Capítulo 11
Tommy Boden se levantou da grama, com a mão pressionada no abdômen, o sangue quente jorrando entre os dedos abertos.
— Socorro! — repetiu, mas a velha já havia corrido na direção do fogo.
Seus amigos o haviam abandonado.
Eles o haviam abandonado ali mesmo, depois que o velho desgraçado o esfaqueou. Talvez não tivessem percebido? Nenhum deles sabia que um assassinato estava em jogo. Haviam sido pagos para incendiar o lugar, mas Dean lhes dissera que estava deserto. Será que confiava em Dean? Não, na verdade não. Ninguém confiava. Supôs que Dean soubesse o tempo todo, porém não contara a ele nem a Nicky, caso se acovardassem. Era para ser um golpe de seguro, seja lá o que isso significasse. Esta casa hoje à noite, e outra mais adiante, na costa, uma semana depois. Receberiam uma quantia considerável por seus esforços, mil libras cada, metade adiantada.
Agora Tommy se perguntava se algum dia conseguiria gastar o dinheiro. Estava sangrando muito e precisava de ajuda. Com os olhos semicerrados, cambaleou em direção à casa da velha senhora. Seria ali que iriam mirar na semana seguinte?
Porra, pensou. Devia estar indo na direção errada. A chuva dificultava a visão, sem mencionar a sensação horrível de seu sangue vital evacuando seu corpo em um ritmo constante.
Ele voltou a cair, aterrissando na lama, e levantou o moletom com capuz e a camiseta, avaliando os dois cortes em seu estômago. Sangue esguichou das feridas e quase vomitou. Nunca havia sido esfaqueado antes. De alguma forma, foi mais doloroso do que o esperado. Seus joelhos estavam fracos, contudo a casa era tão perto. Uma das janelas, devia ser do banheiro, já que o vidro era fosco, brilhava em um tom de arco-íris como uma lâmpada de lava. Isso lembrou Tommy da velha luz noturna do quarto de seu irmãozinho, um carrossel giratório que projetava a imagem de um trem nas paredes do quarto.
Chegou à casa de pedra branca e encostou-se nela, ofegante, deixando uma marca de mão ensanguentada que escorria pelo exterior. Ofegante, deslizou pela parede até chegar à porta da frente. Estava entreaberta. A velha tinha saído às pressas.
Tommy cambaleou para dentro. A casa estava silenciosa, as luzes apagadas.
— Tem alguém em casa? — perguntou. — Preciso de ajuda.
Sem resposta. Máquinas tilintavam e batiam lá fora, e se perguntou por um momento como alguém conseguia dormir com tanto barulho. Cambaleou para a sala de estar, a mão ensanguentada estendendo-se para o interruptor. A lâmpada acendeu. O cômodo era antigo, o papel de parede floral lembrava Tommy do apartamento da avó.
Olhou ao redor, vislumbrando-se em um pequeno espelho sobre a lareira. Estava pálido. Mortalmente pálido. Até seus lábios estavam sem cor.
Viu uma cozinha e caminhou em direção a ela.
— Porra! — gemeu. O que fazer? Precisava se limpar, estancar o sangramento e sair dali. Alguém chamaria os bombeiros e a polícia apareceria. Tinha que ir embora antes que eles chegassem. Seu pai o mataria se se metesse em encrenca com a polícia de novo. E o Dean?
Bem, se entregasse o Dean, sua vida não valeria a pena.
Ele abriu as torneiras acima da pia da cozinha. Uma lama preta pingava, batendo no metal. Inútil pra caralho. Arrancou um punhado de papel-toalha e pressionou contra os ferimentos. Doeu pra caramba, e cerrou os dentes com força, agoniado, embora o fato de ainda estar de pé e andando sugerisse que os ferimentos não eram tão graves quanto pareciam.
Água limpa escorria da torneira. Ele se abaixou e enfiou o rosto embaixo da torneira, sentindo o gosto do líquido frio na língua ressecada. O papel-toalha já estava encharcado de sangue, então o jogou na pia, pegou mais um pouco e saiu cambaleando da cozinha. Havia um telefone na mesa da sala, um daqueles com fio que os idosos ainda usavam. Sabia que deveria chamar uma ambulância, no entanto não podia correr o risco. Os médicos faziam perguntas demais.
