Capítulo 07: As estranhas criaturas que espreitam Atlas à noite
“Oho! Então você aceitará o trabalho? Maravilhoso!” Mestre Talim disse alegremente enquanto rasgava um espeto de churrasco entre tragadas de seu charuto.
Você ao menos consegue sentir a comida assim?
No momento estávamos no pátio atrás da mansão do Mestre Talim, sentados ao redor de sua mesa de chá para discutir o trabalho. E se está se perguntando por que de repente estou o chamando de ‘Mestre’, é porque estou oficialmente trabalhando para ele agora. Então, visto que é meu empregador e tudo mais, não posso sair por aí me dirigindo a ele sem o devido respeito.
“É deliciosamente reconfortante! Serei capaz de dormir um sono profundo à noite, não importa quais assassinos bizarros Daymia escolha enviar.” proclamou com um sorriso radiante. Ok, talvez ‘radiante’ estivesse sendo um pouco exagerado demais, dada a aparência do cara.
“Não quero atrapalhar sua comemoração, mas espero que não baixe a guarda, senhor.” eu o alertei. “Agora, se me permite perguntar, em relação à duração do nosso serviço...”
“Bem, vejamos. A eleição para o presidente do conselho será daqui a meio mês, então suponho que até lá. Posso cuidar das coisas sozinho depois disso. Agora, quanto ao seu pagamento... Há todas as despesas necessárias mais uma diária...”
Mestre Talim acabou me fazendo uma oferta muito maior do que esperei. Ou o cara tinha dinheiro para gastar ou de fato estava tão agradecido quanto afirmava. Claro, ainda não estava nem perto de uma compensação adequada por lidar com mazokus de pleno direito, porém sabia no que estava me metendo quando aceitei o trabalho. Não poderia ser exigente justo agora.
Assim que terminamos de discutir nosso contrato com nosso novo empregador, Gourry e eu decidimos dar uma olhada na propriedade. Afinal, era importante conhecer a geografia do lugar. Tínhamos acabado de dar uma olhada no primeiro andar e estávamos prestes a subir a escada para o segundo quando...
“Passeios turísticos, vocês dois?” veio uma voz zombeteira.
“Oh, sim. É você.” falei, com o nariz empinado de forma óbvia.
Encostado a um pilar, de braços cruzados e zombando de nós, estava Lantz.
“Não estamos passeando. Estamos explorando. Precisamos identificar pontos defensáveis e rotas de fuga caso algo aconteça. Não que precise me explicar para um pervertido obcecado por bundas.” disse, olhando-o com reprovação.
As narinas de Lantz dilataram... Contudo logo se acalmou.
“Oh, ei, não reconheci vocês. Achei que fosse apenas uma criança vagando por aí com o seu responsável.”
Apenas uma criança? Grr!
Posso ser um pouco mais baixa que a média, entretanto não preciso que ninguém me lembre disso!
“Ooh, então gosta de brincar de agarrar o traseiro das crianças, não é? É melhor consertar essa sua personalidade defeituosa se quiser que alguém goste de você.”
“Hngh...” Lantz grunhiu em uma refutação inútil.
“Seu silêncio fala muito. Deve ser uma pena não ter amigos, hein?”
“Ca-Cale a boca!” ele se irritou.
Balancei a cabeça de forma excessivamente dramática enquanto respondia.
“Sim, está tudo se encaixando agora. É assim que pessoas do seu tipo ficam...”
“Ela está certa.” Gourry entrou na conversa. “Se não se esforçar para consertar sua personalidade...”
Sim! Vai lá, Gourry! Cuspa a verdade na sua cara!
“Vai acabar como a Lina aqui.”
Urk! Bati minha cabeça no corrimão. Doeu, mas só um pouco.
“O-O que aconteceu? Está do lado de quem?” clamei.
Gourry coçou a cabeça, parecendo confuso.
“Espere... Não está se considerando mesmo uma pessoa doce e adorável, não é?”
“Deixa pra lá, droga!”
“Bem, de qualquer maneira... Uh, Lantz, certo? Me parece que você está bravo porque Mestre Talim gosta de nós, porque Rod nos aceita e porque aparecemos do nada e começamos a exercer nosso peso sem nos preocupar em provar nosso valor para você.”
“Sim, por aí...” Lantz respondeu mal-humorado.
“Porém... Que me lembre, também me viu vencer o feiticeiro de Daymia, não é?” eu interrompi.
“Oh, por favor. Tudo o que fez foi jogar o corpo de um cara na lama. Não é nada tão incrível; ele que era simplesmente estúpido.”
Argh! Quero dizer, sim, o cara era estúpido. Mas ainda assim!
Acho que Lantz seguia bravo com o dia em que nos conhecemos. Contudo quem guarda rancor por ter sido espancado com a ponta de uma bandeja? Isso é mesquinho!
Na verdade, pensando bem... Talvez seja compreensível.
“Ok. Nesse caso, deixe-me dar uma demonstração do que posso fazer.” Gourry ofereceu casualmente, imperturbável, e desembainhou a espada.
Ei, vamos lá!
“Por que você...” Lantz rosnou, pegando sua própria lâmina.
“Ah, não se preocupe. Não estou tentando começar nada.”
Gourry ignorou no mesmo instante as preocupações de Lantz enquanto tirava uma pequena moeda de ouro do bolso. Então segurou sua espada paralela ao chão com uma mão, a lâmina na vertical, e colocou a moeda em cima dela com a outra. A moeda ficou ali, perfeitamente imóvel, mantendo seu equilíbrio precário no fio da espada.
