Capítulo 172
No momento em que estendi a fruta dourada que recebi de Alice, o humor de Kuro mudou de forma visível.
Sua expressão desapareceu e seus olhos dourados me encararam sem qualquer tremor.
Vendo a aura diferente ao seu redor, parei de falar, mantendo-me em silêncio... Antes de Kuro lentamente virar o rosto para baixo.
“F-Fufufu... Ahaha... Ahahahahahaha!”
“?”
Uma fumaça preta irrompeu do corpo de Kuro, que começou a rir como uma louca, e em instantes envolveu todo o quarto.
A fumaça que parecia engolir todo o espaço fez minha visão escurecer instantaneamente.
O que é isso? Que lugar é esse...
Eu me vi em um espaço escuro como breu, onde não conseguia ver o que estava em cima e o que estava embaixo. Nem conseguia dizer se estava parado no mesmo lugar ou se estava flutuando.
Estava tão escuro que nem conseguia ler a distância entre nós, mas, de alguma forma, conseguia ver meu próprio corpo com clareza. O espaço que poderia ser descrito como anormal era inexplicavelmente sufocante.
Além da sensação de que meu corpo estava sendo comprimido pelo próprio ar, podia senti-lo tremer.
Antes que percebesse, a fruta dourada que deveria estar segurando havia desaparecido e, com o canto dos meus olhos, um par de olhos dourados surgiu de repente na paisagem escura como breu.
“Arehh...? Você parece muito melhor do que pensei! Hehhh... Uma barreira feita por aquelas crianças, hein... Fufufu, hahahaha!”
“Kuro?”
Uma voz sinistra, como se contaminada pela loucura, ecoa no espaço, usando uma voz que deveria ser familiar, porém soa estranha ao mesmo tempo.
“Ahh... Finalmente... Finalmente... Faz tanto tempo!”
Seus olhos brilham no espaço escuro, acompanhados por uma voz zombeteira.
Do que diabos está falando? Alice disse que Kuro me rejeitaria... Contudo seu comportamento está longe do que imagino ser uma rejeição.
“Inúmeras, inúmeras vezes eu falhei... No entanto estou feliz, Kaito-kun. Que um ‘sucesso’ enfim aconteceu.”
“Suce... Sso?”
Não sei do que ela está falando... O que sei é que há um inexplicável ar pesado e assustador envolvendo meu corpo.
É como se eu estivesse preso na barriga de um monstro, tão intimidante que sinto que resistir aqui seria inútil... Eu não deveria estar diante de sua intenção assassina, e Kuro deveria estar rindo, entretanto sinto que meus joelhos estão prestes a ceder.
Kuro disse que estou melhor do que pensava que estaria... Quer dizer que essa sensação atual já foi mitigada pela Magia Defensiva que Alice e os outros prepararam para mim... Com essa quantidade de pressão, ela já foi reduzida? Quão poderoso... Poderia ser o verdadeiro poder de Kuro...
“Kaito-kun... Você já jogou o jogo de derrubar dominós?”
“Dominó?”
“Sim, dominó... Sabe em que momento esse jogo é mais divertido? É naquele momento em que por fim pode derrubá-los.”
“Guhh... Ahh...”
Cada vez mais pressão atacava meu corpo, e até conseguia ouvir algo rangendo.
Talvez as barreiras que Alice e os outros ergueram para mim estejam me fazendo gritar... Se não tivesse essas barreiras, minha consciência já teria sido ceifada há muito tempo.
“O passarinho que criei com muito carinho, como se fosse meu próprio filho... Vê-lo crescer e desenvolver as asas mais lindas que existem... Eu estava realmente ansiosa por aquele momento em que enfim poderia ‘arrancá-las’.”
“O que... Está...”
“Embora nem tudo funciona do seu jeito. Veja bem, sou bastante exigente com meu passatempo... Então, queria desesperadamente arrancar apenas as asas mais lindas... O momento da ‘sua confissão para mim’, o momento em que você brotou as asas mais lindas!”
“A-Aaaahhhh...”
Naquele momento, aquilo finalmente foi liberado.
Em um instante, meus pensamentos foram pintados de preto e fui tomado por um medo que me fez querer gritar... Uma intenção assassina pura e intensa.
Supera em muito a que recebi de Isis, e a palavra morte está sendo gravada fundo em minha mente.
Como se estivesse paralisado durante o sono, meu corpo não se move, e o desconforto é acompanhado por uma náusea intensa, como se o próprio medo estivesse rastejando sobre minha pele.
