sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

A Quiet Place — Capítulo 18

Capítulo 18


Quando o Diretor-Geral Shiraishi partiu para Nagano, Asai não o acompanhou. Dois dias antes, solicitou oficialmente uma licença médica por causa de um resfriado com febre alta.

Como poderia ir para Nagano, sabendo que estava se colocando em uma situação tão perigosa?

Sabia que seria prejudicial à sua reputação no ministério, mas não conseguia ver outra saída. Contava em encontrar uma maneira de compensar o diretor-geral mais tarde.

Como uma criança mimada, Shiraishi era imprevisível, tendendo a mudanças repentinas de humor. Seria justo chamá-lo de temperamental. Um veterano de escritório como Asai sabia que seu chefe não ficaria bravo por muito tempo. Um gerente decente estaria ciente da perda que seria se um subordinado experiente e capaz como Asai lhe desse as costas. Além do mais, Shiraishi mal era dedicado ao seu cargo atual; seus olhos já estavam no cargo de Diretor-Geral de Assuntos Agrícolas ou mesmo Diretor-Geral de Agricultura. Não tinha tempo para fazer alarde sobre assuntos mesquinhos.

Quando naquele dia, na frente dos elevadores, Shiraishi de repente o pediu para acompanhá-lo a Nagano, o instinto de Asai foi aceitar na hora. Isso causou todos os tipos de problemas depois. Sua incapacidade de recusar mostrou o quanto o diretor-geral o intimidava. Não importava o quanto uma pessoa fosse uma criança mimada; quando ocupava aquele posto, era diferente, especial. Um homem como Asai, que passou anos trabalhando para subir no ministério, nunca perdeu essa atitude deferente.

Por cerca de quatro ou cinco dias após concordar em ir a Nagano, sentiu-se deprimido. Logo depois, seu chefe de divisão informou oficialmente Asai que ele acompanharia Shiraishi na excursão. Como o pedido veio do próprio diretor-geral, não havia como recusar. A licença médica foi seu último recurso, mal conseguindo evitar o perigo.

Asai talvez ficasse bem em Nagano, porém nunca se sabe. Era possível que encontrasse os dois homens que o levaram naquela noite, e embora o artigo da revista dissesse que não se lembravam de seu rosto, vê-lo de novo poderia ter despertado sua memória. Dessa forma, não estava com vontade de participar de um jogo de roleta russa.

Um dos gerentes juniores da divisão foi escalado para substituí-lo no último momento. Este relatou a Asai que sua ausência havia sido muito lamentada.

— Eles me disseram que estavam determinados a fazer com que você viesse na próxima vez. Na verdade, já estão planejando o próximo evento. Também disseram que não estão interessados ​​em convidar um bando de nomes de alto nível. Querem realizar um curso de treinamento especial e convidar pessoas com conhecimento prático como você para ministrá-los.

Obviamente, isso estava fora de questão. Se quisesse se manter seguro, demoraria um pouco até que pudesse aceitar convites de qualquer lugar do Japão.

Ele não via o Diretor-Geral Shiraishi desde então. Sabia que deveria se desculpar pelo inconveniente que sua doença fingida havia causado, contudo não conseguiu se obrigar a visitar o seu escritório. Quando reapareceu no trabalho após sua suposta recuperação, se dirigiu apenas ao chefe da divisão para expressar seu arrependimento. Seu gerente não pareceu incomodado em particular.

— Você estava doente. Não havia o que fazer. Vou repassar ao diretor-geral.

Asai se sentiu bastante ofendido. Naquele momento, percebeu o quão fácil poderia ser substituído por qualquer número de pessoas diferentes. Este chefe de divisão também era um burocrata em carreira e, tal qual Shiraishi, Asai sabia que não planejava ficar no cargo por muito tempo. Seu tipo estava muito menos interessado no conteúdo do trabalho do que em ter cuidado para não balançar o barco.

Asai presumiu que Shiraishi comunicaria seu descontentamento por meio de uma mensagem enviada pelo chefe da divisão, no entanto não foi o caso. Apesar de ter pedido em pessoa por Asai para acompanhá-lo a Nagano, descobriu-se que não o queria especificamente, poderia ter sido qualquer um. Asai supôs que, quando seu substituto relatou o quão decepcionados os moradores locais ficaram com sua ausência, provavelmente foi apenas bajulação. Eles podem muito bem ter a intenção de convidá-lo outra vez em algum momento, entretanto não estavam tão incomodados. Ou talvez estivesse apenas pensando demais.



Asai sabia que deveria tomar cuidado para não ficar muito obcecado pelo caso Kubo. Claro, precisava ser cauteloso, mas não deveria ficar neurótico a respeito. Era importante manter a calma.