Até agora, esse era o show padrão de artistas de rua. Espere, a menos que...
“Hyah!” Gourry gritou, puxando a lâmina para trás.
Ouvi um leve tilintar metálico. Então outro. Meus olhos se arregalaram. Os de Lantz também.
A moeda estava agora no chão, cuidadosamente cortada ao meio. O simples ato de puxar a lâmina de baixo dela havia dividido a moeda ao meio. Você precisava de mais do que apenas talento para realizar um truque como esse. Exigia foco, habilidade e velocidade incríveis.
“I-Incrível!” Lantz proclamou com genuína admiração.
Enquanto isso, dei alguns passos subindo as escadas. Gourry estava ocupado embainhando sua espada com um sorriso triunfante no rosto. Ele nunca esperaria o que viria.
“Seu desgraçado!”
Bater!
Executei uma voadora escada abaixo, acertando um joelho na lateral de sua cabeça.
“O-O que acha que está fazendo com meu irmão?” Lantz gritou comigo enquanto ajudava o confuso Gourry a se levantar.
Seu ‘irmão’? Desde quando?
“O-O que no mundo...? Sabe, Lina, esse golpe teria matado a maioria das pessoas...” Gourry reclamou, balançando a cabeça enquanto processava o que havia acontecido.
Coloquei minhas mãos nos quadris e o encarei.
“Mesmo para uma demonstração, desperdiçar dinheiro é imperdoável!” proclamei. “Eu só te dei o que merecia!”
Posso ser uma mestra em magia negra por profissão, sabe, no entanto venho de uma família de comerciantes. Cresci ouvindo o ditado: “Um verdadeiro comerciante nunca desperdiça um único cobre!”
Aliás, minha irmã mais velha trabalhava como garçonete em casa enquanto eu era feiticeira. Parecia improvável que alguma de nós algum dia se tornasse uma ‘comerciante de verdade’. Todavia só porque não queria viver uma vida dedicada ao dinheiro não significava que posso só desperdiçá-lo! A visão de Gourry desperdiçando uma moeda de ouro de maneira tão impensada fez meu sangue ferver.
“E-Espere um segundo. Isso significa apenas que tenho que lucrar com esse feito, certo?” Gourry perguntou.
“Acho que sim. Porém como vai lucrar com o que fez?”
Gourry pegou as duas metades da moeda do chão e mostrou-as a Lantz.
“Bem? Sem me gabar, contudo é um corte muito limpo, não acha?”
“S-Sim, com certeza...”
“Não mostro esse truque para as pessoas com muita frequência. Gostaria de tê-lo como um amuleto de boa sorte? Apenas quinze lieves.”
“Com certeza! Comprado!”
Lieves era a moeda local. Dez delas valiam cerca de uma moeda de ouro.
Oh, então temos dois comerciantes no grupo, não temos?
“Então...” depois de colocar a moeda de ouro dividida no bolso com grande reverência, Lantz olhou para mim com desprezo. “O que exatamente você pode fazer? Se está mandando no meu irmão aqui, é melhor que tenha algumas habilidades. Ou é apenas um patinho que o segue por toda parte?”
P-P-Patinho?
“Oh, ficarei feliz em mostrar o que posso fazer!” gritei quando comecei a recitar um feitiço.
“Gwah! Não, Lina! Por favor, isso não!”
Gourry, no entanto, agarrou-se a mim com tanto desespero que decidi de muito boa vontade atender ao seu pedido e cancelar meu Dragon Slave.
———
“Wow, pelo visto não há muitas pessoas por aqui, não é?” comentei enquanto caminhava pela rua.
Lantz apenas olhou para mim com condescendência.
Depois de terminar nossa volta pela propriedade de Talim, decidimos explorar o resto da cidade e fazer alguns passeios turísticos. Por alguma razão, Lantz se ofereceu para atuar como guia turístico; parecia que tomou um gosto sincero por Gourry. Os mercados estavam concentrados no centro da cidade, portanto a área mais próxima do castelo estava quase toda deserta a esta hora do dia.
“Chegamos, irmão.” disse Lantz ao parar.
Do outro lado da estrada havia uma casa extremamente grande. A propriedade era quase comparável em tamanho à propriedade de Talim, entretanto o prédio em si era muito maior. Tinha cerca de três andares de altura e ocupava a maior parte do terreno onde ficava, quase não deixando espaço para um gramado.
“Ah, é aqui?” Gourry sussurrou.
“Sim. Essa é a residência de Daymia.” Lantz respondeu num tom cordial.
“Imagino por que construiu uma casa tão grande...” murmurei.
“Descubra você mesma.” ele retrucou para mim.
...
Que diabos? Reconheço o favoritismo quando o vejo! Esse cara está sem dúvida guardando rancor!
“V-Vamos, calma, Lina...” Gourry disse de maneira apaziguadora quando percebeu o brilho de raiva em meus olhos.
“Tudo bem, então vamos indo!” propus.
As sobrancelhas de Gourry e Lantz franziram ao mesmo tempo.
“Ir em frente... Pra onde?”
“A casa de Daymia. Onde mais?”
“O quê?” Lantz guinchou. “Você está louca? Quer que nós três invadamos lá em plena luz do dia?”
“Quem disse alguma coisa sobre invadir?” respondi. “Pensei em ir até lá e conversar com o porteiro ou algo do tipo. Eles não podem nos atacar apenas por bater, e é uma boa maneira de sondá-los.”
