Capítulo 10: Agora é sério! Uma batalha final pela sobrevivência
Hmm... Eu não tinha certeza do que fazer. Estava claro que havíamos chegado a um ponto de virada, mas a forma exata das coisas ainda me escapava.
Após a luta até a morte de Gourry e Rod, conseguimos salvar a vida de Lantz e levá-lo a um médico mágico próximo. Eu mesma tratei o ferimento no braço de Gourry com um feitiço, e agora voltamos para a mansão de Talim...
Estava sendo uma noite e tanto.
Não tinha muitas provas que apoiassem minha teoria de ‘Talim é o responsável’, e o que Rod disse sobre a parceria com Halciform estava realmente me incomodando. Marchei de volta para a casa de Talim esperando que pudéssemos encontrar alguma evidência real... E foi o que fizemos.
“O que isso significa, Lina?” Gourry sussurrou.
Apenas balancei minha cabeça. Não fazia ideia de como explicar o que estava acontecendo.
Pois entre os móveis espalhados e quebrados havia um corpo corpulento vestido com vestes roxas. Só poderia presumir que era Talim, o Roxo.
Por que tive que presumir, você pergunta? Simples, na verdade... O cadáver não tinha cabeça.
———
“O que diabos está acontecendo aqui?”
“Queria saber também.”
Enquanto caminhávamos juntos pela estrada noturna, Gourry fazia a mesma pergunta e eu dava a mesma resposta.
Claro, tinha teorias para dias.
Talvez, apesar de suas garantias, Mestre Halciform realmente tivesse perdido a paciência e enviado assassinos atrás de Talim. Ou talvez o cadáver no chão tivesse sido decapitado para esconder o fato de que era um dublê, e o verdadeiro Talim ainda estivesse por aí em algum lugar. Ou talvez Rod mencionando uma aliança com Halciform fosse apenas uma manobra para nos despistar.
Porém, tudo não passava de especulação, e foi por esse motivo que estávamos a caminho da casa de Halciform.
“Ir para a casa do Halciform vai resolver as coisas?” Gourry perguntou.
“Não sei.” dei uma resposta vaga.
“Não sabe?”
“Podemos não descobrir nada ou podemos descobrir tudo. Contudo não saberemos até irmos lá.”
“Isso realmente não esclarece as coisas.”
“Vamos ao Halciform para esclarecer as coisas. Supondo que possamos conseguir uma entrada furtiva com sucesso...”
“Estamos entrando furtivos? Espere, por quê?” Gourry perguntou, chocado.
Percebi que já estava esfregando minhas têmporas.
“Olha... Se Rod disse a verdade e Halciform foi quem enviou assassinos atrás de Talim, acha mesmo que podemos só entrar pela porta da frente e perguntar se fez aquilo e esperar que ele confesse?”
“Bem, ele parecia um cara muito amigável...”
Oh, por favor! Decidi largar a discussão. Em parte porque conversar com Gourry era exaustivo, no entanto o mais importante motivo foi... Chegamos à propriedade de Halciform.
Não havia segurança no pátio. Seguimos para trás da casa e procuramos uma maneira de entrar. Os terrenos eram bem cuidados. Pássaros noturnos cantavam suavemente nas árvores.
“Que tal aqui?” sussurrei, apontando para uma janela do porão.
Não é muito grande. Parecia grande o suficiente para eu passar, embora Gourry fosse uma história diferente.
“Ok, vou entrar e verificar as coisas. Não farei nada estúpido e voltarei em seguida. Então espere aqui, ok?” falei num tom enquanto piscava para Gourry.
“E-Espere!” Gourry protestou alarmado. “Você vai sem mim?”
“O que? Com medo de ficar sozinho?”
“Não, é só... Eu deveria estar lá só para garantir...”
“Oh, não se preocupe. Não vou lançar um Dragon Slave nem nada.” assegurei a ele, acenando com a mão com desdém.
“Não era isso que queria dizer...” Gourry murmurou.
Espere, ele estava...?
“Diga, está preocupado comigo?” perguntei.
“E daí se estiver?” Gourry devolveu a pergunta, desviando o olhar enquanto coçava o nariz sem jeito.
“Gourry... Você está apaixonado por mim?” perguntei sério.
“Ok, certo!” ele declarou em uma agitação repentina. “Eu sou seu guardião, nada mais... Por que não deveria me preocupar?”
“Sim, está bem! Posso vê-lo corando, seu grande idiota!” brinquei, cutucando-o com o cotovelo.
“Ei, pare com isso! Mas falando sério... Por que tem que ir sem mim?”
“Bom, não há como você passar pela janela, certo?”
“Não é verdade.”
Nesse momento, Gourry tirou a espada do cinto. Houve um brilho prateado no escuro e...
Ching!
Então embainhou a espada de volta sem emitir qualquer som.
“O que acha que está fazendo?” perguntei.
Em vez de responder, colocou a mão na moldura da janela com um sorriso e deu um leve puxão. A janela inteira, com moldura e tudo, saiu perfeitamente.
“Wow...”
Se tivesse cortado a janela de qualquer jeito, tudo teria caído no porão com estrondo. Ouvi dizer que, ao decapitar criminosos, os melhores algozes cortam tudo, exceto uma pequena tira de carne, para evitar que a cabeça voe. O que Gourry acabara de fazer exigia a mesma habilidade... Mas, sim, desculpe pela analogia nojenta.
“Se tirar minha armadura, talvez consiga caber agora, certo?” ele perguntou com um pequeno sorriso.
———
Nossa única fonte de luz lá dentro era uma estreita faixa de luar que entrava pela janela. Ficamos parados por um tempo, deixando nossos olhos se acostumarem à escuridão. Sabia que era bem provável que não conseguiria lançar um feitiço de Iluminação sem sermos pegos.
A maior parte das casas deveria estar dormindo a esta hora, porém se Halciform foi quem enviou Rod para a propriedade de Talim... Não havia como estar dormir tranquilo sabendo que seu assassino não havia retornado.
É verdade que não havia muito que eu pudesse fazer enquanto estivesse quase impossibilitada de ver. Embora meus olhos estivessem se ajustando aos poucos, o melhor que consegui abstrair foi ‘talvez seja uma mesa’ ou ‘parece uma prateleira’. De jeito nenhum eu poderia fazer uma varredura séria desse jeito.
“Vai ser difícil.” sussurrei em voz baixa. “E você, Gourry? Sua visão é boa. Viu alguma coisa que pareça suspeita?”
“Alguma coisa que pareça suspeita você diz...” ele disse com uma careta. “Consigo ver muitas coisas que parecem ferramentas mágicas... Contudo não tenho ideia do que seria ‘suspeito’.”
Verdade. Gourry basicamente não tinha nenhum conhecimento de magia. Hmm... Agora que pensei sobre, foi bobagem da minha parte ter o perguntado em primeiro lugar.
Dei outra olhada ao redor por mim mesma. Móveis e pequenos objetos estavam amontoados, enchendo a sala com vagas formas pretas.
O que é aquilo?
Uma área aparentemente aberta chamou minha atenção. Aproximei-me, tomando cuidado para observar cada passo.
As coisas estavam espalhadas por todos os outros lugares, em todas as superfícies e por todo o chão, no entanto não aqui. Uma grande tapeçaria pendurada na parede sobre uma mesa de madeira... Sem nada em cima ou embaixo dela. Curiosamente, se as luzes estivessem acesas, poderia ter escapado por completo da minha atenção em meio a toda a desordem.
‘Escondida à vista de todos’ como dizem.
Por que este era o único lugar limpo na sala? Havia duas respostas possíveis: ou tinha sido arrumado há pouco tempo ou era usado com frequência.
Afastei a mesa evitando o máximo que pude em fazer algum barulho e puxei a tapeçaria que estava atrás dela. Passei a mão pela parede até que meus dedos pegaram alguma coisa. Tracei sua forma e descobri o contorno de uma porta.
Bingo! Outro caso do meu bom carma no trabalho.
