Capítulo 61: O sangue dos sacerdotes corre na escuridão da noite
O pôr do sol pintou o templo de Vrabazard com a cor de sangue. Podíamos ver alguns brutamontes rondando a entrada, assim como da última vez que o visitamos.
Suponho que a confusão ainda não começou...
Gourry e eu fomos direto para a entrada.
“Ei, parem aí! Ah, são vocês, conselheiros. O que querem agora... Ei! Esperem!” um dos rufiões começou a gritar quando não diminuímos o passo nem respondemos.
Lancei um olhar para trás, para todos eles.
“O Sacerdote Francis está em perigo. Precisamos vê-lo!” falei.
“Hã?”
Minhas palavras silenciaram a turba contratada, então os deixamos para trás e entramos no templo. Já conhecíamos a planta do lugar, então caminhamos direto para o quarto do sacerdote e... Wham! Abrimos a porta com um estrondo. Lá dentro, encontramos o Sacerdote Francis e quatro mercenários.
“Vocês...” ele se levantou enquanto os mercenários começavam a cochichar entre si. “O que estão...”
“Zord e Zychael estão mortos!” anunciei sem rodeios antes que qualquer um pudesse falar. Isso foi o suficiente para fazer Francis congelar. “Acho que sabe do que estou falando, certo?”
“Ah...” um sussurro rouco escapou de seus lábios, e seu corpo afundou na cadeira. Os mercenários, que não sabiam nada da situação, mantiveram as mãos nos cabos de suas espadas e trocaram olhares inquisitivos. “Eu...” o rosto de Francis se contorceu de vergonha enquanto balançava a cabeça em um movimento arrastado. “Não é... Minha culpa.”
“Chega de conversa fiada!” Gourry rosnou.
Isso fez Francis estremecer, e os mercenários apertaram suas espadas com mais força. Porém...
“Quantas pessoas estão mortas? Quantas vidas perdidas pelas mãos dos seus assassinos?”
Suas palavras pegaram os mercenários de surpresa. Compreensivelmente, é claro. Francis com certeza não os havia notificado que contratara assassinos.
“Você também matou o Sumo Sacerdote Joshua e fez parecer um acidente?” perguntei.
“Não... Não, por favor... Por favor, me escute...” disse Francis com uma voz fraca, agarrando a cabeça enquanto a balançava para frente e para trás. “Eu recebi... Uma revelação.”
“Hã?” perguntei, franzindo a testa. Uma revelação? Que história é essa?
“Quando o Sumo Sacerdote Joshua morreu naquele incêndio, perdi uma importante fonte de apoio na minha vida. Fiquei me perguntando... Como um homem tão bom pôde apenas perecer assim? Rezei aos deuses em que acredito... Ao Senhor Ceifeed... Ao Senhor Vrabazard. E então, naquela noite... Ouvi uma voz.”
“Uma voz?”
“Falou ao meu ouvido enquanto eu orava... Sim, tenho certeza de que era a voz de Deus. Revelou-me que a morte do sumo sacerdote não foi um acidente... Que foi um assassinato perpetrado pelos ímpios. Que o mesmo malfeitor buscava mergulhar a cidade no caos. Que eu poderia ser o próximo, e que para me proteger, precisava de poder... ‘Reúna poder’, foi o que me disse... Foi o que a voz de Deus me disse!”
“Essa é a coisa mais estúpida que já ouvi!” sibilei, contudo Francis pareceu não me ouvir e apenas continuou a divagar.
“E então... Contratei pessoas. Se um dos outros três sacerdotes fosse o assassino, queria mandar uma mensagem para eles: ‘Sei o que fizeram. Não vou deixar que façam o mesmo comigo. Um dia, vou expô-los.’ No começo, só contratei amadores impulsivos, no entanto os outros sacerdotes também começaram a contratar gente... Então tive que recorrer a mercenários profissionais. Afinal, não podia me dar ao luxo de ser dominado por eles se um dos três fosse o assassino. Aí todos seguiram o exemplo. E então... Antes que pudesse me dar conta... Estava contratando aquele assassino chamado Zord...” Francis confessou, com tormento e arrependimento estampados no rosto.
“E ordenou que matasse o Sacerdote Bran do Oeste?” insisti.
“Não!” agitado, Francis gritou, olhando para mim de novo. “Não pedi que o matasse! Tudo o que ordenei foi que mantivesse os outros sacerdotes sob controle... Pressionasse um pouco os mercenários que contrataram e os fizesse recuar! Só isso! Aquele homem... Zord matou Bran por conta própria!”
“Realmente espera que eu acredite nessa historinha?”
“É verdade!” sua voz falhou. “Alguns dias antes do incidente com Bran, Zord veio me dar seu relatório noturno. Parecia estar excepcionalmente animado. Perguntei por quê... E foi quando me contou que tinha encontrado alguns rostos familiares. Que estava prestes a começar a ‘realmente gostar disso’. Não pensei... Que quisesse dizer...”
Rostos familiares...? Espere um minuto!
Alguns dias antes do incidente com Bran teria sido o dia em que chegamos à cidade. O dia em que nos deparamos com um assassino e mercenário nas favelas. Se esse assassino era Zord, então...