No momento, não havia nada muito preocupante. Não havia mais artigos sobre o assassinato nos jornais ou revistas semanais, nem qualquer sinal de que a investigação se aproximasse de algum suspeito. Crimes cometidos em locais idílicos e pastorais como a serra de Yatsugatake ou o planalto de Fujimi, não importa quão fascinantes para o leitor, sempre tinham que dar lugar a contos sórdidos da cidade grande. Não deve ter havido progresso na investigação, então nada de novo para relatar.

Ele disse a si mesmo que faria uma visita ao Diretor-Geral Shiraishi assim que pudesse e se desculparia por sua ausência, porém de alguma forma o tempo passou rápido demais. O ano chegou ao fim e o novo começou. O diretor-geral reuniu toda a sua equipe para um discurso de abertura do ano, contudo Asai dificilmente se levantaria na frente de todos e começaria a dar desculpas.

Ao longo de janeiro e fevereiro, nunca teve a oportunidade de ficar sozinho com Shiraishi. Ainda que o visse com certa frequência à distância, o diretor-geral seguia sempre cercado de pessoas. Não havia mais encontros casuais em frente aos elevadores. Essa era a questão do destino, às vezes as oportunidades surgiam abundantes e rápidas, e então, de repente, não havia mais nenhuma.

E então finalmente, no começo de março, encontrou Shiraishi no saguão do ministério. Pelo jeito, o diretor-geral saia para almoçar sozinho. Asai o parou enquanto este caminhava em direção à porta onde seu carro o esperava.

Três meses já haviam se passado, o que tornava um pouco tarde para dar suas desculpas, todavia isso estava pesando em sua mente dia após dia e tinha que desabafar.

— Senhor... — ele começou, curvando-se enquanto se aproximava. — No ano passado... Em dezembro, sinto muito não ter podido acompanhá-lo.

O diretor-geral parou no meio do caminho, virou seu corpo pesado lentamente para encará-lo, e a expressão em seus olhos naquele instante revelou que não tinha ideia do que o outro homem estava se referindo. Asai prosseguiu.

— Er... Quando você fez aquela viagem de negócios para Nagano no ano passado, peguei um forte resfriado no último minuto e não pude acompanhá-lo.

Ele curvou-se mais uma vez.

— Ah. — o olhar vago nos olhos de Shiraishi enfim pareceu dar lugar à compreensão. — Ah sim, entendo. Daquela vez... Hmm. Então, já está se sentindo melhor? — Shiraishi seguiu falando, mas não havia nenhuma consideração real por trás disso, e enquanto as palavras pairavam vazias no ar, já estava se movendo de novo em direção ao seu carro que o aguardava.

— Sim, obrigado, senhor. Estou bem.

Dificilmente ainda estaria sofrendo de um resfriado contraído três meses antes!

— Cuide-se.

— Obrigado, senhor.

Enquanto observava a figura desajeitada de seu chefe indo embora, Asai se arrependeu no segundo seguinte por ter tocado no assunto. O Diretor-Geral Shiraishi mal deu alguma atenção ao seu pedido de desculpas.

Não se importava muito com quem iria acompanhá-lo. Tudo o que importava era ter alguém em sua comitiva. Aquelas palavras que o disse na frente dos elevadores não foram mais do que uma tentativa de parecer amável.

Diretores de alto escalão na hierarquia frequentemente diziam coisas assim. Estavam tentando se tornar populares com seus funcionários. Era só conversa fiada, não havia coração envolvido.

Não havia nada com que se preocupar. Asai nem fazia parte da consciência de Shiraishi, a ponto de ter até esquecido que seu subordinado deveria acompanhá-lo a Nagano. Asai se viu tomado por desapontamento ao ter feito todo aquele alvoroço por nada e, ao mesmo tempo, isso lhe trouxe algum alívio. Sua tristeza era a de um funcionário mesquinho que sempre se preocupava demais com as opiniões de seus superiores. Embora achasse Shiraishi um homem medíocre, sofria com a opressão do sistema há anos e não sabia como mudar. Ele invejava os funcionários mais jovens, que pareciam mais capazes de falar o que pensavam.

Mas então foi uma coisa boa que o diretor-geral não estivesse preocupado com sua falta; significava que não havia perigo de ser forçado a ir para Nagano. Em vez de se sentir deprimido por sua própria atitude subserviente em relação aos chefes, deveria estar comemorando.

Por um tempo, tudo continuou como sempre. O clima ficou instável, oscilando entre temperaturas frias e mais amenas, então se acalmou e começou a surgir a primavera.