Ainda assim, não havia como saber se o que quer que estivesse além daquela porta tinha alguma coisa a ver com o mistério em questão. Pra ser honesta, não havia nada de incomum no fato de um feiticeiro ter quartos escondidos e coisas do gênero em sua casa, afinal. E eu não estava entusiasmada com a ideia de invadir o covil secreto de um colega feiticeiro sem motivo.
Veja, a maioria dos feiticeiros está envolvida em algum tipo de projeto. Talim estava estudando linguagem mágica, por exemplo (segundo o próprio), enquanto Halciform pesquisava a vida. E, mantendo a regra de que todo barril tem suas maçãs podres, alguns feiticeiros gostam de roubar para si as pesquisas dos outros.
Para evitar esse tipo de coisa, então, os feiticeiros construíam com frequência salas ocultas dentro de suas casas e se escondiam lá para fazer suas pesquisas. (Não era na verdade um estilo de vida saudável, embora não pudesse culpá-los.) O que havia atrás desta porta poderia ser apenas um desses centros de pesquisa... Entretanto nunca saberia até dar uma olhada por mim mesma.
“Gourry! Por aqui!” chamei.
Gourry caminhou até mim com tanta confiança quanto caminharia por uma rua em plena luz do dia. Parecia que conseguia enxergar muito bem, mesmo numa escuridão como esta.
“Parece que há uma porta escondida na parede. Talvez tenha um interruptor para abri-la em algum lugar, mas levará uma eternidade para encontrá-lo no escuro. Acha que pode só cortá-la como fez com a janela antes?”
“Está brincando comigo?”
“Shhh! Fale baixo!”
“Droga, desculpe... Isso parece um pouco extremo! Nem sabemos ao certo se foi Halciform quem enviou Rod para a casa de Talim ainda.”
“É verdade, porém... É por isso que estamos aqui, para descobrir, e esta porta está entre nós e as respostas. Se não for nada, podemos apenas pedir desculpas mais tarde. Tenho certeza que ele entenderá.”
“Mesmo assim...”
“Escute, ficar sentado coçando a cabeça não vai nos levar a lugar nenhum.”
“Não posso negar, contudo... Meu Deus...” ele suspirou, desembainhando a espada no quadril. “Afaste-se.”
“Ei, espere um segundo!” falei para detê-lo antes de entoar um feitiço que fez o ar ao nosso redor se agitar.
Era uma versão ligeiramente melhorada da barreira contra o vento usada em feitiços como Lei Asa, e impediria que qualquer ruído gerado no interior saísse. Poderíamos derrubar uma mesa inteira cheia de louças e o máximo que alguém lá em cima diria seria: “Ei, você ouviu alguma coisa?”.
“Ok, vamos lá.”
Gourry assentiu. Sua espada brilhou. Um segundo depois, a parede cortada caiu para dentro.
Crashabang!
Foi uma grande comoção, no entanto qualquer pessoa fora da barreira contra o vento não deveria ser capaz de ouvir nada. Além do mais, estávamos no porão. Contanto que não houvesse ninguém logo atrás da porta que acabamos de derrubar, ninguém na casa deveria perceber.
“Wow...” comentei.
“Caramba...” Gourry disse ao mesmo tempo.
Além da parede estendia-se um longo corredor. A luz fraca irradiava do teto e do chão. Achei que poderia ser algum tipo de musgo luminescente, do tipo que cresce em cavernas, entretanto quando olhei mais de perto, pude ver que a rocha desconhecida que compunha a estrutura estava brilhando. Era como se tivesse misturado musgo luminescente com algum tipo de lama e depois moldado no teto e no chão.
Cobri a saída com a tapeçaria de novo antes de prosseguirmos. O corredor revelou-se muito mais longo do que imaginei e descemos por ele em passos silenciosos. Não havia garantia de que Halciform não estivesse por aqui.
Não havia outros caminhos no longo corredor. Nós apenas caminhamos, viramos uma esquina e andamos mais um pouco. Depois de uma segunda esquina e mais um pouco de caminhada, o trajeto enfim teve uma abrupta parada em uma porta dupla logo à direita do beco sem saída. Não parecia estar trancada e não havia sinal de ninguém lá dentro.
“Vamos entrar.” disse Gourry, colocando a mão na maçaneta. Balancei a cabeça em concordância silenciosa.
Sem hesitar, ele abriu as portas...
“O que...”
Nós dois congelamos no lugar.
A sala era grande, poderia até chamá-la de cavernosa. A câmara ritual na casa de Daymia era grande, porém esta sala facilmente a ofuscava. Também havia uma pilha alta, quase até o teto, de aquários de cristal e ferramentas mágicas para experimentos grandes e pequenos. Contudo a visão chocante diante de nós não foi a instalação ou o seu tamanho... Foi o que flutuava dentro dos aquários.
Lobos cobertos de escamas e espinhos roxos. Homens carecas com rostos idênticos. Todos dormiam pacificamente, suspensos na ‘água da vida’... Uma espécie de fluido cultural rico em nutrientes. Estes eram sem dúvida os soldados do exército de homúnculos que Seigram liderou para atacar a propriedade de Talim.
“O-O que essas coisas estão fazendo aqui?”
“Isso é o que eu gostaria de saber...”
Nossos olhos permaneceram fixos nos tanques enquanto avançávamos mais fundo na sala, como se estivéssemos sendo atraídos para lá.
Havia mais exposições de quimeras no caminho. Cobras venenosas aladas, peixes carnívoros com pernas insetoides, fusões troll-dragão e outras criaturas perigosas. Todos tinham uma coisa em comum: foram claramente projetados para a batalha. As criaturas bizarras que vimos na casa de Daymia eram assustadoras, no entanto essas feras tinham um ar muito mais brutal.
E... O próprio fato de eles estarem aqui sugeria que Halciform era seu criador. Com certeza ninguém mais trouxe todos até aqui. O que significava que Halciform foi quem incitou os homúnculos na casa de Talim nas duas vezes. E isso significava...
A trama estava se complicando mais uma vez. O que estava acontecendo aqui?
“Oh, aí está você, minha querida.” uma voz abafada de repente chamou atrás de nós.
Eu me virei, mas não vi ninguém.
“O que os traz aqui agora?” a voz perguntou.
Foi abafada, todavia familiar... E embora não tenha demorado muito para encontrar sua fonte, levei um minuto para compreender ao certo o que estava olhando. Quando me atingiu, minhas pernas cederam e caí no chão.
“O que há de errado, Li...” Gourry também ficou em silêncio quando percebeu o que estive olhando.
“Bem, não posso culpá-los por estarem chocados.” disse a voz.
Vinha de um aquário um pouco maior do que aqueles que você usaria para peixes dourados. Estava cheio até a borda com a água da vida, com incontáveis tubos saindo de dentro.
E dentro... Estava a cabeça viva de Talim, o Roxo.
“T... Ta...” falei, ainda caída no chão. Não conseguia formar a palavra.
Sua cabeça decepada piscou para mim, de alguma forma com mais charme do que ele jamais conseguiu antes da decapitação.
“Isso mesmo, sou eu. Embora possa parecer bem diferente agora, ainda sou o verdadeiro... Talim, o Roxo.”
“Mas... Mas...” Gourry gaguejou, lutando sua própria batalha pelas palavras.
“Mas o quê? Ah, sim, claro. ‘Como isso aconteceu com você?’ Então vocês ainda não descobriram, hmm?”
Gourry assentiu enfaticamente.
P-Porém... Ok, sim. Não sabia como Talim tinha acabado desse jeito, contudo como ele poderia falar a respeito com tanta calma, como se nada estivesse errado?
“Deixe-me ver... Por onde devo começar?” sua cabeça olhava para fora do aquário, para longe. “Agora percebo que meu maior erro foi não confiar em vocês dois o suficiente para contar a história completa. Tenho certeza de que ele lhes contou quando o libertaram da barreira de Daymia que Daymia e eu trabalhamos juntos para selá-lo.”
“Quer dizer... O Presidente Halciform?” consegui recuperar o suficiente da minha sanidade para perguntar. Minha voz seguia estando um tanto rouca.
Gourry permaneceu congelado. O silêncio reinou por um momento. A cabeça de Talim talvez estivesse tentando balançar a cabeça.
