Capítulo 44: Não sou fã de Manto e Adaga, sabe?
“Bem-vinda, Lina Inverse. Perdoe a espera.” as palavras do ruivo tiraram a mim e a Gourry do choque. Ele se levantou e fez um sinal para que nos juntássemos a ele. “Sentem-se, por favor. Sintam-se à vontade.”
“Oh... Claro. O-Obrigada por nos convidarem!” respondi, ainda um pouco tensa ao entrar na sala de jantar.
“O prazer é meu, de verdade. Estou encantado em enfim conhecer a famosa Lina Inverse.”
“Famosa, né?” sussurrei enquanto nos sentávamos. Esperava que o que quer que tivesse ouvido sobre mim não tivesse vindo daquela fonte de boatos maldosa.
Assim que nos sentamos, o regente retomou seu lugar.
“Vamos começar com as apresentações...” começou. “Sou Lavas Nexalia Langmeier, atual regente do Castelo de Welgis. Assumi as funções de meu pai, Lorde Klein, que está doente há algum tempo.”
A atenção de Gourry permaneceu em Mileena e Luke, que estavam atrás de Lorde Lavas. Luke, talvez também curioso, continuava nos lançando olhares, enquanto Mileena permanecia tão inexpressiva quanto na primeira vez em que a vimos.
Lorde Lavas, percebendo ou não os olhares trocados, continuou falando.
“Você pode não pensar nisso olhando para mim, porém sou um grande aficionado pelas artes mágicas... Mais especificamente, por histórias sobre elas.”
Um garçom saiu pela porta atrás do regente, colocou um pouco de sopa à nossa frente e saiu outra vez.
“Existem muitos relatos por aí, é claro, contudo os que achei mais intrigantes ultimamente são as histórias de Lina Inverse.”
“No entanto a maioria dessas histórias não são ruins na verdade?” interrompeu Gourry.
Ei! Por que é só nisso que presta atenção? Se não estivéssemos em um lugar tão chique, eu teria te dado um tapa agora.
O regente estremeceu com as palavras de Gourry.
“É verdade que alguns deles são o que eu chamaria de... Desagradáveis. Entretanto quanto mais realizado alguém se torna, maior sua fama... E mais fofocas surgem para manchar essa fama. De minha parte, acredito que rumores negativos são apenas metade da história.” disse Lavas.
Ele então olhou para mim e continuou.
“Espero que não se ofenda quando digo que coletei uma grande quantidade de rumores a seu respeito. Ouvi dizer que esteve profundamente envolvida nas disputas de poder tanto do conselho de feiticeiros da Cidade de Atlas quanto da família real de Saillune. Houve também a eliminação de um culto maligno em Kalmaart e a derrota do poderoso assassino Zuma. Dizem até que teve uma participação sua na destruição da capital de Dils e da Cidade de Sairaag. Eventos cujo envolvimento exigiria nada menos do que um feiticeiro incomparável.”
Oho... Soltei um ruído interno de apreciação. Alguém fez sua pesquisa!
“Todavia boatos são apenas isso... Boatos. Assim, enquanto comemos, esperava que me presenteasse com algumas de suas realizações em primeira mão. Mas suponho que continuei tagarelando, não é? Aproveite sua sopa antes que esfrie.” disse Lorde Lavas enquanto pegava sua própria colher.
———
Depois do jantar, Gourry e eu saímos do castelo. Estávamos voltando para a pousada.
“Nossa, que refeição!” comentou Gourry, satisfeito, enquanto caminhávamos juntos pela estrada noturna.
“Não acredito que se empanturrou de comida daquele jeito.”
“Bem, estava tudo tão bom... Nobres realmente tem do bom e do melhor, sabia? Mas você também não parecia estar com muita fome. O que houve? Será que fez três ou quatro refeições antes porque não conseguiu esperar o jantar?”
“Hahh...” soltei um suspiro, exausta. “Escute, não é uma questão de apetite. Vejo que esqueceu que Lorde Lavas poderia estar querendo nos pegar.”
“Claro que não. É bem surpreendente como ele não fez nada contra nós, né?”
Ughhh...
“Bem, o que quero dizer é que estava preocupada que a comida pudesse estar envenenada.”
“O quê?” Gourry parou de repente, como se aquilo tivesse acabado de lhe ocorrer. “A-A comida... Estava envenenada?”
“Poderia ter sido, embora não acho que tenha sido, já que você não parece estar pior depois de enfiá-la goela abaixo daquele jeito.”
“É essa a base da sua suposição? Poderia ter dito algo antes de começarmos a comer!”
“Como se pudesse! Ainda não sabemos ao certo se Lorde Lavas é um cara mau, e queria que eu me sentasse alegremente à sua mesa e dissesse: ‘Cuidado aí, grandão, a comida pode estar envenenada’?”
Por que eu não avisei Gourry antes de chegar ao castelo, você pergunta? Para ser sincera... Meio que me esqueci na hora. Mas psiu! Não conte a ele!
“Se comer com cuidado, pelo menos consigo saber se um prato está envenenado. Porém não consigo discernir se me empanturrar.”
“Heh... Então é por essa razão que comeu tão devagar?”
“Bingo.”
“Como aprendeu a identificar o gosto de veneno?”
“Eh, não foi nada demais. Só uma habilidade que minha irmã lá em casa fez questão de que eu aprendesse na época.”
Com isso, Gourry ficou em silêncio por um momento.
“Já faz um tempo que estou pensando nisso...” retomou o grandão. “Contudo que tipo de pessoa é a sua irmã?”
“Não pergunte. Por favor. Deixa pra lá.”
