria que outra pessoa salvasse Sir Gourry primeiro? Deixando de lado a probabilidade de sucesso.”
“Certo, admito que faz sentido, embora...”
“Não vou negar que me apavora ser o único membro da vanguarda. Porém, Senhora Lina, enquanto os remanescentes da facção Dragão do Caos estiverem te perseguindo, não posso desviar a atenção do seu lado. O que significa necessariamente que o melhor plano possível é eu ir sozinha.”
“Bem, talvez, contudo não é um pouco arriscado demais?”
“Conhece um plano menos arriscado, Senhora Lina?”
“Urgh...”
Ela me pegou nessa. Já estávamos a caminho de Sairaag para resgatar Gourry nós mesmos, então não estávamos em posição de dar sermão sobre correr riscos. Embora não conseguíssemos derrotar o Mestre do Inferno, teria que inventar uma maneira de enganá-lo e sair viva...
O ancião dragão dourado Milgazia falou quando estávamos saindo do Pico do Dragão: “Talvez eu deva matá-la agora enquanto tenho a chance.”. E tinha razão. Minha morte poria fim aos planos do Mestre do Inferno. Todavia Milgazia não levou sua ideia adiante porque disse que era assim que mazokus como o Dragão do Caos Gaav se comportavam. No final, escolheu permanecer no Pico dos Dragões em vez de se envolver e se despediu com uma cantada legal sobre deixar o mundo em minhas mãos.
Agora, não havia garantia de que eu chutar o balde prematuramente garantiria a segurança de Gourry. Além do mais, mesmo que frustrasse seu plano, Fibrizo poderia decidir que matar o Dragão do Caos já era o suficiente e dessa forma já poderia considerar isso uma vitória. E o mais importante de tudo, não quero morrer.
Então, continuamos rumo a Sairaag sem nenhuma estratégia real em mente. Era verdade que o plano de Sylphiel era melhor do que plano nenhum, e não havia como evitar o tremendo perigo que representava para ela.
“Não precisa se preocupar comigo. Não tenho qualquer desejo de morrer. Sei que lutarei contra o Mestre do Inferno, entretanto não pretendo agir de forma imprudente. Só que devo esclarecer algo... Não estou pedindo sua aprovação para minha missão. Estou apenas informando você sobre minha decisão.”
“Em outras palavras... É inútil tentar impedi-la?” perguntou Zel.
“Exato!” respondeu Sylphiel com um aceno firme.
———
Mais tarde naquela noite, depois de nos dividirmos em nossos quartos na estalagem, houve uma batida na minha porta. Tinha acabado de tirar a capa e as ombreiras para dormir um pouco quando ouvi.
“Senhora Lina, a senhora está acordada?” veio a voz de Sylphiel do corredor.
“Sim, estou acordada.” respondi enquanto destrancava a porta.
A bela clériga estava do outro lado, com uma expressão muito séria. Ela me cumprimentou com...
“Há um assunto que desejo discutir com a senhora. Posso?”
“Hum... Claro, sim. O que houve?”
Sylphiel entrou e fechou a porta atrás de si sem fazer barulho, sentando-se na cadeira barata do quarto. Sentei-me na cama, de frente, encarando-a.
“Permita-me perguntar sem rodeios...” começou, olhando direto nos meus olhos. “O que a senhora acha de Sir Gourry?”
“Que é um mestre espadachim com cérebro de gelatina.”
Minha resposta foi instantânea e, por algum motivo, Sylphiel ficou sem palavras.
“Não foi isso que eu quis dizer.” retomou o assunto, depois de um momento. “Queria perguntar se você gosta dele ou não!”
“Ah, bem... Não estaria viajando com ele se não gostasse. Já o teria matado de surpresa e vasculhado seus bolsos há muito tempo.”
Por algum motivo, isso fez com que os olhos de Sylphiel ficassem vidrados. Ela deu um suspiro profundo antes de responder.
“Muito bem... Permita-me perguntar de outra forma. Quando viajamos juntos de Sairaag para a Cidade de Saillune, perguntei por que estava viajando com Sir Gourry. Na época, sua resposta foi porque desejava a Espada da Luz para si. Mas agora parece que a Espada da Luz é uma entidade demoníaca, e é improvável que a recupere do Mestre do Inferno. Então, mesmo que consigamos derrotá-lo e salvar Sir Gourry... Não perderá o motivo de viajar junto dele?”