“Sim... E embora não possa negar que Daymia e eu conspiramos, com certeza já deve ter se perguntado por que apenas não matamos o presidente se o queríamos fora do nosso caminho.”
“Sim, estive considerando a ideia... No entanto não poderia exatamente só perguntá-lo sobre.”
“Seria de fato uma coisa estranha de perguntar a alguém. Porém, veja bem, a verdade é... Não é que não quiséssemos matá-lo. É que não conseguimos.”
O que no mundo...?
Parecendo ler a pergunta no meu rosto, Talim continuou.
“Você me perguntou uma vez sobre o assunto da pesquisa de Halciform... Respondi nos termos mais vagos e disse que estava estudando a vida. Contudo, para ser mais específico, era a imortalidade.”
“Ahh...” deixei escapar um pequeno gemido. “Então esse era realmente o campo de Halciform, não de Daymia?”
“Não, Daymia tem interesses semelhantes. Foi Halciform quem promoveu Daymia ao seu cargo no conselho, sabe. O mais provável é que fosse algum tipo de acordo oculto. ‘Ajude-me com minha pesquisa e o nomearei vice-presidente’. A magia poderosa de Daymia, seu pensamento não convencional... Talvez Halciform tenha pensado que poderia levá-lo a um avanço. Contudo, eis que estava errado. Daymia estava muito focado em suas quimeras bizarras e asquerosas para produzir qualquer resultado útil. Meu entendimento é que eles tiveram uma espécie de desentendimento, que foi quando descobri a verdadeira natureza da pesquisa de Halciform.”
“A verdadeira natureza de sua pesquisa?”
“Sim. Ele nos disse que estava pensando em prolongar a vida humana, preservando a boa saúde... Esse tipo de coisa. No entanto um dia, um feiticeiro bateu à minha porta e disse ter se infiltrado na mansão de Halciform para roubar seu trabalho. Esse feiticeiro disse que descobriu algo grande e terrível no processo: que Halciform não estava pesquisando a vida natural, mas a vida eterna. Tudo indica que o presidente conseguiu colocar as mãos em pergaminhos de séculos atrás, quando a pesquisa sobre a imortalidade estava na moda, e assim começou a experimentar os vários métodos registrados nestes.”
“Experimentando? Quer dizer...”
Talim fechou os olhos e disse.
“Isso foi bem na época em que uma praga de desaparecimentos misteriosos se abateu sobre a cidade.”
Não!
“Você pode imaginar o que passou pela minha cabeça quando ouvi a história do feiticeiro.”
Balancei a cabeça engolindo em seco.
“Do que ele está falando?” Gourry perguntou.
“Está dizendo que...” expliquei, meus olhos ainda colados na cabeça flutuando no aquário. “Halciform estava sequestrando moradores locais para usar em sua pesquisa sobre a imortalidade.”
“O quê?”
“Silêncio! Fale baixo! Ainda estamos no porão do cara...”
“Ce-Certo...”
“Então? Você investigou?” questionei Talim.
“É óbvio. Halciform admitiu que usou várias cobaias, embora não tenha dito uma palavra sobre se eram moradores desaparecidos da cidade ou só homúnculos que havia criado para esse propósito. Então enviei alguém para se infiltrar em sua casa...”
Eu não tinha certeza de como me sentia sobre a implicação de que ‘usar pessoas da cidade era ruim, mas usar homúnculos não era grande coisa’... Porém agora não era hora para um debate moral. Decidi manter minha boca fechada e ouvir o resto de sua história.
“No final...” Talim manteve os olhos fechados dentro do tanque por algum tempo antes de reunir coragem para terminar a frase. “Foi justo como temia.”
Eu involuntariamente engoli novamente.
“Na verdade, foi muito pior... Ele já havia adquirido uma espécie de imortalidade improvisada.”
“‘Imortalidade improvisada’?” o suor frio escorria pelas minhas costas enquanto a imagem da máscara branca de Seigram passava pela minha mente. “Quer dizer... Um contrato com um mazoku?”
A expressão sombria de Talim confirmou minha suspeita.
Antigamente, alguns feiticeiros faziam pactos de ‘imortalidade’ com mazokus. Os registros decrépitos daquela época tornavam impossível discernir os detalhes exatos, entretanto parecia que o que eles adquiriram foi um mero paliativo, e não a verdadeira imortalidade.
Ao que parece, aqueles que fizeram pactos de imortalidade selaram suas almas em algo chamado Pedra do Juramento. Os destinatários desta quase imortalidade parariam de envelhecer quando fizessem o juramento e não poderiam mais morrer devido a lesões físicas. Todavia, se a Pedra do Juramento for destruída, o pacto seria desfeito. O mesmo aconteceria se o mazoku com quem fez o pacto fosse aniquilado... O que explicava por que Seigram evitou lutar contra nós.
“Quando soube disso... Procurei documentos do apogeu da pesquisa sobre a imortalidade, procurando uma maneira de derrotá-lo. É claro, pensei em consultar o conselho e o Duque Litocharn... No entanto eles não estavam mais bem equipados para deter Halciform do que eu. Afinal, há um número limitado de maneiras de lidar com ele.”
“Matar o mazoku ou destruir a Pedra do Juramento, certo?”
“Ooh...” Talim disse, com os olhos arregalados. “Estou impressionado com o seu conhecimento. Mas há outra maneira...”
O quê? Isso é impossível.
“Interferência de um mazoku de posição superior à do realizador do pacto. Um feitiço invocando o poder de Olhos de Rubi, o soberano das trevas deste mundo... Em outras palavras, um Dragon Slave, poderia destruir Halciform.”
“Um... Um Dragon Slave? Uh, é mais fácil falar do que fazer...”
Dragon Slave é o feitiço mais poderoso de toda a magia negra, basicamente do mundo. Porém...
Talim me olhou direto em meus olhos e perguntou.
“Você pode usar, não pode, Lina Inverse? Acredito que possa...”
“Claro, contudo se o lançar no meio da cidade...”
“Sim, estou ciente.” disse ele com um suspiro (ou bem, o melhor de um suspiro que conseguiu quando estava com a cabeça submersa na água). “Fará bem mais do que apenas explodir esta mansão. Já o vi ser usado uma vez e é absurdamente poderoso... Poderia destruir perto de metade da cidade. No entanto, senhorita, não creio que a vida eterna seja o limite de seus planos. Seja lá o que for que está planejando, temos que detê-lo.”
Gulp... Engasguei uma pequena lufada de ar.
“M-Mas... Se conseguir encontrar e destruir a Pedra do Juramento podemos pular as opções mais perigosas, certo?”
“Sim, com certeza. É verdade, só que... Precisa encontrá-la primeiro e nem sabemos como é. Foi por essa razão que tentei Daymia, cujo relacionamento com Halciform havia esfriado bastante naquele ponto, com a oferta da presidência... E juntos selamos Halciform.”
“Exceto que Halciform nos manipulou para deixá-lo recuar...”
Mordi meu lábio. A forma das coisas estava enfim ficando clara para mim. Halciform usou algum método, o mais provável que fosse sua telepatia, para pedir a Seigram que encontrasse um humano com o poder e o conhecimento para libertá-lo da barreira. Acontece que eu fui a garota de sorte.
Então, quando descobriram que não tínhamos planos de nos envolver na situação, os mazokus vieram até nós para nos alertar para não nos envolvermos, o que, por outro lado, despertou meu tipo único de curiosidade teimosa. Então, mais uma vez com a ajuda de Seigram, Halciform nos atraiu para a casa de Daymia...
Talvez sua intenção fosse que matássemos Daymia, depois disso nos chamaria via telepatia e nos faria destruir a barreira. Embora as coisas não tenham corrido conforme o planejado, Halciform ainda conseguiu nos enganar para que o libertássemos.
“No momento em que foi libertado, contratou Rod e atacou minha casa com sua horda de homúnculos assassinos. Ele se aproximou de mim com um sorriso e disse: ‘Como agradecimento por todo o seu serviço, permitirei que ajude em um pequeno experimento meu’. Em seguida, tomou minha cabeça e, quando dei por mim, estava suspenso neste limbo. Suspeito que Daymia acabou em uma situação semelhante.”