“Não tenho certeza se é uma boa ideia...” disse Gourry, de braços cruzados. “Mestre Talim mencionou que o cara é meio maluco... E se acabarmos em uma briga de alguma forma, ele aparentemente está bem relacionado. Não seria difícil nos pintarem como os bandidos da situação.”
“Hmmmm...”
Eu não sabia o que dizer. Fiquei um pouco surpresa, para ser honesta. Gourry não apresentava um argumento sólido desde... Bem, desde sempre. Acho que ele tinha um lado astuto por trás daquele exterior indiferente.
“Bom, talvez esteja certo.” respondi, cedendo com bastante facilidade. “Não estou exatamente ansiosa para conhecer o cara. Então o próximo lugar a visitar deveria ser, vejamos... A casa do Presidente Halciform.”
———
Dei duas batidas firmes na aldrava da cabeça do dragão.
Segundo Mestre Talim, Halciform tinha uma assistente chamada Rubia que morava sozinha na mansão do presidente desde seu desaparecimento. Queria saber o seu lado da história.
Todavia não houve resposta na porta.
“Acho que não está em casa...” murmurei, olhando para a mansão.
“Estou indo!” alguém de repente chamou lá do fundo.
Hã? Conheço essa voz...
Vários momentos depois, ouvi a porta ser destrancada. Esta se abriu e, quando a garota do outro lado e eu nos avistamos, nós duas congelamos.
Cabelos da cor do pôr do sol, olhos cheios de tristeza... Sim, essa era a garota que me abordou no caminho para a propriedade Talim, me implorando para ficar fora disso e depois desapareceu.
Não houve nenhuma reação abertamente suspeita, como bater a porta na minha cara, mas nos olhou com extrema cautela.
“Posso ajudar?” perguntou como se nunca tivéssemos nos visto antes.
Ahh, ok. Se é assim que você quer jogar...
“Você seria a Senhora Rubia?” perguntei.
Ela assentiu.
“É um prazer conhecê-la. Estamos investigando o desaparecimento do presidente do conselho, sabe...” menti sem qualquer descaro.
Sua expressão teve uma ligeira contração.
“Já contei ao conselho tudo o que sei. Se realmente está com eles, deveria ter meu testemunho completo. Por favor, deixe-me em paz agora.” disse ela enquanto se aproximava para fechar a porta, não oferecendo espaço para debate sobre o assunto.
“Só uma pergunta!” insisti, ansiosa por saber a verdade por trás do que Mestre Talim tentara esconder de nós. “O que o presidente do conselho estava estudando antes de desaparecer?”
A garota se contraiu. Foi quase a mesma reação que Mestre Talim teve. Sua hesitação durou apenas um momento, antes que me encarasse direto nos meus olhos.
“Estava estudando... A vida. É tudo o que posso dizer.” concluiu fechando a porta.
“Qual é o problema dela?” Lantz disse, descontente.
“Hmm...”
‘Fique fora disso’, hein?
“Por que está sorrindo?” Gourry me perguntou.
“Acho que pode dizer.” falei com um floreio dramático da minha capa. “Que as coisas ficaram um pouco mais interessantes.”
“O... Ok?”
———
Eu me revirei na cama naquela noite.
Veja, Gourry e eu decidimos deixar nossas coisas na pousada e ficar na casa do Mestre Talim. Nem é preciso dizer que é mais provável que os assassinos ataquem à noite, então não é bem uma opção para um guarda-costas virar para sair depois de escurecer com um simples: ‘Está ficando tarde, então é melhor voltar para minha pousada!’
Quanto ao motivo de não irmos buscar nossos pertences... Bem, enquanto estivéssemos a serviço do Mestre Talim, sempre havia a chance de alguém atear fogo em sua casa. Nesse caso, nossa prioridade teria que ser resgatar nosso empregador e, depois de escoltá-lo para um local seguro, era improvável que conseguíssemos voltar para salvar nossas coisas. E isso seria terrível.
Na verdade, terrível seria um eufemismo. Minha bolsa estava cheia de itens mágicos que não eram necessariamente úteis para a maioria das pessoas, porém eram bastante valiosos. Mesmo se os vendesse a preços baixíssimos, ganharia dinheiro suficiente para comprar a propriedade de Talim, seus mercenários e os pertences de sua casa... Tudo... E me retirar para uma vida de luxo.
Então, sim, você entendeu. Magia é um negócio caro, e a ideia de todo esse dinheiro pegando fogo... É o suficiente para fazer uma garota perder o sono. (É claro, não tínhamos garantia de que a pousada também não iria pegar fogo, contudo você só precisa ter fé depois de um certo ponto.)
Dito isto, minha inquietação esta noite não foi por medo dos meus pertences. Pode chamar de premonição, eu acho. Na verdade, as tenho com bastante frequência. Qualquer noite em que estou exausta, no entanto não consigo dormir, é uma garantia absoluta de um ataque iminente, e esta noite parecia ser uma dessas noites.
Sentei-me na cama. Meu quarto era bem confortável, confortável demais para um guarda contratado, na verdade. A desculpa do Mestre Talim era simplesmente que acreditava em ‘cavalheirismo’ (pronunciado com um ca forte, veja bem). Aliás, os meninos estavam todos amontoados, revezando-se na vigília noturna.
Levantei-me e coloquei meus chinelos. Estava usando a mesma roupa daquela tarde, sem a capa que coloquei no travesseiro (não conseguia mesmo dormir com ele). Queria estar pronta para lidar com qualquer problema que surgisse no meu caminho.
Só para ter cuidado, peguei minha espada e coloquei-a no cinto antes de sair do quarto. Ei, não me olhe assim! Estou só fazendo uma pequena viagem ao banheiro.