“Hã...”
A garota tinha razão. Estive tão focada no Mestre do Inferno que nunca tinha pensado a respeito, porém estava de fato certa. A Espada da Luz não voltaria, e ainda que voltasse, Gourry não me deixaria roubá-la... Quer dizer, pegá-la emprestada para sempre.
“É... Acho que não teríamos motivo para ficarmos juntos nesse caso...” falei, cruzando os braços pensativamente.
Por algum motivo, um sorriso dolorido surgiu no rosto de Sylphiel quando me perguntou.
“Será que... Você está tentando pensar em um motivo para ficar ao seu lado?”
“Hein?”
“Se sim... Então por quê? Por que está procurando um motivo?” ela me perguntou, ainda aflita.
Eu, uh, não tinha uma resposta. Quero dizer, é uma boa pergunta, ok?
“Entendo.”
Não tenho certeza do que ‘entendeu’ ao certo, contudo Sylphiel se levantou, com a expressão inalterada.
“Partirei da estalagem amanhã cedo. Prometo encontrar um jeito de salvar Sir Gourry.”
Fiquei mais estupefata com sua declaração.
“Boa noite, Senhora Lina.” Sylphiel disse, e saiu do quarto.
Ela me deixou sozinha com uma sensação inexplicável e estranhamente inquietante no peito.
———
“Então ela está de fato empenhada a tentar, hein?” Amelia sussurrou enquanto caminhávamos por uma estrada que cortava um campo, banhada pela luz suave do amanhecer. Sylphiel já tinha ido embora quando acordamos naquela manhã. “Espero que não faça nada muito imprudente...”
“Bom, a própria pessoa disse que tomaria cuidado. No mínimo, fazer as coisas desse jeito significa que não será arrastada para a nossa luta com Rashart na próxima vez que ele nos atacar. Assim sendo, é uma boa decisão, certo?” sugeri.
“No entanto, pelo jeito que estava falando... Ela está apaixonada pelo Mestre Gourry, não é?” Amelia levantou a possibilidade um pouco incerta, apesar do meu tom arrogante.
“Hmm. Um belo palpite, depois de um encontro tão breve.”
“Quero dizer, é meio óbvio... Entretanto apesar de ter dito que não pretende fazer nada estúpido, quando tiver Gourry bem na sua frente, pode acabar agindo sem pensar.”
Urgh, isso era... Infelizmente possível. Sylphiel era bastante propensa à impulsividade. Todavia mesmo que corrêssemos para alcançá-la agora, não mudaria sua tentativa de ficar à nossa frente e chegar a Sairaag primeiro. Caramba, estávamos nos metendo em problemas a torto e a direito... E agora havia outro bem na nossa frente.
Paramos todos no mesmo instante.
Fwsssh... O vento soprava pela grama verde.
Éramos os únicos na estrada, que se estendia em linha reta até um horizonte azul infinito. Como haviam montanhas ao longe até pouco tempo atrás, imaginei que devíamos estar presos em algum tipo de feitiço.
“Uma das barreiras de Rashart!” disse Amelia enquanto examinava a área com atenção.
Não conseguia ver nada além de uma planície plana de grama que crescia até a altura do meu peito. E de repente...
Fwshfwshfwsh! Uma grande ondulação se moveu pela grama à nossa direita como se uma fera enorme a estivesse rasgando. Fosse o que fosse, estava abrindo um caminho caótico, mas sem dúvidas vinha em nossa direção.
“Está chegando!” gritou Zelgadis, e de repente a ondulação parou.
Na mesma hora, senti uma presença hostil atrás de nós. Seria o movimento na grama apenas uma finta? Enquanto entoávamos feitiços baixinho, nós três pulamos em direções diferentes. Um segundo depois, um clarão veio em nossa direção por trás, queimando o próprio vento em seu caminho. Virei-me para encarar sua fonte... E não vi nada além de mais grama balançando ao vento. A malícia que senti antes havia desaparecido por completo.
