sábado, 14 de dezembro de 2024

A Quiet Place — Capítulo 10

Capítulo 10


O relatório da agência de detetives havia dito que não havia nenhuma relação pessoal entre a Sra. Takahashi e o Sr. Kubo, mas Asai ainda tinha suas dúvidas. Kubo não tinha problemas financeiros, possuía lotes de terra herdados de seu pai em vários locais por Tóquio. O relatório não especificou onde exatamente, porém como os lotes foram comprados por seu pai há muitos anos, eles devem ter sido na cidade velha, ou pelo menos próximos. E perto dela significaria em um dos subcentros recentemente desenvolvidos; de qualquer forma, deviam valer uma fortuna. E deve receber um salário generoso na empresa de seu tio. O negócio de seu pai pode ter falido sob seu comando, contudo isso teria feito pouca diferença a longo prazo. Seguia estando muito bem de vida e só tinha sua esposa e a si mesmo para sustentar.

Por que um homem que não estava com problemas financeiros venderia sua casa de família para Chiyoko Takahashi e depois se mudaria para um pequeno apartamento em Higashi Nakano? Não havia dúvidas de que sua casa em Yoyogi seria muito mais confortável e em um bairro muito mais agradável. Pelo menos era um bairro de luxo e bom gosto até que todos os hotéis invadiram sua paz. Por lei, os moradores locais tinham permissão para bloquear a construção de tais lugares se estivessem dentro de uma zona escolar, no entanto os bairros fora das zonas escolares não tinham poder para fazer nada. Às vezes, os moradores se juntavam e protestavam contra projetos de construção, entretanto era sempre uma causa perdida. Era bastante provável que os moradores de Yoyogi tivessem lançado um protesto contra a construção do Chiyo ali mesmo em sua colina, reclamando que era uma mancha em seus arredores. Ele não precisava do dinheiro, então o que fez o Sr. Kubo vender sua terra para um empreendimento comercial que deveria ter abominado e que sabia que escandalizaria o bairro? E então se tornar um dos executivos daquele mesmo hotel?

Asai tinha certeza de que havia mais na história. A investigação da agência mal havia arranhado a superfície. Um homem com menos de quarenta anos que mandou sua esposa para um sanatório distante. Uma mulher na casa dos trinta, divorciada e envolvida com o presidente de uma empresa de médio porte. Coloque essas duas pessoas uma ao lado da outra, e alguma coisa poderia muito bem sair desse encontro. Chiyoko Takahashi, embora não tradicionalmente bonita, era sem dúvida uma mulher encantadora. Bem falada e educada, maquiagem aplicada com muita habilidade, um vislumbre de flerte em seus movimentos... Seria tão fácil para um homem cuja esposa estava hospitalizada longe perder a cabeça pela Sra. Takahashi. Ele havia cedido suas terras a ela e colocado seu nome em um empreendimento comercial imoral. O que realmente estava acontecendo?

No entanto não era só curiosidade que mantinha Asai ruminando sobre tudo; sabia que sua esposa havia passado mal bem onde a casa do Sr. Kubo costumava ficar. E tinha a estranha sensação de que a própria Eiko poderia ser a conexão entre Konosuke Kubo e Chiyoko Takahashi. O pensamento continuou a incomodá-lo de que, na época da morte de Eiko, houve um terremoto bastante forte, entretanto ainda não sabia se havia alguma conexão entre esse terremoto e sua morte.

A Sra. Takahashi não mencionou o terremoto, então talvez tenha ocorrido antes de Eiko correr para sua boutique. Se fosse esse o caso, então não tinha razão para trazer isso à tona. Se, por exemplo, o tremor tivesse acontecido enquanto Eiko estava deitada nos fundos da loja, então com certeza teria ficado na memória da Sra. Takahashi, e teria dito algo a respeito. Ou seria porque os habitantes de Tóquio estão tão acostumados com terremotos que nem mesmo deixaram uma impressão nela? Asai descobriu que não conseguia apagar esses pensamentos de sua cabeça.