A imagem de Daymia, amaldiçoado a viver como uma massa de carne se contorcendo, passou pela minha mente.
“Não se culpe por isso, senhorita.” encorajou Talim. (Fale sobre um pedido absurdo.) “Nós todos fomos manipulados. Nem Daymia nem eu percebemos que era o Halciform selado estimulando nossa briga. E apesar de reconhecer sua capacidade, escondi de você a verdade por medo de prejudicar a reputação do conselho. Esse foi meu único erro verdadeiro. Mas acredito que possa fazer o que não consegui. Você pode derrotá-lo.”
“Eu vou.” falei com um aceno firme. “Juro.”
“Bom. Agora, não posso fazer muito para ajudá-la neste estado. Nem sequer tenho um conselho adequado... Porém desejo boa sorte. Oh, e mais uma coisa. Antes de sair daqui, poderia me fazer um favor?”
“Claro. O que precisar.”
“Poderia remover aqueles tubos de aparência irritante que saem do aquário?”
Meu queixo caiu. Não sabia o que dizer. Aquele feixe de fios coloridos era a única coisa que o mantinha vivo. Talim com certeza sabia disso...
O que significava que estava nos pedindo para matá-lo.
“Eu...” comecei, minha voz quase um sussurro. “Não posso fazer algo assim.”
“Por favor, minha querida...” pediu Mestre Talim.
“Mas... Mas eu...”
“É verdade que sigo podendo falar e pensar. Contudo toda vez que respiro, respiro água, e as terríveis vibrações são uma tortura quando falo. Estou preso aqui sem meus amados charutos ou mesmo uma boa refeição. Que significado há em uma vida como esta? Talim, o Roxo, já está morto, minha querida.”
“No entanto... Ainda assim...”
Queria discutir, dizer que seguia estando vivo e que só isso já valia alguma coisa... Entretanto naquele momento senti uma presença hostil atrás de mim.
“Saia daí, senhorita!” Mestre Talim exclamou com os olhos arregalados.
Gourry me puxou para o lado quando uma rajada de vento destrutiva atingiu o local onde eu estava. O ataque rasgou minha capa balançando atrás de mim e destruiu o aquário que mantinha Mestre Talim.
Soltei um grito sem palavras.
“Ah, errei. Hahaha... Se ele não a tivesse avisado, tenho certeza de que teria acertado meu alvo.” disse uma voz alegre demais para a violência que emanava.
Voltei-me devagar para identificar sua fonte.
O Presidente do Conselho, Halciform, o Branco, ficou ali em silêncio, com o sorriso brilhante de sempre. Raiva e loucura dançavam em seus olhos.
“Vamos... Não me olhe assim. Apenas queria lhe conceder uma morte rápida... Embora pareça que perdi uma valiosa cobaia por causa do meu problema.”
“Cobaia?” gritei com voz rouca, dando um passo em sua direção. Gourry, ao meu lado, já havia desembainhado a Espada da Luz.
“Oh? Não gosta que eu chame aquela cabeça falante de cobaia?”
“Não... Não gosto nem um pouco.”
“Entendo. Mas...” os olhos de Halciform se estreitaram enquanto os cantos de sua boca se curvavam em um sorriso torcido. “O que pode fazer sobre isso?”
Por que você...!
Saltei para frente, invocando em um curtíssimo tempo e lançando um feitiço.
“Flecha Flamejante!”
Uma dúzia de flechas incandescentes voou direto para Halciform, que não moveu um músculo. Cada uma delas o atingiu de frente, rasgando seu corpo.
Passei correndo por ele de um lado, e Gourry passou correndo pelo outro com um lampejo de sua espada, que cortou direto o torso de Halciform. Então corremos pelo corredor sem olhar para trás. Podíamos senti-lo bem em nossos calcanhares.
“Droga! Realmente não da pra matá-lo, hein?” Gourry gritou.
Sabia, racionalmente falando, que Halciform não poderia morrer até que a Pedra do Juramento fosse destruída... Porém uma coisa era saber e outra totalmente diferente era fazer.
Podia ouvir um canto fraco atrás de mim. Dado o ritmo do encantamento...
Me apressei e comecei a fazer um contrafeitiço, olhando para trás em seguida. Aha, sabia! Estava vindo com uma Flecha Flamejante. Olho por olho, justo como imaginei! Estendi minha mão esquerda para trás...
“Mariposa Valim!”
A bola de luz branca e brilhante que liberei traçou um arco errático no ar enquanto interceptava as Flechas Flamejantes de Halciform.
“O quê?” Halciform gritou, parando no meio do caminho.
Um certo alguém me ensinou esse feitiço. Foi originalmente projetado para extinguir chamas, porém o meu teve algumas atualizações. E como feitiços do tipo fogo, como Bola de Fogo e Flecha Flamejante, eram tão populares como magia de ataque, era uma magia ainda mais útil.
Gourry e eu não perdemos um segundo correndo pelo corredor.
No instante em que voltamos ao porão principal, disparei um par de feitiços Dam Blas para fechar o corredor atrás de nós. Isso deve nos ganhar algum tempo... Tempo mais do que suficiente para escapar, embora não o suficiente para encontrar a Pedra do Juramento.
Para começar, nem fazia ideia de como era a coisa. Era um objeto mágico, então devia ter propriedades mágicas... Contudo isso não era o suficiente. Encontrá-la com tão poucas informações seria quase impossível.
No entanto, a retirada sequer era uma opção aqui. Deixar Halciform solto agora significaria uma desgraça certa para nós mais tarde.
“Por enquanto, vamos sair do porão!” declarei.
“Não precisamos procurar aqui?” Gourry questionou.
“Não está aqui!” gritei de volta, fugindo escada acima.
Faria todo sentido esconder algo importante em meio a toda essa bagunça, todavia ao mesmo tempo, a vida de Halciform dependia daquela pedra. Quem poderia dormir em paz à noite sabendo que um passo em falso casual poderia ser o seu fim? Dito isto, Halciform não parecia o tipo de cara que a mantinha bem trancada em algum lugar seguro.
Onde poderia estar, então? Teríamos que procurar enquanto avançávamos...
Nosso disfarce estava muito além de descoberto agora, então lancei um feitiço de Iluminação no teto enquanto subia as escadas. Gourry seguiu logo atrás de mim.
A porta no topo estava aberta. Uma mulher ruiva estava do outro lado.
“Golpe de sorte!” gritei, pegando Rubia pelo pescoço antes que ela pudesse protestar, empurrando-a contra a parede. “Ok, hora de uma conversinha.”
Uma expressão um tanto medrosa tomou conta de seu rosto. Aposto que eu parecia bastante sanguinária no calor do momento. A pobre garota provavelmente veio verificar toda a confusão que acabamos de causar no porão.
“Onde está a pequena e preciosa Pedra do Juramento do presidente?” perguntei.
“Caramba, Lina, relaxa...”
Ignorei as tentativas de Gourry para me pacificar e olhei direto nos olhos de Rubia... Mas tudo que vi foi uma tristeza profunda.
Hã?
Sem que me desse conta, acabei afrouxando meu aperto.
“Se...” Rubia disse com calma. “Se você tivesse aquela pedra... Poderia parar Sir Halciform?”
“O quê? O que quer dizer com ‘pará-lo’?” perguntei, soltando seu pescoço.
“Eu...” ela começou. “Sei o que ele está fazendo. Tentei várias vezes convencê-lo a parar. Porém... Eu apenas...”
Rubia mordeu o lábio e olhou para baixo. Ela também foi incapaz de detê-lo... Foi por isso que me pediu para não me envolver. Para que Halciform, selado pelo Mestre Talim e Daymia, nunca fosse libertado.
“Você tentou falar com alguém? Como o Duque Litocharn, talvez?” Gourry perguntou.
“Ah, vamos lá...” falei com um suspiro. “É óbvio que não podia contar a ninguém. Quero dizer, sim, poderia ter contado tudo e feito o duque censurar formalmente Halciform... Contudo quem pode dizer que Halciform simplesmente ficaria sentado e aceitaria tal coisa? Quem iria impedi-lo se decidisse se vingar? Ninguém.”