Será que... Se dissipou? No momento em que pensei nisso, senti a hostilidade outra vez. Mais uma vez vinha das minhas costas... Na mesma direção que a grama se movia antes. Afastei-me por reflexo e me virei para ver...
Vwush! Uma lança de luz atravessou a grama, indo direto para uma Amelia assustada! Ela se esquivou o quanto antes, porém ganhou uma mecha de cabelo chamuscada pelo esforço. O raio de luz então desapareceu no céu azul além.
Viera de dentro da grama. Já havia sentido uma presença hostil ali antes, contudo agora não via nem sentia nada. Teria visto de relance se tivesse se teletransportado, e não houvesse nenhum outro sinal de algo escondido na grama também.
Espere, será que... Comecei a entoar um feitiço.
Raios de luz continuaram a voar em nossa direção, cortando a grama aqui e ali. Amelia e Zel tinham feitiços prontos, embora a incapacidade de ver o oponente os forçou a se concentrar em se esquivar.
E nesse momento... Terminei meu feitiço.
“Zellas Bullid!”
Um raio de luz saiu da ponta dos meus dedos e mudou seu caminho pelo ar de acordo com a minha vontade. Atravessou um pedaço do chão verde em um trecho da grama!
Graaah! Um grito ecoou dentro da minha mente. Houve uma distorção de fração de segundo no cenário ao nosso redor... E pouco depois a visão voltou ao normal, com montanhas distantes e tudo. De fato, a barreira estava quebrada.
“Aquela barreira... O chão, o mundo inteiro dentro dele, era o mazoku, certo, General Rashart?” perguntei, virando-me para o inimigo que esperava ver.
“De fato, era eu.” disse uma voz quando Rashart emergiu de uma ondulação no ar. Como antes, levava sua armadura vermelho-escuro, sua marca registrada. “Bem resolvido. Achei que te daria mais trabalho do que isso...”
A falta de bravata em sua voz sugeria que meu golpe o havia prejudicado. Mas mesmo que tivesse sido em forma de barreira, a ideia de que estive dentro daquele cara por um tempo me enojou um pouco.
“Não importa... Vou ter que te enfrentar cara a cara!” declarou o mazoku, desembainhando a espada em um único movimento suave.
Na hora certa, Amelia lançou seu feitiço.
“Ra Tilt!”
“É inútil!” Rashart rugiu, brandindo sua espada para cima e cortando verticalmente o pilar azul de chamas!
Sem hesitar, Zel disparou um dos seus.
“Ra Tilt!”
Desta vez, o corpo de Rashart foi envolto em uma luz azul de verdade!
“Graaah!”
Seus gritos ecoaram ao nosso redor, porém aquele único golpe não seria suficiente para derrotá-lo. Amelia se apressou em disparar outro Ra Tilt... No momento em que uma segunda presença maliciosa apareceu atrás de nós!
Mordirag?
Que pena para ela, eu já esperava esse tipo de ataque furtivo. Virei-me e lancei o feitiço que pretendia lançar em Rashart.
“Sinalizador Gaav!”
Uma língua de chamas mágicas saltou da minha palma direita estendida e voou em direção ao mazoku branco... Ou pelo menos deveria ter feito isso. No entanto as palavras de poder destinadas a ativar o feitiço apenas se dissiparam inutilmente no vento...
O quê? Meu feitiço não funcionou? Meu encantamento, meus gestos e meu controle mental foram impecáveis. Então, por que...
Enquanto minhas palavras ecoavam vazias, Mordirag disparou várias lanças de luz na direção de Amelia. Por sorte, ela se esquivou de todas com facilidade.
E agora essa, por que meu feitiço não havia sido ativado? Rashart não havia selado minha magia enquanto eu estava em seu espaço de barreira como Mazenda fez uma vez, não é? Isto pedia um experimento rápido! Então, comecei a cantar o cântico do Dragon Slave.
Naquele momento, Amelia terminou seu encantamento e lançou um Ra Tilt em Mordirag.
“Roooooh!” todavia um uivo de Rashart o quebrou em seguida.
Sem hesitar, Zelgadis disparou outro Ra Tilt em Mordirag.
“Você nunca vai conseguir!” Rashart bufou.
