Capítulo 12
A polícia chegou alguns minutos depois do carro de bombeiros, um único carro com dois policiais dentro.
Um dos bombeiros havia dado um guarda-chuva a Muriel, e ela se abrigou sob ele enquanto esperava. Sabia que a polícia iria querer falar com ela, e tudo bem, porque também queria falar com eles. Seu choque estava desaparecendo, substituído por uma raiva justificada e incandescente.
A casa de Arthur ardia em chamas enquanto os bombeiros a encharcavam com água. Não conseguia desviar os olhos da estrutura esquelética em chamas. Tantas memórias, desaparecidas em uma nuvem de fumaça.
Os policiais... Um homem e uma mulher... Falaram primeiro com o bombeiro-chefe, que apontou para Muriel, e os dois a olharam com interesse. Os policiais agradeceram ao homem e caminharam em sua direção, a chuva batendo em seus chapéus.
— Sra. McAuley? — disse a policial.
— Isso mesmo. — disse Muriel, tentando se recompor. — Muriel Margaret McAuley.
Pronunciou seu nome com orgulho, como sempre fazia.
— Entendo! — disse o policial. — E onde você pod...
— Foi incêndio criminoso.
O policial a olhou com curiosidade.
— Uh huh.
Ele não parecia convencido, e Muriel sabia que enfrentaria uma batalha difícil.
— Patrick Grant vem tentando nos intimidar há um ano. É óbvio que enviou alguém para incendiar a casa do pobre Arthur. Essa é a casa de Arthur Eastman... E-A-S-T-M-A-N é quem morava lá. Sabia que Grant faria qualquer coisa para se livrar de nós, mas nunca acreditei que se rebaixaria a um assassinato.
Os policiais trocaram um olhar que sugeria que a achavam louca. Não importava. Estava usando galochas confortáveis e, se precisasse, ficaria ali a noite toda até convencê-los.
— Essa é uma acusação, hum, muito séria. — disse o policial, o bigode se contraindo enquanto falava. — Presumo que tenha provas para comprovar o que disse, certo?
Sua colega deu um sorriso irônico, sem conseguir disfarçar bem.
— Bem, não, ainda não, porém é óbvio para qualquer um com meio cérebro. Esse é um requisito para fazer parte da polícia, não é?
— Não precisa ser rude, Srta. McAuley.
— É Sra.
— De fato.
Muriel respirou fundo. Estava com frio e cansada, contudo não se deixaria intimidar por esses idiotas.
— Grant está nos assediando desde o início do desenvolvimento. Era só uma questão de tempo até que... — ela fez uma pausa. — Você não deveria estar anotando o que digo?
— Possivelmente. — ele deu de ombros. — No entanto...
Muriel cerrou os punhos, a raiva crescendo dentro dela.
— No entanto o quê?
Ele começou a responder, mas sua parceira interrompeu.
— Sabemos quem a senhora é.
Muriel se irritou.
— E quem sou eu?
A policial lhe lançou um sorriso cansado.
— A senhora é uma das encrenqueiras.
— Você está atrasando o empreendimento. — disse o policial. — O Sr. Grant está trazendo muito dinheiro para este lugar. É um homem de negócios. Um bilionário. Não é o tipo de pessoa que anda por aí provocando incêndios. Não é um bandido.
— Um bandido é exatamente o que este homem é. — Muriel balançou a cabeça. — Porém parece estar lhe pagando, não é?
— Sra. McAuley, por favor. Eu não sairia fazendo mais acusações por aí.
— Isso poderia lhe causar sérios problemas. — disse a policial.
— Como falei... — continuou seu parceiro. — O Sr. Grant está arrecadando uma quantia considerável de dinheiro. Está criando empregos e fazendo um bem enorme para a comunidade.
Muriel os encarou, incrédula.
— Vocês são a polícia! Deveriam proteger e servir o público, não os interesses de canalhas desonestos como Patrick Grant! — ela cuspiu o nome como se fosse veneno.
— Estamos apenas fazendo o nosso trabalho.
— É, é o que todos dizem. Estou apenas fazendo o meu trabalho. — Muriel deu uma risada de dor. — Se estivesse fazendo o seu trabalho, um homem ainda estaria vivo. Um bom homem. Duas vezes mais homem do que você, policial.
— Vou perguntar de novo... — disse o oficial. — Há alguma prova para sustentar sua alegação? Alguma testemunha?
— Tenho Deus como minha testemunha.
— E ele está disponível para prestar depoimento?
Muriel o encarou. Estava brava demais para chorar.
— Você é podre. — disse ela. — Os dois são. Assim como Grant, podres até a medula. Bem, terão o que merecem.
