Capítulo 07
Ela chegou em casa em cinco minutos, uma caminhada que em qualquer outro dia teria levado pelo menos vinte. Durante todo o caminho de volta, Muriel se maravilhou com a beleza peculiar da criatura e com a forma extraordinária como a fizera sentir.
Aquilo fizera a dor desaparecer.
E não apenas a dor infligida por Conor Grant. A absolvera das pequenas dores nos ossos, das leves pulsações nas mãos, uma dor tão frequente, tão constante, que quase se acostumara. A ausência dela a transportou de volta a um tempo anterior à dor, quando seu corpo era jovem e forte.
Abrindo o portão, pegou o carrinho de mão que usava para transportar plantas pelo jardim e correu em direção à praia, a única roda do carrinho batendo nas pedras. Há anos não corria, e o formigamento do vento contra seu rosto a fez sorrir. Que diabos, a fez rir.
A criatura estava onde a havia deixado. Qual a melhor forma de levantar a coisa? Deveria ter trazido uma pá ou uma bandeja. Tentou agarrar as bordas, mas ela escorregou de suas mãos como ovas de sapo. Deitando o carrinho de mão de lado, Muriel tentou pegar a criatura nos braços. O grande olho se abriu preguiçosamente, observando-a se preocupar com ele. Usando o que pareciam ser suas últimas reservas de força, ele escorreu para dentro do carrinho de mão, a cor se esvaindo rapidamente, o olho se fechando enquanto o sol se punha e a escuridão reinava.
— Vamos, eu te levo para casa. — disse Muriel.
Endireitando o carrinho de mão, começou a empurrar. Era difícil, a roda afundando mais na areia a cada passo, então virou o carrinho e o puxou atrás de si.
Quando chegou em casa, o sol já havia se posto e estava escuro. A luz da varanda estava acesa, graças ao sensor que seu neto havia instalado alguns anos antes, e seguiu o brilho intenso. O carrinho de mão rolou sobre o trilho irregular, a criatura balançando de um lado para o outro. Muriel chegou à porta e entrou, depois subiu o degrau com dificuldade e seguiu pelo corredor até o banheiro. Lá, abriu as torneiras, ambas a todo vapor. Os canos chacoalharam enquanto lama preta jorrava na banheira, eventualmente dando lugar à água fria que jorrava enquanto inspecionava a criatura. Ainda estaria viva? Teria sido rápida o suficiente?
A banheira encheu devagar.
E se precisar de água salgada?
E se? Tudo o que sabia era que a coisa no carrinho de mão estava morrendo e precisava tentar salvá-la. Todas as criaturas de Deus mereciam isso.
Até Patrick Grant, supôs, relutante.
Algo se moveu pelo canto do olho.
A criatura.
Estava escorrendo pela lateral da banheira. Seu corpo viscoso pendia sobre a borda da banheira e então tombou com um respingo.
— Como está a água? — perguntou Muriel.
Não houve resposta. A coisa flutuou pacificamente. Afundou até o fundo e depois subiu, seu corpo se dobrando e ondulando em aparente conforto. O olho se abriu de novo, arregalou-se. Olhou com desejo para Muriel por vários segundos, antes de se fechar.
Ela pensou ter ouvido palavras, palavras que não conseguia entender, numa voz que não ouvia há muitos e muitos anos, porém era tudo muito abafado, muito indistinto.
O relógio no corredor soou oito vezes. Como havia passado um dia inteiro? Uma onda de exaustão a inundou. E seria sua imaginação ou a dor nas costelas havia retornado? Ela abriu o armário espelhado e encontrou um pacote de Tramadol. Mal conseguindo manter os olhos abertos, Muriel saiu cambaleando do banheiro e foi para o corredor, batendo nas paredes como uma bola de pinball. Na cozinha, engoliu o analgésico com um copo d’água, sentou-se na cadeira e esperou que o quarto parasse de girar.
Quando isso aconteceu, ela pegou o telefone e discou o número de Arthur. A linha tocou, e só então se lembrou de que ele estava preso.
Ah, ela tentaria de novo mais tarde. Queria contar a ele sobre sua descoberta maravilhosa. Uma nova criatura marinha! Talvez isso bastasse para impedir a destruição da baía? Estava convencida de que era uma nova espécie.
Billy nunca havia mencionado nada parecido, e já tinha visto de tudo.
Uma nova criatura. Que sorte extraordinária!
Ela desligou o telefone e fez uma careta quando o braço da cadeira pressionou suas costelas. Aquela criaturinha estranha havia feito a dor passar.
Por um tempo.
Sim, mas um breve descanso era melhor do que nada.
Muriel caminhou sonolenta para o quarto e, quando sua cabeça encostou no travesseiro, seus olhos já estavam se fechando. Ela olhou por um instante para a porta, onde aquele lindo brilho do arco-íris brincava nas paredes como a aurora boreal.
Eu te amo, ela ouviu Billy dizer, e então caiu em um sono profundo e sem sonhos.
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