Havia alguns homens no corredor, todos desmaiados. Alguns estavam enrolados em cobertores no chão, enquanto outros, provavelmente destinados a vigiar, dormiam um sono profundo apoiados em suas espadas. Continuei avançando, tomando cuidado para não pisar em ninguém.
Estava um pouco quente demais naquele dia, mas agora que o sol se pôs, ficou frio sem a capa. Consegui resolver meus negócios, porém foi um frio na caminhada de volta ao meu quarto.
“Guh, estou congelando aqui...” sussurrei antes de parar de repente.
Parei atrás de uma porta próxima, uma pequena porta aberta que dava para o pátio dos fundos. Havia algo... Estranho... No ar lá fora. Não era exatamente uma presença. Claro, havia cerca de uma dúzia de homens vigiando do lado de fora também, e não havia nada de estranho em seu comportamento. Não, o que sentia lá fora era uma espécie de frio no ar. Não era hostilidade ou sede de sangue, contudo ainda assim me deu arrepios.
De repente, um arrepio percorreu minha espinha. Meu instinto me dizia que as coisas estavam prestes a ficar sérias... E então vieram barulhos e gritos vindos do pátio.
“Acordem, pessoal! É um ataque!” gritei, chutando os guardas adormecidos mais próximos antes de voar para fora da porta.
O cheiro de sangue chegou ao meu nariz. Já deve ter havido vítimas.
Podia ver lâminas brilhando na escuridão, iluminadas por tochas e pelo luar. O maior perigo dos combates noturnos são sempre os danos colaterais. “Oops, erro meu...” não seria suficiente se alguém como Gourry ou Rod acertasse alguém que não pretendiam com sua lâmina.
Recitei um cântico e lancei alguns feitiços de Iluminação pela área. Foi só então que os vi.
Os assassinos eram um bando curioso. Cerca de uma dúzia de homens enormes... Na verdade, em termos de altura, eles não estavam muito acima da média. Foi a sua massa que foi tão notável. Cada um deles tinha bíceps tão grossos quanto a minha cintura, e era fácil imaginar o quão fortes eram por sua técnica de combate francamente absurda. Em suas mãos usavam maças de aço curvas como rodas de carroça na mão esquerda para bloquear ataques, enquanto empunhavam enormes espadas de carrasco na mão direita para atacar. Não gostaria de cruzar com esses caras, mesmo em um dia bom.
Mas o que realmente me impressionou neles... Foi que todos tinham a mesma face. Pareciam ter cerca de vinte anos de idade e eram carecas. Suas expressões também estavam uniformemente vazias, não mostrando o menor indício de sede de sangue, mesmo enquanto cortavam seus oponentes.
Homúnculos de batalha criados por Daymia, hein?
Mestre Talim estava certo. Se um cara que faz coisas assim assumisse o controle do conselho, não demoraria muito para que a Cidade Atlas ganhar uma reputação desagradável desde Zephilia, no norte, até o Império Elemekiano, no sul.
No entanto, esses caras musculosos não foram os únicos assassinos que Daymia criou. Pude ver orbes vermelhas pairando do lado de fora do meu feitiço de Iluminação, eles eram os olhos de grandes lobos, cujos corpos com escamas roxas eram pontilhados com espinhos grossos. Se tivesse que adivinhar, diria que havia algumas dezenas.
Tínhamos uma vantagem considerável em termos de números, mas no que diz respeito à habilidade e ao moral? Uh-ah. Não havia como algumas dezenas de mercenários contratados competirem com seres distorcidos criados para a batalha. Mais e mais guardas saíam da casa a cada minuto, porém muitos congelaram de medo ou viraram as costas e correram no minuto em que viram as criações bizarras de Daymia. Para seu crédito, alguns ficaram para lutar também.
Isso incluía Rod, que praticamente se misturava na calada da noite. Ele saiu do bando, atacando o homúnculo mais próximo enquanto desembainhava a espada das costas. O homúnculo ergueu sua espada bem alto, contudo assim que Rod o alcançou, de repente mudou de direção e virou para a direita. A espada do carrasco assobiou no ar vazio, e vi um lampejo da lâmina de Rod à luz do meu feitiço.
Enquanto Rod passava pelo homúnculo, ouvi um baque quando a maça de metal do grandalhão atingiu o chão em dois pedaços. Naquele mesmo momento, sangue jorrou do seu flanco. Ao passar, Rod parecia ter cortado o abdômen do cara e a maça de ferro junto...
No entanto isso não o impediu de brandir sua espada gigante outra vez. O homúnculo parecia completamente imperturbável pela ferida bastante profunda.
Ele não gritou nem piscou; apenas partiu logo em seguida para um contra-ataque. Talvez tenham sido projetados para não sentir dor.
Rod se abaixou, evitando o golpe de cabeça erguida antes de saltar para frente. Num instante, cortou o cara ao meio, de ponta a ponta. Sua lâmina ensanguentada brilhou vermelha na luz.
Gourry segurou sua espada longa ao lado do corpo enquanto se aproximava de outro homúnculo corpulento com ar de passeio casual. O grandalhão ergueu a espada sem expressão e uma troca de flashes prateados se seguiu. Gourry se esquivou da espada de seu oponente, então se aproximou e enfiou sua própria lâmina na testa do cara. Seu corpo desabou lentamente no chão.
“Hah! Oh... Opa!”