A outra coisa que o incomodava era os haicais de Eiko. Em sua coleção memorial, havia poemas sobre um amuleto Somin Shorai e uma lanterna Yamaga. Asai nunca tinha ouvido sua esposa falar essas coisas. Tinha quase certeza de que Eiko não gostava de arte popular ou artesanato. Não havia nada parecido em sua casa, e nunca a ouvira mencionar comprar algo em uma loja de departamentos. Deviam ser coisas que tinha ido ver em uma exposição em algum lugar. Asai não conseguia descobrir o que diabos esses objetos e os haicais poderiam ter a ver com a morte sua repentina, todavia não paravam de martelar em sua mente.

Asai estava morrendo de vontade de ir ao Chiyo e dar uma olhada, mas não podia se arriscar a encontrar Chiyoko Takahashi. Não era só que ele não tinha motivo para estar lá, porém se ela de fato estivesse envolvida na morte de Eiko de alguma forma, não queria alertá-la sobre suas suspeitas.

Tinha certeza de que se pudesse entrar no hotel e olhar ao redor, haveria algum tipo de pista. Obviamente não haveria nada à vista, contudo poderia descobrir algo que lhe daria uma dica sobre a verdade. Agarrou-se a essa esperança improvável... Bem, talvez mais uma fantasia... Enquanto, ao mesmo tempo, suas suspeitas sobre a Sra. Takahashi e o Sr. Kubo continuavam crescendo.

Asai não conseguiria aparecer no hotel sozinho como fez nas outras vezes. A história sobre o marido abandonado procurando por sua esposa afastada não funcionaria. E se Chiyoko Takahashi aparecesse quando estivesse no meio do interrogatório de uma das empregadas?

Se fosse conferir o Hotel Chiyo, precisava encontrar uma mulher para acompanhá-lo. No entanto não conhecia ninguém. Este não era um favor fácil, não conhecia nenhuma mulher que arriscaria ser vista entrando em um hotel para casais.

Ele pensou em sua cunhada. Ela talvez fosse simpática se explicasse que estava tentando descobrir a verdade sobre a morte de sua irmã mais velha, no entanto Miyako era uma mulher casada. Talvez ficasse bem com isso se dissesse que havia alguma prova definitiva do outro lado daquelas paredes, entretanto a vaga ideia de que deveria ir dar uma olhada não iria convencê-la. E se não fosse cuidadoso sobre como tocava no assunto, Miyako poderia pensar que tinha outro motivo para convidá-la para aquele tipo de hotel. Bem, não, ele esperava que ela o conhecesse melhor do que isso, mas mesmo assim, o que fariam quando chegassem lá? Colocar disfarces e visitar o hotel exigiria coragem. E obter permissão do marido para fazer algo assim não era uma opção. Os dois indo lá em segredo? Poderia levar a um mal-entendido fatal.

Não, Asai teria que abandonar seu plano de fazer uma visita ao Chiyo até que pudesse encontrar uma companhia adequada.

Asai sabia muito bem como era a aparência de Chiyoko Takahashi, mas nunca tinha conhecido Konosuke Kubo. Que tipo de homem era? Como era? Estava curioso para vê-lo, pelo menos uma vez.

A agência de detetives incluiu o endereço do Sr. Kubo em Higashi Nakano no relatório, até o número do apartamento. Também sabia o endereço e o número de telefone de seu local de trabalho, R-Textiles em Kyobashi. Qual seria o melhor local para dar uma olhada em Kubo sem ser visto?

Poderia ficar no corredor em frente ao apartamento de Kubo e observá-lo entrando ou saindo, embora não havia como prever quando o sujeito poderia aparecer, e se ficasse por muito tempo, os outros moradores ou o síndico do apartamento ficariam desconfiados. Seria como a vez em que esteve espiando pela janela da frente da Cosméticos Takahashi e quase foi confundido com um ladrão pelo homem alto parado com seu cachorro. Se ficasse em um prédio de apartamentos, não havia dúvida de que acabariam lhe perguntando o que fazia por ali.

A outra possibilidade era visitar a R-Textiles. A menos que estivesse viajando a negócios, Kubo seria fácil de localizar em seu local de trabalho, sentado no escritório do gerente de Assuntos Gerais. Asai só precisava observá-lo à distância. Seria o mesmo que em seu próprio escritório, os corredores estavam sempre cheios de visitantes anônimos. Era como qualquer rua da cidade. Asai optou por essa opção.