“T-Tá... Não vou me intrometer.” Gourry deve ter notado o terror nos meus olhos, porque ficou em silêncio de novo com um arrepio.
“De qualquer forma, fiquei me perguntando sobre o que seria aquele convite para jantar.” voltei ao assunto em questão, na esperança de esclarecer as coisas.
“Não sei. Ficamos especulando sobre o que poderia estar tramando no caminho para lá, no entanto tudo o que ele queria era ouvir suas histórias de guerra.”
“Pois é. Talvez ouvir falar de mim pelos seus guarda-costas, Luke e Mileena, tenha despertado sua curiosidade... Embora o momento pareça um pouco conveniente demais, né?”
“Sim. E por falar nisso, Lina, o que aqueles dois estão fazendo lá? O regente não contrataria aqueles dois se estivesse trabalhando com os homens de preto, contrataria?”
“Hmm...” franzi a testa, pensativa. O cara tinha razão. Tínhamos nos unido a Luke e Mileena para lutar contra os homens de preto por uma espada em Bezeld. A espada já tinha sumido, todavia mesmo com o objeto em questão fora de cena, eu duvidava muito que os homens de capa negra fossem tão rápidos em contratar antigos inimigos para proteger um dos seus. “De qualquer forma, nossa prioridade agora é lidar com você-sabe-quem.”
“Justo.”
Nós dois trocamos um olhar enquanto continuávamos a caminhar. Desde que saímos do castelo, sentíamos uma presença nos perseguindo. Se fosse um amigo, teria nos chamado, então o fato de não ter sugeria... Problema.
“Devemos dar o primeiro passo?” perguntou Gourry.
“Boa pergunta. Tudo o que sei é que é melhor não os levar de volta para onde estamos hospedados.” respondi, parando.
Não havia residências ou bares por perto. Era pouco depois do anoitecer, mas as ruas já estavam vazias, exceto pela escuridão e pelo silêncio. Talvez percebendo que havíamos parado, a presença atrás de nós pareceu hesitar por um instante antes de fazer o próximo movimento... Vindo direto para nós!
Uma luz irrompeu da escuridão da noite, cavalgando uma onda de intenções hostis. A luz assumiu a forma de uma lança mágica, porém era fácil de se evitar àquela distância. Gourry e eu saltamos em direções opostas para evitá-la. Contudo então...
“Hã?”
Sentindo uma nova onda de perigo, coloquei a mão na minha espada, meio que por reflexo. Uma figura saltou da escuridão bem diante dos meus olhos! Ei!
Ching! Usei o cabo da minha espada curta meio desembainhada para bloquear um golpe horizontal por um fio de cabelo.
Eita, foi por pouco! Se tivesse sido um segundo mais lenta, a lâmina do meu oponente teria se cravado no meu flanco... Ou pelo menos me livrado de um dedo que segurava minha lâmina. O ataque veio rápido demais para ser o mesmo cara que lançou o feitiço. Seriam dois agressores?
“Lina!” quando saltei para trás, Gourry interpôs-se entre mim e meu agressor, com a espada em punho.
Clash! O homem de preto bloqueou um golpe de Gourry com sua própria lâmina... Uma da cor da escuridão. Da mesma posição, lançou um feitiço contra o grandalhão em retaliação! Quando foi que entoou esse feitiço?
Deveria ter sido um golpe certeiro à queima-roupa, porém Gourry conseguiu se esquivar e canalizar seu impulso para um golpe subsequente. Desta vez, o homem de preto saltou para trás para se esquivar em vez de aparar. Ele se distanciou de Gourry e, de repente, virou-se e disparou correndo.
“Está fugindo?” gritou Gourry.
“Não!” respondi, perseguindo-o. “Quer que o sigamos! Está nos atraindo para algum lugar!”
“E nós vamos só ir junto?” Gourry choramingou enquanto corria para alcançá-lo.
“Claro! É uma armadilha óbvia, então vamos acioná-la, passar por ela e encontrar o próximo passo!”
“Beleza!”
Nós dois disparamos pela rua encoberta pela noite em busca da figura em fuga. Presumi que fossem dois, contudo não havia sinal de um segundo. Talvez minha mente estivesse me pregando peças... Ou talvez fosse parte da armadilha. Seja como for, perseguir esse cara me daria a resposta mais cedo ou mais tarde.
Corremos, virando esquina após esquina. Depois de muita corrida, o homem de preto enfim passou por um certo portão.
“Ei, ali é...”
Gourry e eu paramos por um momento, pois estávamos bem do lado de fora de uma das misteriosas instalações proibidas que havíamos explorado antes. Parecia um pouco com uma biblioteca ou museu, apesar de estar murada e lotada de guardas da última vez que a vimos... No entanto, não havia sinal de guardas por perto agora, e o portão estava escancarado.
“Ei... Lina!” chamou Gourry.
Lá, olhei para o prédio. O homem de preto que estávamos perseguindo estava parado na porta da frente, nos encarando.
“Entendi. A velha rotina de ‘venha me pegar’...” murmurei.
“Nós... Vamos pegá-lo?”
“Pode apostar!” respondi com uma piscadela.
Retomamos a perseguição. Assim que o homem de preto teve certeza de que estávamos o perseguindo de novo, desapareceu pela porta.
“Esse cara está realmente decidido a garantir que continuemos!” comentou Gourry.
“Um sinal de que está confiante em suas próprias habilidades. Ou em qualquer armadilha que tenha armado. Ou... Talvez ambos.”
Logo chegamos à entrada. Um tênue raio de luz brilhou pela fresta da porta, entretanto não havia sinal imediato de ninguém lá dentro. Claro, sabíamos que alguém tinha que estar lá. O mais provável é que estivesse apenas se escondendo.