“Ouvi dizer que vários assassinos atacaram Bran... Mas só contratei Zord! Presumi que outra pessoa fosse responsável pelo ocorrido, porém naquela noite... Zord veio até mim rindo, dizendo: ‘Era isso o que queria, não é? Trouxe meus colegas para ajudar.’ Contudo nunca foi o que eu quis! Não queria nada do que aconteceu! Eu só...!” ele enterrou o rosto nas mãos.
Aha... Agora entendi.
Zord deve ter nos reconhecido naquela noite, percebendo que a vantagem de dois contra dois era arriscada para entrar em combate, acabou se retirando. No entanto não significava que havia desistido de seu desejo de vingança. Assim, chamou seus antigos camaradas e iniciou um banho de sangue, desafiando as ordens de Francis. Seu objetivo era nos arrastar para essa luta. E no fim... Foi Mileena quem...
“Eu não... Pedi por aquilo!” Francis gemeu baixinho, com o rosto escondido pelas mãos, como se tentasse se convencer. “Não... Não queria que Bran morresse. Não é... Minha culpa...”
“Você pode pensar assim se quiser.” disse uma voz do nada. Era Luke.
Então, de repente... Fwssh! A escuridão envolveu o corpo de Francis! Ninguém sabia ao certo o que tinha acontecido a princípio. E enquanto estávamos ali, paralisados em choque... Crash! Um rugido incrível soou, e...
“Graaaaah!” o lamento de Francis ecoou pela sala.
Tudo o que consegui fazer foi ficar ali parada, sem reação. Não conseguia nem imaginar o que estava acontecendo. Luke tinha emboscado Francis; sabia ao menos isso, entretanto por que envolvê-lo na escuridão? E o que foi aquele estrondo...
Claro!
“Luke!” gritei enquanto saía correndo, saltando sobre a mesa do sacerdote em uma disparada em direção à escuridão.
“Lina!” Gourry gritou, logo atrás de mim.
Mergulhei na clareira... E saí do outro lado em um mundo alaranjado. Havia árvores de jardim bem podadas, um longo caminho de lajes, pequenas fontes e estátuas, tudo tingido com a cor do pôr do sol.
“Lina! Onde estamos?” Gourry sussurrou ao emergir do mesmo buraco na parede atrás de mim.
“No pátio, acho.” respondi. Afinal, o quarto do sacerdote ficava bem ao lado.
O chão ao nosso redor estava coberto de guarda-costas e sacerdotes caídos. Estavam inconscientes? Estavam mortos? Sei lá.
Levei um segundo para processar o que tínhamos acabado de presenciar. Luke havia usado um feitiço chamado Nevoeiro Negro, que conjurava uma espécie de névoa negra que reduzia a visibilidade a zero em uma determinada área. Ele lançou o feitiço do outro lado da parede para envolver Francis. Então, enquanto todos estávamos atordoados demais para reagir, lançou um segundo feitiço para romper a parede e arrastar Francis para fora.
Logo os avistei, silhuetados pelo pôr do sol, em pé no telhado da varanda.
“É... Imaginei que você me seguiria. Te conhecendo bem... É. Imaginei que o faria.” disse Luke, com um tom irônico na voz. Era difícil ver seu rosto, coberto pela sombra, todavia Francis já estava pendurado, inerte, em seus braços.
“Chega, Luke! Tudo o que Francis fez foi contratar o Zord! Ele não mandou que fizesse aquilo!” gritei.
“Sim... Eu sei. Estive ouvindo de fora, já sei de toda a situação. É por esse motivo que... Ao contrário daquele idiota do Zord, fiz tudo indolor.”
O quê?
Fffft... Thud. O corpo de Francis caiu dos braços de Luke, bateu na beirada do telhado e despencou no chão.
“Há muito tempo atrás...” Luke continuou, com a voz distante. “Eu também fazia esse tipo de coisa. Matava pessoas por dinheiro e tudo mais. Conhecer a Mileena me transformou em um novo homem. Mas agora... Esses idiotas me fizeram lembrar. Maldição.”
“Está... Está tudo bem agora, Luke!” falei.
“Não... Não está. Ainda não!” ele me repreendeu em voz baixa.
“Luke!”
“Eu agradeceria se vocês ficassem fora desse assunto. Porém sei que pedir não vai adiantar nada, vocês sendo tão intrometidos...”
“Isso não está certo!”
“Não vou discutir. Acho que também não deixaria a Mileena feliz. Contudo... Se eu não o fizer...” nesse momento, Luke parou de falar. O silêncio se instalou, pontuado apenas pelo vento crepuscular. E então...
“O-O que está acontecendo?”
“Ali está ele! Ali!”
Pude ouvir os mercenários finalmente emergindo pelo buraco na parede. Sua chegada era o sinal para Luke sair.
“Luke!” gritei quando ele se virou para ir embora.
Seu olhar se voltou por cima do ombro para mim.
“Estou quase terminando. Não tente me impedir. Próximo... O sul!” sua voz soou quase como um sussurro, e saiu correndo pelo telhado.
“Ei! Peguem aquele maldito!”
“Espere, seu desgraçado!” os mercenários partiram em perseguição. Nesse meio tempo... Apenas fiquei parada.