“Fufufu, não adianta. Kaito-kun... Se eu quisesse, toda essa Magia Defensiva que tem aí não te faria bem algum... Também não adianta esperar que Shiro te ajude aqui. Este espaço que criei não é um lugar onde Shiro possa entrar...”
“Gfuu... Aaaahhhhh...!”
Com suas palavras frias, a sensibilidade na minha mão esquerda... Desapareceu.
Quando movi meu olhar, vi que minha mão esquerda... Não, tudo além do meu cotovelo esquerdo havia sumido.
Não há dor... Porém, também não consigo sentir a presença da minha mão ali. É como se tivesse sido engolida por um espaço negro como azeviche, como se minha mão não existisse desde o início...
“Não se preocupe... Vou me certificar de sentir sua delícia... Comendo você aos poucos, um pedaço de cada vez...”
“...”
Não foi só a minha mão que mudou.
Junto com as suas palavras, a sensação gradualmente desaparece dos meus dedos dos pés... Começando a desaparecer no espaço negro.
O que é isso? O que está acontecendo? O que diabos vai acontecer comigo...
“Você vai morrer.”
“...”
As palavras de Kuro não eram mentira. Não precisei pensar nisso para entender que estava falando sério sobre me matar.
Ao invés disso, meu corpo entende essa realidade, meus pensamentos por fim começam a pensar na morte.
Vou... Morrer? Ahh, entendi... Vou morrer, hein...
Me pergunto por quê... Deveria ter sido algo assustador, deveria estar pensando em não querer morrer... Minha mente já está quebrada? Me pego aceitando essas palavras sem qualquer resistência.
Sinto como se não apenas meu corpo, mas também meus pensamentos estivessem sendo devorados pelo espaço negro... Me sentindo impotente, sem nada que pudesse fazer.
Está escuro e frio... Quanto do meu corpo resta agora? Todo o meu corpo já se foi? Por que não sinto nada? Até meus sentidos... Já desapareceram? A única coisa que consigo sentir é o frio...
“Ei, Kaito-kun? Como é sentir o gosto do desespero?”
“...”
Desespero... Entendo, então esse sentimento se chama desespero... Ahh, é verdade. Pensando agora, é um sentimento que conheci antes.
É aquela sensação sombria e arrepiante... Eu a senti naquele céu escuro e nublado espreitando pelas frestas... E a sensação do corpo da mamãe e do papai ficando mais frios dentro do carro.
É assustador... Frio... Ao ponto de me fazer sentir medo... E congelar.
“Ei, poderia me deixar ouvir suas últimas palavras? Suas últimas palavras tingidas de desespero...”
“...”
Minhas últimas palavras? Entendo... Minhas últimas palavras, hein... Vou ser morto por Kuro agora. O que direi a aquela que está prestes a me matar?
Não consigo mais pensar direito... Não consigo pensar em nada... Não quero pensar em nada...
Em meio aos meus pensamentos se esvaindo, as últimas palavras escaparam espontaneamente da minha boca enquanto todas as coisas na minha visão estavam sendo tingidas de preto.
“Kuro... Obrigado... Por tudo.”
Ahaha... Até eu estou pasmo. Mesmo nessa situação, só consigo sentir gratidão por Kuro.
Tenho certeza de que tenho bastante medo de morrer, contudo pra ser sincero não consigo sentir raiva nem medo por Kuro... Tenho certeza de que ficaria bem mesmo se Kuro me matasse... Pois estou profundamente apaixonado por ela...
“...”
Pouco depois, todo o espaço tremeu com grande intensidade.
E meu corpo, que deveria estar à beira de desaparecer e perder os sentidos, de repente começou a sentir calor.
O medo que me envolvia, o frio glacial... Tudo desaparece em um instante, e minha visão se abre de repente, revelando o par de olhos dourados flutuando no espaço negro.
E não sou o único que mudou.
Os olhos dourados também estão tremendo por algum motivo.
“Por quê... Por quê... POR QUÊÊÊÊÊÊ?”
“?”
Um grito alto demais, com uma voz que não é assustadora como antes, como se estivesse repleta de emoções fortes.
“Eu já fiz tanto! Por que não está com ‘medo’ de mim? Por que não está ‘fugindo’ de mim?”
“Ku... Ro...?”
“Por quê! Mesmo que você vá voltar para casa de qualquer maneira! Mesmo que vá desaparecer! Por que está me fazendo vacilar tanto?”
“...”
Com uma voz triste que soava como um grito, e a cada voz, o espaço negro como azeviche tremia intensamente, como se essa escuridão representasse o coração de Kuro.