Mesmo assim, Zel lançou seu feitiço. Rashart tornou a rugir para proteger Mordirag, mas... Fwoom! Em vez do mazoku branco, o pilar de luz azul engolfou o próprio Rashart!
“O quêêêê?” gritou o general surpreso.
Ah, claro. Zel tinha dado a impressão de que estava mirando em Mordirag, porém seu alvo tinha sido Rashart por sentir sua localização por instinto. Ainda assim, duvido que aquele golpe machucasse o general mais do que o anterior.
“Dragon Slave!” gritei, disparando meu próprio feitiço um instante depois. Uma luz carmesim surgiu do nada, se aglutinando perto de Rashart.
Aha! Funcionou! Embora no fim Rashart parecia estar esperando por essa jogada, pois cortou minha luz carmesim com sua espada mágica um instante depois. Tch! Não vai facilitar, hein?
Ainda assim, o fato de ter usado o feitiço com sucesso significava que minha magia não estava selada, pelo menos.
O que aconteceu, então? Pisquei quando uma ideia passou pela minha cabeça. Será possível?
Isso explicaria tudo... Contudo para ver se minha teoria estava certa, teria que fazer outro teste! Então comecei a trabalhar em um segundo Dragon Slave.
“Tente o quanto quiser, pirralha! Nunca vai funcionar!”
Desviei da onda de choque que Rashart produziu com sua espada e terminei meu feitiço.
“Dragon Slave!”
No momento que entoei...
“Ra Tilt!” Amelia entoou, disparando seu feitiço em Mordirag.
Ótimo! Ela havia programado o tempo de forma intencional para atingir seu alvo ao mesmo tempo! Rashart agora teria que escolher entre abandonar Mordirag e suportar meu Dragon Slave para salvar o mazoku branco. Só que...
“Não tão rápido!” ele rugiu, anulando o pilar azul e a luz carmesim ao mesmo tempo!
O cara extinguiu dois feitiços completamente diferentes em dois alvos diferentes ao mesmo tempo? Droga... Como conseguiu lidar com algo assim? Acho que o título de ‘General do Dragão’ não era só de enfeite.
Apesar de já ter sofrido vários Ra Tilts, Rashart seguia sendo bastante ágil. Embora... Que tal isso?
“Dragon Slave!”
Lancei outro feitiço com determinação em Rashart. Como esperado, o golpe foi bloqueado sem dificuldade, no entanto, sem me deixar abater, comecei a entoar outro.
Enquanto preparava aquilo, obviamente, Amelia e Zel lançavam seus próprios feitiços. Às vezes em Rashart, às vezes em Mordirag. E todos eles eram bloqueados.
Esse padrão continuou por um tempo, e então...
Ok, vamos tentar!
“Dragon Slave!” gritei, disparando pela enésima vez. E depois que Rashart bloqueou este também, fiz questão de dar de ombros e respirar com dificuldade. “Ugh... Minha magia está...”
“O que houve, Lina Inverse?” Rashart gritou triunfante, talvez tendo ouvido meu sussurro. “Você usou todo o seu poder mágico naquele feitiço inútil? Sua tola!” proclamou o mazoku, erguendo a espada.
Amelia começou a entoar um Ra Tilt para tentar me salvar, mas pouco antes de terminar o encantamento...
“Amelia! Por ali!” gritei, apontando para o mazoku branco atrás de mim.
Ela rapidamente mudou seu alvo de Rashart para Mordirag. Se minha teoria estivesse mesmo correta...
“Ra Tilt!”
Desta vez, o pilar de chamas azuis engoliu o corpo de Mordirag com sucesso!
Eu sabia!
“Gruuuuungh!” com um gemido como o uivo de uma fera moribunda, o mazoku branco foi consumido pela luz.
“Não! Mordirag!” gritou Rashart, arrependido. “Tch! Vou fazê-los pagar por isso um dia!” ele cuspiu, e então olhou feio para Amelia enquanto desaparecia no ar... Justo como esperei que fizesse.
Com a batalha aparentando estar encerrada, Amelia e Zel ficaram ali, desconfiados, enquanto eu sorria confiante.
“O que está acontecendo aqui?” Zelgadis perguntou, lançando-me um olhar duvidoso após um período de silêncio. Amelia, por sua vez me encarava, esperando por respostas.