Pouco depois da uma da tarde, avisou ao chefe da divisão que estava saindo e foi caminhando em direção ao metrô em Toranomon. De lá, eram apenas vinte minutos até Kyobashi, e a R-Textiles ficava a menos de dez minutos de caminhada da estação.

A empresa ocupava cerca de cinco salas no quarto andar de um prédio alto de escritórios. Asai não conseguia distinguir nada além dos painéis de vidro fosco que dividiam os cômodos do corredor. Havia uma placa de identificação em cada porta indicando o nome da empresa, contudo, diferentemente do ministério, não havia nada que dissesse qual seção, então não conseguia adivinhar qual delas abrigava a divisão de Assuntos Gerais.

Asai estava usando óculos escuros, na esperança de que ninguém desse uma boa olhada em seu rosto. Óculos escuros eram populares ultimamente, então ninguém acharia estranho. Usou-os também quando visitou a agência de detetives.

Parado no corredor, tentou parecer que esperava alguém. Estava escuro atrás dos óculos. No momento em que esperava que uma secretária ou alguém passasse, a porta da sala mais próxima do elevador se abriu e uma jovem mulher de avental azul-claro e minissaia saiu carregando uma pilha de documentos. Asai foi até ela.

— Com licença, você trabalha para a R-Textiles?

— Sim. — respondeu, olhando para ele.

— Qual sala é a seção de Assuntos Gerais?

— Assuntos Gerais? É esta.

A mulher apontou para a porta pela qual tinha acabado de passar.

— Ah, entendi. Er... O gerente, Sr. Kubo, está no escritório agora? — Asai enfatizou o nome de Kubo para ter certeza de que era no lugar certo.

— Sim, acho que está.

— O gerente de Assuntos Gerais é o Sr. Konosuke Kubo, certo?

— Sim, está certo.

A jovem olhou mais uma vez para os óculos escuros de Asai.

— Veja, estou com uma reunião marcada para um dos outros escritórios deste prédio, no entanto depois tenho uma reunião com o Sr. Kubo. Infelizmente, é a primeira vez que nos encontramos cara a cara, então pensei em ir primeiro para ver como ele é. Depois, poderei ir atendê-lo quando for encontrá-lo mais tarde.

Essa não era a desculpa mais plausível, entretanto a mulher não pareceu se importar.

— Siga-me, por favor. — ela disse, abrindo a porta do escritório.

— Obrigado.

Asai falou suavemente. Ele deu um passo para dentro da porta, bem atrás da jovem. Estava um pouco nervoso, esperando que todos os funcionários do escritório se virassem e o encarassem, porém não precisava se preocupar. Era um escritório grande, abarrotado de mesas e lotado de pessoas, tanto de pé quanto sentadas. Ninguém lhe prestou atenção. A mesa da recepcionista, mais próxima da porta, encontrava-se desocupada.

— Qual deles é o Sr. Kubo? — sussurrou para sua guia.

— O gerente geral está ali.

A mulher levantou a pilha de documentos um pouco para que pudesse apontar de maneira discreta um dedo. Na direção que indicou, em direção à janela, havia três grandes mesas alinhadas, ao redor das quais cinco ou seis homens estavam sentados ou de pé. Mantendo os olhos nos homens, Asai sussurrou mais uma vez para a jovem.

— Qual deles?

— É o que está sentado na extremidade mais distante daquelas três mesas. O homem alto. Usando óculos. Olha, está falando com o vice-gerente... O homem parado na sua frente. Aquele é o Sr. Kubo.

A mulher olhou para Asai para verificar se estava olhando na direção certa.

— Aquele homem de óculos? Aquele que acabou de colocar um cigarro na boca?

A garganta de Asai parecia ter se fechado.

— Isso mesmo. É ele.

— Aquele que está acendendo o cigarro agora?

— Sim.

Asai agradeceu apressadamente à jovem e saiu da sala o mais rápido que pôde.

O Sr. Kubo, gerente de Assuntos Gerais, era o homem que o tinha visto na primavera passada quando tentava olhar dentro da Cosméticos Takahashi. O que estava atrás dele na rua, observando-o, vestido com um suéter cinza e com um pastor alemão. O mesmo rosto longo que o viu bater em retirada apressada.

Asai foi direto para a agência de detetives em Kanda, onde foi recebido pelo mesmo detetive de antes.

— Gostaria de solicitar uma investigação mais aprofundada, por favor. — disse ele, seus óculos escuros ainda firmemente no lugar.