“Lina! Temos que segui-lo!” Gourry insistiu, contudo não me mexi. “Lina!”
“Luke disse para não irmos! respondi, em voz baixa. “Luke... Não quer que o impeçamos.”
“Lina?” Gourry se colocou na minha frente, segurando meus ombros. “Isso não é típico seu. O que acha que Luke quis dizer agora? Para mim, soou como ‘por favor, me impeçam’.”
Ahh... Senti um nó na garganta por um instante. Gourry tinha razão. Luke havia dito para onde iria em seguida. Será que o teria mencionado se de fato não quisesse que o impedíssemos? Se quisesse nos despistar, teria fingido recuar e depois ido embora de qualquer maneira. Não haveria como impedi-lo. No entanto, aparentemente sem motivo algum, acabou nos dizendo seu próximo destino...
“Tem razão!” concordei em silêncio.
Luke devia estar dividido entre dois sentimentos contraditórios: o desejo de se manter fiel à paz que Mileena lhe proporcionara e o ódio profundo que sentia por aqueles que a haviam tirado dele. Nenhum dos dois havia prevalecido por completo... Ainda não.
“Vamos, Gourry.”
“Claro.”
Recitei um feitiço Lei Asa amplificado e decolei em alta velocidade com Gourry a reboque. Nosso destino? O Sacerdote Ryan no templo sul.
———
Estrelas cintilavam no céu crepuscular. O sol já havia se posto no horizonte, e os últimos raios vermelhos no lado oeste da cidade ofereciam pouca resistência à escuridão que se aproximava. A noite caía.
Era essa a hora em que Gourry e eu pousamos no templo sul. Templos típicos, verdadeiros pontos turísticos, fecham suas portas à noite quando o movimento diminui e, de fato, o templo sul estava trancado quando chegamos. Um guarda da cidade e um mercenário estavam de guarda na entrada principal.
“Lina Inverse e Gourry Gabriev, do conselho de feiticeiros!” anunciei ao nos aproximarmos, antes mesmo que pudessem perguntar.
“O que vocês querem?” perguntou o soldado, com uma expressão cautelosa.
“Temos informações de que alguém virá para matar o Sacerdote Ryan. Precisamos vê-lo.” eu disse.
“O quê?” o soldado e o mercenário gritaram em uníssono.
O rosto do mercenário empalideceu.
“T-Tudo bem. Vou mostrar o caminho...”
“Espere!” o soldado o interrompeu. “Dê-nos os detalhes.”
“Não temos tempo!” insisti.
“Se precisam conversar, podemos fazê-lo aqui mesmo! Por que precisam entrar com tanta urgência?”
“Para protegê-lo, é claro!”
“O sacerdote já tem guarda-costas de sobra!”
Entendi por que o soldado estava desconfiado. Ele pensou que poderíamos ser assassinos que vieram atrás do Sacerdote Ryan e que estávamos apenas inventando desculpas para tentar nos aproximar. Não podia culpá-lo por desconfiar, dada a situação. Mas também não podia só recuar. Luke estava se aproximando a cada minuto.
Olhei ao redor por um tempo antes de fixar os olhos em uma lâmpada no portão da entrada. Era um pouco mais alta do que eu, com um poste tão grosso quanto meu pulso, e no topo havia uma estátua de uma jovem segurando um cálice. Uma luz mágica pairava sobre o cálice.
Apontei para ela.
“Gourry, corte isso.”
Gourry imediatamente cortou o ar com sua espada! Swish! Crrreak... Crash! O pilar de bronze foi partido na diagonal, fazendo a lâmpada cair no jardim. Foi uma demonstração de uma espetacular esgrima.
Olhei para o soldado de novo.
“Se fôssemos assassinos, não nos daríamos ao trabalho de conversar. Apenas te mataríamos e conseguiríamos o que queremos. Seria mais rápido, não é? Considere que não vamos seguir esse caminho. Veja bem, o cara que está vindo é muito forte... Se os soldados que guardam o sacerdote conseguirem fazer o que meu amigo aqui acabou de fazer, talvez você não precise de nós, afinal. Porém, se não, o Sacerdote Ryan estará morto... Sem mais nem menos. E aí? O que acha?”
“M-Muito bem...” não tenho certeza se foi a habilidade de Gourry ou meu argumento que o persuadiu, contudo o soldado cedeu. “M-Mas... Irei com vocês.”
“Como quiser. Vamos!” respondi.
Gourry e eu deixamos o mercenário para trás e seguimos o soldado para dentro do templo. Lá dentro estava cheio de mercenários, embora não houvesse sinal dos sacerdotes que costumavam estar presentes.
“Nenhum homem santo a esta hora?” sussurrei para mim mesma.
O soldado deve ter ouvido.
“É hora do jantar.” explicou. “O Sacerdote Ryan deve estar jantando em seus aposentos particulares, e os outros sacerdotes fazem suas refeições no refeitório.”
Isso mesmo, está quase na hora. Nesse caso...
“Depressa!” gritei.
“Hã? Tudo bem...”
Ao meu comando, o grupo acelerou o passo e logo chegamos aos aposentos do sacerdote. Bang! Arrombamos a porta e encontramos um grupo de cinco soldados e mercenários em volta do Sacerdote Ryan, que estava levando um garfo à boca.