A policial ergueu uma sobrancelha.
— Está nos ameaçando, Sra. McAuley?
Muriel suspirou, a luta se esvaindo. De repente, não queria nada mais do que ficar sozinha. Pensar em Arthur, chorar por ele. Era demais. Era demais. Precisava voltar para casa, para Avalon. Talvez ele pudesse acalmá-la outra vez, como fizera antes. Poderia fazer a dor ir embora, mesmo que por pouco tempo.
— Não estou ameaçando ninguém! — respondeu. — Está tarde e meu amigo está morto. — ela engasgou com a última palavra, com os olhos embaçados. — Vou para casa. Se precisar de mim, tenho certeza de que sabem onde me encontrar.
Seus passos se voltaram para sua casa, e o policial colocou a mão em seu ombro.
— Não é nada pessoal, Sra. McAuley. A senhora sabe disso, não sabe?
— Apenas aceite o dinheiro. — disse a parceira. — Será mais fácil para todos.
Ela os encarou.
— É, talvez eu aceite. — mentiu. — Talvez.
Ela se virou. O policial disse algo mais, contudo as palavras se perderam, se perderam para sempre como uma única gota de chuva caindo no oceano.
———
Ao sair do local, Muriel avistou uma van de TV chegando. Perguntou-se se seriam os mesmos jornalistas que haviam filmado a prisão de Arthur.
Aqueles sanguessugas.
Como puderam fazer aquilo com um velho? Ele tinha família. Tinha amigos. Tinha uma vida, e agora se fora.
Muriel não era estranha à morte. Na sua idade, já tinha visto muitos de seus entes queridos falecerem. Perder amigos para a doença e a idade fazia parte do envelhecimento e, embora tenha aceitado, nunca ficou mais fácil. Arthur, no entanto, foi a primeira pessoa que conheceu que foi assassinada.
Você não sabe disso.
Ah, mas ela sabia.
Quando chegou em casa, sua luz sensora acendeu. Que horas eram? Não tinha ideia. Estava escuro como breu, no meio da noite. A luz iluminava o caminho e os restos do galinheiro. Percebeu que teria que consertar a cerca sozinha. Arthur ia fazê-lo, porém... Não poderia mais.
— O que é isso? — sussurrou.
Havia uma marca na parede. Uma marca de mão. Caminhou até a marca e pressionou a ponta do dedo na mancha. Seu dedo ficou úmido de sangue. Sua frequência cardíaca acelerou. E se as pessoas que mataram Arthur tivessem vindo buscá-la?
Estariam esperando lá dentro?
Então por que deixariam uma marca de sangue lá fora?
— Um aviso... — murmurou, sombria. Eles sabiam que ela não podia ir à polícia. A polícia era tão útil quanto um tapa na cara, e duas vezes mais desagradável.
A porta da frente estava escancarada. Será que tinha esquecido de fechá-la? Forçou a cabeça, tentando pensar. Na pressa, talvez tivesse esquecido. Olhou para baixo e viu um rastro de sangue entrando.
— Arthur?
Poderia ser? Será que era mesmo? Será que Arthur tinha escapado do inferno e ido para a sua casa? Excitação e medo se misturavam em sua mente. Cruzou a soleira, saindo da chuva e deixando o guarda-chuva cair no chão do corredor.
— Arthur, é você?
A luz da sala estava acesa. Estava apagada quando saiu da casa. Alguém estava ali. Apressou o passo, com água pingando das mangas do casaco, e entrou no quarto.
Ali, ela congelou.
— Meu Deus! — exclamou. Seus joelhos cederam e agarrou o batente da porta enquanto deslizava. — Meu Deus.
A sala de estar era um matadouro.
O sangue encharcava o sofá e o carpete. As paredes também estavam salpicadas com a substância. Algo pingou na cabeça de Muriel, e seu rosto se voltou para o teto. Mais sangue. Havia sangue por toda parte. O quarto cheirava a morte. Era como se alguém... Ou alguma coisa, tivesse acabado de... Explodir.
Muriel tentou se levantar, mas não conseguiu. Olhou para o teto, para o pingar constante de sangue. Estava no abajur, na mesa, na cadeira de Billy, em...
Seu coração parou, as unhas cravando-se no batente da porta com força suficiente para arranhar a tinta. A velha cadeira de Billy estava virada para a janela.
Havia alguém ali.
Conseguiu distinguir uma mão no braço da cadeira, dois pés firmemente plantados no carpete. A figura estava de pé. Ele estava nu, delineado em um azul glacial pelo luar que entrava pela vidraça manchada de sangue.
Ele olhou para ela.
— Olá, Muriel! — disse Billy.
***
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