Recitei um feitiço baixinho e fiz um sinal para Gourry com os olhos. Então... Bam! Ele chutou a porta, espada na mão! Mas...
“Ninguém em casa.” sussurrou, olhando ao redor.
Parei um momento e então espiei lá dentro também. Um grande salão de entrada circular se abriu diante de nós. No final, havia um corredor e, de cada lado, uma escada que levava ao segundo andar. Castiçais alinhados nas paredes lançavam uma luz fraca e mágica sobre o cômodo. De fato, não parecia haver ninguém por perto. Exceto...
A abertura para o corredor nos fundos era ladeada por duas estátuas de grifo, a mais à direita das quais estava um pouco deslocada de sua posição original. Abaixo dela, havia um buraco no chão que levava ao porão.
“Outra armadilha óbvia.” observou Gourry.
“Acho que é melhor cairmos nessa, né?” respondi. “Afinal, eles se deram a todo esse trabalho para nos convidar.”
Nos preparamos enquanto atravessávamos o cômodo e descíamos as escadas para um corredor abaixo. O próprio teto parecia ter sido encantado com algum tipo de luz mágica, que lançava um brilho frio e inorgânico sobre o corredor austero e vazio.
Depois de caminharmos um pouco, o corredor culminou em uma porta que gritava: ‘Olá! Sou uma armadilha!’, ainda assim, não podíamos só voltar agora.
Chegamos à porta, pegamos a maçaneta e... Clack. Um ar frio nos envolveu, vindo do cômodo adiante. Do outro lado da porta, havia... Escuridão. A luz que entrava do corredor revelava apenas silhuetas alinhadas ao longo de cada parede.
“Iluminação!” conjurei para iluminar o lugar. E então... “O que é tudo isso?” me peguei sussurrando.
O cômodo era ladeado por tubos de cristal que chegavam ao teto. Dentro deles flutuavam seres vivos, aparentemente adormecidos... Criaturas curiosas que não podiam ser chamadas de humanas nem de monstros.
“Diga, Lina, que lugar é este?”
“Uma fábrica de quimeras... E das grandes, aliás.”
As fileiras de tubos se estendiam além da luz do meu feitiço. Deviam ser cem ou mais.
“Será que o cara de preto está mais para dentro?” Gourry perguntou hesitante.
“Sem dúvida, cara.”
Os tubos de cristal estavam embutidos na parede. Seria impossível alguém se esconder atrás deles. Nosso alvo provavelmente pretendia nos levar para o fundo e, em seguida, soltar as quimeras dos tubos para nos cercar. Porém se esse era o jogo, eu tinha um pequeno plano.
Comecei a caminhar pelo corredor estreito entre os tubos, entoando um cântico baixinho. E em pouco tempo...
“Nos encontramos de novo...” disse uma voz enquanto eu sentia uma presença surgir atrás de nós.
Virei-me rápido e vi uma figura parada na porta por onde tínhamos entrado, iluminada pela luz. Não havia como não adivinhar que era um homem de preto. É claro que, dado o código de vestimenta, tecnicamente não tinha como saber se era o mesmo de antes...
“Você se lembra da minha voz? Sou eu... Zain.”
“Zain?” gritei, abandonando meu cântico.
“Quem?” perguntou Gourry.
“De toda aquela confusão em Bezeld! Sabe, o de manto negro que desapareceu lá no final?” gritei. Esse cara não era um lutador ruim, contudo poderíamos vencê-lo, contanto que não baixássemos a guarda.
“Ouvi dizer que vocês se infiltraram em outra de nossas instalações ontem.” disse Zain. “Fiquei bastante surpreso quando meus camaradas mencionaram seus nomes.”
“Então esta cidade é a sua base, afinal?”
“Não posso te responder isso.”
“Aw, sério? Da última vez você mordeu a isca. Crianças crescem tão rápido!”
“Diga o que quiser!” Zain cuspiu indiferente.
Hum, e ele costumava ser tão fácil de manipular também... Não tenho dúvida de que havia algo diferente nele agora.
“De toda forma, vocês dois precisam morrer!” sibilou Zain, com a intenção assassina agora transbordando por todo seu corpo.
Voltei a entoar um feitiço, quando naquele momento...
Krrrik-ak-ak-ak! Os tubos de cristal que ladeavam o corredor entre nós e Zain começaram a estalar audivelmente! Crash! A chamada ‘água da vida’, um fluido de cultivação usado para fazer quimeras, jorrou, escondendo Zain por um momento de nossa vista.
No instante seguinte... Uma presença hostil apareceu atrás de nós.
“O quê?”
Gourry se virou bruscamente. Espadas brilharam. Clang! Sua espada conseguiu bloquear com grande habilidade a lâmina do homem de preto.
Sabia! Eram dois caras! O que significava que meu trabalho era imobilizar Zain, que ainda estava à nossa frente. No entanto, justo quando decidi essa estratégia...
“Como sempre, nada mal!” sussurrou o homem atrás de nós... Na voz de Zain!
O quê? Olhei para a porta à frente e vi que a silhueta da figura havia sumido. Não pode ser! Mesmo que tivesse uma passagem secreta ou algo assim, não deveria ter conseguido passar por trás de nós tão rápido!
Todavia, não tínhamos tempo para resolver esse enigma agora. As quimeras seladas estavam começando a inundar o corredor com seus tubos quebrados.
Lancei o feitiço que havia entoado na mais próxima.
“Congele Bullid!”
Como o nome sugeria, o feitiço disparava um projétil gélido com o objetivo de congelar rapidamente um oponente. O corredor era bem estreito, então se congelasse a que estava na frente, ela deveria segurar as outras atrás. Entretanto...
Crash! Meu feitiço atingiu a quimera da frente, mas em vez de congelar... A criatura apenas foi chacoalhada pelo impacto.
Não funcionou? Será que essa quimera em particular tinha um pequeno demônio dentro?
Não tive tempo de entoar outro feitiço com os monstros vindo em minha direção. Em vez disso, me apressei em sacar minha espada curta e me preparei para enfrentá-los. Veja bem, não sou ruim com lâminas, porém não posso negar que me falta força bruta. Se a Quimera Nº 1 fosse uma fusão de humano e demônio, eu teria dificuldade em derrubá-la com um só golpe. Sendo assim...
A quimera que se aproximava rugiu, ergueu a mão direita e...
Whoosh! Naquele instante, saltei para perto, mantendo-me agachada para que a quimera pensasse que desapareci. Logo, me endireitei, lançando minha espada para cima de mim!
Krrkkh! A ponta da minha lâmina perfurou a mandíbula da quimera por baixo! A fera soltou um uivo coagulado por espuma sangrenta, chicoteando enquanto lutava em agonia.
Em seguida, soltei minha espada, recuei e lancei o feitiço em que estava trabalhando.
“Explosão de Cinzas!”
Whoom! A quimera que se debatia e a que estava atrás receberam o feitiço de frente e se transformaram em cinzas. Veja, esse pequeno número de magia negra cremaria qualquer coisa com vida ou vontade... O que significa que deixou minha espada e as paredes ao nosso redor ilesas. Peguei minha arma quando esta caiu no chão com um estrondo e me preparei para enfrentar a próxima rodada de quimeras.
Cerca de uma dúzia ainda se aglomerava no corredor. Posso derrotar mais algumas da mesma forma, embora seria lento e perigoso. Se ao menos tivesse acesso ao meu bom e velho Sinalizador Gaav, que afetaria demônios e penetraria múltiplos oponentes... Uma pena que as circunstâncias tivessem conspirado, digamos, para me negar aquele feitiço.
Se Gourry tivesse um momento livre, eu poderia ordená-lo a assumir a liderança enquanto ficava de lado observando. No entanto, embora não tivesse tempo para lhe dirigir um olhar, podia ouvir o choque de espadas atrás de mim. Isso significava que os garotos seguiam ocupados, então teria que fazer algo com essas quimeras eu mesma! Se pudesse ao menos bloquear a que estava na frente do bando...
É isso! Comecei a entoar um cântico baixinho. Mantive as quimeras cautelosas à distância com minha espada, e logo depois...
Whoosh! A fera na liderança finalmente decidiu atacar.
Mas, a essa altura, já tinha terminado meu feitiço!
“Sopro de Dinastia!”
Shing! Desta vez, a quimera da vanguarda congelou por completo.
Este feitiço invocava gelo mágico capaz de congelar até mazokus, o que significava que superava qualquer resistência mágica que as quimeras pudessem ter. Geralmente, congelava o oponente e depois o estilhaçava em pequenos pedaços... Todavia ajustei um pouco o encantamento para congelar sem quebrar. Se você realmente entendesse o cântico de um feitiço, tais modificações eram bem fáceis de se fazer.
Certo! As outras quimeras não vão conseguir passar pela congelada na frente do grupo, o que significa que agora posso ajudar o Gourry contra o Zain!
Virei-me, entoando um novo feitiço.
Clink! Clank! Clang! A batalha dos dois continuava a todo vapor, como eu esperava. Gourry também não estava pegando leve com o cara. Os golpes de Zain pareciam vir com mais força e rapidez do que da última vez que o enfrentamos.
Que diabos? Como melhorou tanto tão rápido? De qualquer forma, enfrentar a mim e ao Gourry ao mesmo tempo seria a sua ruína!
Dei a volta por trás do grandalhão e lancei meu feitiço.
“Flecha Flamejante!”
Uma dúzia de flechas de fogo apareceram no ar... Bem entre Gourry e Zain!
“O quê?” Zain gritou surpreso enquanto os raios flamejantes caíam sobre ele.
Fa-fwoom, fwoom, fwoom!
Flechas Flamejantes conjuradas normalmente se manifestavam na frente do conjurador, mas também fiz uma pequena modificação neste feitiço. Ótimo! Agora vamos destruir aquelas quimeras e... Virei-me, apenas para ver...
“Bwuh!” Gourry gritou em choque. O estrondo de espadas se chocando se seguiu. Quanto a quem o atacou, era ninguém menos que...
“Desculpe, garotinha, porém um truque desse nível não vai funcionar comigo!”
“Zain?”
Por um momento, não pude acreditar no que via. Suas roupas pretas estavam claramente cobertas de marcas de queimadura, contudo não havia sinal de dano no homem ali. Será que previu meu ataque e lançou um feitiço de proteção contra fogo? Ou...
“Oh, droga!” Zain gritou de repente, assustado, antes que eu pudesse terminar minha linha de raciocínio.
Mesmo enquanto continuava a trocar golpes com Gourry, seus olhos se voltaram para mim... Não, atrás de mim! Virei-me, ainda cautelosa com qualquer movimento repentino de Zain, e vi a quimera da vanguarda ainda congelada no lugar. Não conseguia ver nada de errado, no entanto...
Ah, claro! As quimeras que estavam se aglomerando atrás da congelada não estavam em lugar nenhum, o que significava... Espera aí, elas tinham só ido embora? Nosso camarada de preto não as controlava?
Percebendo que o som da luta de espadas havia cessado, olhei para trás, na direção dos garotos, a tempo de ver Zain saltar para longe. Ele se afastou bastante de Gourry, depois se virou e disparou para a escuridão.
“Nos atraindo de novo?” sussurrou Gourry.
“Duvido!” gritei em resposta. “Acho que as quimeras escaparam e o caos está prestes a se instalar na cidade!”
“O quêêêê?”
Lancei um rápido feitiço.
“Sopro de Dinastia!”
Shing! Esta versão inalterada pulverizou a criatura congelada, e além dele... Exatamente como eu temia, não havia nada além de um corredor vazio. As quimeras que fervilhavam antes pelo lugar já haviam desaparecido há muito tempo.
“O que devemos fazer, Lina?”
“O que mais? Se os monstros escaparam para a superfície, não podemos ficar aqui parados! Temos que voltar lá para cima e ver o que está acontecendo!”
Saí correndo sem esperar por uma resposta de Gourry, que obedientemente me seguiu. Corremos de volta pelo corredor, seguimos direto para o topo da escada e nos encontramos no salão de entrada mais uma vez.
“Lá!” gritei quando avistei uma quimera parada à minha frente. Ela nos notou e soltou um rugido intimidador, entretanto antes que eu pudesse entoar um feitiço...
Vwoosh! Gourry disparou na minha frente e cortou a fera.
Gourry, você é demais! Se ao menos não fosse tão burro quanto um!
“Era aquela quimera de quem estava falando?”
“É, mas havia muitas outras.”
“Quantas no total?”
“Não tenho certeza... Devem ser umas dez, acho.” não conseguia ver mais nenhuma por perto. Poderia haver alguma vagando por outras partes do prédio, todavia se algumas tivessem saído, tinham que ser nossa prioridade. “Então, vamos lá!”
“Certo!”
Nós dois irrompemos pela porta da frente e...
“Geh!” parei com um gemido. A briga já havia se espalhado para além dos muros do complexo, para as ruas da cidade.
———
“Eu só não entendo!” comentei com Gourry, que estava esperando à nossa mesa, enquanto eu voltava para a pousada.
Na noite passada, conseguimos derrotar todas as quimeras que fugiram pela cidade, voltar para a pousada (agindo como se nada tivesse acontecido) e dormir um pouco. Porém depois do café da manhã, fiquei curiosa sobre o status quo, então fui até a cidade para fazer um reconhecimento.
“Não entendeu o quê? Quer dizer sobre ninguém estar falando sobre o que aconteceu ontem à noite?”
“Bem, é claro que as pessoas estão falando. Houve uma declaração oficial e tudo mais. Disseram que foi obra de um feiticeiro desonesto em fuga, contudo que o culpado em questão já havia sido preso.”
“O que isso significa?” perguntou Gourry, franzindo a testa.
“Significa que a facção dos mantos negros escondeu a verdade.”
Eles provavelmente queriam manter as coisas em segredo aqui em sua cidade-sede. Parece que até deram uma mãozinha ontem à noite, já que Gourry e eu tropeçamos em algumas quimeras já mortas durante nossas rondas. Quer dizer, não é surpresa que os mantos negros não quisessem admitir publicamente a verdadeira causa do caos...
“Ainda assim, poderiam facilmente ter jogado a culpa de todos os problemas em você e em mim. Afinal, eles controlam as autoridades e o fluxo de informações. Mas não fizeram... É isso que não entendo.”
“Hmm...” Gourry coçou a cabeça, confuso.
“Quer que eu explique?” disse uma nova voz.
“Hã?” olhei para ver um rosto familiar. “Luke?”
De fato, era Luke, o guerreiro de cabelos negros e cara de poucos amigos. Ele tinha aparecido na nossa mesa em algum momento, sem Mileena pela primeira vez.
“Ei!” disse Luke sem rodeios, ocupando um lugar vazio enquanto coçava a cabeça sem jeito. “Não sou fã dessa história de mensageiro, entretanto não se pode dizer não a um cliente... É por essas e outras que odeio serviços contratados.”
“Que reclamação enorme de um cara que nos abordou. E que tipo de mercenário odeia serviços contratados?”
“Quem está chamando de mercenário? Eu e Mileena somos caçadores de tesouros!”
“Sério?”
“Sim!”
Como o título sugeria, caçadores de tesouros procuravam ruínas e coisas do tipo para saquear e vender com lucro. A maioria das pessoas diria que não é muito diferente do que Gourry e eu fazemos, veja bem... Porém tanto faz em termos de rótulos.
“Pensando agora...” falei. “Vocês se envolveram em todo aquele drama em Bezeld porque estavam atrás de uma espada, certo?”
“Isso mesmo! Nós caçamos tesouros históricos, superamos provações para encontrá-los e depois os tomamos para nós mesmos! Uma verdadeira vida de aventura! Não sou nenhum mercenário abanando o rabo para um rico idiota entediado.”
“Contudo está abanando o rabo para o Lorde Lavas agora.”
“Waaaah!” Luke de repente berrou, soluçando em resposta ao meu comentário. “Olha... Não estou trabalhando para aquele cara porque quero! É só que...”
“Só que... Ficou sem dinheiro?”
“De jeito nenhum! Só que... Mileena aceitou o trabalho sem nem me perguntar!”
“Podia só ter recusado, sabia?”
“Você é idiota ou algo assim? Jamais recusaria a minha doce Mileena!”
“Com toda essa sua conversa fiada sobre aventura, você é bem covarde quando se trata dela...”
“Hmpf. Sou um escravo do meu amor!”
Ou é só um escravo...
“Um escravo do amor? Qual é, cara...” disse Gourry, estremecendo. “Acho que ela te dominou, só isso. É triste ver um homem cair tão baixo.”
“Sua cara não queima? Já pensou em se olhar no espelho?” disse Luke, olhando feio para mim e depois para Gourry.
“Espera aí, não é bem assim. Lina não me dominou de jeito nenhum. Só parece desse jeito porque não gosto de pensar por mim mesmo.”
Sheesh... Como vivem suas vidas dependem de vocês, claro, mas isso é... Patético, sabiam...
“Então, enfim...” percebendo que essa linha de pensamento só iria ficar mais deprimente, lancei um olhar para Luke. “Voltando ao assunto em questão, o que está fazendo aqui? Fez parecer que tem alguma informação privilegiada.”
“Ah, certo, tem razão.” Luke por fim voltou a si, olhou ao redor com cautela e sussurrou. “Sabe aquelas quimeras que estavam por toda a cidade ontem à noite?”
“Ouvimos rumores.”
“Não se faça de boba. O regente acha que você estava envolvida. Foi ele quem encobriu tudo.”
“Oh?” perguntei, mantendo a voz baixa.
“É. E está querendo a sua ajuda.”
“Hmm.” pensei por um minuto. “Isto não seria... Algum tipo de disputa de poder familiar, seria?”
“Heh. Bom chute!” respondeu Luke com um sorriso.
Não que fosse especialmente difícil de entender. Se houvesse duas partes em conflito e uma fosse o regente, era razoável supor que a outra tivesse posição comparável. Um parente consanguíneo era o candidato mais provável.
“Pra resumir...” começou Luke. “Lorde Lavas tem um irmão mais velho chamado Veisam. Seu irmão é bem ambicioso e não se contenta em comandar um território insignificante. Dessa forma, começou a tramar todo tipo de coisa podre. E agora que o velho deles adoeceu, deixou tudo para o irmão mais novo, enquanto se aproveita do dinheiro e do poder.”
“Irmãos, hein?”
“É. No entanto se o que o mais velho está fazendo for descoberto e o rei souber, irá tirar a patente e os títulos dos dois. Eles podem até acabar com a cabeça em estacas. Então, Lavas está fazendo o que pode para deter o irmão o mais silenciosamente possível. É por essa razão que precisa de pessoas fortes ao seu lado. Um dos espiões que enviou para vigiar o irmão relatou que vocês dois estavam na cidade, assim ele quer contratá-los.”
“Entendo...” comentei. Sem dúvida fazia sentido.
“Tudo iria por água abaixo se você fosse presa por causa do negócio das quimeras, então Lavas inventou uma história para divulgar ao público e me mandou te contar. Agora, é aqui que pergunto: Quer ajudar o regente?”
“Hmm...” cocei a nuca, pensativa. “Se não se importa que pergunte, Luke, por acaso já viu esse tal de Veisam?”
“Não, nenhuma vez. Dizem que não está mais no castelo.”
“Entendo. Então passo.”
“Entendido. Vou avisá-los.” Luke assentiu e se levantou.
“E-Espera aí! Não quer saber por que recusei?” perguntei. Pelo visto era a minha vez de perder a calma.
“Já disse que odeio essa porcaria de ser mensageiro.” disse Luke, irritado. “O que quer fazer não é da minha conta, então não me importa muito o porquê.”
“Mileena vai ficar brava por não ter perguntado.”
Isso provocou um estremecimento no corpo inteiro do autoproclamado caçador de tesouros. Ele então se sentou de volta.
“B-Bom... Talvez eu devesse te ouvir, afinal.”
“Cara, como ela te deixou tão adestrado?”
“V-Vamos lá, fala logo.”
“Não.”
“...”
“...”
“Ei...” Luke disse, esfregando a cabeça com força. “Está querendo me sacanear por acaso?”
“Mais ou menos!”
Luke ficou sem saber o que responder.
“Porém há um bom motivo para eu não te contar...” sugeri. “E agora que perguntou, pode dizer ao regente e a Mileena: ‘Continuei perguntando e ela apenas não quis dizer’.”
“Entendido.”
Pronto, Luke se levantou com uma carranca e saiu.
“Ei, Lina, por que recusou?” Gourry perguntou assim que Luke saiu do prédio. “Parece que o regente está em sérios apuros.”
“Isso pressupõe que Luke... Ou melhor, que o regente esteja dizendo a verdade.” expliquei. “Quer dizer, a armação toda parece legítima, embora não signifique que de fato seja. Por exemplo, e se as posições deles estiverem invertidas?”
“Invertidas?”
“Talvez o regente seja quem está tramando por trás dos panos enquanto o irmão mais velho, Veisam, tenta detê-lo. Talvez Veisam tenha fugido do castelo porque o irmão tentou matá-lo, e o regente queira nos contratar como distração... Ou até mesmo para terminar o serviço. De qualquer forma, precisamos descobrir o que é o quê antes de tomarmos partido. Além disso...”
“Além disso?”
“Você se lembra do homem mascarado que pulou quando os homens de capa preta estavam atrás de nós duas noites atrás? Quem diabos era ele?”
“Não me diga... É o Veisam?”
“Duvido, mas...”
“Já vimos membros da realeza agindo como heróis da justiça antes. Não há nada de estranho em um lorde nobre colocar uma máscara e pular em muros, não é?”
“Hmm... Não posso negar.”
“Certo?”
“De qualquer forma, nossa maior prioridade ainda é descobrir o que está acontecendo. Em outras palavras, é hora de perguntar por aí!”
———
“E aí, Lina.” Gourry me chamou.
“O quê?”
“Estou começando a achar que entrar furtivamente no castelo, mesmo que seja para descobrir o que está acontecendo, pode ser um pouco imprudente.” continuou meu companheiro num sussurro.
Pois, veja bem, nós dois estávamos escondidos nas sombras, vestidos com roupas e máscaras pretas. Na verdade, depois de um dia agitado, decidimos nos infiltrar no castelo na calada da noite. Lancei um olhar para a estrada escura e vi a silhueta de suas torres contra a lua e as estrelas.
“Vamos lá, não seja covarde!” sibilei. “Quando sugeri entrarmos escondidos, você topou!”
“Não me lembro de ter ouvido que íamos entrar escondidos no castelo!”
“Claro que não! Não te contei essa parte!”
“Ok, certo...” sussurrou Gourry, em resposta exausta.
Mais cedo naquele dia, depois que Luke tinha ido embora, eu tinha saído para interrogar os moradores locais e descobri algumas coisas. Primeiro, havia de fato um homem chamado Veisam na família do lorde. Segundo, Lorde Lavas era novo na cidade. Os cidadãos nunca tinham ouvido falar a seu respeito até pouco tempo. Seria um caso de filho bastardo? Rumores nas ruas sugeriam que fosse o caso.
Porém, mais importante, as pessoas estavam dizendo que o desaparecimento de Veisam, a doença do lorde e o repentino aumento de instalações misteriosas no centro da cidade coincidiram com a chegada de Lavas. Parecia um grande sinal de alerta. É claro que a ideia de que o aparecimento de um irmão bastardo tivesse estimulado Veisam a começar a perseguir suas próprias ambições tolas não era uma hipótese que pudesse descartar...
Acho que, de certa forma, não tínhamos aprendido muito em relação à quantidade de caminhadas que fizemos. Nosso objetivo era descobrir qual irmão era o ‘podre’, ajudar o outro a vencer e, depois, pegar algumas espadas mágicas e algumas centenas de moedas de ouro como recompensa. O que quer dizer que precisávamos resolver a intriga o mais rápido possível.
“Ei, Lina, entrar furtivamente no castelo vai mesmo nos revelar o que precisamos saber?”
“Sei lá.”
“Qual é...”
“Bem, é muito mais provável que nos forneça informações úteis do que entrar escondidos naquelas outras instalações de forma aleatória. Veja a de ontem. Tinha uma escada escondida e um monte de quimeras no porão, no entanto não é prova de uma rebelião... E com certeza não nos diz qual dos dois irmãos estava por trás de tudo. Entretanto se Lorde Lavas é quem está tramando uma insurreição, o castelo é o melhor lugar para encontrar evidências. Por exemplo... Se formos encontrados nos esgueirando pelo castelo e os homens de preto nos atacarem.”
“Seria ainda mais imprudente!”
“É só um exemplo. Não é como se eu fosse fazer com que fôssemos pegos de propósito.” protestei.
“Espero que não. Todavia se vasculharmos o local e não encontrarmos nada, significa que o irmão desaparecido está planejando a rebelião e não o regente?”
“Pode significar que Lavas é muito cauteloso. Enfim, vamos logo.”
Peguei a mão de Gourry e comecei a entoar um feitiço de Levitação.
———
Infiltrar-se no castelo em si não foi difícil. Fiz o de sempre: levitamos sobre a muralha externa e pousamos no telhado do prédio principal. Depois, lancei um feitiço para destrancar a claraboia de um quarto vazio e entramos na surdina. O verdadeiro trabalho ainda estava por vir.
Se o regente fosse o mentor e houvesse provas, onde elas estariam escondidas? A segurança lá fora não era muito pesada, mas devia haver patrulhas no próprio castelo e vigias em locais-chave. Não seria fácil passar por todas elas e descobrir a verdade.
Quer dizer, o ideal seria encontrarmos um bandido monologando sobre seu plano maligno para seus lacaios, como nas antigas sagas heroicas, porém... Sabe como é.
Hmm... Onde eu esconderia minhas provas incriminatórias? Fiquei um tempo sob os raios de luar que entravam pela claraboia, com a cabeça pensativamente inclinada para o lado.
“Certo!” sussurrei. “Já sei o que estamos procurando.”
“O quê?” perguntou Gourry.
“Vamos fazer uma visita ao senhor acamado.”
“Ei...”
“A segurança provavelmente será reforçada, contudo podemos descobrir a história toda se o encontrarmos.”
“Acha mesmo que ele vai nos contar?”
“Depende de como abordarmos o assunto. Embora tenho uma ideia. Deixe comigo.”
“Bem... Se insiste.” Gourry parecia hesitante, no entanto pareceu aceitar minhas garantias.
Enquanto procurávamos cuidadosamente por sons e presenças próximas, Gourry e eu abrimos a porta e partimos.
———
“Ei... Você acha que talvez estejamos indo na direção errada?” sussurrou Gourry depois de nos esgueirarmos por um corredor escuro e vazio.
Ao sairmos do quarto, entramos por... Bem, começamos nossa busca, todavia o lugar estava lotado de patrulheiros. Passamos de área de segurança mais leve em área de segurança mais leve, só que tudo o que encontramos até agora foram lugares chatos e pouco prováveis de serem de muita utilidade. Os corredores estavam quase escuros, com apenas uma arandela ocasional na parede e absolutamente nenhum guarda.
“Talvez, claro... Mas que recurso temos?” sussurrei de volta.
“Por que não coloca os guardas para dormir com sua magia?”
“Sabe, Gourry, por mais que me chame de imprudente, essa é uma sugestão bem imprudente. Ainda que colocasse um soldado para dormir para passarmos despercebidos, outro soldado logo apareceria, encontraria seu companheiro desmaiado e soaria o alarme. Teríamos que nos esconder e correr sem nada para mostrar.”
“Entendi, porém ainda assim... Vagar de sala vazia em sala vazia também não está nos levando a lugar nenhum.”
Ack! Uma percepção deverás perspicaz do grandalhão!
“T-Tá bom... Nesse caso, tudo bem, vamos para outro lugar.” cedi, partindo mais uma vez.
Se voltássemos, estaríamos nos deparando com uma unidade de patrulha. A rota à frente parecia segura o suficiente, então imaginei que deveríamos continuar procurando caminhos alternativos. Assim, corremos aleatoriamente no escuro por um tempo, e então...
Nós dois paramos no mesmo instante. O corredor que estávamos seguindo por um tempo de repente se dividiu em dois. À nossa direita, podia sentir a presença humana.
Se houvesse pessoas por perto, seria de se esperar que tivessem luzes... Contudo o corredor em questão era tão escuro quanto os outros. A palavra ‘emboscada’ surgiram na minha cabeça, só que não tive a menor impressão de que aquelas pessoas estivessem tentando se camuflar.
Hmm... Fiquei ali parada na escuridão, ponderando a situação. Se alguém estava ali, sem dúvida era por um motivo. Era improvável que outro grupo de intrusos estivesse invadindo ao mesmo tempo que nós, e se assumirmos que fosse o caso, eles não estariam parados ali, daquele jeito. A ausência de vozes abafadas também descartava uma reunião clandestina.
O que poderia ser, então? A curiosidade começou a me atormentar.
Bem, hora de descobrir! Se apenas fôssemos até lá, as pessoas em questão nos notariam. No entanto, felizmente, não havia patrulhas por perto, o que me abriu um pouco o leque de opções.
Recitei um feitiço baixinho.
“Durma!”
Em instantes...
“Ugh... Hmm...”
“Mrrgh...”
Ouvi uma série de gemidos suaves vindos do corredor, na direção das presenças, seguidos pelo som de pessoas caindo no chão.
Ótimo! Fiz um sinal para Gourry e avançamos juntos. Viramos a esquina e encontramos dois guardas, caídos sob meu feitiço, em frente a uma porta discreta. Dada a localização e a aparência frágil, teria imaginado que fosse um armário de vassouras. Entretanto quem no mundo colocaria guardas em um armário de vassouras?
“O que tem aqui dentro?” perguntou Gourry baixinho.
“Sei lá. Não faço ideia do que estão protegendo tão secretamente assim... Mas a melhor maneira de descobrir é ver com os próprios olhos.” falei, estendendo a mão para a maçaneta. Não estava trancada.
Wreeeeeek... A porta se abriu com um leve rangido. O ar lá dentro estava estagnado. No centro do quarto, havia um único abajur lançando uma luz fraca sobre as paredes e uma velha cama de dossel. Nela, jazia um velho frágil. Ele não demonstrou nenhum sinal de se mexer quando entramos, apenas emitiu os sons instáveis do sono característicos de quem está acamado.
a
Mas... O que um homem doente estava fazendo ali? Se estivesse em quarentena, não haveria guardas no quarto...
“Hmm?” percebi algo no semblante do homem e me aproximei. Tomei seu pulso, inspecionei sua pele e cheirei seu hálito.
“Ei, o que você está fazendo, Lina? O que pode descobrir cutucando esse velho?”
“Que ele foi envenenado, para começar.”
“O quê?” Gourry respirou fundo.
“Do tipo que você alimenta alguém aos poucos. Essa é a causa do seu estado atual. O velho foi envenenado e jogado em um quarto isolado com dois guardas postados na porta, o que significa...”
“O que significa...?”
“Não consigo parar de me perguntar se este é o nosso ‘lorde doente’.”
“E-Espere um minuto!” Gourry gritou em pânico. “Se este velho é o senhor da cidade... O que isso significa?”
“Significa que Lavas está inventando mentiras!” respondi num suave tom.
Se, como Lavas disse, Veisam era quem estava tramando uma insurreição, então o irmão mais novo não tinha motivo para envenenar o senhor e trancá-lo naquele quarto velho e barato. Presumindo que este velho fosse o senhor da cidade, pelo menos. Para ter certeza... A maneira mais rápida de descobrir era simplesmente perguntar a ele.
Coloquei a mão em seu ombro e o sacudi da forma mais gentil que pude. Não queria que o velho acordasse e fizesse um estardalhaço, porém sabia como mantê-lo calmo. Nós apenas diríamos que éramos batedores do rei enviados para investigar rumores de insurreição. Dessa forma, chamar a atenção não seria do seu interesse. Claro, todo aquele disfarce era apenas uma grande mentira, contudo uma certa princesa que eu conhecia teria dito: ‘Vale tudo em nome da justiça!’... Provavelmente, pelo menos.
Independente disso... Nunca tive a chance de colocar meu plano em prática. Sacudi o velho várias vezes, contudo este não deu sinais de acordar.
“Acho que é inútil...” em vez de apenas dormir, ele devia estar enervado em coma.
“O que devemos fazer agora?” perguntou Gourry.
“Precisamos sair daqui.”
“Concordo, mas e depois?”
“Boa pergunta. Por que não acordamos um dos guardas e perguntamos a eles? Se este velho é o verdadeiro lorde, significa que Lavas é quem está usurpando sua posição para reunir uma força militar.”
“Entendo. Vamos lá, então.”
Gourry e eu saímos pela porta, de volta ao corredor. Lá...
“Ei, vocês dois!” gritou uma voz familiar.
Geh! Não sabia o que diabos eles estavam fazendo ali, no entanto olhei para cima e vi... Luke e Mileena.
***
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