“Quem...?” ele gaguejou. “Esperem, vocês são os conselheiros do grêmio de feiticeiros...”
“Sacerdote Ryan, alguém vai te matar!” declarei.
“O-O quê?” Ryan e os mercenários se levantaram com um estrondo.
“Vocês já comeram alguma coisa?”
“Não, estava prestes a começar. Não me diga...!” seus olhos se arregalaram sua mão jogou o garfo fora. “Está envenenado?”
Ele olhou com medo para os pratos na bandeja. Uma salada morna de legumes, peixe branco frito, pão e sopa. Seu garfo mal havia espetado sua primeira garfada de peixe.
“Vamos experimentar.” falei, pegando a bandeja e dando uma mordida carrancuda em cada prato. “Experimente um pouco, Gourry.” incentivei enquanto lhe entregava a comida.
“Certo.”
Gourry também deu uma mordida em cada prato.
O Sacerdote Ryan continuou nos observando com pavor.
“Hmm...” eu disse, pensativa. “Acho que, felizmente, a comida está boa.”
Claro que estava. Luke não teve tempo de se adiantar e envenenar a refeição do homem. Só fiz uma ceninha para que pudéssemos comer alguma coisa.
Ei, não me julgue! A desnutrição compromete tanto a capacidade cerebral quanto a muscular. Não havia como lutar ou argumentar contra Luke de estômago vazio.
“Mesmo assim, este cômodo não é seguro. Como fica ao lado do pátio, poderíamos ser atingidos com um feitiço de fora. Vamos para uma câmara maior, de preferência uma interna, sem janelas... E com poucos esconderijos.” sugeri.
Ryan se levantou em seguida.
“E-Entendido! Para o refeitório, então!”
“Os outros sacerdotes não estão jantando lá?”
“Vou expulsá-los!” declarou o sacerdote sem hesitar. “Vamos! Sigam-nos, todos vocês!”
Deixando seu jantar para trás, o sacerdote saiu do cômodo, cercado por seus soldados e mercenários. Nós dois os seguimos.
Logo chegamos a uma sala vasta com uma grande mesa no centro. Ryan ordenou que os sacerdotes que jantavam ali se retirassem e, em seguida, ordenou que seus mercenários limpassem a mesa. Os sacerdotes, alheios à situação, pareceram descontentes com a ordem, no entanto Ryan claramente não se importava. Quer dizer, tenho certeza de que é difícil ser atencioso quando sua vida está por um fio, mas mesmo assim...
Depois que esvaziamos o local e nos sentamos à mesa central, o Sacerdote Ryan soltou um suspiro.
“Agora, tudo isso sobre alguém tentando me matar... Por quê? O que está acontecendo aqui? Será que um dos outros sacerdotes está por trás disso? É a mesma pessoa que matou o sumo sacerdote e Bran? Há muitos assassinos? Não deveríamos estar fugindo em vez de nos escondermos aqui? Não, talvez o que eu precise seja de mais soldados para me proteger! Por sinal... Ouvi dizer que houve um incêndio na cidade. Tem alguma relação?”
“Calma. Uma pergunta de cada vez, tá bom?” falei, tentando acalmar o sacerdote irritadiço.
Para ser honesta, não tinha muita certeza do que dizer a ele... Não sabia se deveria revelar que Luke era quem estava atrás da sua vida. Se contasse tudo, existia a possibilidade de que começasse a pensar que Ceres, o empregador de Luke, é o responsável. Por outro lado, se ficasse calada, Ryan talvez nunca percebesse o que seu egoísmo tinha causado...
“Este não é o cara que matou o sumo sacerdote e Bran!” respondi. “É alguém com... Uma mágoa mais pessoal contra você.”
“Uma... Mágoa pessoal? Não seja absurda! Nunca ofendi ninguém!” ele insistiu descaradamente, sem qualquer autocrítica.
Com uma onda repentina de raiva interna, me vi levantando a mão e... Wham!
“Guh!” Ryan levou um soco na cara e caiu no chão.
“Sua Santidade!”
“O que vocês estão fazendo?”
Os mercenários nos lançaram olhares acusadores, mas...
“Eu poderia ter feito muito pior. E você teria merecido.”
Foi Gourry quem falou, não eu. As palavras daquele velho sacerdote devem tê-lo irritado bastante.
“O quê? Do que está falando?” Ryan exigiu, levando a mão à bochecha.
Olhei para ele.
“Há alguns dias, um casal visitou este lugar. A mulher foi envenenada e você se recusou a tratá-la por despeito, só porque ela trabalhava para Ceres do Norte. Ela está morta agora. O homem que era seu companheiro tinha um grande apreço por ela, então agora está buscando vingança. A única maneira de consertar as coisas seria trazê-la de volta à vida. E já que parece meio lento para entender as coisas, vou dizer logo de cara: você basicamente a matou.” minha declaração fez com que os mercenários e os soldados olhassem furiosamente para o Sacerdote Ryan.
“Espere... Está me acusando de assassinato? C-Como ousa? Absurdo! Eu... Não sei do que está falando!”
“O mercenário que nos expulsou na porta nos disse que estava agindo sob suas ordens.”