Os jornais apresentavam novos casos de assassinato todo dia. Os assassinos sempre eram pegos em pouco tempo. Mesmo que escapassem, acabariam sendo considerados suicidas. Em todos os casos, a identidade do assassino era sempre descoberta por meio de seu relacionamento com a vítima. Sempre havia alguma terceira pessoa conectada ao caso que poderia esclarecer seu motivo e suas causas. Sem essas informações, a polícia ficaria perdida.

Todos os tipos de livros de códigos e regulamentos estavam alinhados na mesa de Asai, todos necessários para o seu trabalho como administrador, entre eles, é claro, o Roppo Zensho, o compêndio de leis japonesas. O Capítulo 25, intitulado ‘Corrupção’, dizia respeito aos funcionários públicos.



Artigo nº 197: Se um funcionário público ou um intermediário terceirizado for descoberto por ter aceitado um suborno ou exigido um suborno, ou celebrado um acordo para oferecer ou aceitar um suborno, este receberá uma sentença de no máximo três anos. Se for descoberto que aceitou uma solicitação, receberá uma sentença de no máximo cinco anos.



Estranhamente, a seção sobre homicídio apareceu logo após o capítulo sobre corrupção de funcionários públicos.



Capítulo 26: Homicídio

Artigo nº 199: Pessoas culpadas de cometer assassinato devem ser condenadas à morte ou presas por um período entre três anos e prisão perpétua.



O fato de que o homicídio sucedeu de perto a corrupção parecia implicar que os funcionários públicos provavelmente cometeriam assassinato.



Código de Processo Penal

Artigo nº 250: O estatuto de limitações se aplica da seguinte forma:

1) 15 anos para crimes puníveis com morte.

2) 10 anos para crimes puníveis com prisão perpétua ou prisão perpétua com trabalhos forçados.

3) 7 anos para crimes puníveis com uma sentença de mais de 10 anos de prisão ou trabalhos forçados.




Sete a quinze anos. Asai considerou esse período de tempo. A escala que usou foi o número de anos de serviço público que tinha deixado. Quinze anos o levariam a um ano após a idade de aposentadoria. Em dez, talvez já fosse chefe de divisão. Sete seria bem na época em que sua promoção estaria sendo considerada.

Todo o incidente em Fujimi estava desaparecendo de sua consciência, contudo de tempos em tempos começava a fazer esses cálculos. Não era por medo de ser preso. Queria saber quando o estatuto de limitações terminaria para que pudesse viver uma existência completamente despreocupada.

Ele estava no meio de um desses momentos de reflexão quando o presidente Yagishita chegou em uma viagem de Kobe.

— Então o que te traz a Tóquio? — Asai perguntou, acompanhando Yagishita a um café próximo. Era hora do almoço, e homens e mulheres de vários ministérios do governo estavam passeando no parque.

— Um presente de agradecimento para todas as nossas lojas franqueadas. Estamos levando-as a um spa em Hokkaido.

— Wow. Você está sempre aprontando alguma.

— Há muita concorrência hoje em dia. Nossa empresa só oferece passagens aéreas nacionais, no entanto há outras empresas que organizam excursões em grupo para o exterior.

— Quais?

— Kurosaki, os fabricantes de equipamentos agrícolas, por exemplo. Bem, os fabricantes de máquinas são um jogo diferente... Suas vendas estão em um nível diferente das nossas. Não podemos fazer o mesmo tipo de oferta aos vendedores de salsicha e presunto. Ouvi dizer que no final de março eles estão organizando uma viagem de cortesia ao Sudeste Asiático para os membros executivos de todas as cooperativas agrícolas na região de Koshinetsu.

— Toda Koshinetsu? Vai ser um número e tanto.

— Pelo que ouvi se limitaram a cerca de quarenta pessoas, as pessoas com mais influência na região, imagino. Desta vez, não são os executivos de nível de prefeitura que estão levando, mas membros locais das cidades e vilas. O diretor administrativo da Kurosaki Maquinária é um amigo meu, então ouvi direto dele. Essa política de redução da área de arroz... Bem, deixou todo mundo no negócio de equipamentos agrícolas bastante preocupado. Eles escolheram cuidadosamente os membros locais em vez dos figurões. Decidiram que precisam voltar suas atenções para o nível regional.

— Todo mundo está sentindo o aperto, hein?

— Sim, tempos difíceis para os comerciantes também.



Alguns dias depois, o diretor da divisão convocou Asai.

— Asai, a cooperativa da Prefeitura de Nagano está patrocinando um pequeno seminário. Você pode comparecer?

Assustado, repetiu o que achava ter ouvido.

— Prefeitura de Nagano?