Gourry se apressou em saltar para trás quando algo rasgou o lugar onde estava. Com um lampejo de sua espada, rebateu o objeto no chão... Parecia um chifre pontiagudo. Um lobo de escamas roxas lançou um de seus espinhos contra Gourry, tão rápido quanto uma flecha.
O lobo (se é que você pode chamar assim) então respirou fundo como se estivesse se acumulando para liberar poder. Um segundo depois, mais espinhos voaram em direção a Gourry. Se fosse um homem normal, com certeza não teria nenhuma maneira de se esquivar de todos...
Mas só um tolo pensaria que algo tão básico poderia derrubar Gourry!
“Você terá que fazer melhor do que isso!” ele gritou enquanto saltava do chão.
Sem grandes dificuldades Gourry desviou e evitou os vários ataques de espinhos que a criatura lupina disparou enquanto se aproximava de seu alvo. Em seguida, alcançou o lobo no momento em que estava tornando a respirar fundo de novo. Com um único golpe para cima, cortou seu corpo escamoso tão rápido e suavemente que seus pés nem sequer saíram do chão. O lobo então se dissolveu com o chiado de um balão esvaziando.
E Lantz, tenho que admitir, estava se aguentando. Ele atacou um dos grandalhões direto pela frente, travando sua espada bastarda de duas mãos com a lâmina grande do homúnculo. Uma fração de segundo depois, Lantz girou sobre as espadas que se chocavam, impulsionando-se para o espaço pessoal do grandalhão. Então soltou o punho com a mão direita e enfiou um cotovelo na mandíbula abaixada do seu oponente.
Sem palavras, a montanha de um homem perdeu o equilíbrio. Lantz interveio e, antes que o homúnculo pudesse se recuperar, passou de leve o punho pelo queixo do cara.
Errou? Não...
O grandalhão tombou para frente, caindo de joelhos. O que pareceu um golpe de raspão deve ter abalado bastante seu cérebro. Lantz então circulou ao redor de seu inimigo e cravou a espada direto em sua espinha. Parecia que seu estilo de luta era uma combinação de movimentos de espadachim e lutador.
“Posso fazer isso a noite toda! Quem é o próximo?” Lantz zombou. Quando foi um dos lobos que se aproximou, no entanto, ele murmurou. “Bem, preferiria outro daqueles carecas...”
Agora, é óbvio que não preciso lhe dizer que não estava apenas sentada assistindo tudo isso acontecer. Os assassinos não deixaram, para começar.
Um dos lobos perto de mim começou a sugar o ar. Porcaria! Acelerei um encantamento pouco antes de o lobo disparar todos os seus espinhos de uma vez.
“Diem Vento!”
O ar à minha frente se contraiu, canalizando uma onda de choque que lancei no lobo. Era um feitiço de vento mais fraco, projetado para, na melhor das hipóteses, paralisar um oponente, todavia foi o suficiente para dispersar os espinhos do lobo. O lobo, agora coberto de buracos onde antes estavam os espinhos, só conseguiu ficar ali, confuso.
“Vai ter que fazer melhor!”
“Seu filho da...”
“Tome isso! E isso! E isto!”
No momento em que perceberam que os ataques do nosso oponente haviam sido neutralizados, meus colegas mercenários atacaram o lobo, subindo uns sobre os outros para serem os primeiros a derrubá-lo. Porém no momento em que eu estava curtindo aquela cena deliciosa em particular, uma sombra caiu sobre mim. Um dos grandões estava atrás de mim!
Eu mal consegui me esquivar de um golpe da sua espada e, enquanto o fazia, comecei a recitar um feitiço. Engula essa!
Bati a mão no chão.
“Venha Befete!”
Este era um feitiço que invocava espíritos da terra, normalmente para criar túneis no solo. Eu, no entanto, tinha acabado de lançá-lo logo abaixo dos pés do grandalhão.
Suas mãos agarraram o ar ao seu redor, entretanto isso não o salvou de cair no fundo do grande buraco que se formou. Não era profundo o bastante para que a queda o matasse, porém também não era raso o suficiente para que rastejasse para fora.
“Todo seu, pessoal!” chamei alguns mercenários próximos.
“Claro!” vieram suas respostas alegres.
Os mercenários, sentindo-se devidamente confiantes contra um oponente indefeso, jogaram pedras sobre ele de cima, encharcaram-no com óleo e incendiaram-no. Me senti um pouco mal pelo grandalhão... Contudo no momento em que estava hesitando, percebi que alguém estava me observando.
Eu me virei. Havia uma silhueta negra encostada na parede pintada de branco perto do portão da frente. Uma figura humanoide usando uma máscara branca... Seigram!
Saí correndo em direção ao mazoku de máscara branca.
“Então... Decidiu ignorar nosso aviso. Ah, bem...” Seigram disse, quase para si mesmo.
Parei pouco antes de alcançá-lo, subitamente arrependida. Talvez tenha sido porque estava muito bêbada quando o conheci, no entanto não tinha percebido que ele era um mazoku de alto escalão. Já enfrentei um mazoku muito além do nível de Seigram uma vez e venci, mas foi uma vitória difícil que dependeu de alguns elementos críticos alinhados a meu favor.
Claro, tinha certeza de que poderia acabar com Seigram se usasse meu feitiço secreto. Porém... Esse movimento é um pouco poderoso demais. Usá-lo aqui causaria uma cratera em metade da Cidade Atlas.
Um Ra Tilt também pode resolver o problema. Este é um feitiço incrivelmente poderoso que ataca a forma astral de um oponente. Pena que não posso usar. Pra ser mais precisa, eu nunca o aprendi.