Entendo, este lugar é... Com essas emoções que Kuro está liberando em mim agora... É a verdadeira emoção que oculta no fundo do seu coração.
Quer dizer que o que ela fez agora foi apenas uma encenação... Hahaha, como pensei, é uma pessoa bastante escandalosa.
Talvez eu tenha sido influenciado demais pela minha Magia de Simpatia, e ela guiou minhas emoções com sucesso para que acreditasse que falava sério.
E então, aos poucos, fortaleceu a intenção assassina e a ajustou para me fazer sentir medo como se estivesse perto da morte... Fazendo-me sentir medo.
“Kuro...”
“?”
Então, mais uma vez... Como se de repente se lembrasse, uma poderosa intenção assassina foi liberada, e meu corpo tremeu com força.
Contudo, está tudo bem. Meu corpo não desapareceu... E consigo me mover direito! Minha mente também não está mais quebrada!
“N-Não venha aqui... Não venha aqui...”
“...”
Na escuridão negra como azeviche, onde nem consigo me equilibrar, dei um passo definitivo à frente.
Em direção a ‘uma direção diferente’ dos olhos dourados que vejo à minha frente...
A voz assustada de Kuro me convenceu. Aqueles olhos são apenas uma distração... Kuro está logo ali.
Sequer consigo enxergar o que estava à minha frente naquele espaço escuro, no entanto, por algum motivo, conseguia ver claramente onde Kuro estava.
Um passo após o outro, me movi para frente... E estendi a mão para a escuridão onde não conseguia ver nada.
Sentindo minha mão tocar em algo, agarrei-a e puxei-a para mais perto.
“Ahh.”
“?”
Com uma voz suave, quem emergiu da escuridão negra foi... ‘Uma Shiro-san de cabelos negros’?
Não, não importa a aparência. Ela é Kuro.
Com uma expressão trêmula no rosto, com todas as minhas forças... Eu a abracei com força.
“Kuro, eu te amo.”
“???”
Coloquei tudo o que conseguia pensar naquela única frase e confessei.
Seu corpo estremeceu, mas não pareceu resistir.
“Desde que cheguei a este mundo, seu sorriso sempre foi uma fonte de encorajamento para mim. Quero estar junto de você, quero sempre vê-la com um sorriso feliz no rosto, Kuro.”
“Kaito... -kun.”
“Não importa o que diga ou faça... Não tenho medo de você. Também não te deixarei... Ei, Kuro? Meu próprio tesouro... Já o encontrei, sabia? Eu te amo... Mais do que qualquer pessoa... Mais do que qualquer coisa...”
“?”
Ouvindo minhas palavras enquanto a abraçava com força, seu corpo relaxou de repente.
Naquele momento, o espaço negro rachou e se estilhaçou, e a paisagem retornou ao meu quarto familiar.
Não é só o cenário que voltou, Kuro também está de volta à sua forma familiar de jovem garota de cabelos brancos prateados, com seu corpo trêmulo agarrado às minhas roupas.
“Idiota... Seu idiota... Ainda que te fiz passar por tudo aquilo, Kaito-kun... Fazendo sentir medo à força... Mesmo assim, você ainda não tem medo de mim...”
“Unnn. Acho que sim.”
“Idiota... Idiota... Idi... Idi... Eu te amo... Eu também... Te amo! Eu te amo, Kaito-kun!”
Com lágrimas escorrendo dos olhos de Kuro, ela disse a frase “Eu te amo” e saltou em minha direção.
Enterrando seu rosto cheio de lágrimas em meu peito, enquanto seus ombros pequenos tremiam, abracei Kuro gentilmente.
“Desculpe... Desculpe... Eu te fiz sentir medo...”
“Na verdade, não me importo. Quem estava realmente assustada... Era você, certo?”
“Unnn... Estava com medo... Se o Kaito-kun se confessasse para mim... Nunca mais conseguiria... Desistir de você... E se o Kaito-kun desaparecesse... Nunca mais conseguiria sorrir...”
“Não vou desaparecer. Prometo... Não vou tirar o seu sorriso.”
“Kaito... -kun...?”
Depois de ouvir minhas palavras, Kuro se agarrou a mim com mais força do que antes e então... Lentamente olhou para cima e me encarou com os olhos marejados.
“Kaito-kun... Eu te amo. Te amo muito.”
“Unnn. Também te amo, Kuro.”
Contando nossos sentimentos um ao outro novamente, Kuro fechou os olhos.