“Isso... Isso é... É algum tipo de engano! Nu... Nunca... Não é como se eu tivesse envenenado a garota! Ele deveria ir atrás de quem o fez!”
“Já foi!” respondi em um tom casual. Ryan então congelou e ficou em silêncio. “Você disse que ouviu falar de um incêndio por perto, certo? Foi lá que matou o cara. O despedaçou enquanto ainda estava vivo. Depois, o jogou no inferno para terminar o serviço.”
Os joelhos de Ryan começaram a tremer. Parecia que enfim estava entendendo.
“M-Mas...” seu olhar se tornou suplicante. “É só um homem! Quer dizer que não foi o grupo que matou Bran! Então... Com toda essa segurança, não tenho nada a temer!”
“Estou te dizendo que matou os assassinos de Bran naquele incêndio. Quem acha que é a maior ameaça?”
“Yeek!” o velho sacerdote engasgou. “Vo... Vocês vão me proteger, não vão? Deus me confiou a guarda desta cidade! Não posso... Não posso morrer ainda! Por favor, me proteja!”
“Não sei que tipo de coisa estúpida ‘Deus’ te confiou, e não dou a mínima!” deixei claro. “Não tenho obrigação nenhuma de proteger um idiota como você.”
“Por favor!”
“Só quero impedir o cara que está causando destruição, do fundo do meu coração... E por acaso isso significa te manter a salvo.”
“Vou te dar qualquer coisa! Só me salve! P-Por favor! Eu imploro!”
“Então sente-se e cale a boca.”
“S-Sim! Claro!” Ryan disse e rapidamente se sentou.
Seria bom se o velho desgraçado apenas se calasse e ficasse quieto, contudo...
A planta do templo do sul devia ser a mesma das outras filiais. Luke tinha sido guarda-costas no templo do norte, então era seguro presumir que conhecia o básico do lugar. Por outro lado, Gourry e eu não tínhamos muita noção de onde ficava cada coisa... O que significava que movimentar Ryan demais só favoreceria Luke.
A questão, então, era como Luke nos abordaria se nos entrincheirássemos. Não havia janelas no refeitório e apenas duas portas, que ficavam a certa distância de onde Ryan estava sentado. Luke não poderia usar a mesma estratégia que usou no templo do leste agora que tínhamos mudado de sala. Ryan estava muito longe de qualquer parede externa.
Da última vez, demoramos a reagir porque tudo foi muito repentino, no entanto agora que sabíamos o truque, não nos pegaria de surpresa com outro feitiço Nevoeiro Negro. Em outras palavras, se Luke fosse nos atacar de surpresa, havia apenas duas maneiras de fazê-lo: por cima ou por baixo.
“Há um porão embaixo deste refeitório?” perguntei.
“Hã? Não... Só os anexos têm porões. Devemos ir para um deles?” Ryan perguntou, por sua vez.
“O que tem aqui em cima?” perguntei, ignorando-o.
“O quê? Seriam os dormitórios dos sacerdotes... Claro! Ele virá de cima! Isso! Sim! Mandem todos os guardas para o andar de cima! Ei, você aí! Pegue cinco ou seis guardas no pátio que não tenham nada melhor para fazer e leve-os para cima! Ao redor dos quartos cinco a sete dos dormitórios dos sacerdotes! Entendeu?”
Um dos mercenários saiu da sala ao comando de Ryan.
Depois, o corredor ficou em silêncio por um bom tempo. Não tínhamos nada a fazer a não ser aguardar a chegada de Luke.
A espera era interminável. O que estava o atrasando tanto? Não que estivesse ansiosa para que Luke aparecesse furioso, embora quando nos separamos, suas palavras deram a entender que viria direto para cá. Já havia passado muito tempo para que fosse esse o caso. Talvez já estivesse dentro do prédio, esperando o momento certo.
“El... Ele está mesmo vindo atrás de mim?” Ryan enfim perguntou, aterrorizado, incapaz de suportar o silêncio. “Tem certeza de que não houve nenhum engano? Talvez tenha te feito pensar que estava atrás de mim enquanto ia atrás de Francis no leste.”
“Se é o que pensa, podemos ir embora agora mesmo.”
“N-Não! Por favor, não!” Ryan gritou, gesticulando com medo.
“Além do mais...” comecei a dizer, mas então... Ouvi passos se aproximando pelo corredor.
“É... É ele?” Ryan exclamou, apavorado.
Os mercenários se animaram, mas quem chegou à porta foi um sacerdote ofegante.
“Sacerdote Ryan!” o homem chamou.
“O que houve?” Ryan se levantou num pulo.
“E-Emergência!” gritou o sacerdote, caindo de joelhos diante de Ryan.
“Um mensageiro acaba de chegar do templo oriental! O Sacerdote Francis foi morto por um intruso!”
“O quê?” Ryan exclamou, chocado.
“Nós sabemos!” eu disse.
A sala inteira congelou.
“Nós o vimos matar o Sacerdote Francis bem diante dos nossos olhos. E depois, disse que iria para o sul. É por esse motivo que estamos aqui.”
“Não... Não! Isso significa...”
Antes que Ryan pudesse dizer o que ia dizer... Fwoom! Ouvimos um estrondo distante e vários gritos.