Nunca tive muita necessidade de sabê-lo, e foi só um pouco... Nada grandioso, sabe? Sempre imaginei que um ou dois Dragon Slave seriam suficientes para me tirar de qualquer enrascada, contudo se soubesse que isso iria acontecer, sem dúvida teria adicionado essa perola ao meu bolso... Ugh! Bem, não adianta me chutar agora! Só preciso dar um jeito!
“É dia de folga do Duas Máscaras?” perguntei.
Esperava que o companheiro mazoku de Seigram, Gio, estivesse junto, contudo não havia sinal dele no momento. Não pude deixar de me perguntar por quê.
“Gio Gaia? Eu não saberia... Só recebi ordens para observar a batalha aqui.”
“Por Daymia, o Azul?” perguntei.
Deixando Gio de lado, ser capaz de invocar e controlar um mazoku como Seigram... Daymia deve ser realmente um feiticeiro poderoso.
Seigram não respondeu, entretanto. Nós apenas nos avaliamos em silêncio por um tempo.
O que ele tentaria primeiro? Podia sentir o suor frio se formando nas minhas costas. No entanto só então...
“Ei, precisa de uma mão?” uma voz perguntou atrás de mim, sem qualquer respeito pela tensão no ar.
Sabia quem era sem nem precisar olhar.
“Terminou aí, Gourry?” perguntei, ainda olhando para Seigram, apesar de uma sensação interna de alívio.
“Sim, sem problema. Eles ainda estão com Rod, então imaginei que ficariam bem mesmo se eu escapasse. Entretanto esse é aquele cara mazoku, certo?”
“‘Aquele cara mazoku’?” Sério, cara? “De qualquer forma... Apreciaria uma ajuda.”
Dei um passo para trás e fiquei lado a lado com Gourry. Na ausência de um feitiço grande e chamativo, aquela arma dele seria um salva-vidas. Todavia no momento em que as perspectivas de um plano aumentavam...
“Sinto muito, mas... Não posso lutar com vocês agora.” disse Seigram num tom calmo.
“Hã?” Gourry e eu gaguejamos, trocando olhares de surpresa.
“Recebi ordens de testemunhar a batalha, não de participar. Não tenho causa nem vontade de me envolver.”
“Não tão rápido!” gritei. “Você não pode enviar homúnculos furiosos e quimeras de lobo para nós e depois recuar! Pode não querer lutar, mas nós com certeza queremos!”
“Entendo... Então não me deixam escolha.” disse Seigram simplesmente enquanto começava a avançar.
Gourry e eu demos um passo inconsciente para trás. Máscara Branca então saltou do chão para o ar... Porém no instante seguinte, ele desapareceu atrás da parede.
Ele fez questão de nos fazer congelar no lugar, antes de só fugir.
“Não vai escapar tão fácil!” rugi, contornando o portão e perseguindo a silhueta fugitiva de uma capa preta.
“Ei! Espere por mim, Lina!” Gourry disse, acompanhando.
E assim começou nossa perseguição pelas ruas escuras. A cidade estava em um silêncio mortal. A lua estava escondida pelas nuvens esta noite, então tudo o que tínhamos para iluminar nosso caminho eram as lâmpadas de rua encantadas com a Iluminação.
Seigram disparou pelo ar frio da noite como um peixe na água, sua capa preta balançando ao vento sem emitir qualquer som.
Sinto que estou sonhando, pensei, inspirada pela cena estranha. Tudo que conseguia ouvir eram os passos de Gourry e meus, e o som de nossa respiração.
Máscara Branca não desapareceu na noite como fez depois do nosso primeiro encontro. Não seríamos capazes de persegui-lo dessa forma se o tivesse feito. Ou essa habilidade pertencia apenas a Gio, ou...
Ou Seigram estava nos atraindo para algum lugar.
Olhei para Gourry, que ou estava pensando muito ou nem pensava. Era impossível dizer apenas pela expressão em seu rosto.
Nosso estranho desfile durante a noite continuou, às vezes pela avenida vazia e às vezes por becos estreitos.
Por fim me dei conta: estávamos indo para Daymia, o Azul.
Seigram desapareceu de repente pouco antes de o grande e antigo edifício aparecer. Assim como suspeitei, era propriedade de Daymia.
Não havia nenhum sinal de segurança no gramado desproporcionalmente pequeno, contudo podia ver a luz fluindo pelas janelas acima. Eu não gostei. Era muito óbvio. Uma armadilha flagrante.
“Tive a sensação de que terminaríamos aqui.” disse.
“O quê? Você conhece esse lugar?”
Argh! A pergunta de Gourry literalmente me deixou de joelhos.
“S-Seu... Estivemos aqui esta tarde! Lantz nos trouxe!”
“Trouxe?” Gourry cruzou os braços em reflexão antes de dizer. “Hmm... Acho que dá uma vibração diferente à noite.”
Esse é o problema?
“Então, onde estamos mesmo?” Gourry perguntou.
“Casa de Daymia!” gritei.
“Ooh!” ele exclamou, batendo o punho na palma da mão. “Como imaginei!”
“Isso é muito conveniente, já que acabei de dizer onde estávamos... No entanto não é hora para uma rotina de comédia! Vamos logo!”
“Ir para onde?”
Pelo amor de tudo que é sagrado, alguém poderia cuidar desse homem por mim?
“Casa de Daymia!” falei, mal conseguindo controlar meu temperamento.
“Hmm... Entretanto devo dizer...” Gourry começou com uma cara muito séria. “Meu instinto me diz que isso é uma armadilha.”