— Sim. Houve um pedido conjunto dos sindicatos nacional e provincial para uma série de palestras a serem realizadas na região.

Asai se sentiu irritado. Nagano de novo... Sério? Por que estavam sendo tão teimosos?

— Onde em Nagano?

— O sul. Querem que de uma palestra em cada uma das regiões do sul ao longo de um período de cinco dias. A propósito, recebi esse pedido direto do escritório do Diretor-Geral Shiraishi.

— Do diretor-geral?

— Isso mesmo. Ele acredita fortemente que, com as novas políticas agrícolas, o ministério deve oferecer o máximo de apoio possível aos fazendeiros em nível local. Sei que é muito trabalhoso para você, porém gostaríamos que fosse o único a ir, já que está tão familiarizado com a política e a administração do processamento de alimentos.

— Eles me pediram... Hum... Quero dizer, o povo de Nagano me solicitou em específico?

— Não em específico. Bem, disseram que queriam alguém com experiência, e o Sr. Shiraishi me disse para enviá-lo.

— O diretor-geral me queria?

— Parece que você fez um pedido específico para ser despachado. Pelo que me disse, você o contou o quão decepcionado ficou quando se ausentou por causas médicas e não pôde acompanhá-lo a Nagano em dezembro do ano passado, e que disse a ele que definitivamente queria ir na próxima vez.

— Ah, sim. Bem, isso... Er...

Ele não tinha falado com Shiraishi porque queria ser enviado a Nagano. Só queria se desculpar por cancelar na primeira vez. Shiraishi tinha entendido mal seu motivo. Entretanto Asai não poderia dizer tal coisa ao seu chefe de divisão.

— O diretor-geral claramente se lembrava do seu pedido. A excursão será de cinco dias, começando em 1º de abril. Espero que receba o pedido formal em breve.

— Quais distritos do sul de Nagano serão?

— Ina, Takato, Iida, Fujimi e Chino. Serão cinco noites e seis dias.

Não havia como Asai recusar, não depois da última vez, e agora estava sendo recomendado pelo próprio diretor-geral.

Fingir uma doença repentina também não funcionaria dessa vez. Não podia jogar a mesma carta duas vezes.

Seu erro foi abordar Shiraishi em primeiro lugar. O diretor-geral havia esquecido há muito tempo que Asai havia desistido da excursão de dezembro, porque não era um problema que o incomodasse. Ele teve um mau pressentimento na época de que seu pedido de desculpas era desnecessário, e acabou se mostrando certo. Deveria ter deixado os cães dormirem.

Uma excursão de cinco noites e seis dias por uma área relativamente pequena significava que tinha quase garantido a chance de encontrar Akiharu Kido e Jiro Haruta. As palestras seriam assistidas exclusivamente por membros da cooperativa agrícola. E não seriam apenas palestras... Haveria recepções, jantares e outros encontros à noite. Todos os membros locais ficariam ansiosos para participar desses eventos, e com certeza encontraria os dois homens lá também. Asai estaria sentado no lugar de honra, e cada participante viria por sua vez para fazer um brinde. O Sr. Kido e o Sr. Haruta estariam bem ali na sua frente. Os caipiras bebiam muito álcool, e suas festas duravam até tarde. Haveria tempo de sobra para os homens se lembrarem dele.

Se ao menos nunca tivesse conhecido aqueles dois, pensou Asai. Teria ficado bem se não houvesse chance de Kido e Haruta aparecerem. Sabia que continuaria imaginando os olhos deles nele, mesmo enquanto dava uma palestra. Nunca seria capaz de relaxar, teria que ser cuidadoso o tempo todo.

Por que continuava sendo puxado de volta para um lugar que tentava tão desesperadamente evitar? Sentiu como se estivesse enlouquecendo aos poucos.

E então se lembrou de sua conversa recente com Yagishita.

A Kurosaki Maquinária estava convidando membros das cooperativas agrícolas na área de Koshinetsu para uma excursão pelo Sudeste Asiático começando no final de março. Nagano fazia parte da área de Koshinetsu. Os participantes estavam sendo selecionados de pequenas cooperativas locais de acordo com essa política de ‘seleção manual’.

E se Kido e Haruta estivessem na lista de participantes? O final de março era na época da excursão de palestras. Ainda havia uma chance de que pudesse evitar encontrá-los.

Havia um lampejo de esperança no coração de Asai. Precisava obter uma cópia da lista de participantes da Kurosaki o mais rápido possível. Se a excursão começasse no final de março, ela já deveria estar elaborada.

Asai esperou impacientemente que Yagishita voltasse de seu retiro de spa em Hokkaido.

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