A curiosidade deles era compreensível. A maneira como Rashart e eu lutamos desta vez não fazia sentido. Passei a última metade da luta disparando uma série ininterrupta de Dragon Slaves sem pensar, e Rashart não conseguira defender Mordirag no momento mais crucial.
“Acho que encontrei um jeito de derrotar Rashart.” anunciei com um leve sorriso irônico.
———
A estrada de lajes subia e atravessava uma colina baixa. À minha direita, havia uma pequena floresta. Montanhas ainda eram visíveis à distância, porém, fora isso, havia campos de trigo por toda parte. Assim que chegasse ao topo da colina, teria o primeiro vislumbre da cidade.
Banhada pelo suave sol da tarde, continuei sozinha pela estrada. Sim, você leu certo. Sozinha.
Veja bem, enviei Amelia e Zel na frente para alcançar Sylphiel. Imaginei que poderia facilitar as coisas para mim. Os dois partiram no dia seguinte ao nosso último ataque, e passei os últimos três dias desde então sozinha.
Enquanto seguia pela estrada deserta, parei de repente. Percebi que já tinha passado por aqui antes. Foi quando Gourry e eu estávamos a caminho de Sairaag e fomos emboscados bem aqui... Nossa, esse lugar era amaldiçoado ou o quê?
“Posso sentir sua hostilidade a quilômetros de distância, meu caro General. Se era para ser uma emboscada, não posso te dar uma nota de aprovação.” sussurrei para o vento.
“Não vejo sua pequena escolta.” respondeu uma voz atrás de mim.
Virei-me, minha capa esvoaçando na brisa, e olhei para o General do Dragão. Sua armadura vermelha se destacava entre toda a vegetação.
“Eu os enviei para Sairaag antes de mim. É um pouco mais difícil para nós nos soltarmos com eles por perto.” falei.
“Oho.” um largo sorriso surgiu no rosto de Rashart. “Então resolveu dar as mãos para a morte?”
“O oposto. Se me esforçar ao máximo, sou mais do que suficiente para lidar com gente como você.”
“Está blefando. Contudo e de qualquer forma...”
“É! Deveríamos resolver essa luta agora!” proclamei. No instante seguinte pulei para trás para ganhar alguma distância e comecei a entoar um feitiço.
“Muito bem! Vamos começar!” Rashart estendeu a palma da mão esquerda, enviando uma grande quantidade de orbes mágicas em minha direção!
Pulei para o lado. Um momento depois, os orbes explodiram contra as lajes aos meus pés, deixando inúmeros buracos no chão.
Certo! Vamos acabar com isso agora!
“Dragon Slave!”
“Já disse que é inútil!” Rashart zombou.
Mal sabia ele que não era meu alvo desta vez. A luz carmesim que invoquei se fundiu no chão abaixo dos seus pés! Kra-koom! A explosão subsequente sacudiu o ar e agitou a grama. Obviamente não machucaria um mazoku puro como Rashart. Todavia não tinha terminado.
Antes que todo o barulho e reverberação cessassem, investi contra o general através da poeira rodopiante, entoando meu próximo feitiço enquanto corria. Quando emergi do outro lado, Rashart estava quase na minha frente.
“Tola! Achou que poderia me cegar?” ele zombou.
Sua espada foi erguida para liberar outra onda de choque. Ele queria que eu me esquivasse para que tivesse um momento para se recompor... No entanto não ia lhe dar essa chance!
Continuei investindo, ganhando velocidade... E então fechei os olhos!
“O quê?” Rashart gritou surpreso.
Se a sua onda de choque tivesse me atingido naquele momento, eu teria sido morta. Mas...
Vwnn! Ele a liberou após um momento de hesitação, e ela passou direto pela minha orelha direita.
Só para deixar claro, não foi meu comportamento inesperado que o despistou. Foi por não querer me atingir.
Quando abri os olhos de novo, vi Rashart parado diante de mim, tremendo de medo. Porém não hesitei em lançar meu feitiço!
“Lâmina Ragna!”
Vrum! A espada negra que conjurei atravessou o peito de Rashart desta vez.
“Você... Como...”