“O-O que foi isso?” o sacerdote ofegou.
“Algo está acontecendo no pátio!” anunciou um dos mercenários no corredor.
“Ah... Tudo bem! Mandem todos os guardas para...”
“Pare!” interrompi Ryan bruscamente.
“O quê?”
“É provável que seja uma distração! Está causando alvoroço no pátio para atrair atenção para lá! Aí, quando seus guardas se dispersarem, você será atacado!”
“P-Porém só tem um atacante, certo?”
“Sim, contudo tem seus métodos! Pode ser que tenha invocado um golem de pedra para causar estragos! Então fique aí, por favor!”
“Boa ideia, até o golem de pedra... Você me conhece muito bem.”
Eu me encolhi ao ouvir sua voz. Preciso mesmo dizer quem é?
“Quem é... Ghhk!”
No corredor, ouvi o grito de um mercenário interrompido por um gemido.
Então ele apareceu em uma das portas, com sua lâmina desembainhada ao lado. Luke...
“Ei. Você é o Sacerdote Ryan, certo? Vim aqui para te matar.”
Logo em seguida, uma figura atravessou a sala correndo. Gourry!
Em um instante, se aproximou de Luke, desembainhou a espada, assumiu uma postura e bloqueou a passagem! Bela jogada! Luke mal tinha aparecido na porta, no entanto o grandalhão não ia deixá-lo passar!
“Já chega!” gritou Gourry.
“É, imaginei que vocês viriam. Na verdade, queria muito que não tivessem vindo. Não queria envolver vocês dois nisso...” Luke murmurou enquanto preparava a espada e se posicionava para enfrentar Gourry. “Já que sei que não consigo te vencer num duelo de espadas.”
Um sorriso de auto recriminação surgiu em seu rosto.
“Eeeeek!” Ryan gritou, e eu me movi para protegê-lo.
“Não vou te dar nenhuma desculpa esfarrapada do tipo ‘Entendo como se sente’!” gritei. “Mas não posso ficar parada e deixá-lo continuar com essa destruição!”
“Sim... Desculpe por todos os problemas que estou causando. Só que não consigo me controlar!” disse Luke, com o olhar fixo em Gourry.
Luke sabia que não conseguiria superar Gourry em termos de habilidade com a espada, entretanto havia mais do que isso. Havia uma diferença decisiva em suas armas. Luke tinha uma espada mágica com um fio bastante afiado e uma propriedade interessante que lhe permitia armazenar por algum tempo um feitiço nela. Por sua vez, Gourry possuía a lendária Espada Explosiva, tão incrivelmente afiada que tivemos que lançar um feitiço de proteção para mantê-la sob controle. A espada de Luke seria destruída no primeiro choque. Ele devia estar ciente... Contudo não demonstrava nenhuma intenção de recuar. Pretendia lutar até o fim, mesmo que o resultado já fosse evidente? Ou teria um plano em mente?
“Vamos lá!” Luke gritou enquanto brandia sua espada.
A lâmina de Gourry brilhou em resposta. E no instante em que os dois feixes de luz se aproximaram... Whoosh! Uma rajada desviou a lâmina de Gourry! Será que Luke havia carregado sua espada com um feitiço de vento? Em outras circunstâncias, Gourry conseguiria cortar um redemoinho, no entanto, apesar de sua determinação em deter Luke, sua esgrima não tinha a ferocidade de sempre.
“Grk!”
Mesmo assim, canalizou o impulso de sua lâmina desviada em outro golpe. Seu alvo? A espada na mão de Luke! Ia cortá-la ao meio para neutralizar seu poder de ataque.
Mas... Whoosh! Outra rajada de vento desviou a lâmina de Gourry de novo! Desta vez, Luke entrou na frente. Gourry recuou para manter distância.
Eu estava errada... Percebi de repente, atônita. Gourry não estava se segurando nem um pouco; parecia que sim porque o vento que envolvia a lâmina de Luke era simplesmente incrível. Essa era a única explicação para o fato de ter desviado o golpe de Gourry não uma, e sim duas vezes! Luke sabia que Gourry estaria ali, então decidiu priorizar a defesa em vez do ataque. O que significava...
Antecipando o próximo movimento de Luke, comecei a murmurar um feitiço. Gourry não podia arriscar recuar mais. Ele desferiu um terceiro e depois um quarto golpe, porém a espada de Luke os desviou também. Contra um oponente comum, Gourry teria tido a perspicácia de prever a trajetória do vento e cortá-lo. Contudo, embora não fosse tão bom quanto Gourry, Luke era muito superior a um ‘espadachim comum’. Ao se concentrar na defesa, podia continuar usando sua barreira de vento para desestabilizá-lo. Vendo por esse ângulo... Era impressionante!
Enquanto Luke desviava o enésimo golpe, ele bradou.
“Rajada!”
Com isto... Vwoosh! O vento armazenado na espada foi liberado, irrompendo em um uivo!
Pego de surpresa, Gourry perdeu o equilíbrio, sendo forçado a saltar para trás com o vento em vez de resistir, e quando o fez, Luke disparou! Avançou em direção a Ryan no instante em que Gourry saiu do caminho!
Por sorte, previ sua jogada. Liberei no instante seguinte o feitiço que havia entoado.