Rubia assentiu com firmeza. Coloquei a mão em seu ombro e olhei profundamente em seus olhos.
“No entanto ouça com atenção. Parar Halciform significa que temos que matá-lo.”
“Acho...” disse Rubia, balançando a cabeça outra vez. “Que estou preparada para isso.”
Guh, ela parecia tão triste... Até me deixou deprimida agora!
“Ok, nesse caso tudo certo. Agora, sobre aquela Pedra do Juramento...”
“Não sei se é o que está procurando, mas Sir Halciform costumava ter uma bola de cristal como as que os videntes usam...”
Crash!
Rubia foi interrompida por uma comoção abafada à distância. Espere... Esse barulho veio do porão. Ele já havia rompido?
“Basta nos levar até lá!”
“Como quiser!” ela disse, saindo correndo.
Enquanto corríamos pelo corredor, sentíamos um estranho tipo de hostilidade nas nossas costas... Vários tipos, na verdade.
Olhei por cima do ombro e... Yeeeek! Estávamos sendo perseguidos por uma variedade de quimeras, lideradas pelos enormes homúnculos que nos atacaram na outra noite. Correspondiam ao inventário do laboratório que vimos no porão. No minuto em que Halciform percebeu que o tínhamos preso lá dentro, deve ter recuado, liberado suas quimeras de seus tanques e as encarregado de reabrir o corredor selado.
Estava claro que nos alcançariam em breve, e esta passagem era larga o suficiente para que pudessem nos cercar assim que nos alcançassem.
Maldição!
Eu me virei e bati a palma da mão direita na parede.
“Van Layl!”
Veias de gelo se espalharam pela minha mão, traçando espirais ao longo da parede, do chão e do teto que serpenteavam em direção ao exército quimera que se aproximava pelo corredor. No segundo que o gelo os tocou, começou a subir em espiral por suas pernas e corpos, congelando instantaneamente vários deles em estátuas de gelo. Isso faria um bom trabalho afastando aqueles que estão vindo atrás também.
Gourry e Rubia, depois de me esperarem fielmente, voltaram a correr.
“Sabe...” falei para ninguém em particular. “O que Halciform estava pensando, criando coisas tão bizarras?”
“Ele disse que eram experimentos...” respondeu Rubia. “Sua intenção era combinar criaturas com fortes energias vitais...”
Ótimo. E o resultado foram quimeras perfeitas para a batalha. Que bela dor no rabo pra gente...
“Por aqui!” Rubia chamou, apontando para uma escada que levava ao segundo andar.
Subi alguns degraus antes de ouvir o som de asas enormes batendo. Abaixei-me sem sequer olhar para trás quando senti a ameaça iminente nas minhas costas. Um rugido baixo passou por cima. Achei que tinha me esquivado do que quer que fosse, porém, um segundo depois, algo bateu nas minhas costas.
Guh!
Caí para frente, e o impulso fez meu rosto bater na escada.
Isso foi traiçoeiro...
Contudo não há tempo para lágrimas! Não perdi tempo e me levantei para encarar meu atacante, que havia pousado no topo da escada. Seu rosto era ainda mais aterrorizante que o de um demônio inferior. Tinha a pele branca e doentia e asas de couro nas costas.
Parecia uma das fusões troll-dragão que vimos no laboratório. Deve ter sobrevoado os monstros congelados pelo meu Van Layl. Outro oponente complicado...
“Você está bem, Lina?” Gourry perguntou.
Provavelmente usou a cauda para me derrubar depois que escapei de suas garras. O golpe foi um grande choque, contudo eu não estava muito desgastada.
“Estou bem. Mas faça algo sobre essa coisa!” gritei.
Se perdêssemos muito tempo aqui, nossos perseguidores nos alcançariam... Halciform inclusive.
“Ele não cospe fogo, não é?” Gourry perguntou, protegendo Rubia em suas costas.
“Você provavelmente ficará bem.” respondi, duvidando que Halciform liberasse qualquer coisa capaz de queimar sua própria casa.
A abominação híbrida saltou de volta para o ar. Gourry desembainhou a espada quando comecei a entoar um feitiço. Sua espada cortou sua pele grossa, enterrando a lâmina profundamente em seu peito, no entanto não foi o suficiente para impedir a criatura dracônica, que atacou com suas garras.
“Tch!”
Gourry não teve tempo de sacar a espada, apenas deixou-a cravada no peito da criatura enquanto saltava para trás escada abaixo. Ele quase esbarrou em Rubia, porém ela se apressou para sair do caminho.
“Bam Rod!”
Enquanto a criatura tentava persegui-lo, liberei um feitiço que conjurou um chicote flamejante em minha mão. Eu estava mirando na cabeça da coisa, contudo...
Wham!
A quimera abriu a boca e mordeu meu chicote! Foi tão maluco que mal pude acreditar no que via! Acho que mesmo que tenha sido gerado por magia, o fogo ainda era fogo. E o interior de um dragão é resistente a chamas, então foi um movimento totalmente válido... Porcaria!
A criatura então voltou seu olhar para mim. Desembainhei a espada no quadril, no entanto sabia que não tinha forças para desferir um golpe fatal contra a carne de um dragão.
“Gourry!” chamei, jogando minha lâmina para ele sem hesitação.
“Entendi!”
Gourry pegou minha espada e avançou em direção à criatura. Com a atenção voltada para Gourry, comecei a entoar um novo feitiço.
Gourry cortou uma das asas da criatura, fazendo-a perder o equilíbrio e tombar, entretanto no processo sofreu um corte no ombro esquerdo. Aproveitando seu momento de vulnerabilidade, a criatura chicoteou-o com a cauda.
“Ngh!”
Incapaz de se esquivar do golpe, Gourry voou contra a grade. O dragão aproveitou a oportunidade para se levantar.
“Dam Blas!”
Acertou em cheio! Desta vez, meu feitiço explodiu a cabeça do dragão. Mas mesmo quando seu corpo caiu escada abaixo, continuou a se mover.
“Essa coisa é muito persistente.” sussurrou Gourry.
“Parece Gourry. É verdade que você parece o tipo de cara que sobreviveria se tivesse a cabeça arrancada. Eu teria que jogar água fervente para me livrar de você.”
“Está sugerindo que sou uma barata...” Gourry murmurou, virando-se para discutir comigo, porém de repente caiu na gargalhada.
“Hã?”
“Há uma linha no seu rosto.”
“O quê?”
Ah, claro. Desde quando caí de cara na escada mais cedo.
“Ugh, esqueça isso! Vamos indo!”
Depois de confirmar que a criatura dracônica estava de fato morta, Gourry recuperou a espada do peito.
“O segundo andar!” Rubia nos dirigiu.
Um longo corredor se estendia em ambas as direções. Era ladeado por inúmeras portas com estátuas de gárgulas na frente de cada uma. Seu design era uniforme, cada uma com uma esfera de pedra presa na boca aberta.
Falando sobre coisas suspeitas! Caso não esteja familiarizado com eles, deixe-me explicar. Gárgulas são feras mágicas que se parecem com estátuas de pedra. Tem o costume de esperar que uma vítima inocente se aproxime e então atacam. Claro, não teriam chance alguma em uma luta real contra mim e Gourry... Porém agora, não tínhamos exatamente tempo para jogar um jogo prolongado de isso-é-uma-estátua-ou-é -uma-gárgula.
Olhei para Rubia e perguntei.
“Não vai ter gárgulas de verdade misturadas com essas estátuas, não é?”
“Eu... Creio que não.” ela respondeu. “Já limpei esse corredor muitas vezes e sempre foram apenas estátuas. Sir Halciform uma vez me mostrou uma bola de cristal vermelha e disse que era muito importante. Ele então a cobriu para parecer uma pedra normal e colocou-a na boca de uma das gárgulas. Acho que essa pode ser a pedra que estão procurando.”
“Sim, parece que pode ser. Em qual estátua está?”
“Sinto muito...” Rubia disse hesitante. “Contudo tudo o que me foi dito é que estava neste corredor, então devo ter cuidado ao limpar aqui.”