“Você é meio que um péssimo ator, suponho.” falei com um sorriso triunfante enquanto ele me olhava em agonia. “Embora penso que não é justo compará-lo a Xellos e Fibrizo, General do Dragão. Ou devo usar outro nome? Já que agora é o cachorrinho do Mestre do Inferno e tudo mais.”
“O quê?”
Isso mesmo. Rashart não estava agindo em busca de vingança para o Dragão do Caos. Estava me seguindo sob as ordens do Fibrizo.
Como descobri? Havia muitas coisas que pareciam estranhas. Se Rashart quisesse de fato me matar para se frustrar o Mestre do Inferno, não havia necessidade de erguer uma barreira em Ruald e depois seguir rastros quando eu a destruísse. Com os planos do Dragão do Caos indo por água abaixo, a maneira mais fácil de Rashart me derrotar teria sido explodir a cidade e fugir do local... Que se danem os danos colaterais.
Contudo, por algum motivo, sempre que acabava encurralada ou com pouco poder mágico, Rashart inventava um motivo para se retirar primeiro. Foi o mesmo na nossa última luta. Quando minha magia tinha quase se esgotado, o general chegou a sacrificar Mordirag para ter um motivo para recuar. Além do mais, sempre esperava alguns dias antes de reaparecer... Em outras palavras, tempo suficiente para que me recuperasse tanto física quanto magicamente.
Além do mais, apesar de toda a sua conversa sobre querer me matar, sempre que cruzávamos lâminas, seus ataques eram concentrados de forma excessiva em Amelia e Zel, lançando apenas ataques superficiais em minha direção. É preciso um péssimo ator para fazer uma atuação tão ruim.
No entanto o que me convenceu de vez da minha teoria foi o simples fato de que meu feitiço Sinalizador Gaav havia falhado. Este feitiço consumia o poder do Dragão do Caos Gaav, então, se fracassasse, significava que o cara estava morto. É verdade que não sei dos detalhes que levam mazokus a servirem a outros mazokus, entretanto considerando o quão devotos Rashart e Raltark eram ao Dragão do Caos Gaav que se voltaram contra Olhos de Rubi por ele, parecia que eram completamente leais ao seu progenitor. O próprio Dragão do Caos era a única exceção a esse padrão de comportamento, graças à vontade humana que se mesclou em sua existência.
Dito isto... Se o Dragão do Caos Gaav se foi para sempre, a quem Rashart servia gora? A resposta era simples. O rei de todos os mazokus do nosso mundo... O Lorde das Trevas do Norte, Olhos de Rubi Shabranigdu, e o Mestre do Inferno Fibrizo, seu ardiloso segundo em comando.
“Vejo que meu palpite está certo!” sussurrei, movendo a lâmina negra para o lado.
“Raaaaaaaaaaagh!” o grito mortal de Rashart abalou o próprio ar. Seu corpo se dissolveu em incontáveis flocos de neve vermelhos, que se espalharam pelo campo verde.
E com isso, o General Rashart, primeiro fantoche do Dragão do Caos Gaav e depois do Mestre do Inferno Fibrizo... Enfim encontrou seu fim anônimo.
Descobrir que ele agora era o servo do Mestre do Inferno me deu a confiança de que não me mataria, mesmo que me encontrasse sozinha. Foi por essa razão que enviei Amelia e Zel na frente e enfrentei o general por conta própria.
Apesar disso, sabia que se usasse a Lâmina Ragna sem alguma estratégia prévia poderia ter meu ataque esquivado. Foi por esse motivo que comecei com um Dragon Slave para me aproximar e esconder o feitiço que estava entoando. Assim, fechando os olhos quando o alcancei, o lancei em um momento de incerteza. Ele errou intencionalmente a onda de choque subsequente, esperando que me assustasse... Mas aproveitei ao máximo sua hesitação e investi para desferir o golpe fatal.
Ainda assim, isso deixou claro de uma vez por todas o que o Mestre do Inferno buscava. Por que diabos mandaria Rashart atrás de mim daquele jeito? Para me levar ao limite, é claro. Uma pena que Rashart não conseguiu estar à altura do papel.
Porém...
Voltei meu olhar para a estrada que subia a colina. Além dela ficava Sairaag, a antiga Cidade dos Mortos. Esperando por mim lá... Estava o próprio Mestre do Inferno.
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