“Vento de Diem!”
Vwoosh! Minha própria rajada empurrou Gourry de volta na direção de onde viera, diminuindo a distância entre os dois de novo!
“O quê?” Luke exclamou surpreso.
“Graaaah!”
Nesse momento, Gourry soltou um grito de guerra e, por causa deste, ouvi a espada de Luke atingir o chão.
Gourry não a havia derrubado de sua mão, no entanto. Percebendo que um golpe da Espada Explosiva seria o fim de sua lâmina, Luke a largou no momento em que fizeram contato. A natureza improvisada do ataque de Gourry não conseguiu cortar a arma de Luke instantaneamente.
“Rrk!” Luke recuou para o corredor, percebendo que agora estava em desvantagem.
Mas não podíamos deixá-lo escapar! Se fugisse, viria atrás de Ryan de alguma outra forma! Se isso acontecesse, qual seria o sentido de todo esse trabalho duro? Precisávamos que abandonasse seu ódio e recuasse de vez. Não sabia como faríamos para conseguir isso, porém a única maneira de tentar era iniciar um diálogo.
“Gourry! Atrás dele!” gritei, correndo atrás.
Gourry me seguiu e, quando chegamos ao corredor... Bwsh!
O local onde Luke havia se refugiado estava envolto em escuridão... Outro feitiço Nevoeiro Negro! Gourry parou instintivamente. Então, de repente...
Fwoosh! Chamas começaram a surgir da escuridão ao longo do teto!
“Waaaaagh!” gritaram os mercenários surpresos.
As chamas grudaram no teto, sugerindo que Luke havia lançado um feitiço de fogo para cima, de além do Nevoeiro Negro, para nos manter sob controle. Só que eu não ia deixar esse truque me impedir! Corri de cabeça para a escuridão!
Em poucos passos cheguei do outro lado... E parei. Havia luzes mágicas em apliques iluminando o corredor, contudo logo adiante havia outra mancha de Nevoeiro Negro.
“Lina!” Gourry acelerou o passo para me alcançar. Trocamos um olhar, assentimos e saímos correndo de novo. Passamos pela segunda nuvem escura apenas para encontrar uma terceira além dela.
Argh! Desista de uma vez, cara! Sem nem diminuir o passo desta vez, nós dois mergulhamos. Saímos em um cruzamento. O corredor logo adiante estava obscurecido por mais uma mancha de escuridão.
A dúvida nublou minha mente.
“Pare!” gritei, parando eu mesma.
A distração do Nevoeiro Negro... A primeira tentativa fez sentido. Até a segunda. No entanto uma terceira? Luke devia saber que não funcionaria. Então, o que havia de errado com a quarta? Parecia que a havia colocado intencionalmente além do cruzamento, numa tentativa de nos convencer de que tinha ido por aquele caminho. Todavia se realmente quisesse nos despistar, a jogada óbvia teria sido lançar o Nevoeiro Negro na própria interseção e então escolher um lado.
Fazer isso sugeria... Que estava tentando nos enganar, ou nos fazer pensar que estava nos enganando quando na verdade tinha ido por aquele caminho? Ou seria possível...?
“Vamos voltar, Gourry!” falei, me virando de repente e correndo de volta para a escuridão de onde tínhamos acabado de sair.
“Certo!” Gourry respondeu, fazendo o mesmo.
Recuamos até que...
“Waaagh!” os mercenários gritaram, surpresos com nosso súbito reaparecimento.
“Calma!” eu os repreendi enquanto olhava ao redor da sala. Não havia mais ninguém na cadeira central. “Onde está o sacerdote?”
“E-Ele levou seus guardas e saiu correndo pela outra porta!” um dos mercenários respondeu.
Droga! Finalmente percebi o plano de Luke. O objetivo do fogo no teto não era nos impedir, a mim e a Gourry. Era fazer com que Ryan, já apavorado, saísse do refeitório com a fumaça. Nesse meio tempo, Luke fingiu fugir para nos atrair pelo corredor, usando seu conhecimento superior da planta do prédio para chegar ao outro lado do refeitório e interceptar Ryan.
Essa estratégia explicava por que havia demorado tanto para chegar aqui vindo do templo leste. Queria que explicássemos a situação a Ryan e deixássemos seu medo se espalhar.
Gourry e eu corremos pelo salão em direção à outra porta. Nesse instante...
Krr-crash! Mais adiante no corredor, o teto desabou com um estrondo!
“P-Por favor! Pare!” consegui ouvir Ryan gritando além das reverberações da destruição.
Nada bom! Continuamos correndo, apesar de tudo. A poeira ainda não tinha baixado, entretanto não era hora de nos preocuparmos com isso. Escalamos a montanha de entulho no chão. Como o guarda no refeitório havia dito, o sacerdote devia estar com sua equipe de segurança. Havia alguns mercenários caídos por perto, embora não houvesse nenhum sinal de Luke e Ryan.
Onde estão? Usei meus sentidos e captei o som de combate à distância. São eles? Não, é o golem no pátio...
“Aaagh!” por cima do barulho distante, consegui ouvir o Sacerdote Ryan!
“Por aqui!” Gourry gritou e saiu correndo. Eu fiz o mesmo.