E depois de acariciar seus cabelos brancos prateados, que brilhavam ao luar que entrava pela janela, abaixei pouco a pouco meu corpo... E coloquei meus lábios em seus pequenos lábios.
Com minha confissão encerrada e tudo esclarecido, Kuro e eu agora somos amantes, mas... Estou sentindo uma vergonha absurda! O que faço? Não consigo olhar direto nos seus olhos agora, sabia?
Quando de repente me sinto envergonhada pelo fato de termos chegado a um ponto em que sinto vontade de gritar de agonia, Kuro sorri do nada, pegando a fruta dourada que lhe dei antes.
“Kaito-kun, quem te deu isso?”
“Hã? Errr, foi a Alice, porém...”
“Fufu, entendi... Então, sabe o ‘significado’ de me dar essa fruta?”
“Eh? Significado?”
Pensando bem, no final, ainda não sei para que servia aquela fruta dourada, e quando inclinei a cabeça e perguntei, Kuro sorriu de volta.
Então, com um leve rubor nas bochechas, ela me conta com um sorriso travesso nos lábios.
“Apresentar o fruto dourado é o ato de ‘pedido de casamento’ para os Espíritos.”
“Ehh? Eeehhhh?”
“Você daria o fruto dourado a ela, e quando o destinatário o comesse, seria um sucesso. Ouvi dizer que os Humanos também fazem isso há anos, então pensei que já soubesse.”
“Sé-Sério...”
Aquela maldita Alice, por que diabos me deu isso? Não significa que estou pedindo a Kuro em casamento antes mesmo de poder me confessar... O problema é que estou ficando ainda mais envergonhado só de pensar!
Na minha frente, sentindo o calor subindo pelo rosto, Kuro espontaneamente leva a fruta dourada à boca e dá uma mordida... Espera, eeehhhh?
“Espera, K-Kuro?”
“Ahh, é refrescante. Não é uma delícia?”
“N-Não, não dá só pra comentar sobre o gosto nessa situação...”
Kuro comer essa fruta significa que aceitou meu pedido... Ah, isso não é bom, sinto que meu rosto está ficando cada vez mais quente.
Depois de me olhar com ar divertido, Kuro espontaneamente se aproxima de mim e me abraça gentilmente.
“Ahh... Enfim... Enfim te encontrei.”
“Kuro?”
“Faz muito tempo... Por fim encontrei alguém que vai ‘me tratar como igual’... E que ‘ficará ao meu lado’...”
“...”
Lágrimas voltaram a escorrer dos seus olhos, e ela me abraçou com mais gentileza como se eu fosse seu tesouro.
Kuro disse que havia algo que estava procurando há muito tempo... E agora, ela encontrou...
“Kaito-kun... Vou te contar tudo... Sobre mim... O que queria... Meu tudo... Vou te contar sobre tudo, Kaito-kun.
“Unnn.”
Enquanto se agarrava ao meu corpo como uma criança mimada, Kuro se apoiou em mim, enquanto eu a abraçava de volta.
Sinto uma sensação de alegria como se meu coração estivesse sendo gentilmente envolvido em felicidade, enquanto acaricio seus cabelos confortáveis ao toque.
“No entanto, por um tempinho... Só um tempinho mesmo... Espere por mim.”
“Unnn?”
“Neste momento... Estou transbordando de amor por você... Ao ponto que não consigo pensar em nada além do Kaito-kun. Não consigo pensar em nada.”
“Está tudo bem. Não estou com pressa e sempre estarei aqui ao seu lado... Então está tudo bem, mesmo que a gente vá com calma.”
“Unnn. Kaito-kun... Eu te amo... Te amo muito... Não importa o quanto diga, não é o suficiente para transmitir meus sentimentos. Kaito-kun... Obrigado por vir a este mundo... E me conhecer...”
Sentindo o calor inconfundível da minha amada em meus braços, meu coração se encheu de uma felicidade pacífica.
Querida mãe, pai — a misteriosa garota demônio que me encontrou em outro mundo e me salvou. Ela é gentil, infantil, mas de alguma forma madura, e sempre tem um sorriso adorável no rosto, é quem eu mais amo... E a partir de hoje, meu relacionamento com essa pessoa deu um grande passo à frente — de amigos para amantes.
Título: De Amigos para Amantes
Notas do Autor:
<O Medidor de Afeição suprimido de Kuro foi desbloqueado>
Medidor de Afeição de Kuro para Kaito
??? / 100 ⇒ 266347 ↑ (Ainda em Ascensão) / 100
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