“Eu já sei disso, maldição!” gritei. “É a armadilha mais armadilhada que já vi! Mas se não entrarmos na armadilha, nunca descobriremos o que eles procuram! Chame de imprudência, tolice ou só estúpido, porém não fazer nada por ‘cautela’ seria ainda mais estúpido!”
Bufei e o encarei. Gourry se virou para mim e colocou as mãos em meus ombros, ainda ofegante com meu discurso retórico.
Hã?
“Lina.” ele disse em voz baixa, olhando direto para os meus olhos.
Ter Gourry olhando para mim daquele jeito do nada me deixou meio impaciente...
“Preciso que me escute...” continuou.
“O que...? Por que está falando tão sério de repente?” perguntei, minha voz tremulando.
“Toda essa gritaria no meio da noite vai incomodar os vizinhos.”
Eu ataquei Gourry — pra ser específica, em sua mandíbula com meu punho.
———
“Isso é uma armadilha.” falei em voz baixa.
“Sim, uma armadilha total.” Gourry concordou com calma.
No momento estávamos andando por um corredor vazio dentro da propriedade de Daymia. Quando vi luzes nas janelas do lado de fora, presumi que o lugar estaria lotado de guardas, contudo... Não havia nem uma alma viva por perto.
Porta após porta se alinhavam nos corredores enquanto avançávamos. Parecia que esta ala estava sendo usada como dormitório dos mercenários, porque tudo o que ouvíamos lá dentro era o ronco. Abrimos a porta de um quarto evidentemente desocupado e descobrimos que era um armário comum.
Será que um cara no meio de uma luta mortal pelo poder realmente teria uma segurança tão frouxa? A resposta foi... Não, claro que não.
Isso deixa apenas uma explicação aqui. Estávamos sendo atraídos para algum lugar... No entanto, onde?
Esperava que chegássemos lá logo, todavia esta mansão era enorme na verdade! O prédio parecia gigantesco por fora, entretanto parecia ainda maior por dentro. Além do mais, foi organizado como um labirinto!
Você tentava andar em linha reta, e então a próxima coisa que sabia era que estava parado na frente da porta por onde entrou. Pensaria que não subiu um único degrau, mas abriria uma porta e se encontraria no sótão. Era como se o lugar tivesse sido projetado por algum arquiteto maluco. É verdade que teria que estar louco para criar um exército de homúnculos em primeiro lugar...
De qualquer forma, depois de muito vagar, enfim chegamos a uma porta. Era grande e coberta de folhas de ouro, com uma estrela de exorcismo de cinco pontas esculpida nela. Era claramente a entrada para uma câmara ritual. Porém eu não conseguia sentir ninguém além daqui.
“Este é o lugar?” Gourry perguntou em um sussurro.
“Tem que ser.” respondi num tom gentil. “Sei que é uma armadilha, contudo vamos entrar de qualquer maneira. Está pronto, Gourry?”
“Como poderia estar?”
Eu olhei para ele.
“Não seja covarde agora! Por que sempre insiste em empacar quando estamos na porta?”
“Como é que não fazer tudo o que vem à sua cabeça a qualquer momento é ‘empacar’?”
“Olha, às vezes a vida segue uma lógica espúria.”
“Isso está muito além de espúria!”
“Ei, olhe só...” eu disse com admiração. “Você sabe o que significa ‘espúria’, hein?”
“Não! Estava só batendo boca!”
“Ah...”
Nós dois estávamos fazendo isso em silêncio, veja bem. Estávamos mantendo a voz baixa, então nossas brincadeiras não tinham o vigor habitual.
“Escute, Gourry, se não quer fazer isso, por que me seguiu até aqui?”
“Para tentar evitar que você faça algo estúpido!”
“Quando fiz algo estúpido?”
“Sempre! O tempo todo! Qual é a primeira coisa que fará quando arrombar aquela porta?”
“Talvez lance uma Bola de Fogo... Ou três...”
“Viu? Estúpido! Além do mais, ainda não sabemos toda a história.”
“Dã. Dada a forma como o Mestre Talim agiu quando perguntei sobre o Presidente do Conselho, Halciform... Bem, Daymia está envolvido no drama de alguma forma, então quero ouvir o seu lado da coisa.”
“Hã?” Gourry ficou boquiaberto com minha explicação, olhando para mim estupefato. “Ei, espere um minuto! Se esse é o seu plano, é mais uma razão para mostrar um pouco de cautela!”
Ugh, pare de me enrolar bem na parte boa!
“Espere aí, Gourry!”
“Oh?”
Silenciei-o e coloquei um ouvido na porta.
“O que é?” Gourry perguntou.
Ah, o tolo. Ele tinha muito que aprender sobre a maneira como eu planejo!
“Não acho que teremos escolha sobre ir lá em breve.”
“O quê?”
Gourry olhou em volta com uma agitação frenética, no entanto o único sinal de vida ainda estava atrás da porta. Seus olhos se voltaram para mim e se estreitaram com desconfiança.
“Depois de tudo... Estou prestes a fazer isso!” declarei, chutando a porta antes que Gourry pudesse dizer uma palavra.
Viu? Agora não tínhamos escolha!
Gourry apenas ficou olhando, estupefato.
Depois de entrar pela porta agora aberta, paramos. Um vasto espaço se estendia diante de nós. Era uma sala enorme em forma de um círculo perfeito. Parecia que ocupava cerca de metade de toda a mansão, e a única característica digna de nota dentro dela era um pentagrama, significando exorcismo, rabiscado em todo o chão apontando para o norte.
Um destruidor de runas...
Pentagramas poderiam ser usados como base para barreiras, o que enfraqueceria os efeitos de toda a magia neles contida. Digno de nota, entretanto, era o fato de que o poder de tal barreira foi extraído da área total do pentagrama, e não da habilidade do lançador. Em outras palavras, contanto que pudesse torná-la grande o suficiente, qualquer um poderia criar uma barreira poderosa o suficiente para selar até mesmo minha magia. Mas... Esta não era grande demais para lidar.
Do outro lado da grande sala havia um altar com um homem parado diante dele, com um sorriso enlouquecido no rosto. Ele estava ficando careca, o resto do cabelo preto com uma barba combinando. Tinha grandes olhos esbugalhados que vagavam incansavelmente pela sala. E... Estava usando uma capa azul.
“Mestre Daymia?” perguntei.
O homem recuou de repente.
“Assassinos de Talim!” ele gritou com uma voz mais aguda do que eu esperava. Seus olhos já esbugalhados se abriram ainda mais.
Não pudemos deixar de recuar um pouco.
“Quer dizer... Acha que pode nos chamar assim?” Gourry respondeu com muita honestidade.
“Eu sabia! Haha... Sabia! O velho sapo! Depois do que me obrigou a fazer, planejou me matar no final! Sim... É claro! Uweehehe! Sabia de tudo desde o início! Pensou que eu não faria nada? Não sabe quem sou?”
Gourry e eu trocamos um olhar. Ai, nossa...
“Ótimo trabalho, Gourry. Agora o homem está totalmente chateado conosco.”
“Não reclame comigo. Foi você quem aceitou esse trabalho.”
Do outro lado da sala, Daymia continuava gritando, suas divagações incompreensíveis misturadas com risadas incompreensíveis.
Guh, essas coisas realmente me assustam. Ainda assim, Daymia disse algo interessante: “Depois do que me obrigou a fazer...” baseado em seu comentário sobre o “sapo velho”, presumo que esteja falando do Mestre Talim. No entanto o que exatamente o Mestre Talim o obrigou a fazer? Senti que essa era a pergunta que precisava para pressioná-lo.
“Espere! Não queremos fazê-lo mal!” gritei.
A risada de Daymia desapareceu quando olhou para nós sem expressão.
“Falando sobre uma mentira descarada.” Gourry sussurrou ao meu lado. Eu o ignorei, é claro!
“Vocês não são... Assassinos?” Daymia perguntou incrédulo.
“Não, não somos assassinos.”
O silêncio caiu. Alguns momentos depois, um sorriso surgiu no rosto de Daymia, tão insano quanto antes.
“Entendo... Uwehehe, entendo! Sim, entendo tudo! Se não são assassinos de Talim, então... Vocês vieram roubar minhas preciosas quimeras!”
Espere, o quê?
“Sim, entendi tudo... Mas não poderão tê-los! Eles são meus filhos queridos! Nunca os terão! Nunca!”
Ah, que saco...
“Não! Não estamos aqui para roubar suas quimeras idiotas!”
“Não... São ladrões?” Daymia olhou para nós, incrédulo, mais uma vez antes de abrir um sorriso de novo. “Claro... Uwehehe, entendo! Se não são ladrões, então devem ser assassinos de Talim!”
Arrrrrrgh! Não pude deixar de segurar minha cabeça.
“A culpa é sua por esperar uma conversa de verdade com esse cara.” sussurrou Gourry.
“Sim, erro meu.” respondi, arrependida. “Acho que teremos que levá-lo para interrogatório. Só não seja muito rude, ok?”
“Quem é você pra falar?”
“Tá, tá. Eu sei.” falei com um aceno de desdém antes de dar um passo à frente.
Daymia recuou dramaticamente.
“P-Para trás! Fique longe de mim! Fwahaha... S-Suas mãos imundas são inadequadas para me tocar! Você não pode prejudicar Daymia, o Azul! Não pode!”
Sei, sei. Tanto faz.
Nós o ignoramos e continuamos a nos aproximar.
“Afastem-se! Se chegarem mais perto, vou... Vou...”
“Vai o quê?”
“Vou... Fazer isso!” exclamou Daymia, puxando uma corda próxima.
Pa-kap!
O círculo mágico abaixo de nós tornou-se subitamente uma enorme armadilha.
“Oh.”
Claaaaaaaro!
“Lina!” Gourry gritou, agarrando-se a mim enquanto caímos. “Faça sua magia agora!”
Não brinca! Já estou trabalhando nisso!
“Levitação!”
Meu feitiço Levitação poderia suportar sem qualquer dificuldade o peso de uma carruagem inteira. A barreira de Daymia enfraqueceria um pouco, porém não fatalmente. E então, nossa queda...
Espera, não parou? Hã? Ok, a velocidade havia diminuído bastante, contudo ainda estávamos a caminho de um fundo invisível abaixo.
“O que houve? Continuamos caindo!”
“Eu sei! Não se preocupe!” tinha uma ideia de qual era o problema, no entanto não tive tempo de contar tudo para Gourry. “Posso suportar o peso de uma pessoa!”
Krrrk! O rosto de Gourry congelou... Então ele se agarrou a mim com ainda mais força.
“E-Ei!”
“Lina! Vamos morrer juntos!”
“Ei! Era só uma piada! Ei! Cuidado com essas mãos, amigo! Gah!”
Perdemos o equilíbrio no ar e caímos em queda livre.
Fwoosh!
Houve um barulho e a sensação de água ao nosso redor... Acho? Não estava consciente o suficiente para realmente processar o que era.
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