Estava tudo bem. Estancaria o sangramento e sairia de fininho. Seu pai tinha saído para beber com os amigos esta noite, e sua mãe havia pegado o bebê e os deixado no mês passado, então não haveria ninguém em casa para sentir sua falta de qualquer maneira. Sentou-se no sofá, balançando os pés para cima e deitando-se sobre ele, puxou o lenço contra a barriga. Seu sangue estava espalhado pelo chão, entretanto não havia nada que pudesse fazer a respeito.
Voltou a verificar o papel toalha. Ainda havia um pouco de branco visível, então talvez o sangramento estivesse diminuindo?
No final do corredor, algo molhado e pesado caiu no chão.
— É você, senhora? — perguntou Tommy. Sua garganta estava seca e o gosto de sangue acobreado persistia. — Preciso de ajuda. A senhora sabe primeiros socorros?
Silêncio.
— Senhora?
Ouviu o rangido metálico de uma maçaneta, depois um clique forte. Uma porta se abriu com um gemido nas dobradiças enferrujadas.
— É você?
Gotas de suor escorriam pela testa de Tommy. Ouviu algo, um som estranho, um leve chapinhar como quando seus sapatos estavam encharcados pela chuva. Havia uma presença na sala junto com ele.
— Senhora?
Ainda sem resposta. Tinha que ser a velha. Será que era surda? Ou teria descoberto o que tinha feito e estava tentando surpreendê-lo?
Foda-se. Podia ter sido esfaqueado, porém ainda podia dar uma surra em alguma velha. Ele a mataria se precisasse. Dean apreciaria isso.
Alguma coisa vinha em sua direção. Estava por ali, perto, todavia não conseguia ver. No entanto ouviu, deslizando encharcado pelo chão.
— Eu sei que você está aí! — gritou.
Uma voz falou em sua cabeça. Era uma língua desconhecida, apesar que de alguma forma inexplicável, sabia o que dizia.
Com fome...
— Vai se foder!
Ele se levantou, deixando o maldito papel toalha cair aos seus pés, e preparou os punhos, curvando-se um pouco para aliviar a dor.
A coisa estava perto. Por que não conseguia ver?
— Vou te arrebentar pra caralho! — ameaçou, dando um passo à frente, com a adrenalina a mil.
Seu pé pousou em algo pegajoso.
— O que é isso? — falou, com uma voz fina e apavorada. Olhou para a poça brilhante aos seus pés, e então ela disparou para cima, grudando em suas pernas, subindo mais alto.
Queimava.
O fino material de náilon de sua calça de moletom secou, revelando uma musculatura crua e brilhante sob a substância gelatinosa e contorcida. Bateu nas pernas, na gosma que parecia descascar camadas de pele a cada segundo, mas sua mão ficou presa. Foi puxada para dentro da gosma, e a sentiu se dissolver. Não apenas a carne desta vez, até os ossos também. Eles se desintegraram em sua pele derretida como uma luva de borracha cheia de migalhas de pão.
A gosma continuou subindo, deslizando por suas coxas.
Tommy gritou, clamou, chorou. Lembrou-se do isqueiro no bolso. A coisa estava quase lá, então enfiou a mão restante e o puxou. Acendeu na primeira vez, entretanto quando o enorme olho branco se abriu e o encarou, Tommy largou o isqueiro, aterrorizado. Gritou novamente, e então sua voz o abandonou enquanto uma gosma fria subia por seu ânus. Cerrou as bochechas e enfiou a mão na parte de trás da calça, agarrando o cordão membranoso com força e puxando com força. Estava preso a algo. Algo dentro dele. Puxou com mais força, sentindo a pressão em suas entranhas, até que... Com um último puxão hercúleo, suas entranhas se abriram, liberando uma torrente de merda quente que jorrou por entre suas bochechas cerradas.
Quando os órgãos internos de Tommy começaram a se liquefazer, ele emitiu um gemido fino e agudo. Através da pele translúcida da criatura, podia ver seu pênis se desfazendo em pedaços e flutuando pelo corpo turvo da coisa que se agarrava ao seu corpo, destruindo-o, matando-o.
— Meu pau! — gritou. — Meu pau, porra!
Como últimas palavras, elas podem não ter sido profundas, mas certamente foram apropriadas.
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