O homem franziu a testa.

— Oh, houve algum problema com o primeiro?

— Não. De forma alguma. Desta vez, gostaria que concentrasse a investigação em Konosuke Kubo.

— Entendo. Que tipo de coisas quer saber?

— Sua rotina diária quando morava em Yoyogi.

— Sua rotina diária? Não agora, mas quando morava na casa em Yoyogi?

— Bem, estou interessado em seu estilo de vida atual também, no entanto por enquanto apenas quando esteve em Yoyogi. Antes de sua casa ser transformada em um hotel.

— Foi no final de abril que sua casa foi demolida para dar lugar ao hotel. Vai ser muito difícil descobrir muito sobre sua vida antes disso, você sabe.

— Estou disposto a pagar o que for preciso.

— E você sabe, as pessoas não são muito comunitárias naquele bairro. Elas não têm muito a ver umas com as outras. Não vamos tirar muito proveito entrevistando seus ex-vizinhos. Não tenho certeza de qual seria a melhor abordagem.

O detetive cruzou os braços.

— Estou contando com você para encontrar um jeito.

— Tudo bem. ‘Sua rotina diária’ é um pouco vago. O que quer saber especificamente?

— Em primeiro lugar, se estava em casa na tarde do dia 7 de março.

O detetive fez uma anotação.

— Houve um forte terremoto às 15:25 daquela tarde. — Asai continuou.

— Um terremoto? O que isso tem a ver com Kubo?

— Talvez nada. Entretanto naquele dia houve um grande terremoto, e poderá usar o fato para refrescar a memória das pessoas.

— Entendi. Então quer que eu descubra se Kubo esteve em casa na hora do terremoto e o que fazia?

— Sim. Contudo não apenas durante o terremoto. O que esteve fazendo naquela tarde, até por volta das quatro.

— E há algo em particular que lhe interesse sobre aquela tarde? Se puder me informar, pode me ajudar a encontrar algumas pistas.

— Sim, gostaria de saber se alguém visitou o Sr. Kubo em casa em algum momento da tarde.

— Ah, quer dizer uma mulher?

O detetive provavelmente presumiu que Asai se referia a Chiyoko Takahashi.

— Não apenas a Sra. Takahashi. Quer dizer, ela pode muito bem tê-lo visitado naquela tarde, no entanto se houvesse outra pessoa...

— Outra pessoa?

— Sim. Homem ou mulher... Não importa. Qualquer um que tenha visitado aquela casa na tarde do dia sete.

Asai estava sendo deliberadamente vago. Ele tinha Eiko em mente, contudo não ousou colocar isso em palavras, mesmo que de forma discreta. Se o detetive soubesse a identidade do provável visitante, saberia muito a seu respeito.

— Não acho que ninguém saberia disso além das pessoas na casa. — disse o detetive, fazendo uma careta. — Sua esposa está em um sanatório em Nagano. Só tem a governanta que poderia ajudar.

— A governanta? Claro. No entanto no seu relatório anterior você escreveu que o Sr. Kubo não tinha uma. Apenas uma ajudante de meio período.

— Ela foi enviada por um serviço de despacho.

— Então se perguntar ao serviço de despacho, permitirão que fale com a ajudante?

— Acredito que sim. Entretanto esses serviços nem sempre enviam a mesma pessoa todas às vezes. Vou priorizar encontrar a pessoa que trabalhou no dia 7 de março.

— Seria útil se pudesse falar com outras pessoas que trabalharam em dias diferentes, para ter uma ideia da rotina diária do Sr. Kubo, mas vamos descobrir sobre o dia 7 de março primeiro. Acha que conseguirá encontrá-la?

— Se ela ainda estiver trabalhando no serviço de despacho e em outro emprego, e irei encontrá-la lá e a entrevistarei. Se tiver saído do serviço, pode demorar um pouco mais para encontrá-la.

— Eu agradeceria.

— Entendido. Há mais alguma coisa que gostaria de saber?

Asai pensou por um momento.

— Na verdade, há. Quais são os hobbies do Sr. Kubo?

***

Para aqueles que puderem e quiserem apoiar a tradução do blog, temos agora uma conta do PIX.

Chave PIXmylittleworldofsecrets@outlook.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário