Tomo 02 — Capítulo 08: Da Beleza Encontrada em Cavernas Profundas
O túnel começou a descer quase assim que entraram. Onde antes era fresco, agora o ar tornava-se quente e úmido, de modo que às vezes Elric tinha a impressão de que estava a avançar através da água. As pequenas luzes que proporcionavam uma iluminação tênue não eram, como pensara a princípio, lâmpadas ou tochas, mas delicados nós de substância macia naturalmente luminescente, de aparência quase carnal. Ele e Oone descobriram que estavam sussurrando, como se não quisessem incomodar nenhum habitante deste lugar. Porém, Elric não sentiu medo aqui dentro. O túnel tinha a atmosfera de um santuário e pôde notar que Oone também havia perdido um pouco de sua cautela normal, embora sua experiência a tivesse ensinado a ser cuidadosa com qualquer coisa que fosse considerada uma ilusão potencialmente perigosa.
Não houve nenhuma transição óbvia de Sadanor para Marador, exceto talvez uma ligeira mudança de humor, antes que o túnel se abrisse para um vasto salão natural de vivos e brilhantes azuis e verdes, de amarelos dourados e rosas escuros, todos fluindo uns para os outros, como lava que tinham esfriado há pouco tempo, mais parecidas com plantas exóticas do que com a rocha que eram. Aromas, como os das flores mais lindas e inebriantes, faziam Elric sentir-se como se estivesse caminhando num jardim, não muito diferente dos jardins que conhecera quando criança, lugares de maior segurança e tranquilidade; contudo não havia dúvida de que o lugar era uma caverna e que haviam viajado para o subsolo para chegar até lá.
A princípio encantado com a visão, Elric começou a sentir certa tristeza, pois até agora não se lembrava daqueles jardins da infância, da felicidade inocente que tão rara é para um melniboniano, independente de sua idade. Pensou na mãe, morta durante o parto, no pai em luto infinito, que se recusara a reconhecer o filho que, em sua opinião, matara a mulher.
Um movimento vindo das profundezas deste salão natural e Elric tornou a temer o perigo, no entanto as pessoas que começaram a surgir estavam desarmadas e tinham rostos cheios de melancolia contida.
— Chegamos a Marador. — sussurrou Oone com certeza.
— Você está aqui para se juntar a nós? — uma mulher perguntou. Suas vestes eram esvoaçantes de uma miríade de cores brilhantes, refletindo as cores das rochas nas paredes e no teto. Seus longos cabelos dourados desbotados eram acompanhados de olhos da cor do estanho velho. Ela estendeu a mão para tocar Elric, uma saudação, e sua mão estava fria sobre a dele. Sentiu-se contagiado pela mesma triste tranquilidade e pareceu-lhe que poderia haver destinos piores do que permanecer aqui, recordando os desejos e prazeres do seu passado, quando a vida era tão mais simples e o mundo parecia um lugar mais fácil de conquistar e melhorar.
Logo atrás, Oone disse com uma voz que soava áspera além do necessário aos seus ouvidos.
— Somos viajantes em sua terra, minha senhora. Não temos nenhuma intenção de lhe fazer mal, entretanto não podemos ficar.
Um homem falou.
— Viajantes? O que buscam?
— Procuramos... — disse Elric. — A Fortaleza da Pérola.
Oone mostrou nítido descontento com sua franqueza.
— Não temos nenhum desejo de permanecer em Marador. Queremos apenas saber a localização do próximo portão, o Portão Paranor.
O homem sorriu com melancolia.
— Temo que está perdido. Perdido para todos nós. Mas não há mal nenhum na perda. Há até conforto nisso, você não sente? — ele virou-se sonhando, com olhos distantes sobre eles. — Melhor não buscar aquilo que só pode decepcionar. Aqui preferimos lembrar o que mais queríamos e como foi querer...
— Melhor, mesmo, que continuar procurando? — Elric ficou surpreso com seu tom direto.
— Por que continuar, senhor, quando a realidade só pode ser inadequada quando comparada com a esperança?
— Assim o considera, senhor? — Elric estava preparado para considerar esta ideia, porém Oone apertou-lhe o braço com mais força.
— Recorde-se do nome que os ladrões de sonhos dão a esta terra. — ela murmurou.
Elric refletiu e se deu conta do que se tratava, aquela era a verdadeira Terra dos Antigos Desejos. Todos os seus anseios esquecidos estavam voltando, trazendo-lhe uma sensação de simplicidade e paz. Agora se lembrou de como essas sensações foram substituídas pela raiva quando começou a perceber que havia pouca probabilidade de seus sonhos se tornarem realidade. Ante a injustiça do mundo, restou-lhe se enfurecer. Dessa maneira, se lançou em seus estudos de feitiçaria. Estava determinado a mudar o equilíbrio das coisas e introduzir maior liberdade, maior justiça por meio do poder que tinha no mundo. Contudo, os seus colegas melnibonianos se recusaram a aceitar a sua lógica. Os primeiros sonhos começaram a desaparecer e com estes a esperança que a princípio elevou seu coração. Agora aqui estava a esperança que lhe foi oferecida de novo. Talvez houvesse reinos onde tudo o que desejava fosse verdade? Talvez Marador fosse um mundo assim.
— Acredito que se eu voltasse e encontrasse Cymoril e a trouxesse aqui, poderíamos viver em harmonia com essas pessoas. — respondeu a Oone.
A ladra de sonhos era quase desdenhosa.
— Esta é chamada de Terra dos Antigos Desejos, não a Terra dos Desejos Realizados! Há uma importante diferença. As emoções que está sentindo são fáceis de ter e ser conservadas, enquanto a realidade permanece fora de seu alcance, enquanto apenas anseia pelo inatingível. Quando você se empenha em descobrir a realização, Elric de Melniboné, então alcançou estatura no mundo. Vire as costas para essa determinação, sua própria determinação para ajudar a construir um mundo onde a justiça reine, e perderá meu respeito. Incluso provará que é um mentiroso e que sou uma tola por acreditar que poderia me ajudar a salvar a Jovem Santa!
Elric ficou chocado com tal explosão, que parecia ofensiva naquela atmosfera particular de serenidade.
— Todavia acho que é impossível construir um mundo assim. Melhor ter a perspectiva do que o conhecimento do fracasso?
— Isso é o que todos neste local acreditam. Permaneça aqui, se quiser, e acredite no que eles acreditam para sempre. No entanto acho que é preciso sempre fazer uma tentativa para a justiça, não importa quão fraca seja a perspectiva de sucesso!
Elric se sentiu cansado e desejou sossegar e descansar. Bocejou e se espreguiçou.
— Essas pessoas parecem ter um segredo que eu gostaria de aprender. Acho que vou conversar um pouco com elas antes de continuar.
— Faça-o e Anigh morre. A Jovem Santa morre. E tudo em você que valoriza também morrerá. — Oone não levantou a voz. Seu tom era quase prosaico. Mas suas palavras tinham uma urgência que quebrou o humor de Elric. Não foi a primeira vez que considerou refugiar-se nos sonhos. Se o tivesse feito, seu povo seria agora governado por ele e Yyrkoon estaria morto ou exilado.
Pensar em seu primo e em sua ambição, em Cymoril esperando seu retorno para que pudessem se casar, ajudou a lembrar Elric de seu propósito aqui e se livrar do clima de reconciliação, de retirada. Ele se curvou para as pessoas da caverna.
— Agradeço sua generosidade, porém meu próprio caminho segue em frente, através do Portão Paranor.
Oone respirou fundo, talvez aliviada.
— A sintonia com o tempo não é medida de forma familiar aqui, Príncipe Elric, contudo tenha certeza de que está transcorrendo muito mais rápido do que eu gostaria...
Foi com profundo pesar que Elric deixou o povo melancólico para trás e a seguiu pelas cavernas brilhantes.
Oone acrescentou.
— Essas terras ostentam nomes adequados. Tenha cuidado com o que é familiar.
— Talvez pudéssemos ter descansado lá? Restaurado nossas energias? — perguntou Elric.
— Sim. E morreríamos cheios de doce melancolia.
Seus olhos a encararam, surpreso, e viu que ela não havia sido afetada pela atmosfera.
— Foi o que aconteceu com Alnac Kreb?
— Claro que não! — exclamou, recuperando-se em seguida. — Alnac era totalmente capaz de resistir a uma armadilha tão óbvia.
Elric agora se sentia envergonhado.
— Quase falhei no primeiro teste real de minha determinação e disciplina.
— Nós, ladrões de sonhos, temos a vantagem de termos sido testados tantas vezes. — ela disse a ele. — Fica mais fácil de enfrentar, embora a atração continue forte.
— Para você também?
— Por que não? Acha que não tenho desejos esquecidos, nada com que não gostaria de sonhar? Nenhuma infância que teve seus momentos doces?
— Perdoe-me, senhora.
Oone encolheu os ombros.
— Há uma atração por esse aspecto do passado. Pelo passado em geral, suponho. No entanto esquecemos os outros aspectos... Aquelas coisas que nos forçaram à fantasia em primeiro lugar.
— Você acredita no futuro, então, senhora? — Elric tentou brincar.
A rocha sob seus pés se tornou escorregadia e os dois foram forçados a fazer a descida suave com mais cautela. À frente, Elric pensou ter ouvido outra vez o som do rio, talvez agora correndo no subsolo.
— O futuro contém tantas armadilhas quanto o passado. — retrucou Oone com um sorriso. — Acredito no presente, meu senhor. No eterno presente. — e havia um tom agudo em sua voz, como se nem sempre tivesse tido essa opinião.
— Suponho que a especulação e o arrependimento oferecem muitas tentações. — disse Elric; então engasgou com o que viu pela frente.
O ouro derretido descia em cascata por dois canais bem desgastados na rocha, formando um gigantesco edifício em forma de V. O metal fluía descontrolado e, todavia, à medida que se aproximavam, tornou-se óbvio que não estava quente. Algum outro agente causou o efeito, talvez uma substância química presente na própria rocha. Quando o ouro atingiu o fundo da caverna se espalhou em um lago, e o lago, por sua vez, alimentou um riacho que borbulhava, brilhante com o material precioso, descendo em direção a outro riacho que a princípio parecia conter água comum. Quando Elric olhou com mais cuidado, viu que aquele riacho era, por sua vez, composto de prata e os dois elementos se misturaram ao se encontrarem. Seguindo com os olhos o curso desse riacho, viu que eles se encontravam, a alguma distância, com outro rio, este de um escarlate brilhante, que poderiam ser rubis líquidos. Em todas as suas viagens, nos Reinos Jovens e nos reinos do sobrenatural, Elric não tinha visto nada parecido. Ele fez menção de se mover em direção ao rio para inspecioná-lo mais detalhadamente, porém Oone o deteve.
— Chegamos ao próximo portão. — disse ela. — Ignore essa maravilha em particular, meu senhor. Veja.
Seu dedo apontava entre correntes gêmeas de ouro e Elric pôde distinguir algo sombrio além.
— Ali está Paranor. Está pronto para entrar naquela terra?
Ao se lembrar do termo usado pelos ladrões de sonhos, Elric permitiu-se um sorriso irônico.
— Tão pronto como sempre estarei, senhora.
Então, assim que deram um passo em direção ao portão, ouviu-se o som de cascos galopando vindos de trás. Eles ressoaram agudamente na rocha da caverna. Ecoaram através do teto sombrio, através de mil câmaras, e Elric não teve tempo de se virar antes que algo pesado lhe atingisse o ombro e fosse atirado para o lado. Teve a impressão de um cavalo mortalmente branco, de um cavaleiro vestindo uma armadura de marfim, madrepérola e carapaça de tartaruga clara, e então passou pelo portão de ouro derretido e desapareceu nas sombras além. Contudo não havia dúvida na mente de Elric de que havia encontrado um dos guerreiros que já o atacara na ponte. Teve a impressão da mesma risada zombeteira quando os cascos desapareceram e o som foi absorvido pelo que quer que estivesse além do portão.
— Temos um inimigo. — disse Oone. Seu rosto estava sombrio e cerrou as mãos ao lado do corpo, claramente controlando-se. — Já fomos identificados. A Fortaleza da Pérola não se limita a defender, senão que nos ataca.
— Conhece aqueles cavaleiros? Você já os viu antes?
Oone balançou a cabeça.
— Conheço os de sua classe, apenas isso.
— E não temos meios de evitá-los?
— Muitos poucos.
Ela estava franzindo a testa de novo, considerando algum problema que não estava preparada para discutir. Depois pareceu desconsiderá-lo e, tomando-o pelo braço, conduziu-o sob as cascatas gêmeas de ouro frio para uma outra caverna. Desta vez o local foi preenchido de repente por um suave brilho verde, como se caminhassem sob um dossel de folhas sob a luz do sol do outono. Elric se recordou da Velha Melniboné, no auge do seu poder, quando o seu povo era suficientemente orgulhoso para considerar o mundo inteiro como garantido, quando nações inteiras tinham sido remodeladas para o seu prazer passageiro. Ao emergirem em outra caverna, tão vasta que a princípio não percebeu que ainda estavam no subsolo, viu as torres e os minaretes de uma cidade, brilhando com o mesmo cálido verde, que era tão bonito quanto sua amada Imrryr, a Cidade dos Sonhos. Cidade que explorou durante sua infância.
— É como Imrryr, ao mesmo tempo em que não é nada parecido com Imrryr. — disse surpreso.
— Não. — disse ela. — É como Londres. É como Tanelorn. É como Ras-Paloom-Atai.
E Oone não o dizia em tom sarcástico. Falou como se de fato acreditasse que a cidade se parecia com aquelas outras cidades, das quais Elric reconheceu apenas uma.
— Contudo você já a viu antes. Como se chama?
— Não tem nome. — respondeu. — Tem todos os nomes. É chamada como você quiser. — e se virou, como se estivesse descansando, antes de conduzi-lo pela estrada que passava pela cidade.
— Não deveríamos visitá-la? Pode haver pessoas lá que possam nos ajudar a encontrar o caminho.
— E pode haver aqueles que tentarão nos prejudicar. — contrapôs Oone com um gesto. — Agora já está claro, Príncipe Elric, que a nossa missão é suspeita e que certas forças podem muito bem ter a intenção de nos deter a qualquer custo.
— Acha que os Aventureiros Feiticeiros nos seguiram?
— Ou nos precederam. Deixando pelo menos algo de si aqui. — disse, enquanto olhava cautelosamente para a cidade.
— Parece um lugar tão pacífico. — disse Elric.
Quanto mais olhava para a cidade, mais se impressionava com a arquitetura, toda da mesma pedra esverdeada, no entanto variando do amarelo ao azul. Havia vastos contrafortes e pontes curvas entre uma torre e outra; havia torres tão delicadas quanto teias de aranha, mas tão altas que quase desapareciam nos telhados da caverna. Parecia refletir alguma parte dele que não conseguia lembrar no ato. Ansiava por ir para lá. Ficou ressentido com a orientação de Oone, embora tivesse jurado segui-la, e começou a acreditar que a mesma estava perdida, que não era mais adequada para descobrir seu objetivo do que ele próprio.
— Devemos continuar... — disse ela num tom urgente.
— Eu sei que encontraria algo naquela cidade que tornaria Imrryr grande outra vez. E, em sua grandeza, posso levá-la a dominar o mundo. Porém desta vez, em lugar de trazer crueldade e terror, poderíamos trazer beleza e boa vontade.
— Você é mais propenso à ilusão do que imaginei, Príncipe Elric. — disse Oone.
O albino se virou com raiva.
— O que há de errado com tais ambições?
— São irrealistas. Tão irreais quanto aquela cidade.
— A cidade parece sólida o suficiente para mim.
— Sólida? Sim, à sua maneira. Assim que passar por seu portão, irá abraçá-la tão intensamente quanto qualquer amante há muito perdida! Vamos então, senhor. Venha!
Oone parecia tomada por um temperamento igualmente ruim e subiu uma estrada de obsidiana que serpenteava ao longo da colina em direção à cidade.
Assustado com sua mudança repentina, Elric a seguiu. Contudo agora a sua própria raiva estava se dissipando.
— Vou respeitar, senhora, seu julgamento. Sinto muito...
Ela não estava o ouvindo. Momento a momento, a cidade se aproximava até que logo os dois foram ofuscados por esta, olhando para muralhas, cúpulas e torres cujo tamanho era tão gigantesco que era quase impossível adivinhar sua verdadeira extensão.
— Há um portão. — disse ela. — Ali! Atravesse e me despedirei. Eu mesma tentarei salvar a criança e você poderá se entregar às crenças perdidas e assim perder as crenças que o mantém atualmente!
E agora Elric olhou mais de perto para as muralhas, que pareciam jade, e viu formas escuras dentro das paredes, viu que as formas escuras eram figuras de homens, mulheres e crianças. Sua respiração ofegava ao avançar para observá-los, observando rostos vivos, olhos imortais, lábios congelados em expressões de terror, de angústia, de miséria. Eram como muitas moscas presas em âmbar.
— Esse é o passado imutável, Príncipe Elric. — disse Oone. — Esse é o destino daqueles que procuram recuperar suas crenças perdidas sem primeiro experimentar a busca por novas. Esta cidade tem outro nome. Os Ladrões de Sonhos a chamam de Cidade da Covardia Inventiva. Você não entenderia as reviravoltas da lógica que trouxeram tantos para esse passe! O que os fez forçar aqueles que amavam a compartilhar seu destino. Ficaria com eles, Príncipe Elric, e cuidaria de suas crenças perdidas?
O albino virou-se com um estremecimento.
— Mas se eles puderam ver o que aconteceu com os viajantes anteriores, por que continuaram na cidade?
— Eles se cegaram para o óbvio. Esse é o grande triunfo da necessidade irracional sobre a inteligência e o espírito humano.
Juntos, os dois regressaram ao caminho abaixo da cidade e Elric ficou aliviado quando as belas torres ficaram muito atrás e passaram por várias outras grandes cavernas, cada uma com a sua própria cidade, embora nenhuma tão magnífica como a primeira. Não sentira vontade de visitá-las, embora tivesse detectado movimento em algumas e Oone tivesse dito que suspeitava que nem todas eram tão perigosas quanto a Cidade da Covardia Inventiva.
— Você chamou este mundo de Reino dos Sonhos. — falou Elric. — E, na verdade, o nome é apropriado, senhora, pois parece conter um catálogo de sonhos, e não poucos pesadelos. É como se o lugar tivesse nascido da mente de um poeta, de tão estranhos que são algumas das vistas.
— Eu lhe disse... — ela disse, falando mais calorosamente agora que ele havia reconhecido o perigo. — Muito do que testemunha aqui é a matéria semi formada de realidades que outros mundos, como o seu e o meu, ainda estão para testemunhar. Não sei até que ponto eles existirão em outros lugares. Esses lugares foram moldados ao longo dos séculos por uma sucessão de ladrões de sonhos, impondo forma ao que de outra forma seria amorfo.
Elric começava agora a compreender melhor o que Oone lhe contara.
— Em vez de fazer um mapa do que existe, você impõe seu próprio mapa!
— Até certo ponto. Nós não inventamos. Apenas descrevemos de uma maneira particular. Dessa forma, podemos abrir caminhos através de cada um dos inúmeros reinos, pois só aqui os distintos reinos se ajustam um com o outro.
— Na realidade, poderia haver mil terras diferentes em cada reino?
— Se você quiser ver assim... Ou uma infinidade de terras. Ou uma com uma infinidade de aspectos. As estradas são feitas para que o viajante sem bússola não se afaste muito de seu destino. — ela riu quase alegremente. — Os nomes fantasiosos que damos a esses lugares não são por impulso poético, nem por capricho, e sim por uma necessidade. Nossa sobrevivência depende de descrições precisas!
— Suas palavras têm profundidade, senhora. Embora minha sobrevivência também tenda a depender de uma lâmina boa e afiada!
— Enquanto depende de sua lâmina, Príncipe Elric, se condena a um destino singular.
— Está predizendo minha morte, senhora?
Oone balançou a cabeça, seus lindos lábios formando uma expressão de extrema simpatia e ternura.
— A morte é inevitável para quase todos nós, de uma forma ou de outra. E admito que, se o Caos algum dia conquistar o Caos, então você será o instrumento dessa conquista notável. Seria realmente triste, Príncipe Elric, se ao domesticar o Caos, destruísse a si mesmo e a tudo que ama!
— Eu a prometo, senhora Oone, fazer o meu melhor para evitar tal destino.
E Elric ficou surpreso com a expressão nos olhos da ladra de sonhos, optando então por não especular mais.
Caminhavam agora por uma floresta de estalagmites e estalactites, todas com as mesmas cores brilhantes, verdes e azuis escuros, vermelhos intensos, tudo enquanto ouvia-se um som musical, como a água que cai do teto para o chão. De vez em quando, uma enorme gota caía sobre um ou outro, contudo tal era a natureza das cavernas que logo voltavam a secar. Eles começaram a relaxar e caminharam de braços dados, quase alegres, e foi só então que viram as figuras voando entre as presas de rocha que se projetavam para cima.
— Espadachins. — murmurou Elric, e acrescentou com ironia. — É nesse momento que uma arma seria útil...
Sua mente estava meio preocupada com a situação, meio tateando o caminho através dos mundos dos elementais, buscando algum tipo de feitiço, alguma ajuda sobrenatural, no entanto seguia perplexo. Parecia que os caminhos mentais que estava acostumado a seguir estavam bloqueados para ele.
Os guerreiros estavam velados, vestidos com mantos pesados e esvoaçantes e suas cabeças eram protegidas por elmos de metal e couro. Elric teve a impressão de ver olhos frios e duros com pálpebras tatuadas e soube no ato que se tratava de membros da guilda dos Aventureiros Feiticeiros de Quarzhasaat, deixados para trás quando seus companheiros se retiraram dos Reinos Oníricos. Sem dúvida estavam presos aqui. Se fazia claro, entretanto, que não pretendiam negociar com Elric e Oone, mas estavam se aproximando, seguindo um padrão familiar de ataque.
Elric ficou impressionado com a estranheza daqueles homens. Faltava-lhes certa fluidez de movimentos e, quanto mais se aproximavam, mais percebia que era quase possível ver além dos olhos, dentro das cavidades de seus crânios. Estes não eram mortais comuns. Já tinha visto homens como estes em Imrryr uma vez, quando foi com o pai numa daquelas raras ocasiões em que Sadric decidiu levá-lo em alguma expedição local, a uma antiga arena cujos altos muros aprisionavam certos melnibonianos que haviam perdido a alma em busca de conhecimento mágico, mas cujos corpos ainda viviam. Também pareciam possuídos por um ódio frio e violento contra qualquer pessoa que não fosse como eles.
Oone gritou e se moveu com rapidez, caindo sobre um joelho quando uma espada se balançava em sua direção, e depois bateu contra um dos grandes pilares pontiagudos. As estalagmites estavam tão próximas umas das outras que era difícil para os espadachins golpearem ou esfaquearem, e por um tempo tanto o albino quanto a ladra de sonhos se abaixaram e se esquivaram das lâminas até que uma delas cortou o braço de Elric e ele viu, quase surpreso, que o homem havia o arrancado sangue.
O Príncipe de Melniboné sabia que era apenas uma questão de tempo até que ambos fossem mortos e, ao cair para trás contra um dos grandes dentes rochosos, sentiu a estalagmite deslocar-se em suas costas. Algum truque da caverna havia enfraquecido a rocha e agora estava solta. Todo o seu peso foi lançado para frente contra ela. Começou a ceder. Rapidamente colocou seu corpo na frente, apoiando a rocha em seu ombro, então com toda sua energia correu com a grande lança rochosa em direção ao agressor mais próximo.
A ponta da rocha atingiu em cheio o peito do homem velado. O Bruxo Assassino soltou um grito sombrio e agonizante, e um sangue estranho e anormal começou a jorrar ao redor da pedra, jorrando e penetrando nos ossos do guerreiro, quase reabsorvido por este. Elric saltou para frente e arrancou o sabre e o punhal de suas mãos enquanto outro dos atacantes o atacava pela retaguarda. Toda a sua astúcia de batalha, todas as suas habilidades de guerra, retornaram para Elric. Muito antes de tomar Stormbringer, havia aprendido as artes da espada e da adaga, do arco e da lança, e agora não precisava de uma lâmina encantada para acabar sem grande esforço com o segundo Bruxo Assassino, e depois com um terceiro. Gritando para Oone pegar as armas, disparou de rocha em rocha, atacando os guerreiros, um de cada vez. Seus inimigos se moviam devagar, incertos agora, mas ninguém fugia.
Logo Oone se juntou a Elric, mostrando que era uma lutadora tão talentosa quanto o próprio. Ele admirava a delicadeza de sua técnica, a segurança de suas mãos enquanto defendia e investia, atacando com a maior eficiência e empilhando seus cadáveres com toda a economia de movimentos de um gato em um ninho de ratos.
Elric teve tempo para sorrir por cima do ombro.
— Para alguém que recentemente exaltou as virtudes das palavras em detrimento da espada, você se mostra bem-sucedida com uma lâmina, senhora!
— Muitas vezes é bom ter a experiência de ambos antes de fazer a escolha. — replicou, ao mesmo tempo em que despachava outro de seus agressores. — E devo admitir, Príncipe Elric, que há momentos em que uma peça de aço decente tem certa vantagem sobre uma frase bem elaborada!
Os dois lutaram juntos como dois velhos amigos. Suas técnicas eram complementares, porém não diferentes. Ambos lutaram como lutam os melhores soldados, sem crueldade nem prazer em matar, com a intenção de vencer o mais rápido possível, causando o mínimo de dor aos oponentes.
Oponentes que, por sua vez, pareciam não sofrer nenhuma dor, embora cada vez que um dos seus morria, emitiam o mesmo lamento perturbador de angústia, e o sangue que escorria das feridas era realmente estranho.
Por fim, o homem e a mulher terminaram e ficaram apoiados nas lâminas emprestadas, ofegantes e procurando controlar a náusea que tantas vezes se segue a uma batalha.
Então, enquanto Elric observava, os cadáveres ao seu redor desapareceram em pouco tempo, deixando apenas algumas espadas para trás. O sangue também desapareceu. Não havia quase nada que indicasse que uma luta havia ocorrido na grande caverna.
— Para onde foram?
Oone pegou uma bainha e colocou seu novo sabre nela. Apesar de todas as suas palavras, era óbvio não tinha intenção de prosseguir sem armas. Em seguida colocou duas adagas em seu cinto.
— Se foi? Ah. — ela hesitou. — Para qualquer piscina de ectoplasma meio-vivo de onde vieram. — respondeu balançando a cabeça. — Eram quase fantasmas, Príncipe Elric, contudo não de tudo. Eram, como eu lhe disse, o que os Aventureiros Feiticeiros deixaram para trás.
— Quer dizer que parte deles retornou ao nosso próprio mundo, assim como parte de Alnac retornou?
— Exatamente.
Oone respirou fundo e fez menção de continuar.
— Então por que não encontramos Alnac aqui? Ainda vivo?
— Porque não o procuramos. — respondeu. E falou com toda a sua antiga firmeza; o suficiente para fazer Elric avançar apenas um pouco mais no assunto.
— E talvez de qualquer maneira não o encontraríamos aqui, como encontramos os Aventureiros Feiticeiros, na Terra das Crenças Perdidas. — disse o albino calmamente.
— É verdade. — assentiu Oone.
Assim, Elric a tomou nos braços por um momento e permaneceram abraçados, por alguns segundos, até que estivessem prontos para continuar em frente em busca do Portão Celador.
Mais tarde, enquanto Elric ajudava sua aliada a atravessar outra ponte natural, abaixo da qual corria um rio de matéria marrom e fosca, Oone lhe disse.
— Esta não é uma aventura qualquer para mim, Príncipe Elric. É por isso que precisei que você viesse comigo.
Um pouco intrigado sobre por que ela deveria, afinal de contas, dizer algo que ambos consideravam natural, Elric não respondeu.
Quando as mulheres de focinho os atacaram, com redes e espinhos, não demoraram muito para abrir caminho e expulsar as criaturas covardes, e nem foram muito incomodados pelas criaturas vulpinas que galopavam em suas patas traseiras e tinham garras como os pássaros. Até brincavam juntos enquanto despachavam matilhas de feras que se pareciam com cavalos do tamanho de cães e falavam algumas palavras em língua humana, embora sem qualquer noção do significado.
Agora, pelo menos, estavam chegando às fronteiras de Paranor e avistaram à frente duas enormes torres de rocha esculpida, com pequenas varandas, janelas, terraços e ameias, todas cobertas de hera velha e arbustos trepadeiras com frutos amarelo-claros.
— É o Portão Celador. — disse Oone, aparentando relutar em se aproximar. Com uma mão no punho da espada, a outra rodeava o braço de Elric. Então parou e respirou fundo e lentamente. — É a terra das florestas.
— Você a chamou de Terra do Amor Esquecido. — recordou-a Elric.
— Sim. Esse é o nome atribuído pelos ladrões de sonhos. — ela riu um pouco sarcasticamente.
Elric, inseguro quanto ao seu humor e não desejando se intrometer, também se conteve, olhando de sua companheira para o portão e vice-versa.
Ela estendeu a mão para suas feições brancas como ossos. Sua própria pele era dourada, ainda cheia de enorme vitalidade. Seu olhar fixo para o rosto dele. Então, com um suspiro, se virou e caminhou em direção ao portão, tomando sua mão dele e puxando-o logo atrás.
Passaram entre as torres e aqui as narinas de Elric foram imediatamente preenchidas com os ricos cheiros de folhas e turfa. Ao seu redor havia enormes carvalhos, olmos, bétulas e todos os outros tipos de árvores, no entanto todas elas, embora formassem uma copa, não cresciam sob a luz do céu aberto, mas eram nutridas pelas estranhas rochas brilhantes no teto da caverna. Elric achava impossível que as árvores crescessem no subsolo e maravilhava-se com a saúde e a normalidade de tudo.
Foi, portanto, com certo espanto que observou uma criatura emergir do bosque e plantar-se firme no caminho ao longo do qual deveriam percorrer.
— Pare! Devo saber o que vocês estão fazendo!
Seu rosto estava coberto de pelos marrons e seus dentes eram muito proeminentes. Suas orelhas tão grandes, seus olhos tão parecidos com os de uma corça, que parecia nada mais do que um coelho crescido demais, embora estivesse solidamente blindado em latão surrado, com um casco de latão na cabeça. Também eram encadernadas em latão suas armas, uma espada e uma lança de aspecto artesanal.
— Procuramos apenas passar por esta terra sem causar danos ou sermos prejudicados. — disse Oone.
O guerreiro coelho balançou a cabeça.
— Muito vago. — respondeu, e de repente ergueu a lança e cravou a ponta profundamente no tronco de um carvalho. O carvalho gritou. — Isto é o mesmo que este me contou. E muitos mais desses.
— As árvores eram viajantes? — questionou Elric.
— Seu nome, senhor?
— Eu sou Elric de Melniboné e, como minha senhora Oone aqui, não quero incomodá-lo. Nos dirigimos para Imador.
— Não conheço nenhum ‘Elric’ ou ‘Oone’. Eu sou o Conde de Magnes Doar e mantenho esta terra como minha. Por minha conquista, você deve voltar pelo portão.
— Não podemos. — contrapôs Oone. — Recuar significaria a nossa destruição.
— Seguir em frente, senhora, significaria a mesma coisa. O quê? Pretende acampar no portão para sempre?
— Não, senhor. — respondeu ela e colocou a mão no punho da espada. — Se necessário, abriremos caminho através de sua floresta. Estamos tratando de assuntos urgentes e não aceitaremos nenhuma retenção.
O coelho-guerreiro puxou a lança do carvalho, que parou de gritar, e atirou-a em outra árvore. Este, por sua vez, gerou lamentos e gemidos até que até o Conde de Magnes Doar balançou a cabeça, irritado, e tirou a arma do tronco.
— Creio que então terão de lutar comigo. — disse ele.
Foi nesse momento que ouviram um grito vindo do outro lado do pilar direito e algo branco e estridente apareceu ali. Era outro dos cavaleiros pálidos, envergando uma armadura de osso, carapaça de tartaruga e madrepérola, com os olhos horríveis semicerrados de ódio, os cascos do cavalo batendo numa barreira que não existia quando Oone e Elric passaram.
Quando a barreira caiu, o guerreiro começou a atacar.
O albino e a ladra de sonhos tentaram se defender, porém foi o Conde de Magnes Doar quem se adiantou e apontou a lança para o corpo do guerreiro. A lança foi desviada por uma armadura mais forte do que parecia e a espada erguida desceu, quase desdenhosamente, cortando o elmo de latão até o cérebro do guerreiro-coelho. Este cambaleou para trás, com as mãos agarradas à cabeça, a espada e a lança abandonadas. Seus redondos olhos castanhos pareceram se arregalar ainda mais e começou a gritar. Ele virou-se lentamente, dando voltas e mais voltas, e depois caiu de joelhos.
Elric e Oone se posicionaram atrás do tronco de um dos carvalhos, prontos para se defenderem quando o cavaleiro os atacasse.
O cavalo empinou outra vez, bufando com a mesma fúria estúpida de seu dono, e Elric saiu correndo de seu esconderijo, agarrou a lança caída e esfaqueando até onde a couraça e o gorjal se juntavam, deslizando habilmente a ponta da lança na garganta do guerreiro.
Houve um som sufocado que por sua vez se transformou em uma risada familiar, e o cavaleiro virou o cavalo e tornou a cavalgar contra eles. Ao longo do caminho através da floresta, seu corpo balançando e sacudindo como se estivesse em agonia mortal, todavia ainda suportado pelo cavalo enfurecido.
Ambos assistiram-no desaparecer.
Elric estava tremendo.
— Se não o tivesse visto morrer na ponte de Sadanor, juraria que foi o mesmo homem que me atacou lá. Ele tem uma familiaridade intrigante.
— Você não o viu morrer. — disse Oone. — Só o viu mergulhar no rio.
— Bem, acho que está morto agora, depois daquele golpe. Quase lhe cortei a cabeça.
— Duvido que esteja... — disse ela. — Acredito que seja nosso inimigo mais poderoso e não teremos que lidar com ele de maneira séria até que nos aproximemos da própria Fortaleza da Pérola.
— Ele protege a Fortaleza?
— Muitos o fazem.