“Hmm... Acho que isso significa que teremos que verificá-las uma por uma.”
“Se tivessem tempo.” veio uma voz fria do nada.
Eu suspirei. Todos nós nos viramos para ver quem era.
Uma sombra começou a surgir por trás de uma das estátuas no corredor. Usava uma máscara branca sob um capuz baixo.
“Seigram...”
Suor frio escorreu pelas minhas costas. Halciform deve ter usado sua telepatia para invocá-lo.
“Ele me chamou aqui para ganhar tempo. Disse que estava preocupado com o fato de sua casa ser saqueada... Os humanos podem ser criaturas tão egoístas.”
“Então você veio direto até nós, não é?” falei com falsa bravata. “Halciform não perderá sua imortalidade se te vencermos?”
“Só se puder...”
Ngh... Fiquei em silêncio.
Assim que o quase imortal Halciform entrasse em cena, estaríamos ferrados. A ausência de Gio Gaia também me incomodava. Precisávamos acabar com Seigram ou encontrar a Pedra do Juramento antes que qualquer um deles aparecesse... Essa era a única maneira que encontrei para vencermos.
Alternativamente, posso lançar um Dragon Slave e acabar com tudo sem problemas. No entanto não estávamos no meio do nada agora. Liberar esse feitiço aqui dizimaria a cidade.
Então, ainda que nossas chances de sucesso com o plano A fossem mínimas, se tivesse que escolher entre essas duas opções... Arriscaria com o plano A!
“Oh, vamos acabar você...” eu disse com confiança. “E o faremos antes que ele chegue aqui também.”
“Ah... Há apenas um pequeno problema com esse plano.”
Grk! Congelei ao ouvir aquela voz. Virei-me, lenta e incerta...
E lá estava, sua capa branca flutuando atrás dele.
“Já estou aqui.” disse Halciform, o Branco, com o mesmo sorriso implacável no rosto. Então se virou e chamou gentilmente. “Venha até mim, Rubia.”
Mas ela balançou a cabeça tristemente.
“Por favor, Sir Halciform, estou lhe implorando... Pare com isso.”
“Como pode dizer isso, Rubia? Sabe que estou fazendo tudo isso por você, para nunca mais perdê-la.”
“Não!” gritou Rubia em um ataque. “Está perseguindo o fantasma de uma mulher morta! Nunca... Nunca serei a Rubia que você amou! Mesmo... Mesmo que tenha me feito à sua imagem... Ainda sou apenas um homúnculo que foi criado!”
O que...
“Rubia, você não é...” hesitação e tristeza surgiram no rosto de Halciform. “Você é Rubia. Meu primeiro e único... Precioso...”
“Mestre Halciform...” a voz sombria de Seigram interrompeu. “Poderíamos talvez lidar com esse absurdo depo...”
“Absurdo?” Halciform lançou um olhar severo para Seigram. Um momento de silêncio se seguiu antes que soltasse um suspiro silencioso. “Sim, suponho que sim. O acerto de contas deve ter prioridade. Seigram, fique onde está e observe.”
“Sim, senhor.” Máscara Branca respondeu com uma pitada de desprezo.
“Sir Halciform!”
“Afaste-se, Rubia.” eu insisti enquanto ela tentava se colocar entre mim e Halciform.
“O quê?” ela perguntou, olhando para mim com perplexidade.
“De uma forma ou de outra, vai ter que acabar aqui e agora.”
“Sim, acredito que sim.” concordou Halciform.
Gourry apenas assentiu enquanto desembainhava a Espada da Luz.
“Mestre Talim temia que estivesse atrás de algo mais do que apenas a imortalidade, mas...” falei, olhando para Halciform.
Ele deu um passo mais perto sem cerimônia e respondeu.
“A eternidade era tudo que eu queria... Para nunca mais perder o que era importante para mim.”
Um pensamento passou pela minha mente: talvez não consiga vencer esse cara.
Se conseguíssemos destruir Seigram, Halciform tornar-se-ia mortal novamente. No entanto, teria que ser extremamente cuidadosa ao mirar no mazoku. Se não o aniquilássemos com um golpe, acabaria fugindo e perderíamos nossa chance. Mesmo assim, um golpe direto de uma Lança Elemekia não conseguiu derrubar Gio Gaia, e Seigram parecia ser de longe superior. Derrotá-lo de uma só vez pode ser impossível.
Aquilo me deixou com apenas uma opção. Não era o plano com mais nuances... Porém teria que servir.
Halciform levantou silenciosamente a mão direita, sinalizando o início da nossa batalha. Um canto baixo começou a soar de seus lábios. Gourry e eu começamos a correr. Desembainhei minha espada e comecei meu próprio encantamento. E no momento em que Halciform terminou seu feitiço...
Saltei para a direita e Gourry saltou para a esquerda. Foi uma finta simples, estávamos apenas trocando de posição, contudo foi o suficiente para fazer Halciform hesitar por uma fração de segundo. Mesmo sendo imortal, era um claro amador quando se tratava de combate real.
Terminei meu feitiço.
“Sinalizador!”
Pequenas bolas de luz atingiram o chão ao redor de Halciform, cercando-o com dezenas de pequenas explosões.
“Ngh!”
Por um minuto, ele ficou escondido nas chamas.
“A pedra!” gritei.
“Certo!” Gourry respondeu, sabendo exatamente o que eu queria dizer.
Ele balançou a Espada da Luz na estátua de gárgula mais próxima, destruindo a pedra em sua boca. Algumas dúzias de Flechas Flamejantes dispararam de repente das chamas cada vez menores ao redor de Halciform. Felizmente, foi fácil escapar da barragem imprecisa de ataques.
Uma flecha perdida voou em direção a Seigram, que estava nos observando da retaguarda. Teria sido muito engraçado se o acertasse, pensei, mas Máscara Branca se esquivou sem esforço. Que droga!
Pensando nisso, porém, Flecha Flamejante era um feitiço elementar. Mesmo se tivesse acertado, não teria sequer chamuscado o mazoku. Não deveria ter criado muitas expectativas.
Antes que as chamas que cercavam Halciform se apagassem por completo, convoquei outro feitiço.
“Bulse Rod!”
Meu alvo desta vez não era o presidente, e sim as estátuas de gárgulas. Um chicote de luz brotou da minha mão e açoitou duas das estátuas, quebrando suas cabeças e as pedras em suas bocas junto. Como disse antes, essa tática não era exatamente sutil, contudo até descobrirmos qual gárgula tinha a Pedra do Juramento, nosso plano mais eficiente era apenas destruir todas elas.
“Ah!” Halciform empalideceu quando percebeu o que estávamos fazendo.
“Bola de Fogo!”
Uma bola de luz veio em nossa direção, no entanto...
“Tch!”
Gourry agarrou um dos pedaços de pedra que estava aos seus pés e jogou-o direto na bola brilhante... Que mira! A esfera explodiu com o impacto, enviando raios vermelhos de fogo pelo ar.
Entretanto, antes que a explosão cessasse outra saraivada de Flechas Flamejantes caiu sobre nós. Consegui me salvar me escondendo atrás de uma estátua de gárgula. Gourry saltou para trás, mas uma das Flechas atingiu o chão a seus pés! Ele perdeu o equilíbrio e sua mão esquerda atravessou o ar antes de enfim agarrar o rosto de uma gárgula.
Ele usou isso para se recuperar. Ou, pelo menos, tentou. Na verdade, continuou caindo e caiu de bunda... Com uma esfera de pedra na mão. Ela prontamente saiu da boca da gárgula, o que significa...
“Gourry! Essa é a pedra!” gritei.
“Não!” Halciform trovejou.
Em seguida, comecei a entoar um feitiço e Gourry sabia justo o que fazer.
“Isto...” disse ele, erguendo a Espada da Luz. “Deve resolver!”
Sua mão lançou a pedra e quebrou-a em fragmentos vermelhos de joias, superficialmente cobertos por rocha comum. Halciform soltou um grito ao ver a cena... Agora era minha chance!
“Dam Blas!” proclamei, liberando meu feitiço.
Uma bola vermelha de luz saiu da minha mão, atingindo Halciform no peito com uma explosão estrondosa!