Saímos do corredor, viramos uma esquina e... Considerando nossa direção geral, tinha quase certeza de que estávamos a caminho do quintal. Em qualquer outro momento haveria guardas por toda parte, mas não havia um único à vista agora. Devem ter se reunido todos no pátio mais cedo.
Nós dois seguimos correndo pelo corredor e... Wham! Abrimos com força uma porta que estava entreaberta! Saímos do prédio para a noite silenciosa.
Aqui e ali, lâmpadas lançavam uma tênue luz mágica. O gramado estava bem aparado e as árvores bem cuidadas. Silhuetas sombrias de estátuas de bronze nos cercavam. Ainda conseguia ouvir a confusão vinda do pátio, que parecia ter atraído a maioria dos guardas do templo. Havia apenas alguns aqui atrás... Todos caídos no chão.
Em silêncio entre eles... Estava Luke.
“Eu simplesmente não entendo!” disse ele baixinho.
Havia uma massa negra a seus pés... Olhei para baixo e vi que era o corpo do Sacerdote Ryan. Maldição!
“Humanos... Às vezes parece que eles podem sobreviver a qualquer coisa, e então... A menor coisa os mata.”
Não consegui impedi-lo. Cerrei os dentes com força.
“Lutando contra aqueles mazokus... De novo e de novo, me peguei pensando... ‘Cara, estamos perdidos.’ Porém conseguimos superar todas as vezes e vencer. Contudo depois de tudo aquilo... Ver a Mileena ser derrotada por um idiota de segunda categoria como o Zord... Só não parece real. Só... Não está certo.”
“Luke...”
“Até esse cara... Morreu assim, do nada. Não queria ter de ouvi-lo reclamando, assim pensei em cortar suas cordas vocais. Até tomei cuidado para não atingir a artéria para que não morresse tão rápido, contudo... Acho que foi o choque, porque ele apenas... Ploft. É uma droga, porque queria de todo meu coração fazer esse cara sofrer...”
“Luke...”
“Não é o suficiente. Ainda não é o suficiente...”
“O quê?” suas palavras me causaram um arrepio na espinha. O ódio dentro dele não havia sido aplacado. Podia senti-lo emanando de Luke.
“Pensei que matar esse cara seria o fim de tudo. Que seria o suficiente. Que depois, eles poderiam apenas me prender ou me matar ou o que fosse. Mileena não vai voltar de qualquer jeito, então por que me importaria? Era o que estive pensando. No entanto acho que não, porque aquela voz horrível... Continua surgindo dentro de mim... Dizendo para continuar... Que ainda não é o suficiente. Se ao menos Ceres e seu pessoal tivessem uma magia melhor... Se pudessem ter usado Ressurreição, poderiam ter salvado a Mileena!”
“Luke!” gritei.
Era verdade que o Sacerdote Ceres e seus médicos mágicos não conseguiram neutralizar o veneno e que nenhum deles era capaz de conjurar Ressurreição. No entanto, o veneno de Zord não foi projetado para ser incurável por feitiços antídotos comuns. Quando chegamos ao templo do norte naquela noite, este já havia circulado por todo o corpo de Mileena e esgotado sua energia.
Quer dizer, sim, ela poderia ter se recuperado se tivéssemos conseguido remover o veneno por completo. E um feitiço como Ressurreição, que extrai força vital da área circundante para transferir para o paciente, poderia ter recuperado energia suficiente para que resistisse contra o resto do veneno sozinha. Mas culpar Ceres pelo que aconteceu parecia tão...
“Já sei! Estou apenas dando desculpas e descontando nos outros! É o que minha cabeça me diz! Porém... No meu coração... Meu coração está me dizendo que não é o suficiente!”
“Acorda, Luke!” gritou Gourry, contudo suas palavras também não alcançaram o coração de Luke.
“Próximo alvo... O norte.”
“Não faça isso, Luke!” interrompi. “Você só está alimentando o ódio em seu coração! Se matar o Sacerdote Ceres, daqui a pouco vai estar descontando sua raiva em nós! E se conseguir nos matar, será outra pessoa a seguir! No fim, não terá mais ninguém para descontar além de si mesmo! Se você se entregar ao ódio, poderá destruir a cidade inteira e mesmo assim nunca ficará satisfeito!”
“Ok, tudo bem. O que vocês fariam? É fácil dizer para um cara só parar... Entretanto e se a mesma coisa acontecesse com vocês? E se algum idiota matasse seu parceiro e alguém dissesse para deixar o ódio de lado? Pode garantir que conseguiria? Se alguém dissesse que não adiantaria, iriam só virar e dizer ‘ah, tem razão’ e deixar para lá?”
“Eu...” eu não sabia o que dizer.
Lentamente, Luke se virou.
“É isso... Tem que ser o fim!”
“Luke!” gritei... Todavia meu grito foi abafado pelo som de Luke lançando seu feitiço, alçando voou para o norte.
Para o templo do Sacerdote Ceres.
***
Link para o índice de capítulos: Slayers
Para aqueles que puderem e quiserem apoiar a tradução do blog, temos agora uma conta do PIX.
Chave PIX: mylittleworldofsecrets@outlook.com




Nenhum comentário:
Postar um comentário