Ela o abraçou de novo, por um rápido instante, depois se ajoelhou para inspecionar o falecido Conde de Magnes Doar. Na morte, se parecia mais com um homem, pois os pelos do rosto e das mãos já estavam ficando grisalhos e até sua carne parecia prestes a desaparecer. O casco de latão também adquirira um tom feio de prata. Elric se lembrou da morte de Alnac e desviou os olhos.
Oone também se levantou rapidamente e havia lágrimas em seus olhos. As lágrimas não eram pelo Conde de Magnes Doar. Elric tomou-a nos braços. De repente, sentiu saudades de alguém de quem mal se lembrava dos velhos sonhos, dos sonhos de sua juventude; alguém que, talvez, nunca tenha existido.
Pensou ter sentido um leve arrepio percorrer Oone ao abraçá-la. Buscou a lembrança de um pequeno barco, de uma garota loira dormindo no fundo do navio enquanto ele navegava em mar aberto, de ele mesmo navegando em um esquife em direção a ela, cheio de orgulho por poder ser seu salvador. Contudo, nunca conhecera uma garota assim, tinha certeza, embora Oone o lembrasse daquela garota, todavia adulta.
Com um suspiro, Oone se afastou.
— Pensei que você fosse... É como se eu sempre tivesse te conhecido... — ela levou as mãos ao rosto. — Oh, esta maldita terra foi bem nomeada, Elric!
Elric só podia concordar.
— No entanto, que perigo existe para nós? — perguntou.
— Quem sabe? — respondeu sacudindo a cabeça. — Muito ou pouco. Nenhum? Os ladrões de sonhos dizem que é na Terra do Amor Esquecido que as decisões mais importantes são tomadas. Decisões que podem ter as consequências mais monumentais.
— Então não se deve fazer nada aqui? Não tomar decisões?
Ela passou os dedos pelos cabelos.
— Pelo menos devemos estar cientes de que as consequências podem demorar muito para se manifestar.
Juntos, eles deixaram o guerreiro-coelho morto para trás e continuaram pelo túnel de árvores. Agora, de vez em quando, Elric pensava ter visto rostos vigiando-os nas sombras verdes. Assim que teve certeza, viu a figura de seu falecido pai, Sadric, de luto pela mãe de Elric, a única criatura que realmente amou. A imagem era tão forte que Elric gritou.
— Sadric! Pai! Este é o seu Limbo?
Com isso, Oone gritou com urgência.
— Não! Não se dirija a ele. Não o traga para você. Não o torne real! É uma armadilha, Elric. Outra armadilha.
— Meu pai?
— Você o amava?
— Sim. Embora fosse uma classe infeliz de amor.
— Lembre-se disso. Não o traga aqui. Seria obsceno trazê-lo de volta para esta galeria de ilusões.
Elric a entendeu e usou todos os seus hábitos de autodisciplina para se livrar da sombra do pai.
— Tentei dizê-lo, Oone, o quanto sofri por sua perda e em sua tristeza. — ele estava chorando. Seu corpo tremia com uma emoção da qual acreditava ter se libertado há muito tempo. — Ah, Oone. Eu mesmo teria morrido para deixá-lo ter sua esposa devolvida aos seus braços. Não há como...?
— Esses sacrifícios não têm sentido. — disse ela, agarrando-o com as duas mãos e segurando-o próximo de si mesma. — Especialmente aqui. Lembre-se de sua missão. Já cruzamos três das sete terras que nos levarão à Fortaleza da Pérola. Cruzamos metade. O que significa que já realizamos mais do que a maioria. Controle-se, Príncipe de Melniboné. Lembre-se de quem e do que depende do seu sucesso!
— Mas se tenho a oportunidade de consertar algo que estava tão errado...
— Isso tem a ver com seus próprios sentimentos, não com o que é e o que pode ser. Você inventaria sombras e as faria realizar seus sonhos? Isso traria felicidade para sua trágica mãe e seu pai?
Elric olhou por cima do ombro para a floresta. Não havia sinal de seu pai agora.
— Parecia tão real. De carne tão sólida!
— Você deve acreditar que somos a única carne sólida em toda esta terra. E até nós somos... — ela se conteve, sua mão se estendeu para o rosto dele e o beijou. — Vamos descansar um pouco, nem que seja para restaurar nossa força psíquica.
E Oone puxou Elric para as folhas macias ao lado do caminho. E ali o beijou e moveu suas lindas mãos sobre seu corpo e lentamente ela se tornou tudo o que ele havia perdido em seu amor pelas mulheres e ele sabia que, por sua vez, se tornou tudo o que ela sempre recusou a se permitir desejar em um homem. E também se deu conta, sem culpa ou arrependimento, que o ato amoroso deles não tinha passado e que seu único futuro estava em algum lugar além de suas próprias vidas, além de qualquer reino que jamais visitariam, e que nenhum dos dois jamais testemunharia as consequências. E apesar desse conhecimento, sentiram-se despreocupados e felizes, e deram um ao outro a força de que precisariam, se é que confiavam em levar a um bom término a missão para alcançar a Fortaleza da Pérola.
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