“Conseguimos!” Gourry gritou.
Porém a celebração foi um pouco prematura. Seu tom mudou logo depois quando o fogo foi lançado em sua direção.
“Gwah!”
Gourry mal conseguiu se esquivar das chamas. Não... Estava arrastando a perna esquerda. Deve ter sido atingido. Nada bom.
Mas como ele...
“Não pode ser.” Gourry respirou, suor escorrendo em sua testa enquanto olhava para Halciform... Que estava à sua frente sem um único fio de cabelo fora do lugar, com raiva brilhando em seus olhos. “Eu quebrei a Pedra do Juramento!”
Ao ouvir essas palavras, o feiticeiro olhou maliciosamente.
“Pedra do Juramento?” perguntou, um sorriso frio se formando em seus lábios. “Ah... Você erroneamente pensou que essa era minha Pedra do Juramento.”
“O quê?” engasguei, olhando por reflexo para Rubia.
Halciform seguiu meu olhar.
“Entendo... Rubia te contou então. Rubia, não consigo entender... Não, discutiremos esse assunto mais tarde. Meu querido Mestre Gourry, o que acabou de destruir foi apenas um repositório de orbe de memória para minha pesquisa sobre a imortalidade. Como tal, era muito importante para mim... No entanto Rubia parece ter tido uma impressão errada sobre o seu propósito.”
Ugh! Isso foi um desastre, porém não havia sentido em descontar nela. Mais importante ainda... Onde estava a verdadeira Pedra do Juramento? Que opções nos restaram? Eu estava ficando sem ideias.
“Contudo, preciso fazê-lo pagar por destruir meu orbe de memória...”
Uma luz branca apareceu na mão direita de Halciform, Gourry estava em sua mirra! Corri direto para ele, entoando um feitiço enquanto avançava.
“Bola de Fogo!” Halciform encantou.
“Lei Asa!” eu também encantei.
Agarrei Gourry e segurei firme enquanto decolamos.
A bola de fogo de Halciform explodiu atrás de nós um instante depois. A força da explosão fez com que acelerássemos mais rápido do que imaginei, arremessando-nos contra a parede no final do corredor. Por um segundo, pelo canto do olho, senti como se vislumbrasse um sorriso zombeteiro na máscara branca de Seigram.
Naquele momento, uma ideia me ocorreu.
“Ngh...”
Quando recuperei o controle do meu feitiço Lei Asa, saquei minha espada com bainha e tudo. E pouco antes de Gourry e eu batermos na parede... Mudei nosso curso de voo para nos enviar direto para Seigram.
“O quê?” ele gritou sem tempo para se esquivar.
“Fuja, Seigram!” Halciform gritou.
Todavia era tarde demais. Com a coronha da minha espada, quebrei a máscara de pedra branca de ‘Seigram, o Sem Rosto’.
“Gaaaah!” Halciform lamentou.
Enquanto isso...
“Guh!”
Bati na parede com um baque. Tentei ao máximo desacelerar meu feitiço Lei Asa, entretanto não consegui a tempo. Gourry veio atrás de mim, me imprensando entre ele e a parede. A aterrissagem forçada fez meus ossos rangerem.
“Lina, você...” Gourry disse enquanto se abaixava rapidamente para me ajudar a levantar. “Amorteceu minha queda?”
“Sem chance.” eu disse com um sorriso para suportar a dor.
“Oh...” Seigram recolheu os pedaços de sua máscara quebrada com reverência, como se tivesse perdido algo precioso. “Ohh...” seu rosto amorfo... A escuridão que havia revelado sob seu capuz... Olhou para os fragmentos em suas mãos. “Minha... Minha Pedra do Juramento...”
“O quê?” Gourry exclamou.
Yup. No final, a Pedra do Juramento era a máscara branca que cobria o... Rosto-sem-face de Seigram? Como queira chamar.
Veja, estive pensando sobre algumas coisas por um tempo. Primeiro: por que Seigram era tão avesso a lutar contra nós? E dois: por que seu camarada se referiu a ele como ‘sem rosto’? Acontece que esta era a resposta para ambas às perguntas.
“S-Seigram!” Halciform gritou em agonia ao cair de joelhos. Ser separado da imortalidade parecia atormentá-lo com exaustão e dor. “Mate eles! Por favor!”
“Oh, cale a boca de uma vez!”
Lancei uma saraivada de Flechas Flamejantes que atravessou o feiticeiro. Rubia desviou os olhos quando ele caiu no chão, imóvel.
“Agora então...” voltei minha atenção para Seigram. “Você ouviu a ordem de morte do seu mestre. O que vai fazer agora?”
Seigram lentamente virou seu ‘rosto’ para nós.
“Agora que nossa Pedra do Juramento está quebrada, não preciso mais obedecê-lo...”
Boa resposta! Muito nobre. Foi bom saber que os mazokus não eram todos idiotas mesquinhos. Gourry e eu estávamos bastante exaustos, para dizer a verdade, e eu estava ansiosa para evitar mais brigas.
“Contudo...”
Uh-oh.
“Ainda devo ter um acerto de contas com você. Pelo meu próprio orgulho.”
Sim, esqueça o que acabei de dizer. Mazokus são todos idiotas mesquinhos!
Seigram flutuou silenciosamente até o estirado Halciform.
“Então vamos começar!” ele declarou, uma chama azul explodindo de sua mão.
Eu pulei, enquanto Gourry... Não? Em vez disso, girou no local, evitando a bola flamejante por um fio de cabelo. Ela passou sem acertá-lo, explodindo quando atingiu o final do corredor...
E foi aí que Gourry pulou! Estava aproveitando a onda de choque!
“Tome isso!” gritou, atacando com a Espada da Luz.
Mas, de repente, Seigram foi envolto em escuridão... Escuridão que desapareceu logo depois, aparentemente levando o mazoku junto com ela.
“O quê?” Gourry caiu no chão, pego de surpresa. A ferida de sua perna devia estar pior do que imaginei, porque ele tropeçou bastante ao pousar.
“Corra, Gourry!” avisei-o.
Seu corpo se virou bem a tempo de ver uma bola gigante de plasma explodir em seu rosto!
“Gwah!”
Gourry foi lançado com força contra uma estátua de gárgula. A Espada da Luz caiu de sua mão. Chamei-o, porém não houve resposta.
“Agora...” o mazoku sem rosto voltou-se devagar em minha direção. “Somos só nós dois.”
Seigram... Estava usando a escuridão para desaparecer no espaço.
“Lança Elemekia!”
A escuridão o engoliu outra vez, permitindo-lhe evitar sem problemas meu feitiço. Pude sentir a escuridão se aglutinando atrás de mim e virei-me a tempo de ver uma bola de luz voando em minha direção.
“Bwuh!”
Consegui evitá-la me curvando para trás, porém o feitiço queimou a ponta do meu nariz ao passar por cima de mim.
Por que você...!
Joguei de lado minha espada embainhada e tirei uma pequena faca de minha túnica. Ela brilhou no ar e cavou a sombra de Seigram quando atingiu o chão. Este é o feitiço Captura de Sombra, um truque para prender um oponente do plano astral. Não era usado para causar nenhum dano, entretanto era uma armadilha eficaz que deveria funcionar até mesmo em seres astrais como mazokus.
“Oh... Um humano que pode prender minha sombra? Sua capacidade mágica é impressionante.” disse Seigram, incapaz de se mover.
Queria retrucar, contudo não era esse tipo de luta.
As coisas estavam perigosas o suficiente para que eu começasse a entoar uma Lança Elemekia. Nem mesmo um mazoku como Seigram poderia absorver um golpe direto de alguém ileso.
“Talvez sua habilidade seja o motivo... De ter me subestimado.”
Então ouvi um som baixo de raspagem... E meus olhos se arregalaram. A faca que segurava a sombra de Seigram no lugar, que pensei estar cravada firme em uma fenda no chão, estava subindo devagar. Com um tilintar metálico, saiu por completo do chão. Seigram então se levantou de novo no ar.
“O poder da minha forma astral substitui a influência da sua faca no plano astral. Não é nada de especial... Embora eu tenha certeza de que não é algo que sua laia ve com muita frequência.”
“Urgh!” retomei meu feitiço interrompido. “Lança Elemekia!”
O mazoku desapareceu na escuridão novamente. Tch!
De repente, uma sensação de queimação perfurou meu flanco. Uma flecha de fogo me atingiu por trás. Seigram estava parado perto de onde Gourry estava deitado. A Espada da Luz estava no chão ao seu lado. Pensei rápido e então ataquei.
Posso fazer isso funcionar?
“Bola de Fogo!” gritei.
A bola de luz que conjurei explodiu não muito longe de Gourry, bem aos pés de Seigram. A força da explosão fez voar pedaços do chão, bem como...
Eu estendi minha mão direita!
“Tola!” o mazoku zombou, saindo da fumaça. Ele descartou minha Bola de Fogo e pretendia me matar antes que eu pudesse lançar outra. “Pretende matar seu companheiro aqui? Sabe que feitiços de fogo não funcionarão comigo!”
Seigram se aproximou, sua mão brilhando em vermelho. Sua intenção era lançar seu feitiço diretamente em mim! Não tive tempo para entoar, no entanto...
“Luz, venha!” gritei, a lâmina brilhante perfurando o corpo sombrio de Seigram.
“Gwaaaah!” o grito do mazoku ecoou pelo corredor. Com a mão direita ainda levantada, toda a parte superior do corpo se inclinou para frente. “Q-Quando você...?”
Seu capuz vazio virou-se para minhas mãos, aparentemente olhando para a Espada da Luz que o havia empalado.
Minha Bola de Fogo não foi um ataque; foi apenas uma maneira inteligente de tirar a Espada da Luz do chão. Assim que estava no ar, agarrei-a. Claro, todo o truque foi um tipo de aposta mais fácil de falar do que fazer... Para ser honesta, não tinha muita fé de que daria certo, mas imaginei que era a única maneira de conseguir derrotar Seigram e sua absurda capacidade de desaparecer.
Felizmente, ganhei a aposta.
“Droga... Maldita seja!” Seigram se enfureceu, reunindo poder em sua mão direita.
Sem chance!
“Desista!” gritei.
Passei a Espada da Luz através dele com toda a força que tinha, cortando um golpe que o dividiu na vertical. Seigram emitiu um som que não chegou ao nível de um grito, tropeçou alguns passos para trás e caiu de joelhos.
Enfim... Acabou...
“Não... Não se engane...” o mazoku sussurrou.
O quê?
“Eu ainda não... Estou... Destruído...”
O poder da Espada da Luz variava de acordo com a força de vontade de seu portador. Se um ataque infundido com minha vontade não fosse suficiente para matar esse cara... Quanta capacidade mágica ele tinha?
“Algum dia... Juro a você...!” sibilou, a escuridão começando a envolver seu corpo.
Nada bom! Se Seigram fugisse agora, poderia causar problemas para nós mais tarde. Nunca teria uma boa noite de sono sabendo que esse bastardo ainda estava atrás de mim.
“Não vai escapar!” gritei, brandindo a Espada da Luz...
Porém tudo que consegui cortar foi uma sombra fugaz.
Seigram escapou no final, contudo pelo menos ganhamos o dia. Na verdade, sigo preocupada com o outro mazoku... Gio Gaia, que não tinha aparecido... No entanto se ele não tivesse aparecido até agora, o mais provável é que não apareceria.
Assim, por fim voltei minha atenção para Gourry, que seguia caído no chão. Esperando que ele não estivesse muito ferido, me arrastei hesitante em sua direção.
“Lina!” Rubia gritou.
Senti uma presença hostil surgindo atrás de mim e me virei em choque sem palavras. Uma bola de calor explodiu nas minhas costas, me fazendo voar contra a parede. Apaguei por um segundo, todavia me recompus o mais rápido que pude. E então...
“Guh!”
Uma dor indescritível percorreu meu corpo. Foi preciso toda a força que eu tinha para virar a cabeça e olhar para o corredor. A Espada da Luz voou ainda mais longe do que eu, pousando aos pés de Halciform, o Branco.
Porém a mão esticada em seu manto... Era apenas minha imaginação ou parecia estranhamente alongada? Seus cabelos brancos desgrenhados eram apenas o resultado da violenta batalha? E... E aquela luz verde brilhando em seu olho esquerdo?
“Não pode ser...” sussurrei. “Gio Gaia?”
“Gio Gaia não existe mais...” disse Halciform com um sorriso sinistro. “Como punição por perder para você... Eu o devorei.”
Devorou?
Halciform olhou para a Espada da Luz a seus pés e a chutou para trás com o calcanhar.
“Tome isso, Rubia. Poderá ser útil para meus experimentos mais tarde.” disse ele, sem sequer olhar para ela. “Li em um antigo pergaminho que adquiri durante minha pesquisa sobre a imortalidade... Que comendo outro, pode-se ganhar um pouco do seu poder.”
“Então... Quer dizer...”
“Não.” disse o feiticeiro de branco, balançando a cabeça. “Essas cobaias foram apenas tentativas de prolongar minha vida, absorvendo sua força vital. Esse experimento foi um fracasso, mas então me ocorreu: O que aconteceria se consumisse um ser cuja vida útil e poder excedessem os meus? É claro, isso me levou a...”
“Um mazoku.”
“Sim. É claro que eles não concordam prontamente com essas coisas. E então, quando Gio pediu para enfrentá-los... Avisei-o que se perdesse, o preço seria sua ajuda em um experimento meu.”
As coisas estavam se encaixando. Foi por esse motivo que não contou a Gio sobre a Espada da Luz... Absorver a vitalidade de um mazoku também explicaria como Halciform foi capaz de sobreviver às minhas Flechas Flamejantes mesmo depois que seu pacto de imortalidade foi quebrado.
“Agora... O tempo de conversa acabou.” declarou Halciform ao dar um passo à frente.
Eu estava realmente sem opções agora. Não estava em condições de me esquivar de nada. A única maneira de superar Halciform era vencê-lo e acertá-lo bem onde doía. Porém... Mesmo um golpe direto com uma Lança Elemekia não seria uma morte certa.
“Não se preocupe...” disse Halciform com um sorriso cativante. “Não vou extinguir a sua existência por completo. Criarei um homúnculo com sua tremenda capacidade mágica para fazer experiências. Sendo assim...”
De jeito nenhum... Um arrepio percorreu minha espinha.
“Devo te consumir para que seu poder viva para sempre.”
“Já basta!” Rubia implorou.
Halciform se virou para vê-la segurando a Espada da Luz com as mãos trêmulas. Seus olhos reluziam com uma triste determinação.
“Rubia?” o feiticeiro de branco sussurrou.
“Por favor... Por favor, pare com isso! Por favor, não mais...”
“O que está dizendo? Pare com essa bobagem... Abaixe essa espada e espere por mim lá embaixo. Não se preocupe. Tudo acabará em breve.”
“Não.” ela recusou, balançando a cabeça fervorosamente com lágrimas nos olhos.
“Apenas faça o que eu digo, minha querida Rubi...”
“Não!” Rubia gritou e saiu correndo... Direto para Halciform!
“Rubia!” Halciform estendeu a mão direita, a luz brilhou em sua palma.
Não faça isso, Rubia!
Suas figuras se encontraram.
“Ah...”
As palavras me falharam. Halciform foi... Empalado pela Espada da Luz nas mãos de Rubia.
“Por favor, pare com isso... Sir Halciform...” Rubia implorou, enterrando o rosto em seu peito.
A luz na mão do feiticeiro se apagou. Ele descartou o feitiço e acariciou suavemente o cabelo de Rubia.
“Sim... Claro...” ele sussurrou.
Rubia ergueu os olhos em estado de choque. Halciform ficou ali olhando para ela com um sorriso gentil e genuíno.
“Não posso me dar ao luxo de perder para ninguém... Contudo, Rubia... suponho que seja compreensível que seja você quem me mate...” Uma expressão inescrutável apareceu em seu rosto quando o que restava de sua força abandonou seu corpo. E, assim, caiu o feiticeiro que buscava a vida eterna.
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